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Álbum de Testamentos

"Como é possível alguém ter tanta palavra?" – Ivo dos Hybrid Theory PT

Músicas Não Tão Ao Calhas – Tell Me It's Over

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Avril Lavigne lançou, no ano passado 12 de dezembro, a música Tell Me It’s Over, que serve de segundo avanço ao seu sexto álbum – que se chamará Head Above Water, tal como o primeiro single, e será lançado a 15 de fevereiro.

 

"Oh, you come and you leave
Shame on me for believing every word out of your mouth"

 

Se a faixa Head Above Water não representou uma grande inovação no que toca à Avril, pelo menos em termos musicais, Tell Me It’s Over é outra história. Esta é uma música soul com elementos de jazz, uma faixa que parece saída do século passado (anos 50 ou assim), com saxofones à mistura com piano e violinos. Faz lembrar o tema Love on the Brain, da Rihanna – uma música bastante boa mas, na minha nada enviesada opinião, Tell Me It’s Over é melhor.

 

Acho que ninguém estava à espera desta – o mais próximo que Avril tinha estado deste estilo foi com o cover de How You Remind Me. Julgo ter referido há uns anos que esperava ouvir mais músicas dela nesse género. Mas daí a ouvir a voz da Avril num coro de soul vai um pedaço.

 

Julgo que a Avril referiu uma ou outra vez, em entrevistas, que gostava de ouvir jazz nas horas vagas. Em declarações mais recentes, a propósito deste lançamento, referiu mesmo que se inspirou em nomes como Aretha Franklin, Billie Holiday, Ella Fitzgerald e Etta James, em parte por serem ícones feministas (mais sobre isso adiante).

 

 

De qualquer forma, gosto muito do resultado final.

 

Começando pela interpretação. Esta música pode ter sido território novo para a Avril mas, baseando-se no seu desempenho vocal, não se nota nada. Quando saiu uma prévia da faixa, com os seis primeiros segundos, eu contava com vocais graves, estilo Give You What You Like.  Em vez disso, Avril alterna sem dificuldade entre agudos e graves, dá voz aos coros, como se tivesse passado os seus (*faz contas de cabeça*) quase dezassete anos de carreira cantando neste estilo.

 

Tanto Head Above Water como Tell Me It’s Over mostram que a voz da Avril nunca esteve em melhor forma – ótimas indicações para o álbum novo.

 

A letra de Tell Me It’s Over, não sendo nada do outro mundo, é melhor que a de Head Above Water – mais fluida e consistente, sem partes que parecem só lá estar para a rima ou para preencher buracos. No que toca à Avril, está acima da média em termos de qualidade.

 

Esta é mais uma canção entre várias na discografia da Avril sobre relações falhadas. Tell Me It’s Over fala sobre uma relação tóxica, sem futuro, mas em que o homem insiste em permanecer na vida da narradora. Não é capaz de dar-lhe o que ela quer, ou de tratá-la como deve ser, mas consegue manipulá-la demasiadas vezes. Na terceira parte da canção, a narradora está determinada a cortar com ele de vez e para sempre.

 

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É curioso que Avril tenha escrito esta letra nesta altura do campeonato. Ela sempre deu a impressão de ser bastante exigente em termos românticos – músicas como He Wasn’t e The Best Damn Thing deixam-no bem claro. Se olhássemos para essas duas faixas, nunca imaginaríamos a narradora delas (assumindo que é a mesma narradora nas três músicas), presa numa relação tóxica – antes, não aceitava um homem que não lhe abrisse as portas, mas agora não consegue largar um que, no videoclipe, lhe destrói o telemóvel?

 

Só prova que , por vezes, somos os nossos piores conselheiros.

 

Como podem ver, estou bastante satisfeita com Tell Me It’s Over. A única falha que tenho a apontar é à percussão – a batida soa um bocado artificial. Não havia necessidade, podiam ter gravado uma bateria a sério.

