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Álbum de Testamentos

"Como é possível alguém ter tanta palavra?" – Ivo dos Hybrid Theory PT

Música 2023 #3: Too big to hang out, slowly lurching toward your favorite city

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Hoje vamos então falar da dona disto tudo, da omnipresente. Taylor Swift é um poço sem fundo de ótima música. Dez álbuns de estúdio, um décimo-primeiro a caminho, em menos de vinte anos de carreira, incluindo reedições e respectivos baús e, no caso de Midnights, múltiplas edições especiais. Chega a ser irritante. 

 

Mas não há volta a dar. Taylor tornou a ser uma das artistas que mais ouvi em 2023. 

 

Este ano, Taylor lançou duas regravações de álbuns antigos: Speak Now no verão, 1989 no outono. Gostei muito do primeiro. Speak Now era um daqueles que ainda não tinha explorado muito e estava à espera da reedição para ficar a conhecer melhor. 

 

Não fiquei desiludida. Já tinha ouvido alguns fãs elogiando as letras em Speak Now, as histórias que contam – algo que regressaria em força em folklore e evermore. Também gosto muito da sonoridade: o country pop do início da carreira dela misturado com rock, alguns momentos de pop punk e metal sinfónico.

 

Um aspeto de que gosto imenso em relação a Speak Now – tanto no alinhamento padrão como no baú – é da duração destas músicas. Faixas de quatro ou cinco minutos, algumas de seis ou sete. Solos de guitarra, instrumentos com tempo de antena. Numa altura em que é raro ouvirmos música com mais de dois ou três minutos de duração, sabe bem, é refrescante.

 

Já conhecia e gostava de algumas músicas em Speak Now: Mine e Back to December. Enchanted, então, é uma das minhas preferidas de Taylor há uns anos. Com a regravação fiquei a conhecer e a gostar de mais umas quantas. 

 

Haunted, para começar, a tal que brinca com metal sinfónico. Parece uma música dos Within Temptation. É gira, mas uma parte do meu cérebro está sempre à espera de ouvir a voz de Sharon den Adel. Também gosto de Dear John e Last Kiss. Better than Revenge é a Misery Business de Taylor – um bocadinho de mesquinhez sabe bem de vez em quando. Never Grow Up leva-me lágrimas aos olhos – Taylor tem demasiadas músicas com essa capacidade, não acho nada bem.

 

 

Mas as minhas preferidas neste álbum são duas (bem… três, se contarmos com Enchanted). A primeira é Sparks Fly – aparentemente um clássico na discografia de Taylor. Segundo as minhas pesquisas, Taylor tê-la-á composto aos dezasseis anos, ainda antes de ter lançado o seu álbum de estreia. Tocou-a nalguns concertos, apareceram vídeos dessas apresentações na Internet, os fãs adoraram e convenceram Taylor a gravá-la para Speak Now. A versão de estúdio é diferente, menos country, mais pop rock, com alterações na letra. Na minha opinião é melhor, mas não nego que a versão pré Speak Now tem um charme muito próprio.

 

Adoro a sonoridade de Sparks Fly, sobretudo aquele refrão. Em termos de letra – sobre paixão adolescente – não é super original, mesmo um bocadinho básica, mas que posso dizer? Apela ao meu coração romântico de menina de quinze anos – um pouco como Enchanted, na verdade.

 

E, de qualquer forma, a letra tem um ou outro indício de que a narradora tem mais autoconsciência do que seria de esperar. “Give me something that’ll haunt me when I’m not around” – ela quer sentir-se assim, ela quer que o seu interesse romântico lhe dê motivos para o prender na sua cabeça. Também gosto do verso “Get me with those green eyes”. Olhos bonitos usados como armadilha, mesmo como arma.

 

A minha outra preferida é Long Live, a faixa que encerra a edição-padrão de Speak Now. Esta é outra com uma sonoridade pop rock grandiosa que eu adoro. A letra é uma carta de amor de Taylor para os seus colaboradores, a sua banda e – como ela tem sublinhado nos últimos tempos – os seus fãs. É uma canção de vitória, uma celebração dos seus triunfos após ter entrado no mundo da música como desfavorecida.

 

Ou pelo menos é assim que ela se pinta.

 

Isto pode ter acontecido por a regravação ter saído poucos dias antes do 10 de julho, mas, de uma forma muito minha, desde o início associei Long Live à vitória da Seleção Portuguesa no Euro 2016. Afinal de contas, também essa foi uma história de underdogs que triunfaram. 

 

 

When they gave us our trophies and we held them up for our town” recorda-me, claro, as nossas celebrações no feriado a seguir à final. “You held your head like a hero on a history book page” é basicamente a postura de Cristiano Ronaldo por defeito. “I had the time of my life fighting dragons with you” faz-me pensar em como tantos destes jogos grandes, contra tubarões futebolísticos, o nervosismo, a euforia, a frustração, os Nitromint debaixo da língua, têm sido dos períodos mais excitantes da minha vida. 

 

Por fim, os versos “and the cynics were outraged, screaming ‘this is absurd’” dão-me vontade de rir. Descrevem de forma quase literal a reação dos franceses à nossa vitória.

 

Por outro lado, embora esses versos também se encaixassem no tema da final do Euro 2016, prefiro dedicar aquela parte mais calminha (a que começa com “Will you take a moment?”) à minha família HT.

 

…talvez eu esteja na minha era Speak Now – depois de ter passado por uma era Midnights na primeira metade de 2023.

 

Passemos às faixas inéditas de Speak Now. É possível que a minha opinião mude no futuro mas, até ao momento, este é o meu baú preferido das regravações. A única de que não gosto tanto é Electric Touch (acho que teria ficado melhor sem a participação do Patrick Stump).

 

Começando por Castles Crumbling, aquela por que mais ansiava por causa da participação de Hayley Williams. Estava com algum medo de uma situação semelhante a Snow On the Beach, em que a voz de Lana Del Rey mal era perceptível – de tal modo que, mais tarde, foi lançada uma segunda versão da música. No que toca a Taylor, por vezes “feat” é uma palavra demasiado forte.

 

 

Felizmente, nesse aspeto, não nos podemos queixar de Castles Crumbling. Hayley ouve-se bem quando canta – a interpretação do verso “and they trusted me” é muito ela. Eu queria ainda mais Hayley, mas podia ter sido pior.

 

Alguns de nós estranharam que tenha sido esta música a ter a participação de Hayley. Uma balada ao piano, calminha, vagamente atmosférica, não é o género musical em que o ouvinte comum pensa quando se fala na Hayley dos Paramore. Hayley revelou há umas semanas que a primeira música que Taylor lhe enviou se encaixava melhor no estilo pelo qual os Paramore são conhecidos (provavelmente Electric Touch), mas Hayley não gostou. Taylor, então, enviou-lhe Castles Crumbling. Hayley gostou mais dessa.

 

A letra terá sido um dos elementos a conquistar Hayley. Como li algures, Castles Crumbling é a antítese de Long Live. É uma canção de derrota em vez de vitória. A narradora perdendo o amor do público, o poder que detinha e ao qual se afeiçoar demasiado – ao ponto de ter deixado corrompê-la. 

 

É interessante analisar a letra de Castles Crumbling à luz das personalidades díspares de Hayley e Taylor. Penso em Idle Worship e No Friend, dos Paramore, cujos narradores se ressentem dos pedestais em que foram colocados, que avisam – com toda a razão – que aquilo que os fãs veneram é uma ideia, uma ilusão, não corresponde à realidade.

 

Acho que Taylor está mais afeiçoada à fama que Hayley. Ela mesma se descreveu há pouco tempo como “a pathological people pleaser”, e os últimos anos deixaram bem claro que ela gosta da fama, gosta da sua posição como DDT do mundo da música (e não só) – daí eu torcer o nariz a algumas das mensagens de Anti-Hero. Havemos de regressar a essa ideia mais à frente. 

 

Aqui entre nós, não estou habituada a isso da parte dos artistas e bandas que sigo. Estou habituada a ouvi-los falar mais de amor à arte, menos de amor à atenção e aos prémios. Mas também acredito que pelo menos alguns deles liguem mais a isso do que estão dispostos a admitir.

 

Não que vá fazer juízos de valor sobre esta atitude de Taylor (bem… não muitos). Tem as suas vantagens e as suas desvantagens, como tudo. Em Castles Crumbling mostra mágoa pela perda do pedestal. Penso que será um retrato fiel daquilo que Taylor sentiu quando Kanye West a humilhou durante os VMAs – e talvez quando o público se virou contra Taylor em 2016.

 

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Ao mesmo tempo, a narradora de Castles Crumbling admite culpas naquilo que aconteceu, admite ter abusado da sua posição. O que remete para Dear Reader – uma música que tem vindo a subir na minha consideração nas últimas semanas – onde Taylor tenta dar conselhos, mas sabe que não tem autoridade para tal. Gosto em particular dos últimos versos “You should find another guiding light, guiding light, but I shine so bright”. É como se Taylor estivesse em debate consigo mesma – ou com a voz do coro, como numa tragédia grega. Ela gosta de ser admirada, gosta de ser um exemplo a seguir, mas sabe que não o merece verdadeiramente.

 

Castles Crumbling será talvez a melhor música do baú de Speak Now, a mais profunda. Naturalmente, já que os Paramore irão com ela para a Eras Tour na Europa, espero que Taylor e Hayley a cantem todas as noites.

 

I Can See You, a única música do baú com direito a videoclipe, é engraçada, mais sexy  do que o habitual para Taylor na altura – com tropos que ela só voltaria a usar em Reputation. Compreende-se porque terá sido deixada de fora da Speak Now original – a equipa de Taylor, talvez ela mesma, tentando manter uma imagem ainda relativamente inocente.

 

When Emma Falls in Love é fofinha. Timeless também é linda: a letra faz lembrar Mine e também as letras em folklore e evermore.

 

Finalmente, Foolish One é daquelas músicas que nos faz perguntar “Quem nunca?”. Sobre enganos de alma ledos e cegos, sobre alimentar ilusões sobre os nossos interesses românticos, mesmo sabendo que a outra parte não sente o mesmo.

 

Definitivamente nunca me aconteceu. Nunca fiz filmes na minha cabeça baseando-me em quase nada, sabendo que a pessoa em questão já estava comprometida. No cenário pintado em Foolish One, em defesa da narradora, o interesse romântico (assumindo que é um rapaz) também estava comprometido, mas mantinha um caso com a narradora. A narradora só se culpa a si mesma, mas a verdade é que isto não abona nada a favor do carácter do rapaz. No fundo, uma versão mais jovem e inocente de illicit affairs.

 

 

De qualquer forma, no final de Foolish One, a narradora é gentil consigo mesma. Promete a si mesma que, um dia, haverá quem corresponda aos seus afetos. De qualquer forma, Foolish One é uma boa música para se ouvir depois de Sparks Fly, para descer um pouco à Terra.

 

Como poderão concluir, gostei muito de Speak Now (Taylor’s Version). Pena a sua era ter sido tão curta. Cerca de um mês depois, mais coisa menos coisa, Taylor estava já a anunciar a regravação de 1989 e rapidamente se deixou de falar de Speak Now. Foi chato.

 

Embora, para sermos justos, ao menos o baú de Speak Now teve direito a um videoclipe. O de 1989 não teve essa sorte.

 

Ao contrário do que aconteceu com as regravações anteriores, já tinha acompanhado o lançamento da 1989 original e guardo alguma nostalgia em relação a essa hora. Ouvir Shake it Off em todo o lado e arranjar a minha própria coreografia para ela, usar versos de Blank Space para descrever os meus primeiros tempos com a Jane.  

 

Também já conhecia o álbum bastante bem. Ainda pensei que pudesse redescobrir algumas músicas da edição-padrão, mas não foi o caso. Tirando You Are in Love e Wonderland, mais recentemente, aquelas de que gostava não se alteraram. As minhas favoritas são Clean, Wish You Would e os singles, tirando Bad Blood.

 

Avancemos já para as faixas do baú. Em termos de temática são muito consistentes – parece que são todas sobre o romance falhado de Taylor com Harry Styles. Aliás, as cinco parecem contar uma narrativa, começando na lua-de-mel da relação, passando pelas diferentes fases da rotura. Pode-se argumentar que a história tem um final aberto – a narradora perguntando se a relação terminou mesmo. Não é dada uma resposta.

 

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Infelizmente, não gosto tanto do baú de 1989 como gosto do baú de Speak Now. Parte disso, será mesmo porque as músicas são pura e simplesmente menos apelativas para mim. Por outro lado, na altura em que saiu a regravação, vi imensos vídeos de Swifties no YouTube sobre estas músicas… e acho que foi um erro.

 

Este é para mim o problema da música de Taylor e dos Swifties. Com as devidas exceções (e mesmo assim há quem duvide que sejam mesmo exceções), Taylor infamemente escreve sobre pessoas reais, escreve a sua própria história, deixa pistas, referências. Um típico Swiftie adora escrutinar as letras, os videoclipes e… bem, tudo o que Taylor faz ou deixa de fazer, para tentar descobrir mensagens secretas, descobrir de que interesse romântico Taylor está a falar, o que isto revela sobre a relação deles. 

 

Não digo que não compreenda o apelo, atenção! Também compreendo o gozo de Taylor em escrever a sua própria história, em criar a sua própria mitologia. Eu faço o mesmo, até certo ponto, com os meus blogues – numa escala muito menor, claro. Mas por vezes é demais. Lá está, sou o tipo de ouvinte que gosta de fazer as suas próprias interpretações das músicas que ouve. Não gosto de me limitar a um cânone oficial. 

 

É por isso que gosto mais do baú de Speak Now. Tem menos bagagem em termos de “lore”.

 

Mas pronto, isto sou só eu, o problema sou eu – (mais uma) obrigatória referência a Anti-Hero. Sou eu que tenho de reajustar a minha relação com a música de Taylor e com as análises de Swifties mais ferrenhos. É preciso moderação.

 

Falemos sobre as músicas em si. Uma das minhas preferidas neste baú é Say Don’t Go. Sobretudo pela parte musical. As melodias são super cativantes e bem apoiadas pela instrumentação. Aquele refrão é irresistível, incluindo os backvocals. Não posso deixar de reparar nas semelhanças, tanto em termos de letra como de musicalidade, com You’re Losing Me. 

 

 

Now That We Don’t Talk também é interessante. Ainda assim, acho que todos concordamos que Is it Over Now é a melhor deste baú. Para começar, é a mais sumarenta no que toca ao romance com Harry Styles. Tem, também, óbvias semelhanças com Out of the Woods. 

 

Um dos meus aspetos preferidos, no entanto, é a sua falta de linearidade, a sua estrutura fora do convencional, o quão caótica soa. Porventura um bom reflexo das emoções de Taylor quando a compôs. 

 

Sei que há algo que vem antes, mas já falamos sobre isso. Para já queria falar do concerto de Taylor na Luz, pelo qual anseio. Tenho feito um esforço para evitar spoilers – nem sequer quis ver o filme da Eras Tour – mas é praticamente impossível. Como disse acima, Taylor Swift é omnipresente, estou sempre a apanhar publicações sobre a Eras Tour. Ainda por cima, em todos os concertos há pelo menos um fã a filmá-lo todo e a transmiti-lo em direto no Tik Tok ou no Instagram (ou no YouTube?). Logo, toda a gente sabe o que acontece em cada noite da Eras Tour.

 

Sinto-me ambivalente em relação a isso. Eu nunca seria a pessoa que filma um concerto inteiro. Não sou repórter de imagem, como disseram uma vez no grupo de fãs dos Hybrid Theory, não é para isso que pago bilhete. E, regra geral, só gosto de ver vídeos de concertos se forem de uma digressão a que já fui. Sou aquela pessoa que não gosta de ter spoilers, caso tenha uma hipótese, por remota que seja, de ir a um concerto desses. Embora seja difícil evitá-los – por exemplo, os HT devem estrear um novo alinhamento no concerto que vão dar na Covilhã, no início de março, e acho que vou ter de fazer blackout às redes sociais para não levar com spoilers

 

E, de qualquer forma, por muito bom que o vídeo seja, não se compara à experiência de estar mesmo lá.