 

É apenas um pormenor, não afeta a qualidade da música, na minha opinião. Só reparei nisso porque uma pessoa o referiu no Twitter – se não o tivesse lido, ter-me-ia passado ao lado.

 

Não digo que Tell Me It’s Over esteja já entre as minhas músicas preferidas, mas é um passo na direção certa. O álbum homónimo jogou muito pelo seguro, tirando uma ou outra exeção. Tanto esse como o Goodbye Lullaby pareceram seguir um critério comercial na escolha dos singles – o quarto álbum, por exemplo, era cerca de oitenta por cento, mais coisa menos coisa, baladas e/ou música maioritariamente acústica, mas só uma dessas faixas se tornou single.

 

Não que tenha dado grande resultado.

 

Desta feita, foram lançadas duas baladas como singles – pela primeira vez em toda a carreira da Avril. A única exceção poderá ser Nobody’s Home depois de My Happy Ending, para o Under My Skin, mas não considero My Happy Ending uma balada.

 

Calculo que ela tenha mais controlo sobre a sua carreira e estratégias de marketing, depois de se ter mudado de gravadora. Faz bem. Se é para ser flop, que o seja com liberdade criativa, segundo os termos da Avril!

 

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Como disse antes, o álbum chamar-se-á Head Above Water, tal como o primeiro single. É um bom nome para este álbum, tendo em conta as circunstâncias e tudo o que a Avril revelou, quando lançou o single. Só acho estranho que ela não tenha revelado na altura que o álbum teria o mesmo nome (talvez só o tenha decidido depois).

 

O nome, data de lançamento, capa e tracklist foram revelados oficialmente no passado dia de 7 de dezembro – exatamente oito anos após o mesmo ter acontecido com o Goodbye Lullaby (mais um argumento para a minha previsão de que Head Above Water será uma versão melhorada de Goodbye Lullaby).

 

A capa não é das mais populares entre os fãs. Eu mesma não gostei muito à primeira – não pela nudez, mais por a achar demasiado escura. É, aliás, a segunda capa de seguida em preto. Eu sei que é a cor preferida da Avril, mas acho que ficava um pouco melhor a cores, com o fundo em azul.

 

Além de que aquele braço é um fail de Photoshop. Espero que corrijam antes do lançamento do álbum. Duvido que o façam, no entanto, já que a capa tem sido publicada em vários sítios sem alterações desde essa altura.

 

Agora que já se passaram alguns dias, já gosto um pouco mais da capa. Continuo a achar que a capa do álbum homónimo é pior.

 

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Na verdade, acho a tracklist muito mais interessante – com títulos como Love Me Insane e Bigger Wow. Além de que tem piada haver uma música chamada I Fell In Love With the Devil, num álbum cuja faixa-título é essencialmente uma oração.

 

Dumb Blonde é, segundo Avril, a música mais agitada, mas parecida com os seus típicos singles pop rock. Segundo um texto que vazou por umas horas há um par de meses, Dumb Blonde será uma música contra estereótipos misóginos como, lá está, “a loira burra”.

 

Quase quinze anos após Don’t Tell Me, Avril vai finalmente lançar outra música feminista. Ainda bem!

 

Por sua vez, Warrior é um título que conhecemos há quase dois anos. Pelos vistos, foi escolhida para encerrar o álbum. Baseando-me nisto, acho que Warrior funcionará como um epílogo à história contada em Head Above Water. Avril refletirá sobre tudo por que passou, concluindo que é uma guerreira, que sobreviverá e sairá mais forte desta luta.

 

Ficamos à espera, então. Talvez saia mais um single antes mas, se não sair, não me importo. Pode haver quem não tenha gostado de ter de esperar três meses por Tell Me It’s Over, depois de Head Above Water. Eu, no entanto, acho-o preferível a levar com metade de um álbum antes do lançamento oficial.