 

Por outro lado, não vou mentir, a ideia de haverem milhares – se não forem milhões – de fãs um pouco por todo o planeta a verem o mesmo concerto ao mesmo tempo é linda. É o que possivelmente irá acontecer a 24 e 25 de maio: imensa gente pelo mundo inteiro de olhos em Portugal, em Lisboa, no Estádio da Luz. Como se fosse a final da Liga dos Campeões ou do Europeu. 

 

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E a verdade é que – chocante! – nem toda a gente é como eu. Regressando aos fãs de HT, lá no grupo há muitas pessoas pedindo vídeos dos concertos para compensar por não poderem ir. Partilhamos a experiência dentro do possível. Eu nunca pediria isso a outra pessoa, não para mim mesma. Mas se me pedem a mim, filmo três ou quatro canções por noite com todo o gosto – que, de resto, faria sempre.

 

Assumindo que os demais não se importam que eu cante por cima dos vocalistas ou que, pelo menos no caso dos HT, grite parvoíces aos membros das bandas. 

 

No que toca à Eras Tour, no entanto, devo ficar demasiado longe para conseguir filmar alguma coisa que se veja. Hei de filmar só mesmo pelo ambiente, pelas bancadas cantando em coro.

 

Estou ao mesmo tempo excitada e nervosa com a perspetiva de ver Lisboa virada do avesso para receber a Eras Tour. Eu que, ainda por cima, trabalho perto do Estádio da Luz e não vivo muito longe dele (“slowly lurching toward your favorite city”). Suponho que não seja pior que a vinda do Papa, no ano passado, que esteja mais ou menos ao nível de, lá está, a final da Champions. E, mal por mal, creio que os Swifties são ligeiramente menos desordeiros que típicas claques de futebol. 

 

Vamos ver como corre. 'bora lá provocar atividade sísmica no Estádio da Luz! E vou fazer figas para que me cruze com Taylor ou com os Paramore na rua, por esses dias. Não é impossível...

 

No meu primeiro rascunho deste texto, nesta parte dizia que esperava que, a médio/longo prazo, depois da Eras Tour e das regravações que faltam, Taylor fizesse uma pausa. Como referi acima, Taylor tem dez álbuns de estúdio publicados, com uma série de músicas extra.

 

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Paremos para pensar nisso. Os Linkin Park só lançaram seis álbuns entre 2000 e 2017. Bryan Adams só chegou ao décimo álbum ao fim de quase vinte e cinco anos de carreira. 

 

E o pior é que toda a discografia de Taylor é boa. Algumas músicas são melhores do que outras, claro, mas no geral acima da média. Como disse acima, um poço sem fundo. E eu ainda não conheço a música dela tão bem quanto desejava. Preciso de passar (ainda) mais tempo com ela. Dava-me jeito ter um ano ou dois sem música nova de Taylor para me pôr a par de tudo como deve ser – até porque, parecendo que não, gosto de ouvir outros artistas e bandas, de vez em quando.

 

Mas não. Vem aí um álbum novo em abril, The Tortured Poets Department. Acho que fui a única cuja primeira reação foi revirar os olhos.

 

Não me interpretem mal. Não digo que não esteja nem um bocadinho entusiasmada com TTPD. Bem pelo contrário. Acredito que será tão bom como qualquer um dos outros álbuns de Taylor, talvez ainda melhor. Aquilo que já se conhece do álbum promete. Estou certa de que, daqui a um ano ou menos, estarei a escrever sobre várias músicas de TTPD no balanço musical de 2024.

 

Mas não começa a ser demais? Ela há de lançar um álbum de inéditas este ano, depois deverão vir as últimas duas regravações em 2025, depois dessa um décimo-segundo álbum inspirado pelo moço atual… Para além da questão de ser demasiada boa música para o tempo de que disponho… Taylor está em todo o lado! No mundo da música, na final da Super Bowl, no ciclo eleitoral norte-americano (conselho de amiga: quando se quiserem sentir melhor em relação aos nossos políticos, pesquisem notícias sobre política nos Estados Unidos), em breve no Estádio da Luz. Sei que nem tudo é por vontade da própria Taylor, mas mesmo assim. Tenho medo de que as pessoas se fartem, de que eu me farte, de que a própria Taylor entre em burnout. Na minha opinião, precisávamos de menos. 

 

Taylor claramente não concorda. Não digo que o gosto pela fama seja o seu principal catalisador. Acredito nela quando diz que cria tanta música pelo gozo. Mas ela também gosta da atenção, gosta de ser dona disto tudo, não adianta negá-lo. E eu tenho medo que as suas asas derretam, que tudo isto rebente na cara dela.

 

Espero estar enganada. Espero que Taylor saiba o que está a fazer. Genuinamente não lhe desejo mal. Mesmo com as suas falhas, que não devem ser ignoradas (a mania de se fazer de vítima, a poluição do seu jato privado, mesmo o facto de ser bilionária, etc), ela está longe de ser uma pessoa horrível e, se é para haver alguém omnipresente desta forma, que seja alguém com o talento de Taylor Swift. Já tivemos de levar com pior.

 

E por agora é tudo. Na próxima parte, a última deste balanço, vou falar de músicas soltas que marcaram o meu ano. Espero não me demorar muito com ela, mas é possível que só consiga publicá-la em março. Enfim.

 

Obrigada pela vossa visita, como sempre.

Música 2023 #1: Feels, concertos e a banda de tributo responsável pela maior parte deles

Primeira publicação de 2024! Um ano muito feliz, caros leitores. 

 

Nos últimos tempos, tem estado na moda nas internetes descrever diferentes fases das nossas vidas como eras – inspirando-nos, pelo menos em parte, em Taylor Swift. É uma coisa recente nas redes sociais, mas a verdade é que é algo que faço há já muitos anos, de certa forma. Penso em diferentes períodos da minha vida, recordo-me de filmes e séries que via na altura, da música que ouvia, em que ciclos de álbuns estavam os meus artistas e bandas preferidos. 

 

Daí este meu hábito de fazer um balanço musical no fim de cada ano aqui no blogue. É uma maneira de escrever a minha própria história, de criar um cânone pessoal, romantizar a minha própria vida. É pura auto-indulgência, provavelmente só eu é que quero saber, mas também noventa por cento deste blogue é auto-indulgência. 

 

2023 foi um ano longo e intenso, de altos e baixos. Tenho-lhe chamado o ano dos feels, um ano em que pensei demasiado, senti demasiado. Muitas emoções contraditórias ao mesmo tempo – não é a primeira vez que falo disso. Muitas delas boas, sim, e vou falar da maior parte neste texto, mas também emoções más, ansiedade. Tive alguns motivos para isso (situações pessoais, no trabalho, etc.), mas em muitos casos não há motivo, é só a minha cabeça, sou eu a fazê-lo a mim mesma. Muitas letras dos Linkin Park fazendo sentido. 

 

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Hei de regressar a essa questão na segunda parte deste balanço. De qualquer forma, grande parte das emoções boas deste ano estiveram ligadas aos concertos – 2023 foi o ano deles. Em termos musicais, o ano valeu mais por eles e menos pela música que ouvi – que, aliás, acabou por ser uma continuação de 2022, com algumas exceções. Havemos de falar sobre isso, mas antes queria dedicar a primeira parte deste balanço aos concertos a que fui. Cinco no total, cada um deles marcante à sua maneira. 

 

Não vamos seguir uma ordem cronológica, no entanto. Vamos começar pelo segundo: o de Avril Lavigne, pelo qual esperei mais de metade da minha vida.

 

Não queria que tivesse sido em Zurique, na Suíça, queria que tivesse sido por cá. Mas como aquela mulher nunca mais regressou a Portugal, eu e muitos outros fãs portugueses cansámo-nos de esperar. Em finais de 2019, comprámos bilhetes para concertos em diferentes cidades europeias. No meu caso, os bilhetes foram prenda de Natal do meu irmão nesse ano – bilhetes para mim, para ele e para a sua namorada. 

 

Ainda assim, como se já não tivessem bastado todos aqueles anos à espera, rebentou a pandemia e a digressão europeia foi adiada nada menos que três vezes – e, na minha opinião, a última vez foi desnecessária. Foi toda uma odisseia só para ver aquela mulher ao vivo.

 

E, aqui entre nós, a verdade é que, na altura do concerto, já nem estava muito muito para aí virada. Tinha outras coisas na mente… e no coração. Estava já a tratar da análise a Meteora20, o concerto dos Hybrid Theory no Altice Arena fora menos de uma semana antes e andava cheia de feels à pala disso (mais sobre isso a seguir… como já devem ter percebido pelo título). 

 

Ao mesmo tempo, quem acompanhe o meu blogue já saberá que, apesar de ainda a considerar a minha cantora preferida, a minha mãe musical, o meu entusiasmo em relação a Avril arrefeceu nos últimos anos, depois dos seus últimos dois álbuns. Sentia-me quase com síndrome de impostora, pensando que o meu eu de dez, quinze anos antes, é que merecia estar ali. 

 

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No entanto, quando Avril finalmente subiu ao palco no The Hall, quando a vi pela primeira vez na minha vida com os meus próprios olhos, em vez de através de um ecrã, juro, vieram-me as lágrimas aos olhos. Toda a gente à minha volta a cantar Bite Me e eu ali especada, rezando para que o meu irmão não reparasse. Este meme ilustra-o na perfeição. 

 

Quanto ao concerto em si, já vi melhores, mas não foi nada mau. Há anos que sei que Avril não é excelente em palco e, sobretudo após uma Doença de Lyme e já a caminho dos quarenta, não se podia exigir muito. Daí, por exemplo, o concerto ter tido tantas pausas (pena ela não ter pelo menos trocado de vestimenta). 

 

Uma coisa de que gostei foi de Avril ter convidado os músicos de abertura para regressarem ao palco e cantarem All The Small Things com ela (podia ter sido uma música dela mas pronto). Não é algo que se veja muitos artistas a fazerem. 

 

De qualquer forma, quando são músicas que adoro tanto quanto estas e o músico é simpático, faz um mínimo de esforço, para mim é suficiente. Até o meu irmão disse que se divertiu – lembrava-se da maior parte das músicas depois de eu as ter imposto lá em casa durante praticamente toda a minha adolescência e mais além. 

 

Tivemos direito a Wish You Were Here, alegadamente a pedido dos fãs, o que foi simpático. Mas claro que eu estava lá sobretudo pelos clássicos. Filmei Complicated e parte de I'm With You (e What the Hell). Ainda não estou cem por cento habituada à minha voz, mas ralo-me cada vez menos. No que toca a este concerto então, foram pelo menos dezoito anos à espera da oportunidade para cantá-las assim. Em I'm With You, então, não poupei as cordas vocais. 

 

No dia seguinte, acordei com uma enorme constipação. Foram dois concertos emotivos, bem vividos, em menos de uma semana, em dois países com climas distintos – na segunda-feira anterior fora a banhos na Costa da Caparica, três dias depois estava em Berna, com temperaturas de inverno português. Está visto que não tenho queda para estrela de rock, que faz digressões por vários países. 

 

 

Mas valeu a pena. Os anos de espera, os adiamentos pela pandemia, o frio, a constipação. Tudo. 

 

Ainda não desisti de vê-la por cá, na companhia dos restantes sobreviventes do Fórum Avril Portugal. Houve uma possibilidade há umas semanas, quando foi anunciada a presença dela em vários festivais de música na vizinhança. No entanto, não foi anunciado nada para cá até agora – cheguei a pensar que que ela viria ao NOS Alive – é pouco provável que seja.

 

Um dia.

 

No que toca a música em si, não posso dizer que tenha ouvido muita de Avril este ano, com algumas exceções. I’m a Mess continuou a subir na minha consideração. É de caras a minha preferida da era Love Sux, mesmo não primando pela originalidade, nem sequer dentro da própria discografia de Avril. 

 

Na Primavera, lançou Eyes Wide Shut, uma colaboração com Illenium e Travis Barker. Gosto muito, é uma música fixe, talvez uma das melhores letras de Avril dos últimos anos. Esta, infelizmente, confirma as minhas suspeitas em relação à atitude de Avril no que toca a romance.

 

Por outro lado, Fake As Hell, a colaboração com os All Time Low, é péssima. Acho que nem sequer cheguei a ouvir segunda vez.

 

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Quando não esteve em digressão – ou a tirar fotos com Hayley Williams, aquecendo o coração a muitos millennials como eu – Avril terá passado a maior parte do ano em estúdio. Os álbuns dela têm sempre um parto difícil, é raro termos certezas em relação a lançamentos. Desta feita, no entanto, como já temos concertos marcados, podemos assumir com alguma certeza que teremos, no mínimo, um single até ao início do verão. 

 

Depois de Head Above Water e Love Sux, não tenho expectativas para o próximo álbum. Se seguir o padrão, será um disco menos animado, mais introspetivo – mas não estou muito para aí virada. Neste momento, preferia algo intermédio, variado, semelhante ao quinto álbum.

 

Vamos agora saltar mais de seis meses, até ao concerto de João Pedro Pais. Conforme escrevi no ano passado, ele é um dos meus músicos nacionais preferidos e, sedenta de concertos como tenho andado, quando soube deste, agarrei a oportunidade. Convidei a minha tia – os bilhetes serviram de prenda de anos para ela.

 

O concerto assinalava os vinte e cinco anos de carreira de João Pedro – esse e outro, um mês antes, no Porto. O Coliseu dos Recreios esgotou para a festa. Eram lugares sentados – nada contra por princípio, mas houveram várias ocasiões em que quis dançar, pôr os braços no ar. Em Louco Por Ti, então, até queria dar headbangs (este som são certos fãs dos Hybrid Theory a rir). 

 

O concerto em si teve emoções fortes, várias surpresas – pelo menos para mim. O início foi morno, na minha opinião, até ao momento em que entrou uma figura encapuzada em palco. Fiquei a olhar sem perceber, até aquela espécie de monge templário começar a cantar Ao Passar Um Navio com a voz do Miguel Ângelo.

 

Só dias mais tarde é que percebi o significado, todo o lore que eu não conhecia. Era uma uma referência à fatiota que o João Pedro usara na final do Chuva de Estrelas (ele parece ter dezasseis anos aqui...) – fatiota essa que, por sua vez, era uma referência a Ser Maior, dos Delfins. Diz que no concerto do Porto, um mês antes, o Miguel Ângelo já tinha feito esta gracinha, apanhando o próprio João Pedro de surpresa. Estes dois concertos foram as primeiras vezes desde a tal final do Chuva de Estrelas em que os dois partilharam o palco.

 

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Antes disto, esquecia-me demasiadas vezes do quão boa é a voz do Miguel Ângelo. Fez muito bem em aparecer lá no Coliseu para nos recordar – mais sobre isso já a seguir.

 

Quem também veio dizer olá foi o André Sardet. Para um dueto em Foi Feitiço e para oferecer flores ao João Pedro – algo de que o último não estava à espera, conforme repetiu várias vezes.

 

Houveram vários outros momentos emotivos: Salvador, o filho de João Pedro, subindo ao palco para tocar Paciência com o pai; a música dedicada à mãe de João Pedro; o abraço a Manuela Eanes. Descobri também que a música És do Mundo é dedicada ao Zé Pedro, dos Xutos e Pontapés. Houve um momento, perto do fim, em que o João Pedro se pôs a percorrer os corredores no meio da audiência. Passou junto a mim, mas infelizmente não me deu um high-five.

 

Fica para a próxima.

 

O concerto ainda durou quase três horas. É certo que não me pareceu muito muito exigente em termos físicos, mas mesmo assim… respeito! Justificou bem o preço dos bilhetes. Tanto eu como a minha tia gostámos muito, eu pessoalmente repetia. Será difícil tornar a apanhar um concerto como este, de quase três horas. 

 

Por outro lado, espero que o próximo seja de pé. 

 

 

Fizeram um par de reportagems sobre estes concertos – podem vê-las aqui e aqui – e a RTP transmitiu há pouco tempo o concerto do Porto. Ainda não consegui acabar de vê-lo, por acaso, mas parece ter sido semelhante ao de Lisboa.

 

Ainda assim, aqui entre nós, acho que o nosso foi melhor.

 

Naturalmente, este concerto fez-me gostar ainda mais da música do João Pedro. Continuo a adorar Louco Por Ti, continuo a adorar Uma Questão de Fé. Ultimamente tenho ouvido muito Fazes-me Falta, uma música a que pouco tinha ligado antes mas que é linda. Aquela terceira parte! 

 

Um dia destes ganho vergonha na cara e começo a ouvir os álbuns mesmo, em vez de só ligar aos singles.

 

Com isto tudo, passei o bichinho à minha tia. Poucos dias depois daquela noite, comprámos bilhetes para o concerto de quarenta anos dos Delfins, no Altice Arena – foram a minha prenda de Natal. A participação do Miguel Ângelo no concerto do João Pedro foi um bom investimento, rendeu-lhe um par de bilhetes.

 

Além disso, terá um gosto especial pois, se bem me recordo, foi em casa dela que ouvi o CD Saber A Mar pela primeira vez – eu devia ter sete ou oito anos – e convenci-a e ao meu tio (quando ainda eram casados) a oferecer-nos um exemplar. 

 

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Tenho estado a rever a matéria para esse concerto nas últimas semanas, sobretudo precisamente o álbum Saber A Mar. Já não ouvia algumas destas músicas há vinte anos, talvez mais. São melhores do que me recordava – a Sofia de oito anos já tinha bom gosto. 

 

Calculo, assim, que a música dos Delfins terá papel de destaque no balanço musical de 2024. Estou ansiosa pelo concerto – e aviso desde já que não respondo por mim quando eles tocarem 1 Lugar Ao Sol

 

Agora e durante o resto desta parte vamos falar dos três concertos que restam. Foram todos da mesma banda, mas cada um teve um impacto diferente. 

 

Já mal me lembro de quem eu era na manhã do dia 15 de abril. Releio o meu balanço musical de 2022 e mal reconheço a pessoa que o escreveu.  Antes de os Hybrid Theory, a banda portuguesa de tributo aos Linkin Park, terem entrado na minha vida – através do concerto que eles deram no Altice Arena. Eles publicaram a transmissão desse concerto no YouTube no mês passado e ainda bem que o fizeram. Já me tinha esquecido de grande parte dele. Foi tão, mas tão bom!

 

E a verdade é que a noite de 15 de abril deu início a todo um arco de personagem, toda uma jornada que durou o resto do ano, que ainda continua. Já escrevi sobre esse concerto, como poderão ler aqui. A versão ultracondensada é que adorei, mas essa noite, juntamente com Meteora20, reabriu feridas relacionadas com a perda de Chester Bennington e andei triste por uns tempos por causa disso. 

 

Além disso, precisei de algum tempo – não muito – para perceber ao certo o que sentia em relação aos Hybrid Theory. Em parte porque foi a primeira banda de tributo, ponto, que conheci, não sabia como era ser fã de uma. Em parte por todas as emoções relacionadas com a morte de Chester e o hiato dos Linkin Park.

 

 

Correndo o risco de soar defensiva… os Hybrid Theory fazem um excelente trabalho recriando o espetáculo de uma banda em pausa. São muito parecidos com os membros “originais” desta banda. O vocalista, Ivo Massana, em particular, tem a voz idêntica à do vocalista “original”, falecido demasiado novo e de quem sentimos tanta falta. Acho que não fui a primeira nem fui a última pessoa sem saber o que sentir. 

 

E de qualquer forma as ambiguidades não duraram muito. Descobrir mais sobre eles, ler os artigos, ouvir as entrevistas, ajudou a desatar os nós. Sentir o respeito deles pelo legado dos Linkin Park, ouvir o Ivo dizer que não gosta de ver vídeos comparando-o com Chester. E ajudou escrever sobre o concerto no Altice Arena e sobre eles.

 

A infame terceira parte da análise a Meteora, que referi há pouco… Sabem o medo que eu tinha de publicá-la? Para começar, foi escrita com o coração na ponta da caneta como nunca tinha escrito antes. Depois, tinha medo que os membros dos Hybrid Theory dessem com essa terceira parte e não adorassem o facto de falar sobre eles e depois passar o resto do texto a chorar por Chester. Tinha medo que sentissem que estava a culpá-los pela minha tristeza. 

 

Pois bem, não precisava de me ter preocupado pois a reação a este texto foi fantástica. Incluindo da parte dos próprios Hybrid Theory. O DJ Dani Pimenta partilhou-o no Facebook dele e o Ivo fez uma story no Instagram, como poderão ver abaixo (aquela era uma foto que eu publicara na página deste blogue uma semana ou duas antes). Quando vi esta última, então, estava sozinha mas acho que corei. E pode ou não ter havido uma lágrima ou outra. 

 

Depois desta fiquei tipo “Bolas, agora tenho de retribuir”. E o concerto seguinte mais perto de mim seria no festival Lendas do Rock, na Quinta da Marialva em Corroios, no dia 20 de julho (de todas as datas possíveis…). 

 

Demorei semanas a decidir-me. Mesmo depois de comprar bilhete, só quase no próprio dia é que tive cem por cento de certeza de que ia. Para começar, era num sítio que eu não conhecia (em junho, fiz questão de tirar uma tarde de sábado para visitar a Quinta da Marialva, mesmo para saber o que esperar). O concerto era num dia de semana, os HT atuariam tardíssimo – podia pedir para entrar mais tarde no trabalho, no dia seguinte, mas tinha algum medo de conduzir à uma ou duas da manhã. Por fim… estava com medo de abrir a ferida outra vez. 

 

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Por outro lado… eu tinha de voltar a vê-los, tinha de lhes agradecer pessoalmente se conseguisse – nesta altura, já sabia que os membros dos Hybrid Theory costumavam receber os fãs depois dos concertos. 

 

Além disso, era no fucking dia 20 de julho, o sexto aniversário da morte de Chester – que, ainda por cima, calhou a uma quinta-feira, o mesmo dia da semana que em 2017. Seria sempre um dia difícil para mim, sobretudo depois da recaída de meses antes. 

 

Era como no final da primeira temporada de Ted Lasso. Das duas uma: ou ficava triste em casa, ou ficava triste num festival de música, entre outros fãs de Chester e Linkin Park, também eles com saudades. 

 

E talvez nem estivesse triste. Corria o risco de me divertir, de curtir a música que Chester nos deixou, homenageando-o da melhor forma possível. De criar recordações felizes para este dia, para as funcionalidades de memórias dos Facebooks desta vida. 

 

Bem, tecnicamente, o concerto começava depois da meia-noite, já dia 21. Também servia, eram os anos do Ivo – outra coisa para reduzir a tristeza da efeméride. 

 

Escolhi não ficar sozinha.

 

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Assim, fui às Lendas do Rock no dia 20 e correu tudo bem. Mais do que bem. Era um festival de bandas de tributo e os Hybrid Theory eram cabeças de cartaz naquela noite. Fiquei na fila da frente, onde conheci pessoalmente outros membros do grupo de fãs dos HT. Não muitos, infelizmente – mais ou menos de esperar, era noite de semana.

 

As primeiras bandas deram para entreter e até para me divertir. Os de que mais gostei foram dos Black Metallica – pena não terem tocado Whiskey in a Jar. Ainda os HT não tinham subido ao palco e eu já estava de pescoço dorido. 

 

Mas os Hybrid Theory são outro nível, não se compara. Como disse acima, houveram partes do concerto do Altice Arena de que eu já me tinha esquecido e soube bem recordá-las assim. Ao mesmo tempo, apesar do que passara nos meses anteriores, apesar de ser dia 20 de julho, não houve tristeza nenhuma (só durante One More Light e mesmo assim). Pelo contrário, não me lembrava da última vez que me sentira tão feliz. 

 

Ainda assim, ainda não estava habituada à voz do Ivo, às semelhanças nalguns gestos e expressões. Ainda não estou, na verdade.

 

E não sei se me quero habituar.

 

Destaque para o momento em que cantámos rapidamente os Parabéns ao Ivo no início de One More Light. Mas para mim o ponto alto do concerto foi durante In the End. Calhou estar a filmar e… bem, vou deixar as imagens falarem por si.

 

 

Como se não bastasse, apareço numa fotografia profissional do momento. Um luxo!

 

Mas os momentos marcantes não ficaram por aqui. Depois do concerto, continuava a querer falar pelo menos com o Ivo… mas estava cheia de vergonha. Teve de ser a Sandra Sousa, do grupo de fãs, a chamar-mo (super grata!), quando estavam a arrumar as coisas em palco. Eram os anos dele, aquele era o primeiro de três concertos em três dias em quase literalmente três cantos do país (Corroios, Faro e Funchal). Foram só cinco minutos, eu nem quis tirar foto mas não levava a mal se o Ivo dissesse que não. 

 

Mas não disse e eu fico muito grata. 

 

Lá lhe agradeci pela partilha do texto do blogue – provavelmente gaguejei, já não me recordo. Eu tinha ensaiado aquela conversa na minha cabeça algumas vezes nas semanas anteriores. Nunca imaginei a resposta dele. 

 

–  Como é possível alguém ter tanta palavra?

 

Eu ri-me.

 

– História da minha vida – disse-lhe eu, e é verdade. É algo que podia ter sido dito por alguém da minha família, por amigos meus, gente que me conheça há anos. De onde acham que vem o nome do blogue? Naturalmente, passou a ser o novo slogan cá do estaminé.

 

Depois desta, despedimo-nos, desejei-lhe um dia feliz e o meu coração nunca mais arrefeceu.

 

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(fonte)

 

Eis uma coisa (entre muitas, na verdade) que não estava no meu bingo para 2023: a noite do aniversário da morte do Chester foi das mais felizes do ano. Gostava que passasse a ser um ritual anual. Claro que nem sempre irá dar, mas este ano o dia 20 calha a um sábado. Se derem um concerto nesse dia (estou a contar com isso porque 20 de julho) e for em Portugal Continental, talvez seja possível.

 

Penso que foi depois das Lendas do Rock, mais ou menos, que comecei a ficar mais ativa no grupo de fãs. Estávamos no verão, os HT andavam em digressão por todo o país, haviam inúmeras fotos e vídeos para partilhar. Começámos a conversar no Messenger, primeiro sobre a banda, claro, depois sobre outras coisas: fotos do que comíamos, como no início do Instagram, disparates variados. Quando dei por mim, estava a falar online todos os dias com uma mão cheia deles, a ir a convívios com eles, a fazer amizades! Algo que continua até agora. 

 

Ao mesmo tempo, depois de Corroios, só queria mais e mais Hybrid Theory. A oportunidade seguinte seria a Semana Académica de Lisboa… até a cancelarem. Foi uma situação horrível, um balde de água fria coroando um mês de setembro que não me correu bem. Nem quero falar muito sobre isso, leiam mais pormenores aqui (ainda estamos à espera do reembolso). 

 

Entretanto, ainda antes deste cancelamento, foi anunciado um concerto no Pavilhão Multiusos de Gondomar para o dia 2 de dezembro. Comprei bilhete quase de imediato, para o Golden Circle. Sim, foi em Gondomar, a mais de trezentos quilómetros de casa, mas este seria o mais parecido que teríamos a uma repetição do Altice. Além disso, o cancelamento do SAL só aumentou ainda mais os desejos de vitamina HT. 

 

Agora que penso nisso, esta não foi a primeira vez que fiz uma visita-relâmpago à zona do Porto para ter uma das noites mais felizes da minha vida. Curiosamente, nessa ocasião também acabei num almoço nos arredores de Coimbra, no dia seguinte. 

 

Os mais de dois meses de espera foram longos e difíceis, mas ao menos serviram para ir cimentando as amizades novas com o pessoal do grupo de fãs. De tal forma que a festa não foi só a noite de sábado, foi o fim de semana inteiro. Já conhecia pessoalmente alguns dos fãs de outros convívios, outros foi a primeira vez, mas gostei de estar com todos. Pude finalmente conhecer o JLee, o fundador do grupo de fãs e um amor de pessoa. Já pude voltar a ver alguns deles depois de Gondomar, mas não deixo de ter saudades desse fim de semana.

 

Mas falemos sobre o espetáculo em si. Como referi antes, fiquei no Golden Circle, tal como a larga maioria do grupo, na fila da frente. Vimos o tributo aos Korn. A música não me diz muito, mas eles não foram maus, deram para aquecer. 

 

 

Mas, claro, tal como em Corroios, eu estava lá para os Hybrid Theory e eles não desiludiram quando, finalmente, subiram ao palco. Houve pirotecnia (também tinha havido no Altice Arena, mas aí fiquei bem mais longe do palco) e, na fila da frente, começámos a ser assados logo com Burn it Down.

 

Se bem que, nos dias frios que temos tido, os lança-chamas até têm feito falta.

 

O alinhamento não foi radicalmente diferente do costume – diz que eles criam um por ano – e mesmo assim teve algumas novidades. Regressaram Don’t Stay e Shadow of the Day – desta vez sem Virgul porque, pela minha sondagem, só mesmo eu e a minha irmã é que gostámos. Tocaram Figure.09, o que me agradou. Na verdade, alguns de nós tivemos spoiler disso umas horas antes. Conseguimos ouvi-los do lado de fora do Multiusos, tocando-a durante o soundcheck.

 

Por outro lado, tive pena que tivessem cortado Crawling e Leave Out All The Rest. Talvez não quisessem abrandar demasiado o ritmo – até porque One More Light arrancaria lágrimas suficientes. Também não tocaram From the Inside nem Somewhere I Belong, mas com essas importo-me menos.

 

Momento engraçado quando o Ivo se trocou todo com Lost, como poderão ver no vídeo acima/abaixo: repetiu a primeira estância em vez de cantar a segunda. 

 

Enfim, não foi grave (acho que uma boa parte do público nem percebeu, sorte ter sido uma música mais “recente”), teve piada. Por algum motivo está o YouTube cheio de compilações de bloopers em concertos – dos Linkin Park e não só. Como se costuma dizer, só acontece a quem faz – e no que toca a Lost ao vivo, praticamente ninguém faz. Não a este nível.

 

 

Mesmo assim, não resisti a ser má, mais tarde. Já explico. 

 

Uma das minhas preferidas neste concerto foi Faint, por dois motivos. Primeiro, pelo Miguel Martins, que veio tocar para junto de nós. Ele apareceu no meu vídeo, este mostra outra parte. 

 

Foi também pelo Dani. De toda a banda, ele será o que menos se comporta como o seu homólogo, Joe Hahn (corrijam-me se estiver enganada), mas eu prefiro assim. O homem dá cá um espetáculo! Podia passar o concerto todo a vê-lo dançar e a abanar o capacete.

 

E falando de abanar o capacete… aparentemente surpreendi quase toda a gente do grupo de fãs quando deixei sair o meu lado mais metaleiro. Até compreendo a confusão. Na maior parte do tempo sou uma betinha: calminha, introvertida, de poucas palavras. Acho que, com os anos, me deixei influenciar por músicos como Hayley Williams, famosa pelos seus headbangs. Ou então, pura e simplesmente, adoro concertos, adoro música, ponto – o que não surpreende quem dê uma vista de olhos a este blogue. Gosto de senti-la, de vivê-la com o meu corpo. E essa paixão só tem aumentado com o tempo – ou então sou eu que me vou sentindo cada vez mais confortável na minha própria pele. Também suspeito que parte disso será vingança pelos cancelamentos durante a pandemia.

 

Aliás, acho que não é a primeira vez que o refiro, esta paixão começou no Rock in Rio de 2008, com os Linkin Park. É também por isso que me afeiçoei tanto aos Hybrid Theory: porque permitem-me prestar homenagem a isso.

 

Em Gondomar, então, dei-lhe tão forte que, depois do concerto, fiquei com a cabeça pesada, a andar à roda. Tanto headbang deve ter sido demais para o meu ouvido interno. 