 

Só espero que o resto do álbum esteja ao nível dos primeiros dois singles, sobretudo de Tell Me It’s Over.

 

Antes, tenho planeado um texto de Músicas Ao Calhas centrando-se em duas músicas, uma delas da Avril. Mesmo que não hajam mais entradas de Músicas Não Tão Ao Calhas antes do lançamento de Head Above Water, preparem-se para uma dose saudável de Avril Lavigne neste blogue.

 

Entretanto, ando já a trabalhar no habitual texto de fim de ano. Este deverá ser um pouco mais curto que o do ano passado – ainda não sei se vou sequer dividi-lo em duas partes. De qualquer forma, já comecei a escrever o primeiro rascunho. Espero conseguir publicá-lo a tempo.

 

Obrigada pela sua visita, como sempre.

20 de 50 perguntas

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Eis-me aqui respondendo ao desafio das 50 perguntas, após ter sido nomeada pela Bruxa Mimi. Para tags como esta, estou sempre aberta – se não se importarem com eventuais demoras. Tecnicamente, ainda só fui nomeada para as primeiras vinte perguntas, logo, será a essas que vou responder.

 

Começando com…

 

1)O que mais odeias em ti?

 

Odiar odiar, não sei se existe algo em mim que odeie. Neste momento, gostava de ser menos insegura. Já fui muito pior, mas quero tentar ter mais confiança em mim mesma.

 

Também ajudava ser menos cabeça no ar.

 

2) Nome pelo qual te chamam.

 

Sofia, na maior parte das ocasiões. Às vezes trocam o meu nome com o nome da minha irmã. A minha família – sobretudo os meus irmãos – chama-me Fifi quando me querem irritar (já não resulta). A minha irmã às vezes trata-me por Fia – sobretudo quando me quer pedir coisas.

 

3) Se pudesses visitar qualquer lugar no mundo, onde é que irias e porquê?

 

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Iria a Moçambique com os meus pais. Eles são retornados, nasceram lá, foram expulsos para Portugal Continental quando tinham treze ou catorze anos e nunca mais voltaram. Gostava de ir lá com eles, um dia.

 

4) O que te faz chorar?

 

De uma maneira geral, situações tristes com que empatizo demasiado. Eu sei que esta é uma resposta demasiado vaga, mas a verdade é que não consigo encontrar um padrão – tirando, talvez, histórias de maus tratos a crianças e animais.

 

5) Escolherias voltar atrás no tempo ou ganhar mais tempo no presente?

 

Escolheria ganhar mais tempo – assumindo que significa, por exemplo, que os dias tivessem mais de vinte e quatro horas. Não porque me desagradasse voltar atrás no tempo – pelo contrário, agradar-me-ia demasiado.

 

Se pudesse, viveria para sempre no passado em alturas mais felizes. Como, por exemplo, o verão de 2016: quando Portugal tinha acabado de ser Campeão Europeu; Pokémon Go tinha acabado de sair e toda a gente andava a jogar ou, pelo menos, a falar disso; íamos ter o primeiro encontro do Odaiba Memorial Day; Trump ainda não tinha sido eleito e o Chester ainda estava vivo.

 

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É óbvio que isto não é maneira de viver – conforme os Escolhidos aprenderam na peça de teatro de Digimon Adventure Tri. Por isso é que escolheria ter mais tempo no presente: para ter mais tempo para vivê-lo.

 

Ou pelo menos, de uma maneira mais prosaica, para ter mais tempo para dar conta do recado com este blogue.

 

6) Não vou morrer sem…

 

…ver a Seleção Portuguesa ganhando um título. Pode não parecer nada agora, que já aconteceu, mas houve uma altura que eu temi nunca ver um jogador com a Camisola das Quinas levantando uma Taça (embora, em retrospetiva, pelo menos no que toca a Europeus, acho que era uma questão de tempo). Hoje já posso dizer que vi – e foi uma noite fantástica.