 

Zero arrependimentos.

 

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Foi nessa altura que os membros da banda nos receberam. Pude dar um beijo ou abraço a cada um deles, outra coisa que me aqueceu o coração de uma maneira parva – sobretudo depois de tudo o que aconteceu desde o concerto no Altice Arena. Isso e as duas fotos que tirei, sobretudo a segunda, com a banda e praticamente todo o grupo de fãs – a família toda. 

 

Pelo meio, ainda me virei para o Ivo, mostrei-lhe a página do Genius e perguntei-lhe:

 

– Queres que te mande o link?

 

Acabámos os dois a rir. Mais tarde senti-me um bocadinho culpada pelo roast, de tal forma que, quando fiz publicações nas redes sociais, fui menos má. 

 

Ainda assim, a Ana Luísa do grupo de fãs brasileiros foi ainda pior do que eu. Vale a pena ler os nossos comentários neste reel – até porque o próprio Ivo se juntou à festa. 

 

O que me leva a outra das minhas partes preferidas do ritual de um concerto HT: as publicações nas redes sociais nos dias seguintes. Até porque os rapazes fartam-se de partilhar as nossas stories do Instagram. É bom, recordamos momentos felizes em conjunto com quem esteve lá, partilhamos parte da experiência com quem não pôde estar, adiamos o início da depressão pós-concerto.

 

Em suma, um fim-de-semana inesquecível. A maneira perfeita de encerrar o ano.

 

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Nesta fase, há muito que desisti de racionalizar a questão dos Hybrid Theory. Não os confundo com os Linkin Park, são uma banda diferente – são literalmente uma banda tributo. Tirando isso, não preciso de justificar mais nada. Compreendo que nem toda a gente goste mas, respeitosamente, quem não gosta come menos. Eu cá adoro-os, eles têm sido simpáticos comigo (mais até), deram-me três concertos fantásticos e encontrei uma família entre os seus fãs. Direta e indiretamente, têm-me feito dar passos para fora da minha zona de conforto, revelado novas facetas minhas, despertado tantas emoções – das boas – em mim. 

 

Aliás, se me permitem, esta está a ser uma história lindíssima, quase poética, chega a ser caricata. Há pouco menos de um ano estava a comprar bilhetes para o Altice Arena às cegas, sem pensar bem no que estava a fazer, sem saber o que esperar. “Há de ser giro, dizem que eles são bons.” Imaginava lá eu tudo o que esta simples decisão desencadeou. 

 

Nem sempre foi fácil, sobretudo aquelas semanas de recaída nas saudades de Chester, em que até In the End me deixava com um nó na garganta. Continuo a achar que foi um exagero da minha parte. Dito isto, passaria por tudo outra vez, não me arrependo de uma lágrima que seja. Tudo isso me levou até aqui. Os Hybrid Theory foram a melhor coisa que me aconteceu em 2023.

 

E, lá está, já não é só pela própria banda – é também pelas pessoas que conheci graças a eles. Chamo-lhe a família HT. Sou mais próxima de alguns deles do que outros, não vivemos assim tão perto uns dos outros, não nos vemos assim tantas vezes – mas temo-nos uns aos outros.

 

Não é muito diferente do que acontece com a minha família biológica, na verdade.

 

Por essa parte temos de agradecer ao JLee. Já o fiz pessoalmente, mas nunca é demais repeti-lo. Graças ao JLee, os Hybrid Theory são mais do que uma banda: são uma família. Falando por mim, já não é só pelos próprios rapazes e pela experiência Linkin Park que vou continuar a ir aos concertos, dentro das minhas possibilidades. Será também para estar com estas pessoas.

 

 

Claro que fica sempre aquela mágoa por os próprios Linkin Park não estarem no ativo, por o Chester não estar cá para ver a sua música ainda unindo pessoas, ainda conquistando fãs, incluindo de palmo e meio. Ninguém queria que tivesse de ser assim, todos temos saudades. Dito isto, a par da maior sensibilidade para questões de saúde mental, isto está a ser a melhor coisa a nascer da tragédia. E eu não conheço melhor forma de homenagear Chester, de, hashtag, deixá-lo orgulhoso.

 

E a história vai continuar daqui a menos de duas semanas, em Amiais de Baixo. E noutros concertos depois desse, ainda por marcar. Não sei o que o futuro reserva para os Hybrid Theory (ou para os Linkin Park), mas, enquanto eles continuarem, eu continuo.

 

Com tudo isto, em termos de música em si, Linkin Park foi uma das bandas que mais ouvi em 2023. Em parte por causa de Meteora20, mas também por causa dos Hybrid Theory. Músicas que não andava a ouvi tanto nos anos anteriores que reentraram na minha cabeça. Músicas que ganharam facetas novas depois de ver e/ou ouvir o que os HT fazem com elas. 

 

Sharp Edges, que eles têm usado para encerrar os concertos, será porventura o exemplo mais óbvio. Por outro lado, antes de 2023, não contava ouvir One More Light ao vivo nem o desejava particularmente. Mas é sempre um ponto alto nos concertos dos Hybrid Theory. Descobri, aliás, que o grito de “I do!” no meio é super catártico. 

 

Por outro lado, passei uma boa parte do ano obcecada pelo cover que os rapazes fizeram de Iridiscent. A música original não está entre as minhas preferidas, mas esta versão ficou linda. 

 

Espero que eles criem mais versões destas no futuro.

 

 

Por fim, nós, na família HT, somos todos fãs de Linkin Park, claro. E, naturalmente, de vez em quando falamos sobre as nossas músicas preferidas.

 

De Linkin Park e não só, na verdade. Hei de falar sobre isso na segunda parte deste balanço, mas tenho-me deixado influenciar pelas sugestões do pessoal do grupo. E vice-versa, na verdade. É uma das maneiras mais bonitas de descobrir música nova. 

 

Lost foi a minha música número um, tanto no Spotify Wrapped como no meu Last.fm – até mesmo no YouTube Music. Faz todo o sentido. Foi a música que deu o pontapé de saída para a era Meteora20 e marcou a minha história com os HT – porque, ao contrário da maioria dos fãs de Linkin Park, já tive o privilégio de ouvi-la tocada ao vivo. Três vezes.

 

Pode-se discutir se é das melhores dos Linkin Park (acho que sim, pelo menos top 20) ou mesmo se é a melhor do baú de Meteora (acho que sim, mas há quem discorde). Para mim vale, não só pelos méritos próprios, mas também pelo que representa, pelas emoções que despertou em tanta gente. É a minha música preferida de 2023. 

 

E por hoje fico por aqui. A segunda parte deste balanço também falará de feels e concertos (neste caso, concertos futuros), mas será mais convencional, mais focada em música propriamente dita. Ainda deverá demorar um bocadinho, claro, mas não é grave. Desde que não ultrapasse o recorde do ano passado, em que só consegui terminar o balanço de 2022 em finais de fevereiro.

 

Uma vez mais, obrigada Hybrid Theory, banda e família. Obrigada também a vocês, caros leitores. Continuem por aí. 

Paramore – This is Why (2023) #1

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No passado dia 10 de fevereiro, os Paramore lançaram o seu sexto álbum de estúdio, intitulado This is Why – o sucessor ao excelente After Laughter

 

As expectativas estavam altas para este álbum. No entanto, quando This is Why saiu, confesso que não me entusiasmou muito. Não que não tenha gostado, mas estava à espera de gostar mais.

 

Talvez tenha sido por, lá está, a fasquia estar demasiado alta – depois de os seus dois antecessores e mesmo Petals For Armor, o primeiro álbum a solo da vocalista Hayley Williams, terem sido tão marcantes para mim, cada um à sua maneira. Talvez estivesse à espera de um álbum diferente. Em minha defesa, pelas entrevistas que os membros da banda foram dando antes e depois da edição de This is Why, pelos dois primeiros avanços, não era a única que estava à espera de um trabalho um pouco mais político/social, mais voltado para o exterior e para a atualidade, pois não?

 

É certo que demorei algum tempo a dar a devida atenção a This is Why. Como tem sido a regra comigo, o timing não foi o ideal. Sobretudo no que toca aos meus músicos preferidos, como os Paramore, a minha maneira de digerir música é escrevendo sobre ela aqui no blogue – e todo o trabalho de análise e pesquisa que isso implica. O que demora. This is Why foi editado no mesmo dia que Lost dos Linkin Park, o primeiro avanço da edição de vigésimo aniversário de Meteora, que saiu daí a dois meses. Dei prioridade a Meteora20 – podem ler aqui como é que isso correu.

 

E a verdade é que a minha opinião em relação a este álbum melhorou imenso quando tive oportunidade de examiná-lo mais de perto. This is Why continua a ter os seus problemas e iremos falar sobre isso. No entanto, acho que é daqueles que precisa de tempo para ser apreciado. 

 

Como o costume, temos imenso sobre que falar, logo, esta análise virá em duas partes. Publico a segunda amanhã.

 

Comecemos pelo princípio. Agora que penso nisso, já lá vai quase um ano desde que surgiram as primeiras pistas relativas a This is Why, o single e o álbum. Às vezes parece-me que já se passou imenso tempo, às vezes parece que tudo se passou na semana passada. Por estes dias, sempre que oiço esta música, regresso ao momento em que esta saiu e em que estava a escrever sobre ela para o blogue: de finais de setembro até meados de outubro, um período muito excitante da minha vida, como referi na altura.

 

 

Mesmo tirando esse aspeto, continuo a gostar imenso de This is Why por si mesma. Continuo a achar que foi uma boa escolha para primeiro avanço.

 

O segundo avanço, The News, foi lançado dois meses depois de This is Why, o single e dois meses antes da edição do álbum completo. Como já muitos assinalaram, musicalmente parece saída de Brand New Eyes – depois de lhe aplicarem um filtro mais moderno, mais rítmico, à Taylor York (guitarrista, co-compositor e a pessoa mais importante dos Paramore). Zac Farro, o baterista, deu-lhe super forte, é uma coisa parva. Uma das minhas partes preferidas são dos acordes de guitarra na terceira parte. 

 

Por outro lado, não sei se aparece nos créditos, mas Zac também canta no pré-refrão, não é? Canta a expressão “the news”, certo?

 

Como na larga maioria das músicas dos Paramore, a letra é a parte mais interessante da música. Hayley escreveu-a aquando da invasão da Rússia à Ucrânia, no ano passado – quando a Comunicação Social e as redes sociais não falavam de outra coisa (no contexto deste álbum, vou assumir sempre que Hayley é a narradora nestas letras). Na verdade, a letra de The News podia ser sobre uma infinidade de eventos da última meia dúzia de anos: a pandemia, obviamente, as alterações climáticas, o #MeToo, O Black Lives Matter, as dificuldades económicas, as transições de poder de Donald Trump para Joe Biden, de Jair Bolsonaro para Lula da Silva, etc. 

 

Nestas alturas, sentimo-nos pressionados a estar informados sobre tudo, a preocuparmo-nos com tudo, a ter uma opinião sobre tudo, a indignar-nos em relação a tudo – o que remete para This is Why. À Comunicação Social interessa manter-nos presos, de modo a obterem mais audiência, mais cliques, mais interações nas redes sociais que estimulam os algoritmos – daí usarem e abusarem do sensacionalismo e do clickbait (“Exploitative, performative, informative”). 

 

Uma pessoa tenta desligar-se para proteger a sua sanidade mental, mas depois sente-se culpada pela apatia, por poder, nalguns casos, dar-se ao luxo de desligar, de não querer saber, de não ter a sua vida diretamente afetada pelo que está a acontecer (“I’m far, so far, from the frontline, quite the opposite, I’m safe inside”). Embora na prática, muitas vezes haja muito pouco que uma pessoa possa fazer, tirando, lá está, fazer donativos quando pode, votar quando há eleições ou participar em manifestações. 

 

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E depois temos o nosso retângulo português, em que por vezes as notícias são só estúpidas. Veja-se o tempo que se gastou com aquilo a que gosto de chamar o Galambagate. O que não deixa de ser outra maneira de nos manipular – desta feita por alienação.

 

A frase “all along we called it normal” reflete a maneira como muitos destes eventos que motivam grandes coberturas noticiosas expõem falhas da sociedade atual que poucos haviam questionado. O #MeToo e o Black Lives Matter são exemplos óbvios. 

 

Pena Hayley não ter desenvolvido esta ideia para além deste único verso, nem mesmo noutra canção deste álbum. É a única falha que tenho a apontar a The News.

 

Algumas notas rápidas sobre o videoclipe. Hayley é fã de filmes de terror e já os tinha usado como inspiração para os vídeos de Petals For Armor. Ao mesmo tempo, a estética do vídeo – quase tudo em tons escuros ou mesmo negros, contrastando com o cabelo cor-de-laranja de Hayley – faz lembrar o vídeo de Ignorance. Só reforça as semelhanças de The News com Brand New Eyes. 

 

A terceira música que ouvimos de This is Why foi C’est Comme Ça. Existem muitos fãs que não gostam desta música, mas eu gosto. Não digo que esteja entre as minhas preferidas, mas não estará muito longe.

 

Compreendo porque é que muitos não gostam. Aquele refrão foi uma jogada arriscada. Consigo ver como alguns poderão considerá-lo repetitivo, esquisito, mesmo irritante. Mas também me pergunto quantos destes fãs serão americanos que não estão habituados a ouvir uma língua que não o inglês. No entanto, acho que resulta muito bem na música: com um toque maníaco que condiz com o tema da letra. 

 

 

Toda a sonoridade é bastante caótica – de uma maneira deliberada, claro. Dizem que é influência dos Bloc Party. Só sei que gosto imenso das guitarras, sobretudo durante o solo. Também gosto das estâncias faladas em vez de cantadas – um elemento até agora inédito na discografia dos Paramore.

 

A expressão “c’est comme ça” traduz-se para “é o que é”. Do género, “é o que é, o que é que se pode fazer?”. Desde que a música saiu, sempre que oiço alguém dizer essa expressão, ou algo semelhante, digo “c’est comme ça” – nem que seja só para mim mesma.

 

A primeira quadra da letra (tirando o refrão) é toda uma referência à vida em pandemia. Todos nós envelhecemos demasiado depressa, todos sofremos e atrofiámos com o confinamento – eu em menor escala, pois pude/tive de trabalhar fora de casa.

 

O resto da letra é mais interessante e específico para Hayley, falando de algo que ela mesma já falou em diferentes ocasiões, incluindo numa publicação no Discord. Hayley tem uma relação estranha com conforto. Tende a romantizar e a desejar conflito e instabilidade. Chegou mesmo a admitir numa entrevista recente que tem um certo vício em adrenalina. 

 

E eu tenho de dizê-lo: sempre tive muitas semelhanças com Hayley, mas nisto não podíamos ser mais diferentes. Não gosto de instabilidade nem de incerteza, não lido bem com adrenalina. Claro que sei que às vezes é inevitável, que uma pessoa tem de sair da sua zona de conforto para evoluir, blá blá blá Whiskas saquetas. 

 

Nem sequer discordo. Diria mesmo que, vá lá, nove em cada dez vezes que faço coisas que me assustam, sou narrativamente recompensada por isso. Tudo bem. Não tenho de gostar.

 

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Regressando a Hayley, a apetência dela para o caos não surpreende pois a vida dela sempre foi assim – e eu falo do alto do meu privilégio, a minha vida tem sido bem mais fácil por comparação. Como já muitos sabem, a infância dela não foi fácil, entre os múltiplos divórcios dos pais e a mudança para Nashville quando ela tinha doze anos. A sua adolescência foi igualmente caótica com os Paramore. A vida de uma banda de rock já de si é instável – e esta em particular passou os seus primeiros dez anos em guerra uns com os outros (com algumas pausas pelo meio, assumo eu). Pelo meio, Hayley teve uma relação tóxica que durou uma década. 

 

Por isso sim, o caos terá sido o normal de Hayley durante muito tempo. Ela dá muitas vezes o exemplo do início da era After Laughter, em que tinha acabado de se divorciar, andava em digressão, bebia em excesso e “festejava” todas as noites. Bem como a sua tendência para se envolver com pessoas tóxicas. Acredito que Hayley, de vez em quando, sinta a tentação de reverter para esse modo.

 

Só que, claro, há meia dúzia de anos, o caos quase deu cabo dela. Dela e não só – conforme vimos em Petals For Armor, Hayley chegou a boicotar o seu namoro com Taylor porque não sabia lidar com uma relação saudável.

 

Por isso, Hayley teve de adotar hábitos mais saudáveis, apesar de uma parte de si resistir aos mesmos. E isto de resto é algo mais ou menos universal. Sobriedade, ter uma alimentação saudável, dormir oito horas, tudo isso é uma seca. Beber a mais e outros hábitos auto-destrutivos é que são fixes – pelo menos é o que dizem. 

 

Hayley pode lamentar ser demasiado dependente de conflitos para ser verdadeiramente saudável, ser demasiado movida a mesquinhez – algo a que iremos regressar. No entanto, não acho que seja uma falha, pelo contrário. Saber funcionar no meio do caos é uma grande vantagem – porque, sejamos realistas, nem sempre é possível ter estabilidade. Ainda por cima, volta e meia os Paramore vão em digressão, uma vida claramente instável. Um dos temas da era This is Why é dualidade e iremos falar sobre isso mais à frente. Uma das grandes vantagens de algo multifacetado é a capacidade de se adaptar – algo que a seleção natural favorece, segundo Darwin.

 

Por tudo isto sim, gosto de C’est Comme Ça. E fico feliz por a auto-depreciação de After Laughter não ter ido a lado nenhum.

 

 

Running Out of Time foi lançada como single, com direito a videoclipe e tudo, mais ou menos na mesma altura em que o álbum todo foi editado. Esta música, no entanto, no contexto de This is Why fica esquisita. Sobretudo tendo em conta a sua posição no alinhamento do álbum. Passamos de The News, um tema inspirado pela guerra na Ucrânia, como vimos antes, para um tema sobre a tendência de Hayley para se atrasar para tudo.

 

Não me interpretem mal, eu identifico-me com isso. Também não sou das melhores a gerir o meu tempo. Sobretudo no último ano, ano e meio, em que tenho tido imensas coisas a acontecer ao mesmo tempo na minha vida. É raro atrasar-me mesmo – na maior parte dos casos, chego em cima da hora ou, quanto muito, cinco minutos depois. Por outro lado, dá para ver que demoro séculos a publicar aqui no blogue. 

 

Aliás, Running Out of Time descreve bem o dia em que This is Why foi editado. Na véspera tive uma insónia, logo, aproveitei para ouvir o álbum pela primeira vez na cama. Como adormeci mais tarde, acordei mais tarde do que planeara e passei a manhã a correr. 

 

E sim, muitas vezes é egoísmo. Quero ficar mais uns minutinhos na cama, quero escrever mais um bocadinho durante a minha hora de almoço, quero fazer uma última festinha à Jane antes de sair para o trabalho. Quem nunca?

 

O problema é que a letra de Running Out of Time é demasiado trivial. É o equivalente dos Paramore à Runaway de Avril Lavigne. Noutro álbum e/ou noutras circunstâncias não me importaria, mas logo a seguir a The News? Num álbum que inclui temas como Figure 8 e Thick Skull? Não encaixa.

 

O pior é que não tinha de ser assim. A propósito desta música e de não ter tempo para nada, Hayley comentou que, hoje em dia, “tudo é uma emergência”. Existem demasiadas causas a precisarem de atenção, uma pessoa não sabe para onde se virar e ainda tem de arranjar tempo para cuidar de si mesma – o que remete para The News.

 

 

Ao mesmo tempo, nesta altura do campeonato, já toda a gente saberá acerca dos problemas de saúde mental de Hayley. É possível que estes estejam por detrás dos constantes atrasos – há quem ache que o videoclipe remete para isso. E faz sentido: se uma pessoa nem sempre se consegue levantar da cama, claro que se irá atrasar para muitas coisas. 

 

Tudo isto podia ter dado uma ou duas camadas de profundidade a Running Out of Time, mas nada disto foi traduzido para a letra. Isto já tinha acontecido com algumas músicas dos trabalhos a solo de Hayley: as explicações dela sobre as letras são mais interessantes que as letras em si. 

 

Tendo isto em conta, não consigo gostar muito de Running Out of Time – embora reconheça que é uma boa música. 

 

E de qualquer forma, esta sempre tem alguns detalhes interessantes. O instrumental é irrepreensível, para começar. Além disso, acho graça ao segundo e terceiro refrões, quando Hayley muda para a terceira pessoa: “She’s always running out of time”. É um tropo relativamente comum, a voz do coro nas tragédias gregas, que comunica as mensagens da história para a audiência. Lorde usou-a muito em Melodrama, como explicaram neste vídeo

 

Acho curiosa a explicação de Hayley, no entanto. Referiu que se inspirou nos Oompa Loompas do filme Willy Wonka e a Fábrica de Chocolate, que desempenham um papel semelhante: ir dizendo verdades. Tem piada, diferentes caminhos para chegar ao mesmo conceito. 

 

Dito isto, teria sido mais giro se tivessem posto o Zac e o Taylor a cantar “She’s always running out of time”. Sempre seriam múltiplas vozes, reforçando as semelhanças com os coros ou com os Oompa Loompas. E teria a piada adicional de ouvirmos os colegas de banda queixando-se daquilo que parece ser um problema antigo de Hayley. 

 

 

Vou passar agora de uma música de que não gosto tanto para uma música de que gosto ainda menos. Big Man, Little Dignity é, na minha opinião, uma grande oportunidade perdida. 

 

A instrumentação é suave, mesmo bonita, mas não se adequa de todo ao tema da canção. Eu sei que os Paramore têm várias músicas em que o instrumental tem o carácter oposto ao da letra – veja-se a larga maioria de After Laughter – mas nessa a dissonância funciona. Aqui não. 

 

Em parte porque a letra acaba por ser igualmente suave, não havendo verdadeiramente um contraste. Para uma música criticando o patriarcado e/ou a masculinidade tóxica, Big Man, Little Dignity precisa desesperadamente de acutilância.

 

O refrão então é o pior. Nos últimos anos, e depois dos dois últimos álbuns de Avril Lavigne, ganhei alergia a refrões circulares, logo, isto poderá ser um viés meu. Até porque os Paramore também têm alguns: That’s What You Get, por exemplo. Mas o de Big Man, Little Dignity soa particularmente forçado. Sobretudo o último verso, quando Hayley se põe com o “li-li-li-li-little dignity”.

 

E podemos falar sobre o verso “No offense but you got no integrity”? O que é isto? É suposto isto ser ofensivo? A mulher que escreveu a letra de Dead Horse não conseguiu escrever nada melhor aqui?

 

Dito isto, Big Man, Little Dignity sempre tem algumas qualidades redentoras. A segunda estância faz-me lembrar Dominoes de Lorde: “Must feel good being Mr. Start Again”. Também eu comecei a reparar na maneira como certos homens poderosos embarcam em mudanças de imagem, como forma de fugir às responsabilidades por aquilo que fizeram. Veja-se quando o Facebook mudou o seu nome para Meta como forma de se dissociar das acusações de promoção de desinformação e de discurso de ódio. Mais recentemente, o Twitter mudou o seu nome para X – pergunto-me se terá sido por motivos semelhantes. 

 

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Ao mesmo tempo, é de facto frustrante ver como estes homens conseguem escapar-se às consequências pelos seus actos. Como Donald Trump, por exemplo. Andamos há anos à espera que ele seja preso, mas ainda ninguém conseguiu fazer nada. Como uma barata grande e nojenta que ninguém consegue matar.

 

Enfim. Estou com algumas esperanças relativamente a esta última acusação que lhe fizeram.

 

Big Man, Little Dignity é a música de que menos gosto em This is Why. O resto do álbum é melhor, felizmente.

 

You First e Figure 8 são as músicas mais pesadas neste álbum, logo, estão entre as mais populares. Das duas gosto mais de You First – uma música que Taylor não queria incluir no álbum, coitado, depois de ter stressado imenso com ela.

 

Não compreendo porquê. O instrumental ficou fantástico. Penso que será uma daquelas situações em que, por vezes, uma pessoa está demasiado perto do quadro para conseguir ver a imagem completa.

 

Hayley começa por admitir que não é o tipo de pessoas que perdoa e segue em frente. Os anglo-saxónicos têm uma expressão que se traduz sensivelmente para “a melhor vingança é viver bem” – e eu até concordo. Mas também concordo com Hayley quando esta diz que viver bem é apenas um privilégio. Como vimos a propósito de Big Man, Little Dignity, demasiadas vezes os perpetradores de crueldades escapam às consequências e continuam a fazer mal a outros. 

 

 

E se pensarmos, por exemplo, no ex-marido de Hayley, ela não dependia financeiramente dele, não teve nenhum filho com ele, pôde sair daquela situação com relativa facilidade. Tem dinheiro e disponibilidade para ser acompanhada psicologicamente enquanto lida com os traumas do seu passado e para adotar hábitos de vida saudáveis. Há muitos que não têm tais possibilidades. 

 

É refrescante ouvir alguém como Hayley reconhecendo a sua posição privilegiada. 

 

No fundo, You First é uma continuação dos temas de Simmer: não só o conflito entre raiva e misericórdia, o conflito entre instintos benévolos e malévolos. Hayley admite ceder demasiadas vezes ao seu lado negro – como um animal vadio a quem ela dá comida todos os dias, logo, ele continua a aparecer. Ao ponto de Hayley se tornar parte do problema e isso voltar-se contra ela. 

 

É a isso que se refere o muito citado verso “I’m living in a horror film where I’m both the killer and the final girl”. Para mim, é também uma referência ao vídeo de Simmer. 

 

O refrão fala de carma – que Hayley espera que apanhe primeiro os demais do que a ela. Se eu acredito em carma? Mais ou menos. De certa forma sim: não tanto como uma força cósmica, mais pela lógica do “Não faças aos outros aquilo que não queres que façam a ti”. Se uma pessoa trata mal os outros, é menos provável que os outros a tratem bem. Pode ser até que os outros procurem retribuição. 

 

Há anos que sei que Hayley tem um lado mesquinho. Desde Dead Horse, com o “When I said goodbye, I hope you cried” – não que eu tenha pena do visado. Por outro lado, Hayley tem dado o exemplo de quando interrompe concertos por causa de pessoas à bulha na audiência. Dá sermões aos visados como se fosse uma professora (palavras dela!), mas depois diz que se arrepende. Como se ela fosse melhor. Pensa que, se calhar, aquelas pessoas não têm dinheiro ou disponibilidade para ir ao psicólogo e aquela é a única forma que têm de lidar com o que se passa nas suas vidas.

 

 

Eu diria que Hayley tem, vá lá, noventa por cento de razão nos seus ralhetes. Nos Estados Unidos, para além de os bilhetes serem caríssimos, as empresas que os vendem têm umas práticas muito manhosas para inflacionar os preços (para mais informações, vejam este vídeo). Ao ponto de os fãs de Taylor Swift terem processado a Ticketmaster no final do ano passado. Por outras palavras, aquela gente terá gasto dinheiro e anos de vida para estar num concerto dos Paramore. Ou seja, não será por falta de capital que eles não são acompanhados. Quanto muito andou a gastá-lo no sítio errado – parecendo que não, concertos não substituem o psicólogo.

 

E, como a própria Hayley disse, concertos devem ser um escapismo, um lugar seguro, das melhores experiências da nossa vida (mais sobre isso adiante). Sobretudo depois de dois anos de pandemia e de muitas outras desgraças. Para quê estar a passar por tantos obstáculos para arranjar bilhetes para, depois, estragar a noite a si mesmo e aos outros andando à porrada?

 

Além de que os ralhetes de Hayley chegam a ter piada. Por exemplo, um em que ela disse mesmo “Momma’s pissed, y’all” e outra em que ela ameaçou os desordeiros com uns chutos no rabo com os seus “sapatinhos de bailarina”.

 

Se bem que ameaçar pessoas violentas com violência contraria ligeiramente a mensagem do sermão. 

 

Por outro lado, a propósito de outra zaragata, Hayley acabou por pedir desculpa nas redes sociais após ter expulso um casal do concerto. Achou que o ralhete se transformou em humilhação pública. Vendo este vídeo, ela de facto soa um bocadinho cruel sem necessidade. Hayley também pediu desculpa por andar a dizer coisas como “se voltarem no Partido Republicano, estão mortos para mim”. Como se isso convertesse alguém. Até remete para a “cancel culture” que a própria Hayley critica em This is Why: “You’re either with us or you can keep it to yourself”

 

Também eu gosto de pensar em mim mesma como uma boa pessoa, mas tenho os meus momentos. Tenho um lado egoísta, egocêntrico e arrogante. Irrito-me facilmente com outras pessoas, impaciento-me no trabalho com a ignorância e a exigência de certos utentes – quando eu mesma também não sei tudo, também cometo erros e passo por estúpida de vez em quando. Quando devia praticar a máxima do Ted Lasso e ser curiosa antes de tecer juízos de valor. 

 

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É um dos temas deste álbum: a dualidade de tudo, de herói e de vilão todos temos um pouco. Havemos de regressar a esse assunto. 

 

Depois de You First, temos Figure 8 – que, em linha com o que acabámos de dizer, explora o lado mais vilanesco. A letra é, se calhar, um pouco vaga demais, demasiado abstrata. Pelo que consigo deduzir da entrevista da banda a Zane Lowe, a letra falará da indústria musical, do próprio estilo de vida dos Paramore em digressão ou quando lançam um álbum. A maneira como essa vida os explora até ao tutano e os transformam em algo de que Hayley não gosta. 

 

Não digo que eles não tenham razão de queixa, mas esta mensagem pode cair mal. Pode parecer que eles estão a cuspir no prato que os alimenta – ainda por cima quando Hayley se põe a dizer “all for your sake”. Sim, a indústria musical não é meiga, mas existem por aí muitos músicos que não têm nem metade dos benefícios de que os Paramore gozam. 

 

Para ser justa, não se pode dizer que eles não reconhecem os seus próprios privilégios. E, de qualquer forma, quando Hayley canta “all for your sake”, pode estar a dirigir-se à comunicação social. Esses sim, fartam-se de lucrar à custa de músicos como os Paramore. Hayley de vez em quando refere as entrevistas agressivas que teve de dar durante a era de After Laughter, quando ela se encontrava numa situação particularmente vulnerável.

 

A expressão “figure 8” refere-se ao número 8 que, na horizontal, é também símbolo do infinito – representando o ciclo vicioso em que os três entram quando entram em modo Paramore. 

 

 

No Genius, no entanto, descobriram referências a um episódio de Schoolhouse Rock, um programa educacional americano dos anos 70 e 80. A expressão “spinning in an endless figure 8” parece ter inspirada pela cena da criança a patinar no gelo. De facto, na terceira estância, Hayley compara-se a si mesma a gelo fino, o que pode significar duas coisas. Ou que ela, lá está, se encontra numa posição vulnerável e pode ser magoada facilmente. Ou, ao contrário, Hayley é uma armadilha e, se a outra pessoa não tiver cuidado, pode sair magoada.

 

Não surpreende que Figure 8 esteja entre as mais populares neste álbum.

 

E ficamos por aqui hoje. Amanhã vem o resto. Como sempre, obrigada pela vossa visita. Espreitem a página de Facebook deste blogue. Até amanhã!

Música 2022 #5: O lado colorido

Referi no texto anterior que o meu gosto musical se define por aquele meme da casa escura ao lado da casa colorida. Claro que esta é uma versão muito redutora da coisa – até porque muitos dos artistas e bandas que oiço não se encaixam perfeitamente numa só casa. De resto, o texto anterior focou-se na casa escura. Hoje vamos focar-nos na casa colorida.