 

7) Alguma vez inventaste uma desculpa para não saíres de casa quando tinhas uma coisa combinada?

 

Tanto quanto me lembro não. Sou introvertida por natureza. Das poucas ocasiões que faço planos com outras pessoas, regra geral, são pessoas com quem quero mesmo estar. Assim sendo, a menos que tenha uma boa razão, não desmarco.

 

8) Último lugar onde estiveste.

 

No meu café preferido, com a minha cadela, Jane.

 

9) Comida favorita

 

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Esparguete. Deem-me muito esparguete. É o meu alimento preferido desde pequena, o alimento que poderia comer todos os dias sem enjoar. Gosto de esparguete com praticamente todos os acompanhamentos possíveis – o meu prato preferido é esparguete com amêijoas – mas chega-me esparguete simples, cozinho só com sal e um fio de azeite.

 

Estão a ver as pessoas na televisão e nos filmes, que comem um balde de gelado quando estão em baixo? Eu prefiro comer uma panela inteira de esparguete (isso ainda não aconteceu, mas talvez um dia…)

 

10) Comida que não comes

 

Existem vários alimentos que não aprecio muito (leguminosas, brócolos, coisas demasiado doces ou gordurosas, a maior parte do peixe frito), mas se tiver de comer, como. A única coisa que não como de forma alguma é couves de Bruxelas. Não, não e não.

 

11) Vivo perdendo…

 

Vou responder o mesmo que a Mimi: tempo. Infelizmente, tenho o defeito da procrastinação. Mesmo tendo menos tempo que antes para coisas como estes blogues, ainda desperdiço demasiado tempo em coisas como o Facebook, o Twitter, o Quora, o YouTube e as reposições da Anatomia de Grey.

 

12) Uma frase

 

 

It’s not about deserve, it’s about what you believe”

Wonder Woman

 

Acho que nunca escrevi sobre isso aqui no blogue, mas o filme da Wonder Woman, no ano passado, ainda que imperfeito, marcou-me imenso. Esta citação, primeiro de Steve Trevor e repetida por Diana, é cada vez mais relevante nos dias de hoje – em que, conforme referi há bem pouco tempo, o mundo e a Humanidade parecem cada vez piores.

 

Conforme já escrevi várias vezes neste blogue, uma pessoa fica tentada a ceder ao cinismo e à apatia. Tentamos contrariá-lo, tentamos manter a esperança e algum idealismo, por nós mesmos. Não porque os demais o mereçam, não porque esperamos ser recompensados ou mesmo que alguma coisa mude, mas porque queremos ser assim. Porque é nisso que acreditamos.

 

Eu tento, pelo menos.

 

13) Último concerto a que foste.

 

Ao da Shakira, em julho passado. Conforme já tinha explicado antes, a Shakira pode não ser uma das minhas cantoras preferidas, mas sempre a respeitei e tenho acompanhado a carreira dela de forma casual.

 

Não achei grande piada aos singles do álbum El Dorado – não sou grande fã de reggaeton e, ainda assim, acho que a Shakira é a melhor nesse estilo. Veja-se La Tortura e Hips Don’t Lie. Por outro lado, no início deste ano, depois de me oferecerem os bilhetes, andei a explorar a discografia dela e encontrei algumas pérolas. Várias músicas do álbum Sale el Sol (a faixa-título, Antes de las Seis, Mariposas), o dueto Mi Verdad com Maná e Ciega Sordomuda. Esta última, aliás, foi uma das que mais toquei no Spotify este ano (mais sobre isso noutra ocasião).

 

Fiquei um bocadinho chateada por ela não a ter tocado.

 

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Diverti-me imenso no concerto. Mesmo não conhecendo e/ou não adorando todas as músicas da setlist, fartei-me de dançar. Se tivesse hipótese de ir a três concertos da Shakira por semana ficava logo em forma.

 

Não sei qual será o meu próximo concerto, ainda. Os Within Temptation vêm cá no próximo ano, mas vêm à Concentração Internacional de Motos de Faro. Tenho de arranjar uma mota para ir?