 

 

Começando por Mika. Este é um artista sobre quem não escrevo desde 2016, mas que se tem mantido na minha rotação ao longo de todos estes anos. Tenho ouvido uns quantos temas do seu álbum mais recente, My Name is Michael Holbrook, de 2019, de forma muito casual, quando me aparecem no aleatório, sem pensar muito nisso. Algumas das minhas preferidas são Cry e Dear Jealousy.

 

Ainda assim, houveram algumas músicas que fui negligenciando. Quando Mika co-apresentou o Festival da Canção e cantou um medley de algumas das suas músicas – e a sua apresentação foi melhor que as de metade dos concorrentes – recordei-me delas. Em particular, Love Today e Lollipop.

 

Isto numa altura em que, lá está, Everything is Emo tinha acabado de começar e eu andava entusiasmada com essas músicas.

 

Foi também nessa altura – na véspera do Festival, se não me engano – que Mika lançou o single Yo Yo. Uma das minhas músicas preferidas de 2022. É um tema de disco pop, bastante simples, talvez mesmo básico, em termos de instrumentação. Mas funciona. É um caso de menos que é mais.

 

Diz que Mika está a preparar um par de álbuns, um em inglês, outro em francês, mas ainda não há previsão de lançamento. Em todo o caso, hei de continuar a acompanhar casualmente a carreira dele e espero que um dia volte a Portugal – o Rock in Rio 2016 foi giro.

 

Uma que se tem mantido sempre forte na minha rotação é Carly Rae Jepsen. A cantautora canadiana lançou um álbum este ano, The Loneliest Time. Por azar, foi editado no mesmo dia que Midnights, de Taylor Swift. 

 

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Cheguei a temer que houvesse alguém na editora de Carly que a odiasse secretamente. Até porque já o lançamento de Emotion foi uma confusão. No entanto, daquilo que pesquisei, The Loneliest Time foi anunciado cerca de um mês antes de Midnights. Deve ter sido uma coincidência infeliz.

 

Segundo Carly, The Loneliest Time é um dos seus álbuns mais pessoais. Algumas destas músicas foram compostas como páginas do seu diário. Carly nem sequer queria lançá-las, mas foi persuadida pela sua editora.

 

Este é o primeiro caso que conheço em que uma editora prefere o mais honesto em vez de o mais radiofónico. Respeito.

 

Uma dessas músicas mais diarísticas é o primeiro single, Western Wind, lançada uns meses antes do resto do álbum. Acho que a ouvi pela primeira vez quando me apareceu no Radar de Lançamentos do Spotify. Nos meses que se seguiram, ia adicionando-a às minhas filas, gostando do que ouvia, mas sem lhe prestar muita atenção. Uma das primeiras coisas que me atraiu em Western Wind foi a sonoridade vagamente mística, criada pela percussão e pelos sintetizadores.

 

Mais tarde, depois de sair The Loneliest Time e depois de ler e ouvir algumas entrevistas, descobri que a letra de Western Wind foi inspirada pelas suas experiências durante o confinamento. Carly estava a viver em Los Angeles e a sua família estava a viver no Canadá quando a pandemia começou. Perdeu a avó nessa altura, mas não pôde ir ao funeral nem estar com a família por causa das restrições nas fronteiras.

 

Western Wind não é uma música triste, no entanto. Aliás, faz-me lembrar Everglow, dos Coldplay, pois fala sobre sentir a presença e o amor dos seus entes queridos, mesmo com a distância.

 

 

Ao mesmo tempo, Western Wind fala sobre o contacto com a Natureza que, para Carly, lhe recorda a infância. Faz parte do arquétipo do Canadá, eles gostarem muito do ar livre. Por outro lado, este tem sido um tema recorrente desde o início da pandemia, por motivos óbvios. Nem sequer é a primeira vez que o comento aqui no blogue.

 

Ora, o segundo single, Beach House, é muito diferente. O instrumental é mais alegre, daqueles que convidam a palmas. Há muitos que não gostam desta música e eu até compreendo porquê – é daquelas canções um bocadinho tolas. Confesso que já fui mais papista nesse aspeto – e, de resto, existe muito pior por aí. 

 

Eu acho engraçada. Carly escreveu a letra sobre as suas experiências quando aderiu ao Tinder ou a uma aplicação semelhante. 

 

Eu pergunto-me, no entanto, como é que não se soube que Carly Rae Jepsen andava a aparecer em apps de encontros – ela é relativamente famosa! E aposto que levou com uma mão-cheia de piadas com Call Me Maybe. Aparentemente ela não se manteve na app durante tempo suficiente para isso mas, de qualquer forma, a experiência não foi divertida. Corre-se o risco de entrar em território muito sombrio quando se fala  de encontros que correm mal. Beach House conseguiu manter o tom humorístico, o que nem sempre é fácil. Pontos para Carly.

 

E acho que não estou a perder nada ao não aderir ao Tinder.

 

Outro single de que gosto é de Surrender My Heart – que também abre o álbum. Esta é outra música sobre relutância em apaixonar-se após más experiências anteriores. Carly é uma confessa romântica incurável e isso reflete-se na sua música. Paradoxalmente, tem tido azar no amor. Isso foi algo que a atormentou durante o confinamento: o facto de ainda não ter encontrado a pessoa certa.

 

 

Em Surrender My Heart, a narradora – vamos assumir que é Carly – está com uma pessoa e está ativamente a lutar contra os comportamentos tóxicos que adotou, depois de todas as suas relações falhadas. Algumas por sua causa, ela admite – “All the broken hearts that I broke before they could break me”. Carly quer deixar tudo isso para trás, quer deitar os muros abaixo, ter fé no amor e no seu amado. 

 

O refrão é tão cativante como algumas das melhores músicas de Carly. Gosto em particular dos backvocals.

 

A balada Go Find Yourself or Whatever é outra autobiográfica. Terá sido inspirada pelo término de uma relação de Carly. O tipo deixou-a, dizendo que, como diz o título, precisava de “se encontrar a si mesmo”.

 

É uma situação curiosa Isto de se “encontrar a si mesmo” é um daqueles ditos de psicologia popular que tem estado na moda nos últimos anos – e que, de tão usados, já começaram a perder o seu significado. Chegam mesmo a ser usados como pedras para atirar aos demais. 

 

Não digo que tenha sido esse o caso do interesse romântico de Carly. Pelo contrário, é possível que o sujeito tivesse boas intenções. Se ele tinha assuntos pessoais por resolver, talvez não fosse saudável ele continuar naquela relação.

 

Dito isto, Go Find Yourself or Whatever mostra-nos o outro lado. A narradora pode compreender as razões do amado, mas também pode vê-las como “Estou melhor sem ti” ou “Não fazes bem à minha saúde mental”. Carly chegou a descrever Go Find Yourself or Whatever como uma canção zangada, mas eu não a vejo assim. Acho que a narradora está a lidar com a situação com uma elegância de louvar – claramente ressentida, mas espera que o amado volte para ela, quando se encontrar a si mesmo ou lá o que for.

 

 

Eu não sei se estaria disposta a fazer o mesmo.

 

Outras músicas de que gosto são Anxious e Keep Away. Ainda preciso de passar mais tempo com The Loneliest Time, mas acho que gosto um bocadinho mais dele que de Dedicated. Carly abrindo o seu coração foi uma aposta ganha – tanto na música como no amor, ao que parece. 

 

Emotion continua a ser o melhor, no entanto. Side B incluído.

 

Por fim, temos de falar sobre Taylor Swift. Ela que continua uma presença forte nos meus hábitos musicais – e provavelmente assim continuará. A música da mulher é tão cativante que, se não tenho cuidado comigo mesma, não oiço mais nada. 

 

E muitas vezes nem sequer são as músicas mais recentes. Muitas vezes são músicas como Treacherous e evermore, que têm ganho novos significados com o tempo.

 

Por outro lado, tenho de confessá-lo: ao fim de algum tempo cansa. São muitas canções sobre relações românticas e, sobretudo, sobre separações.

 

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Apesar da omnipresença de Taylor na minha vida musical, é pouco provável que alguma vez escreva uma análise como deve ser a algum álbum dela. O mercado está saturado. Há por aí muita gente com mais conhecimentos sobre a carreira dela e histórico amoroso, mais capaz de identificar as pistas e os infames easter eggs. Tenho pouco a acrescentar ao debate. Não digo nunca, mas para já vou limitar-me a textos como este – e a eventuais Músicas Ao Calhas, se me apetecer.

 

Não sei como foi com outros fãs de Taylor, mas não contava com um álbum de músicas inéditas em 2022. Estava à espera de mais regravações – estou um bocadinho desiludida por não termos ainda 1989 TV ou Speak Now TV. 

 

Tirando isso, Midnights foi uma surpresa agradável. Taylor regressou ao synth pop de 1989, Reputation e Lover, mas com as lições aprendidas com folklore e evermore. Tenho uma certa pena que Taylor não se tenha aventurado num género musical diferente – ando com desejos de um álbum rock – mas a música é boa e isso é o mais importante.

 

Anti-Hero tem-se fartado de quebrar recordes, mas não está entre as minhas preferidas. É possível que seja por excesso de exposição. Estou contente por Taylor ter percebido que as pessoas preferem o seu lado honesto em vez de uma música estilo Me!, concebida para ser o êxito radiofónico. 

 

Ainda assim, cansei-me depressa do verso “It’s me, hi, I’m the problem, it’s me” – e acho que era previsível.

 

Também não adoro Bejeweled. Das três músicas que tiveram direito a vídeo até agora, Lavender Haze é a de que gosto mais – adoro o verso “Get it off your chest, get it off my desk”. Alguns fãs queixam-se que Taylor nunca escolhe as músicas certas como singles. Eu não sou assim tão categórica, mas no que toca a Midnights concordo. 

 

 

Karma é uma das minhas preferidas em Midnights. Tem um estilo de instrumentação semelhante a Bejeweled, mas na minha opinião melhor executado. Os momentos com piano (?) que vão pontuando a música fazem-me pensar no ataque Dazzling Gleam em Pokémon. A letra tem uma dose saudável de braggadocio – na minha opinião justificado e mais genuíno do que quando Taylor se faz de coitadinha, como em You’re On Your Own, Kid. Adoro o verso “Ask me why so many fade but I’m still here” – tanto pela mensagem e sim como pelos vocais harmonizados.

 

Midnight Rain é outra das minhas preferidas. Uma balada estilo anos 80 – aliás, lembra-me imenso All That, de Carly Rae Jepsen. À semelhança de outras músicas neste álbum, como Labyrinth, os vocais artificiais são muito prevalentes. Regra geral, não costumo gostar de vocais como estes – Carly Rae Jepsen, por exemplo, usou-os em músicas como The Loneliest Time e eles irritam-me. No entanto, em Midnights todos eles foram bem sacados.

 

Só prova que estes elementos menos “orgânicos” – coisas como auto-tune, dubstep, etc – não são maus por si só. Depende tudo da forma como são usados. Mais sobre isso já a seguir.

 

A letra fala de algo que eu penso ser muito comum: dois apaixonados cujos projetos de vida não encaixam. Faz lembrar a história de ‘tis the damn season e dorothea em evermore – com a diferença de que, em Midnight Rain, há mais certeza de que foi tomada a decisão certa. Ainda que a narradora de vez em quando pense nele.

 

Vigilante Shit é quase um guilty pleasure – sombria de uma maneira lamechas e deliciosa. Também gosto muito do tom sonhador de Snow on the Beach – não sei se Taylor pretende lançar mais singles para Midnights, mas, se eu tivesse voto na matéria, escolheria esta. 

 

Labyrinth, Maroon e Question…? são três músicas de que gosto mas que ainda não digeri por completo. Destas três, a minha preferida é a terceira – o cenário pintado pelo refrão recorda-me uma de várias histórias que escrevi há muitos anos, em miúda.

 

 

Depois temos ainda a versão Deluxe – a 3am Edition, edição das três da manhã, que está cheia de pérolas. Algumas delas, na minha opinião, mereciam estar na edição padrão de Midnights.

 

Bem, mais ou menos no caso de Bigger than the Whole Sky: uma música linda mas de partir o coração. Especula-se que a letra tenha sido inspirada por um possível aborto espontâneo. Talvez Taylor a tenha deixado de fora da edição-padrão para não ter de responder a perguntas sobre ela.

 

Compreende-se.

 

Would’ve Could’ve Should’ve, que parece ter sido inspirada pela relação de Taylor com John Mayer, não é das minhas preferidas. Tem, no entanto, sido bastante comentada pelos fãs pelo infame verso “Give me back my girlhood”.

 

Gosto muito de High Infidelity, que apresenta uma situação de moralidade questionável – a narradora explicando os motivos pelos quais traiu o companheiro. Paris também é muito gira – é a música mais alegre em toda Midnights. No entanto, estou zangada com Taylor por esta música ter saído duas semanas depois de eu ter estado em Paris. Isto faz-se, Miss Swift?

 

Em defesa dela, a Paris da música não parece ser a cidade propriamente dita, antes uma metáfora. Como a Paris dos Chainsmokers – uma música de que também gosto muito.

 

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É possível que alguns de vocês não conheçam Hits Different. Esta é uma faixa exclusiva da versão de Midnights vendida na Target (uma cadeia de supermercados norte-americana) e não está disponível em nenhum dos Spotifys desta vida. Mesmo no YouTube os vídeos nunca permanecem disponíveis durante muito tempo. Nos últimos anos, faixas como esta costumam ser lançadas nas plataformas de streaming mais cedo ou mais tarde. Mas já lá vão quatro meses e, até agora, nada… (É melhor sacarem-na aqui.)

 

Às vezes o fator raridade sobrevaloriza uma canção e é possível que ele esteja presente com Hits Different. Mas continuo a achar que é uma das melhores em Midnights e merecia estar na edição-padrão. Ao mesmo tempo, é uma sonoridade distinta do resto do álbum – com mais guitarra acústica, embora mantenha elementos de synth pop. Talvez tenham achado que não se encaixava bem com o resto das músicas. 

 

Há quem descreva Hits Different como a august deste álbum. Consigo compreender porquê: o refrão de Hits Different parece-se um bocado com a terceira parte de august. Aliás, tanto o refrão como a terceira parte desta música são excelentes.

 

Espero que não demorem muito mais a colocar isto no Spotify. O resto do mundo merece ouvir Hits Different.

 

Falta só falar sobre a minha canção preferida em Midnights – e possivelmente de todo 2022. Para isso, vamos regressar à 3am Edition e olhar para a primeira das faixas-extra: The Great War.

 

 

Esta música cativou-me forte logo na primeira audição e, nas raras ocasiões em que isso acontece, fico refém para o resto da eternidade. No caso de The Great War, estas melodias devem ter uma droga qualquer, sobretudo no refrão – são viciantes.

 

A instrumentação é daquelas coisas que, como comentei acima, não devia resultar mas resulta. É a música mais eletrónica em toda a Midnights, com notas daquilo que me parece ser 8bit.

 

8bit! Música de Game Boy! Taylor e Aaron Dessner criaram uma autêntica obra de arte com música de Game Boy! E eu costumo dizer que prefiro instrumentos “a sério”...

 

Ao mesmo tempo, existe algo de militarístico na percussão, sobretudo na terceira parte – o que se adequa à letra, claro. Esta é uma das melhores letras em todo o álbum, se não for de todo o ano: comparando uma discussão feia entre amantes a uma das Guerras Mundiais. Uma das partes é menos belicosa, tenta resolver a situação diplomaticamente. A narradora, no entanto, tem uma coleção de más experiências anteriores, o que a leva a comportamentos destrutivos, tanto para ela como para o amado – veja-se toda a segunda parte. Claro que, a partir de certa altura, ela percebe que está errada e põe fim ao conflito. 

 

Tal como Lorde fez com todo o álbum Melodrama, Taylor pegou numa situação relativamente corriqueira e transformá-la em algo grandioso.

 

E depois são os pormenores. Adoro a frase “Diesel is desire” – não consigo perceber se isto é considerado assonância ou aliteração, só sei que adoro a maneira como soa. Por outro lado, a expressão “crimson clover” também aparece em A Praise Chorus, outra das minhas músicas favoritas em 2022 – uma coincidência engraçada.