 

14) Música do momento

 

Neste momento? Uma que ainda não saiu. Tell Me It’s Over, o segundo single do sexto álbum da Avril Lavigne, Head Above Water (sim, o nome do primeiro single é o mesmo que o do álbum). Mais sobre isso na próxima entrada de Músicas Não Tão Ao Calhas.

 

15) Última mensagem no WhatsApp

 

O meu irmão escrevendo “Estou à duas horas a passar a ferro” e eu corrigindo-lhe “Escreve-se ‘Estou HÁ duas horas’”

 

Grammar Nazi sofre…

 

16) O que mais te stressa

 

Esta é semelhante à pergunta do que me faz chorar: não sei, depende. Tirando, talvez, jogos importantes da Seleção Nacional, não tenho nenhuma resposta tirando coisas universais: ter tempo a menos e tarefas a mais; ter demasiadas coisas acontecendo ao mesmo tempo; não ter controlo; estar atrasada; perder coisas importantes; dias difíceis no trabalho…

 

Que vou responder mais?

 

17) Tira uma selfie e mostra

 

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Tirei esta há uns meses.

 

18) Uma música com a palavra Amor

 

Vou escolher o tema What Is Love, de Haddaway – a minha música preferida para dançar, neste momento. Lanço o desafio, aliás: ponham-na a tocar e tentem ficar quietos. Eu não consigo – começo logo a abanar o capacete, como o Jim Carrey.

 

Segundo o próprio Haddaway, estão sempre a perguntar-lhe, lá está, o que é o amor. Ele responde que cada pessoa tem a sua definição. Eu concordo, com uma exceção: comportamentos abusivos não são amor. Tirando esse caso, não existe um significado único, universal. Cada um tem a sua resposta.

 

19) O que é feio mas tu achas bonito?

 

Estou como a Mimi: bonito ou feio é uma opinião. Se acho uma coisa bonita, não vou dizer que é feia.

 

20) Mostra a última foto do teu Instagram.

 

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A Jane é rainha e senhora do meu Instagram.

 

 

Eu acho que já quase toda a gente na blogosfera já respondeu a este desafio. Assim, não nomeio ninguém em específico. Quem quiser, responda e deixe o link com as respostas nos comentários. Quando fizer a segunda parte do desafio, incluo esses links na publicação.

 

Fico à espera que a Mimi responda às outras perguntas. Até à próxima!

Mike Shinoda – Post Traumatic (2018)

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Mike Shinoda lançou, no passado dia 15 de junho, Post Traumatic, o seu primeiro álbum em nome próprio – apesar de já habitar no mundo da música há cerca de vinte anos, sobretudo como cérebro dos Linkin Park, mas também com o seu side-project, Fort Minor.

 

O projeto Post Traumatic, aliás, começou com um EP de três músicas, lançado no início do ano – já falámos sobre ele antes, bem como sobre um par de músicas que Mike lançou uns meses depois.

 

Na verdade, à data do lançamento oficial, quase metade do álbum estava cá fora. Penso que já referi aqui que não gosto muito dessa moda: quando vamos ouvir o álbum pela primeira vez as músicas que já conhecemos antes ensombram as que não conhecemos. Demora imenso tempo até estarem todas em pé de igualdade.

 

Foi, em parte, por isso que depois de About You me esforcei por não ouvir nada até ao lançamento oficial do álbum. Mike, no entanto, explicou que a ideia era ir partilhando as músicas connosco em tempo real, dentro do possível, documentando o seu estado de espírito na altura.

 

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Post Traumatic é isso, aliás: um diário musical de Mike, nos primeiros nove meses, mais coisa menos coisa, após a morte de Chester Bennigton. A tracklist está ordenada de modo mais ou menos cronológico. E de facto nota-se uma evolução ao longo do álbum, começando com um tom sombrio (raiva, desesperança, frustração e, sobretudo, luto) e terminando num tom… não diria luminoso, mas bem menos pesado, com alguma esperança, até.

 

Não que seja uma progressão linear. Mesmo depois de um ponto de viragem algures entre Promises I Can’t Keep e Crossing A Line, há ocasiões em que Mike parece regredir, em que a uma música mais leve se segue uma mais sombria. O contraste mais ostensivo, na minha opinião, é Hold It Together (uma das mais pesadas de todo o álbum) a seguir a Crossing a Line. Outro exemplo é Ghosts vir antes de Make It Up as I Go – que, por sinal, começa com a frase “I keep on running backwards”. O próprio Mike já comentou, em diversas ocasiões, que o todo este processo não lhe tem sido linear, que as fases do luto – negação, raiva, negociação, depressão, aceitação – não ocorrem necessariamente por esta ordem. Cada pessoa tem a sua progressão.

 

Eu argumentaria que o tema principal de Post Traumatic é precisamente controlo. Não apenas sobre as emoções da perda, mais até sobre as consequências dessa perda.

 

Conforme tínhamos comentado antes, Mike não perdeu apenas uma das pessoas mais importantes da sua vida, ele essencialmente perdeu o seu emprego, o seu modo de vida, parte da sua identidade. Perdeu os Linkin Park. O futuro da banda tem sido amplamente discutido ao longo do último ano, ano e meio (se pode ou deve continuar sem Chester, se devem arranjar um novo vocalista, etc), mas lá está: não se sabe. Ninguém sabe. Depois de quase duas décadas de Linkin Park, da noite para o dia a vida profissional de Mike, tal como a conhecia, esfumou-se, deixando-o sem saber o que fazer.

 

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A frase “only my life’s work hanging in the fucking balance”, de Over Again, parece ser a ideia principal de Post Traumatic, o denominador comum à maioria das faixas. O álbum documenta a busca de Mike por controlo sobre o seu destino, a procura de, como o próprio têm referido, “um novo normal”.

 

Já escrevi antes sobre as primeiras quatro faixas do álbum. As minhas opiniões não mudaram radicalmente desde essa altura. No entanto, gosto um bocadinho mais de Watching As I Fall e Nothing Makes Sense. A primeira faz mais sentido no contexto do álbum – falaremos melhor sobre isso mais à frente – e ganhei apreço às guitarras elétricas, bem à Linkin Park, depois dos últimos refrões.

 

Também Nothing Makes Sense Anymore faz mais sentido (no pun intended) no contexto do álbum. Os efeitos na voz do Mike não me incomodam tanto e compreendo um bocadinho melhor a letra, as metáforas. A pintura que levou com tinta entornada quando estava quase pronta. Mike num penhasco sobre o mar, julgando-se protegido do tumulto das ondas, até o chão abater-se sobre os seus pés, atirando-o para a tempestade. Mike debatendo-se no escuro, à procura de uma luz. Gosto particularmente dos versos “I’m a calll without an answer, I’m a shadow in the dark, trying to pull it back together, as I watch it fall apart”.

 

Passou-se isso com a maior parte das músicas em Post Traumatic: precisei de tempo, de ouvir várias vezes, para aprender a apreciá-las. Isso, ou estou numa altura em que só consigo ouvir música com ouvidos de ouvir sob a forma de CDs no meu carro.

 

 

Quando About You foi lançada, por exemplo, não achei nada de especial – mais uma vez, não era fã dos efeitos na voz de Mike. No entanto, uma vez mais com o tempo deixei-me de ralar com isso, sobretudo no contexto do álbum.

 

O tema principal da canção é o facto de toda a gente assumir que toda e qualquer música criada pós Jullho de 2017 será sobre Chester. Não que não seja compreensível: foi um acontecimento de grande impacto na vida pessoal dele e toda a gente soube. Um pouco à semelhança do que acontece, por exemplo, com as músicas da Taylor Swift, em que toda a gente tenta descobrir sobre qual nos ex-namorados ela canta.