 

 

The Great War é mesmo daquelas músicas que estimulam a imaginação que se aplicam a inúmeras histórias. A mim invoca-me imagens do filme Expiação, que vi no verão passado e que deu cabo de mim. Ao mesmo tempo, têm-me aparecido várias montagens de vídeos nas minhas sugestões do YouTube – como a acima. 

 

Eu mesma tentei fazer uma story com imagens do primeiro filme de Tri, mas não saiu bem como queria. Eu devia era fazer um AMV – se algum dia arranjar tempo, paciência e software para isso, este está no topo da lista.

 

E depois de Midnights? Taylor prepara-se para ir em digressão pela primeira vez em vários anos. À data desta publicação, só há marcações para os Estados Unidos – os Paramore, aliás, irão abrir um par de concertos – que se estendem até agosto. Ainda não há datas para concertos na Europa, mas estas deverão ser anunciadas mais cedo ou mais tarde.

 

Ela virá a Portugal? Talvez. Taylor era para ter vindo em 2020, antes de a pandemia ter cancelado tudo. Se vier, eu gostava de ir, mas será quase de certeza uma corrida estilo Coldplay no ano passado. E os bilhetes serão caríssimos. 

 

Entre esta digressão e o filme que ela irá realizar, não sei se ela planeia lançar música em 2023. Ninguém a censuraria – seria o primeiro ano desde 2018 sem que Taylor lançasse música. Mas ando um tudo nada sedenta de mais relançamentos. Os intérpretes de easter eggs dizem que o próximo será Speak Now, o que me agrada – só mesmo por causa de Enchanted. 

 

E chegámos ao fim deste balanço. Finalmente. Isto foi um autêntico exagero e, por incrível que vos pareça, houveram músicas marcantes este ano que ficaram de fora. Coloquei-as na playlist do ano à mesma. Temas como, por exemplo, Lost My Mind de Finneas, Celestial de Ed Sheeran (porque continuo a comer da mão), Guerra Nuclear de Marisa Liz e de António Variações e uma Questão de Fé, de João Pedro Pais, na sequência do meu texto sobre música portuguesa. Deixo também aqui o link da playlist de Setembro de 2022 para complementar. E o meu Spotify Wrapped, que este ano acho que até ficou fidedigno.

 

 

Agora se me permitem algumas reflexões sobre 2022 com dois meses de atraso… para mim 2022 foi o oposto de 2021. 2021 foi um ano melhor que o anterior em termos coletivos mas foi pior para mim em termos pessoais. 2022 foi péssimo em termos coletivos – muito menos Covid, mas guerra, inflação, crise energética, seca em Portugal – mas, a nível pessoal, foi o melhor desde 2019. Entre outras coisas, estou mais feliz no trabalho. Foi o regresso a uma quase normalidade após a pandemia. Voltei a ir a concertos, viajei mais, convivi mais. Como escrevi num dos textos anteriores, vi mais séries e filmes – destaque para Kizuna em português nos cinemas portugueses – alguns fora da minha zona de conforto. 

 

E, como poderão deduzir desta série de testamentos a que chamo balanço musical, não me faltou música. 

 

Na verdade, sinto que, depois de dois anos acontecendo relativamente pouco por causa da pandemia, desde há alguns meses para cá está a acontecer tudo ao mesmo tempo para compensar. Isso já tinha acontecido em setembro e escrevi sobre isso na altura. Depois, tivemos o Mundial – um Mundial muito melhor do que tinha o direito a ser – fora de horas, em cima do Natal, na mesma altura em que saiu Pokémon Scarlet & Violet e em que os Paramore lançaram The News.

 

E isso tem continuado e vai continuar em 2023. Vejam-se as últimas semanas: Lost, uma inédita dos Linkin Park dos trabalhos de Meteora saiu no mesmo dia que o álbum This is Why. Depois disso, em abril, vou ter dois concertos em menos de uma semana – vou ver os Hybrid Theory ao Pavilhão Atlântico no dia 15 e, no dia 21, vou finalmente ver Avril Lavigne a Zurique.

 

Aliás, toda a gente e respectivos avós vão lançar música em 2023, ao que parece. Os Sum 41, para começar, como comentámos no texto anterior. Avril está em estúdio neste momento – no que toca a ela, no entanto, é melhor apontarmos só para a 2024. Lorde também anda a brincar com a ideia de lançar música nova, apesar de, tecnicamente, ainda andar em digressão por Solar Power. Ela, aliás, acaba de ser confirmada no Paredes de Coura. 

 

Mas eu dificilmente poderei ir. Paredes fica muito longe e não marquei férias para essa altura. 

 

 

Está também prestes a sair a edição de vigésimo aniversário de Meteora. Mike Shinoda também irá lançar algumas canções a solo e tem deixado em aberto a possibilidade de os Linkin Park lançarem música nova. 

 

Tudo isto é bom, claro. O reverso da medalha é que é muita coisa para digerir ao mesmo tempo, quanto mais escrever – quando eu também tenho trabalho e outros assuntos pessoais na minha vida (diz que isto é a vida adulta). É por isso que estamos em finais de fevereiro, princípios de março, e eu ainda a refletir sobre 2022. 

 

Uma pessoa com juízo chegaria à conclusão de que talvez eu não precise de escrever tanto, mas eu quero. Existem tantas coisas que quero escrever, nem só apenas nestes blogues. Um lema/lamento que adotei nos últimos meses é que a vida é demasiado curta para tudo o que quero escrever. Vai continuar a ser verdade em 2023. 

 

Já que falo no assunto, deixo os meus planos para os próximos textos deste blogue. O próximo será uma análise a Meteora, a propósito do vigésimo aniversário – algo semelhante ao que fiz com o Hybrid Theory. Não vou publicar no próprio dia 25 de março. Em parte porque não devo ter tempo, mas também quero esperar pela edição de aniversário para poder incluir as faixas novas e as demos todas na análise. Espero divertir-me tanto como com Hybrid Theory.

 

A seguir, escreverei sobre This is Why dos Paramore. Vou precisar destas semanas, ou meses, para formar uma opinião sobre o álbum – ainda está tudo muito no ar. Depois disso, logo se vê. Não quero preocupar-me demasiado com isso e não vou ter pressa. Como disse antes, existem coisas que quero escrever fora dos meus blogues. Não estranhem se isto voltar a ficar parado durante longos períodos. 

 

Obrigada por me terem aturado mais um ano. Continuem a aturar-me durante mais um… ou melhor, durante mais dez meses – espero nunca mais voltar a atrasar-me com um balanço musical. Antes de me ir embora, deixo-vos o link para o meu Tumblr – aderi no início do ano para servir de alternativa ao Twitter. Não que publique nada de especial, mas tenho-me divertido – para mim é um mundo à parte de todas as outras redes.

 

Como sempre, obrigada pela vossa visita. Até à próxima.

Música 2022 #1: Bryan Adams ou porque preciso de música feliz

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Hoje quebro uma regra não escrita aqui do blogue e começo a minha retrospetiva musical do ano… em novembro. Como já tinha explicado antes, o meu plano inicial foi sempre escrever um texto nesse estilo sobre a música que Bryan Adams lançou em 2022. Como já estamos perto do fim do ano, o próximo texto terá uma estrutura semelhante e os textos que publicarei a seguir farão parte da retrospetiva, mais vale incluir já estes dois na série. 

 

Agora só espero que o meu velho não me troque as voltas e não me lance música nova antes do fim do ano.

 

Até calha bem começar hoje pois Bryan completa sessenta e três anos hoje. Que este texto sirva de mensagem de parabéns.

 

A retrospetiva deste ano será interessante pois 2022 está a ser um ano louco para mim em termos musicais – quero ver o que irão dizer os relatórios anuais do Spotify e do Last FM. Este é apenas o começo. Infelizmente, como vamos entrar em modo Mundial daqui a poucos dias, os próximos textos ainda vão demorar. 

 

Na verdade, vou começar este texto sobre Bryan Adams falando sobre uma canção de Lionel Ritchie. Foi durante a contagem decrescente para o início do concerto de 30 de janeiro. Como habitual, havia música a tocar nos altifalantes do Pavilhão Atlântico, para ir entretendo o público à espera que Bryan subisse ao palco. A certa altura, tocou All Night Long (All Night) e toda a gente se pôs a cantar, a bater palmas, a dar uns passinhos de dança. Foi o primeiro momento da noite em que a audiência se uniu pela música.

 

(Obrigada Elisabete Branco, do Bryan Adams Group do Facebook, pelo vídeo)

 

Estes são momentos subvalorizados da experiência de ir a concertos e que eu mesma aprendi a apreciar nos últimos tempos. Já tinha acontecido em 2017, antes do concerto dos Sum 41, com o público cantando One Step Closer dos Linkin Park. Voltou a acontecer em força no concerto mais recente dos Sum 41 com os Simple Plan ​​– a produção conhecia a audiência e pôs a tocar vários êxitos do emo/pop punk dos anos 2000. All the Small Things, Sugar, We’re Going Down, Misery Business (poucos dias antes de ser oficialmente “descancelada”), Basket Case (OK, esta era dos anos 90, mas pronto…).

 

Da mesma forma, acredito que a equipa do Pavilhão Atlântico tenha posto All Night Long a tocar pelos eventuais fãs cruzados – Ritchie também foi um cantor de sucesso nos anos 80 e 90. Mas eu gosto de pensar que o público aderiu não só por isso, também pela mensagem da canção: “Well, my friends, the time has come, to raise the roof and have some fun”. Depois de quase dois anos de pandemia, dez mil almas vinham finalmente a um concerto a sério. 

 

Nas semanas seguintes fiquei obcecada pela música e apercebi-me de algo: eu preciso de música alegre para sobreviver, sobretudo em momentos menos felizes da minha vida. Aconteceu em 2017 com Loucos, de Matias Damásio, que me fez chorar na manhã a seguir ao concerto de homenagem a Chester Bennington. Aconteceu no ano passado com o single Solar Power, num verão em que não pude ir de férias. Acontecia agora com All Night Long, num período em que estava menos feliz do que tenho estado ultimamente. 

 

Música alegre tem má reputação nalguns círculos. Alguns argumentos até fazem sentido. Em pesquisas para este texto, dei com um par de artigos descrevendo a maneira como a música alegre pode ser usada para controlar a população, tornando-a mais complacente, agressiva, mesmo mais racista e xenófoba. Vejam-se as marchas militares, hinos nacionais, cânticos de claques desportivas. 

 

Confesso que estes artigos me fizeram questionar muita coisa, mas isso foge ao âmbito do texto. Passemos à frente. 

 

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Assim, manipulação de massas à parte, há quem acredite que a música alegre é por defeito mais fútil, inferior a música triste ou zangada. Por exemplo, um dos motivos pelos quais muitos criticaram precisamente o álbum Solar Power foi por ser demasiado alegre – como poderão ler aqui, na minha opinião, os problemas do álbum são outros. Noutro exemplo, durante os trabalhos do Self-Titled dos Paramore, Hayley Williams tinha algumas dúvidas em relação a Still Into You – receava que fosse demasiado alegre. Em oposição, alguns géneros de música fazem quase uma romantização da tristeza – o “emo” é o exemplo óbvio, mas também a estética da sad girl”

 

Isto acaba por entrar na questão do idealismo versos cinismo – a felicidade e o otimismo são infantis, a infelicidade e o pessimismo são adultos. A cena do génio torturado. Citando Ursula K. Le Guin, “temos um mau hábito, encorajado por pedantes e sofisticados, de considerar a felicidade como algo um tanto estúpido. Só a dor é intelectual, só o mal é interessante. Essa é a traição do artista: uma recusa em admitir a banalidade do mal e o tédio terrível da dor.

 

Não concordo a cem por cento com esta citação, no entanto, sobretudo com a última frase. Não acho que ninguém considere a dor “entediante”. Pelo contrário, a expressão artística poderá ser uma maneira saudável, num ambiente controlado, de sentir e lidar com sentimentos negativos. Essa é a própria definição de catarse – havemos de regressar a essa ideia. Mas definitivamente concordo que existe a ideia de que a felicidade é anti-intelectual. 

 

Mesmo eu, há dez anos, nunca viria para aqui dizer tão bem de uma música “de festa” como All Night Long. Claro que me tornei mais flexível nessas coisas com os anos – mas ainda não gosto do Pitbull nem de música semelhante à dele. 

 

E de qualquer forma acho que, a certa altura, se foi demasiado na direção contrária. Penso que não é a primeira vez que refiro aqui que, apesar de ter gostado de folklore e evermore de Taylor Swift, a partir de certa altura estes começaram a pesar. 

 

Além disso, recordo-me de estar de férias no verão de 2020 e na rádio tocavam músicas como everything i wanted, de Billie Eilish, e uma literalmente intitulada Death Bed, leito de morte. E eu pensava: “As coisas já estão suficientemente difíceis, com a pandemia e tal. Estou aqui a tentar aproveitar as minhas férias. Não podia tocar algo menos deprimente?”.

 

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Não me interpretem mal. Não quero insinuar que não gosto de música que não seja “feel good” ou que não reconheço a sua importância. Afinal de contas, os Linkin Park são uma das minhas bandas preferidas e eles não têm uma única música propriamente alegre – apenas esperançosa ou reconfortante. Da mesma forma, este ano tenho explorado o meu lado “emo”/pop punk e tal, graças ao programa Everything is Emo de Hayley Williams e ao concerto dos Simple Plan e dos Sum 41. 

 

Música que os nossos artistas ou bandas preferidas criaram para exorcizar os seus próprios demónios. Música que nos dá força, que nos dá esperança ou que, pura e simplesmente, dá voz, instrumental e melodia ao que estamos a sentir, que não nos deixa sozinhos no escuro. De maneira paradoxal, alguns dos melhores momentos da minha vida foram em concertos dessas bandas, sentindo essa raiva coletiva, revolta coletiva, tristeza coletiva. Já falei disso antes, mas Mike Shinoda chegou a dizer que um dos objetivos dos Linkin Park fora criar um sítio onde as pessoas experimentassem uma sensação de pertença enquanto gritavam que o mundo era horrível, um lugar seguro para exprimirem estas emoções mais negativas. 

 

Isto tudo para dizer que todas as emoções musicais são válidas e importantes. Eu preciso de todas, não consigo limitar-me a apenas uma parte do espectro. Nunca me senti muito muito confortável com tristeza – o que, admito, poderá não ser muito saudável. Algumas pessoas se calhar estranhariam – já aconteceu, sobretudo quando era mais nova, considerarem-me mais triste e mais séria do que realmente sou. 

 

Ou talvez tenha uma “resting bitch face”.

 

Como referi antes, nestes dias não estou tão infeliz como noutras alturas, mas ainda me recordo de sentir frases como “Life is good, wild and sweet” e “Forget all of the tears that you’ve cried, it’s over” batendo mais forte do que, se calhar, mereciam. Talvez fosse escapismo, talvez fosse enterrar a cabeça na areia. Ou talvez quisesse agarrar o momento de alegria possível, ser feliz nem que fosse apenas durante os cinco minutos ou menos de uma canção.

 

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E a verdade é que é isso que a maior parte da música de Bryan Adams representa para mim. Música feel good para cantar no carro, sobre amor, sexo, aproveitar a vida, ser-se jovem, livre e feliz.

 

Aliás, acho que é essa a intenção de Bryan, sobretudo nos últimos anos. De que outra forma se explica que ele tenha lançado um álbum intitulado So Happy it Hurts depois de dois anos de pandemia? Não que ele não seja interventivo, antes pelo contrário. Conforme ele explicou nesta excelente entrevista, ele apoia causas discretamente. Bryan levantou mesmo a hipótese de, em vez de simplesmente boicotar ou “cancelar”, um concerto de música feel good num país reprimido ser por si mesmo um acto de ativismo. 