 

No entanto, uma coisa são ex-namorados, outra coisa muito diferente é um homem que morreu demasiado cedo e de uma forma horrível. Tendo em conta que Mike sente dificuldade em manter o luto sob controlo (e havemos de voltar a falar sobre esse aspeto), não lhe será fácil ouvir toda a gente perguntando-lhe coisas como:

 

– E neste verso, em que falas de beijar o céu? És tu a tentares ir ter com o Chester ao Além?

 

Talvez isto tenha sido um fator pesando contra a decisão de lançar música a solo – saber que não poderia fugir a estas perguntas, que mesmo que compusesse sobre outros temas, as pessoas iriam sempre ligá-lo a Chester. Aliás, em About You, Mike parece não querer dar esse passo. Em parte pelos motivos que acabámos de discutir, em parte porque já passara metade da sua vida fazendo música. Talvez já não tivesse nada sobre que cantar.

 

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É um medo que todas as pessoas criativas têm de vez em quando: que um dia a fonte seque e já não tenham nada para criar. Mike chega mesmo a pôr a hipótese de aproveitar a desculpa e zarpar.

 

Ainda bem que não o fez.

 

Em About You, temos a participação de blackbear. Segundo Mike, os versos que ele interpreta foram inspirados na experiência que ele teve com os Linkin Park (ele colaborou com Mike na composição de Sorry For Now, no álbum One More Light). Os versos são abstratos de propósito, a ideia é cada ouvinte fazer a sua interpretação.

 

A meu ver, estes versos refletem sobre o processo de cantar sobre, lá está, alguém que morreu. O narrador (o próprio blackbear?) parece achar que é apenas uma cura rápida, nada que funcione a longo prazo (“Find something that works fits the symmetry, for only a quick broken remedy”). Ao mesmo tempo, também fala da falta de controlo sobre o processo de luto, tal como referimos antes.

 

 

A faixa que se segue, Brooding, é um tema instrumental. O termo “brooding” não tem tradução literal em português – significa algo como amuar, sem a conotação condescendente.

 

É um bocadinho complicado tentar interpretar o significado de uma peça instrumental, mas vou tentar... Brooding começa, de facto, de forma melancólica, ganhando ritmo depois do primeiro minuto – talvez simbolizando emoções em conflito, talvez representando uma tomada de decisão. Não sei. Signifique o que significar, faz uma boa transição entre About You e Promises I Can’t Keep.

 

Em termos musicais, esta última tem um estilo parecido ao do álbum Living Things. É o que acontece com muitas músicas neste álbum: adotam um estilo híbrido entre rock e eletrónico, semelhante ao dos álbuns A Thousand Suns e Living Things. Promises I can’t Keep tem ainda alguns elementos que me recordam Leave Out All the Rest. Em todo o caso, é um estilo de que gosto.

 

Em termos de letra, Promises I Can’t Keep pega de novo no tema da perda de controlo, parecendo até uma sequela direta a A Place to Start. Mike lamenta o fim da sua vida antiga com os Linkin Park, segura, previsível. Receia o futuro. Culpa-se a si mesmo por ter sido apanhado de surpresa, por não ter conseguido evitar o que aconteceu.

 

 

Ao mesmo tempo, no refrão, Mike parece ganhar noção que a segurança da sua vida antiga, o controlo que tinha sobre ela, eram ilusórios. Que não havia muito que ele pudesse ter feito. Assim, Mike procura habituar-se a isso. Procura aceitar que poderá não conseguir pôr os seus planos em prática e, lá está, cumprir as suas promessas.

 

Penso que é aqui que se dá o switch, que quando Mike se conforma com a instabilidade, quando aceita que a sua vida nunca mais será a mesma, que fica em condições de dar o próximo passo.

 

O que nos leva a Crossing A Line.