 

Merece a reflexão, pelo menos. Em todo o caso, esse intervencionismo raramente é vertido para a música de Bryan em si. E, sinceramente? É melhor assim. Das poucas vezes em que isso aconteceu, não resultou, na minha opinião. E o espírito feel good da música de Bryan também tem o seu impacto em tempos tão difíceis como os atuais.

 

Um bom reflexo dessa atitude é o tema Never Gonna Rain, um dos singles de So Happy it Hurts. Bryan será sempre o otimista, o sonhador, a pessoa que tentará ver o lado positivo e focar-se menos no negativo. Esse espírito tem as suas limitações, claro, como Rose Colored Boy dos Paramore tão bem nos recorda, mas o cinismo também não é resposta para tudo. A virtude estará algures no meio. 

 

Precisamos de música de intervenção, que denuncie o que está errado no nosso mundo. Precisamos de música que dê voz à nossa dor, à nossa raiva. Mas também precisamos de música que nos recorde que há mundo para além disso tudo, que a vida também pode ser boa.

 

 

O concerto dele em janeiro serviu para isso. Como referi antes, foi o meu primeiro concerto a sério após a pandemia – para mim e, acredito, para o resto da plateia – e celebrámos adequadamente. O próprio Bryan sentiu o nosso alívio, a nossa euforia. Orgulho-me em particular de ter aguentado o concerto todo sem tirar a máscara – sempre cantando, dançando, saltando, dando headbangs como se a música fosse mais pesada do que realmente é. 

 

Como desenvolvido acima, a música de Bryan é perfeita para ilustrar este espírito. músicas como Here I Am, Back to You e Cloud Number 9 bateram particularmente forte – as duas últimas em particular, pois não lhes dera muita rotação nos meses anteriores.

 

O único motivo de queixa que não chega a sê-lo é que o concerto em si não foi muito diferente do de 2019. Só se tinham passado dois anos e cerca de mês e meio, logo, ainda nos recordamos de muitos dos truques de palco. Sou capaz de apostar que a montagem de fotografias que Bryan mostrou da sua vida em Birre, quando era miúdo, era exatamente a mesma. 

 

Não que possamos censurar Bryan por isso. Quase não houveram concertos entre dezembro de 2019 e janeiro de 2022. Não houve tempo para Bryan e os seus colegas de banda se cansarem dos truques atuais e sentirem a necessidade de inovar. E, de resto, é uma queixa menor. Dez em dez, repetia a experiência.

 

Falemos agora sobre o álbum So Happy it Hurts. Este é outro trabalho cuja concepção foi condicionada pela pandemia. Tal como Hayley Williams fez com o seu segundo álbum a solo, Flowers For Vases, Bryan gravou todos os instrumentos (ou quase todos). Ao contrário do que aconteceu com FFV, em So Happy it Hurts não se nota. Não surpreende: Bryan tem muito mais experiência como instrumentista. Só precisou de reaprender a tocar bateria. 

 

So Happy it Hurts assemelha-se a Shine a Light no sentido em que não tem nenhum conceito particular, são apenas músicas que Bryan foi compondo. Ainda assim, coloco o álbum mais recente um pouco acima porque, na minha opinião, tem músicas melhores. Pelo menos os singles saem um bocadinho mais da caixa habitual para Bryan – veja-se On the Road e Kick Ass, como discutimos no ano passado, e Never Gonna Rain, lançado uns dias antes dos concertos em Portugal. 

 

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Esta última é uma das minhas preferidas neste álbum. Foca-se mais no baixo do que o costume para Bryan e gosto dos vocais no pós-refrão, sobretudo no último. Por outro lado, o título da música é irónico num ano de seca. 

 

A minha preferida, no entanto, é These Are the Moments that Make up my Life. 

 

Esta foi uma das primeiras que ouvi quando o álbum saiu – as músicas foram publicadas no YouTube, calhou clicar primeiro nesta. Cativou-me logo, sobretudo por causa da letra. 

 

Musicalmente é interessante – suave no início, guiada por um riff de guitarra, ganhando mais intensidade quando se juntam os outros instrumentos. 

 

Não sei se esta não será uma das letras mais pessoais de Bryan em anos. These Are the Moments that Make Up my Life fala sobre a felicidade das pequenas coisas da vida doméstica e familiar: o som da chuva a cair, os beijos da pessoa que se ama, o riso das crianças.

 

Regressando ao tema de abertura deste texto, These Are the Moments that Make up My Life é um exemplo claro de música feliz que ninguém pode acusar de futilidade. Não que seja propriamente profunda, mas é uma maneira mais realista, mais terra-a-terra, de salientar o lado bom da vida. Nem sempre conseguimos ir a um concerto, à discoteca, à praia ou numa longa viagem, mas podemos ir colhendo felicidade nas pequenas coisas do quotidiano.

 

 

Foi de resto uma das lições da pandemia. Fomos privados de muito, mas serviu para nos recordarmos que, no fim de tudo, o mais importante são as pessoas que amamos. Nesse aspeto, These Are the Moments that Make Up My Life recorda-me World’s On Fire – uma das que melhor envelheceu do álbum Post Traumatic de Mike Shinoda. 

 

Por estes motivos, de início pensei que Bryan tinha composto esta música durante a pandemia. Não foi o caso. Em entrevista, Bryan disse que These Are the Moments that Make Up My Life era uma ideia com uma década de idade que ele só conseguiu concluir durante os trabalhos para So Happy it Hurts. 

 

Faz-me todo o sentido que os primeiros rascunhos desta canção tenham sido criados há dez anos – foi quando as filhas dele nasceram. Acredito que These Are the Moments that Make Up My Life tenha sido uma lição que Bryan aprendeu na última década. 

 

Como adulto (e mesmo antes), ele nunca teve uma vida “normal”. Em entrevistas recentes, Bryan admite que não se recorda de grande parte dos anos 90, tirando fotografias, porque estava sempre a trabalhar. Fazia duzentos concertos por ano, chegou a estar quatro anos seguidos em digressão. 

 

Vou agora falar de coisas que li em entrevistas antigas a Bryan algures entre 2008 e 2010. Agora não consigo encontrá-las e linká-las aqui, pois foi há mais de dez anos. Assim, não tomem o que vou referir a seguir como verdade absoluta. Segundo o que me recordo, Bryan confessou que, quando começou a haver uma epidemia de divórcios na sua equipa nos anos 90, percebeu que estava a exagerar. Entrando em território de fofocas, uma ex-namorada de Bryan terá dito que a relação não resultou porque a carreira dele tinha prioridade sobre tudo. 

 

Não creio que Bryan se arrependa da maneira como passou os anos 90. Afinal de contas, foi o que o colocou onde está hoje. Mas a partir dos anos 2000 terá começado a moderar-se – indo em digressão apenas dez a catorze dias por mês. E depois dos cinquenta anos, depois de já ter atingido o pico, assentou com uma companheira (esposa?) vinte anos mais nova e teve duas filhas. (Inveja eu, por ele ser homem e capaz de se reproduzir depois dos cinquenta anos? Não! Que ideia…) Aí, terá aprendido o valor de uma existência mais tradicional. Daí These Are the Moments that Make Up My Life. (“I’ve taken some wrong roads, but I know this one's right”)

 

É claro que isto sou apenas eu a especular. 

 

 

Gosto imenso do videoclipe desta música. Nesta era os vídeos de Bryan têm sido todos muito simples e este não é exceção. É apenas Bryan numa praia qualquer no Canadá, atirando paus ao cão do irmão. Este vídeo parece ter sido feito de propósito para mim. Como tenho referido várias vezes aqui no blogue, um dos meus lugares felizes nos últimos anos, um dos meus sítios perfeitos, é a Meia Praia de Lagos, passeando a pé com a minha Jane. A diferença é que ela prefere bolas em vez de paus. 

 

O que condiz na perfeição com o tema da música. 

 

These Are the Moments that Make Up My Life é, assim, a minha canção preferida de Bryan nos últimos anos – desde Brand New Day, pelo menos, ou talvez antes. Tenho alguma pena de os concertos de janeiro se terem realizado antes da edição do álbum – queria que ele tivesse tocado esta. 

 

So Happy it Hurts não foi a única coisa que Bryan lançou este ano. Longe disso, o homem lançou-me quatro álbuns inteiros em 2022! 

 

Já referi aqui no blogue que, há uns anos, Bryan compôs a banda sonora do musical Pretty Woman da Broadway, baseado no filme de Richard Gere e Julia Roberts. Durante a pandemia, em parte por aborrecimento, em parte por precisar de lançar música (mais sobre isso já a seguir), Bryan gravou a sua própria versão dos temas do musical e lançou-os em álbum.

 

Não tenho muito a dizer sobre estas músicas. São uma audição agradável, dentro do estilo de Bryan – ele foi um bom casting para um conto de fadas do mundo moderno. Diria que a minha preferida é On a Night Like Tonight – em parte porque emparelha com a On A Day Like Today, outra de que sempre gostei. Por outro lado, gosto imenso de Something About Her – clássico Bryan.

 

 

Falemos agora sobre as regravações que Bryan lançou de algumas músicas suas – as versões Clássicas. Basicamente, Bryan mudou de editora há um par de anos e a editora antiga terá ficado com os direitos da sua looooonga discografia. Assim, Bryan resolveu dar uma de Taylor Swift e regravou os seus maiores êxitos. Estes foram lançados em duas tranches – Classic e Classic Part II.

 

Antes de mais nada… isto não devia ser permitido. Seria de esperar que os autores de uma propriedade intelectual tivessem sempre direitos sobre o seu trabalho. Estas músicas só existem por causa do trabalho de Bryan e dos seus colaboradores. É triste que isto tenha acontecido a Bryan ao fim de mais de quatro décadas de carreira.

 

Dito isto… não percebo o que Bryan quer fazer ao certo ou o que ele quer que nós façamos. Estamos a falar de quarenta anos de música: catorze álbuns de estúdio, incluindo a banda sonora de um filme, uns quantos Best Of’s, múltiplos discos ao vivo. Mesmo que ele quisesse regravar toda a sua discografia – aquela que pudesse – provavelmente não faria mais nada com a sua carreira.

 

Nesse aspeto, faz sentido que Bryan tenha começado pelos seus êxitos. Talvez ele até queira ficar por aí. Por outro lado, ele não o fez com a pompa e circunstância com que Taylor Swift tem re-lançado os seus álbuns. Muitos fãs casuais poderão nem sequer ter reparado. E, tanto quanto sei (posso estar enganada), as rádios não receberam o recado e não estão a substituir as versões antigas pelas novas. Eu até estou disposta a abdicar das versões antigas, pelo menos em termos de música digital e pelo menos em termos de versões de estúdio (versões como as do Bare Bones e do MTV Unplugged são um caso à parte). Com um par de exceções de que falarei já a seguir. Mas não sei se todos os fãs estarão dispostos a fazer o mesmo.

 

Uma diferença entre os casos de Taylor Swift e Bryan é, aparentemente, o caso do segundo não ser pessoal. Sublinhe-se o “aparentemente”. Com Taylor, o tipo que ficou com os direitos da música dela foi alguém que conspirara contra ela (mais detalhes aqui). Tendo isto em conta, os fãs e o público em geral têm aderido às regravações de boa vontade – tarefa facilitada pela maneira como ela relançou Fearless e Red, este último em particular. Com Bryan não existe nenhum drama deste género, que se saiba. Não existe o mesmo imperativo moral para cortarmos com as versões antigas.

 

Pelo menos é isso que digo a mim mesma.

 

 

Além disso, se Taylor consegue recriar canções antigas com bastante fidelidade, para Bryan isso é quase impossível. Para começar, as músicas mais antigas de Taylor têm dezasseis anos – as de Bryan têm mais de quarenta. Não sei muito do assunto, mas assumo que as tecnologias de captação de áudio e produção musical tenham evoluído significativamente desde os anos 80.

 

Em segundo lugar, a voz de Bryan mudou. Os seus vocais nos dois primeiros álbuns são quase irreconhecíveis comparada com os dias de hoje, sem o seu icónico timbre rouco. Este começou a aparecer em Cuts Like a Knife e foi-se desenvolvendo nos álbuns seguintes até estabilizar, mais ou menos, em Waking Up the Neighbours, em 1991. Ele nunca poderia recriar os vocais das versões dos anos 80 de Summer of 69’, Heaven ou Cuts Like a Knife em 2022.

 

Talvez por isso Bryan não se tenha preocupado demasiado com a fidelidade. Ainda assim, as novas versões são bastante fiéis às antigas, com algumas exceções. Uma diferença marcante, que Bryan tem assinalado, é o facto de as músicas agora terem finais em vez de fade outs. Não tenho nada contra fade outs em música por princípio, mas sempre calculei que fossem complicadas de tocar ao vivo. Não me choca que Bryan tenha querido corrigi-lo.

 

Fiquei contente por Bryan ter regravado Hidin’ From Love e Teacher Teacher – duas canções que precisavam. Ainda este ano falámos sobre a primeira – ele já tinha publicado uma versão de Hidin’ From Love com este novo instrumental. E se há álbum que merecia uma regravação é o primeiro de Bryan.

 

Por seu lado, já tinha escrito aqui no blogue, a propósito dos 30 anos de Reckless, que o demo de Teacher Teacher tinha algumas arestas por limar, apesar de gostar da canção. Bryan fez exatamente o que eu queria.

 

 

Não desgosto desta versão de Back to You. Esta foi sempre uma das minhas canções preferidas dele – foi a primeira música “a sério” que aprendi a tocar na guitarra. Antes de Classic, Back to You não tinha nenhuma versão de estúdio – foi um original do álbum MTV Unplugged. Fica um amargo de boca por a versão Clássica não ter a orquestra da Julliard. 

 

Na verdade, a única regravação em que me quero focar é a de Here I Am – a minha canção preferida de todos os tempos, como poderão ler aqui.

 

Esta era outra em que Bryan muito dificilmente poderia fazer copy/paste. Como vimos antes, foram os produtores da banda sonora do filme Spirit a dar um estilo mais R & B à versão original de Here I Am. No entanto, eles não estavam lá para as regravações.

 

A versão Clássica não difere radicalmente da versão de 2002 mas, de todas as regravações, será a mais diferente. Penso que esta é mais parecida com o que Bryan teria criado com os seus colaboradores habituais. A instrumentação é mais “orgânica”, mais rock. Os sintetizadores e produção eletrónica foram substituídos pelo piano e bateria.

 

Por outro lado, aplaudo o facto de Bryan ter resistido à tentação de encurtar a duração da música. 

 

Here I Am, de resto, é daquelas canções que soa bem em praticamente qualquer arranjo. Ainda assim, de todos os temas regravados, este será o único em que me recuso a abdicar da versão original. Estou demasiado afeiçoada a ela. Aos backvocals na parte final (nos créditos diz que é Bryan a cantar, mas não me parece que seja ele), às batidas – sobretudo por causa da minha velhinha montagem de vídeos da Seleção.

 

 

Aliás, se eu tivesse tempo e software, faria uma montagem de vídeos para a versão Clássica – incluindo imagens de, entre outras coisas, o Euro 2016 e a Liga das Nações de 2019

 

A grande vantagem de regravações como estas é que os temas ganham uma nova vida anos – ou décadas – depois de as ouvirmos pela primeira vez. Here I Am completou vinte primaveras este ano, é a minha preferida de sempre. E no entanto, duas décadas depois, continua a surpreender-me. 

 

Nem tudo tem a ver com esta regravação, sequer. No início deste ano descobri Me Voilà, a versão francesa da música. E agora, há um par de semanas, descobri um cover feminino lindíssimo de Me Voilà: uma instrumentação bastante diferente, folk, mas que resulta.

 

E é tudo o que tinha para dizer. Que Bryan esteja a ter um dia muito feliz. Agradeço-lhe por tudo o que a sua música tem feito por mim. Não sei ao certo o que ele fará nos próximos tempos – estou curiosa. Em todo o caso, como acho que já o referi antes, enquanto ele cá estiver, eu estarei lá, dentro das minhas possibilidades. E, como já disse antes, não haverá nenhum outro sítio na Terra onde preferiria estar.

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