 

Tal como já tínhamos visto antes, esta faixa também pega no tema da falta de controlo, da incerteza, mas sob um ponto de vista mais esperançoso. Mike continua a sentir-se impotente perante o desconhecido, mas ao menos sabe o que quer fazer e acredita em si mesmo.

 

Crossing A Line continua a ser uma das minhas preferidas. Após uma primeira parte bastante sombria, o seu tom luminoso é agradável.

 

 

Avançando um pouco na tracklist, aliás, encontramos Make it Up As I Go, que me soa a uma versão sombria de Crossing A Line. Em ambas as canções, Mike mostra-se decidido a seguir em frente, a construir uma nova vida, a encontrar “um novo normal”. A diferença está na motivação. Em Crossing A Line, Mike é motivado por esperança. Em Make it Up As I Go, Mike é motivado por resignação, impaciência, mesmo teimosia, diria eu.

 

Mike queixa-se, mais uma vez, que o caminho para a recuperação não é linear, que de vez em quando dá passos para trás. Admite mesmo que ainda não está bem, que ainda tem dúvidas, que de vez em quando perde a esperança.

 

No entanto, Mike não quer de todo ficar parado e ceder ao desespero. Sabe que ninguém pode ajudá-lo, que tem de ser ele mesmo a desenrascar-se. Quer seguir em frente, mesmo que não saiba para onde vai, mesmo que tenha de se venturar no desconhecido. Mesmo que tenha, como reza o título da canção, de ir improvisando, de ir inventando pelo caminho.

 

É uma letra que acho muito interessante e algo estranha, mesmo. No que toca a músicas sobre seguir em frente, estou habituada a temas luminosos e letras esperançosas – Last Hope, dos Paramore, Keep Holding On, da Avril Lavigne, Million Reasons, da Lady Gaga, Crossing a Line neste mesmo álbum. Não estava habituada a uma música ao mesmo tempo sombria e motivadora. Mas acredito que existam pessoas que se identifiquem mais com este estilo do que com músicas como as que referi acima.

 

 

K.Flay é quem canta o refrão de Make it Up As I Go. Julgo que esta é a primeira vez que ouvimos a voz de Mike ao lado de uma voz feminina. Não sou grande fã da voz de K., soa-me demasiado artificial. Em Make it Up as I Go até encaixa bem, mas não sei se ia gostar de ouvir uma música cantada a solo por ela.

 

Voltando um bocadinho atrás na tracklist, a Crossing a Line, uma das músicas mais esperançosas de todo o álbum, segue-se uma das mais deprimentes. Holding It Together mostra as piores partes do processo de luto: os esforços que Mike ia fazendo para não ir abaixo, as noites mal dormidas, a sua esposa, Anna Shinoda, sofrendo com ele.

 

A música fala especificamente de um episódio verídico, em que alguém terá falado a Mike acerca de Chester, durante uma festa de anos de uma criança- Mike não gostou e terá respondido com uma piada que não caiu bem.

 

Estou certa que o tal sujeito, ou sujeita, não terá falado com más intenções. Eu própria, se calhar, também meteria o pé na poça. Mas, lá está, Mike estava com dificuldades em manter as emoções do luto sob controlo. Talvez pensasse que a festa de anos do miúdo ajudá-lo-ia a espairecer. Até vir esta pessoa estragar tudo.

 

 

Há pessoas que dão tempo a Mike para recuperar, que o aconselham a não ter pressas. Um bom conselho, só que Mike sente o tempo a passar, deixando-o para trás. Como diria Ellis Grey, o carrossel não pára de girar. Não dá para carregar no botão de pausa, não dá para andar para trás, não dá para sair dele.

 

Não que Mike não o tenha tentado, como vemos em Lift Off.

 

Esta é uma faixa interessante. Tem uma sonoridade inesperadamente etérea, fazendo pensar em voos noturnos e céus estrelados. A interpretação do refrão – por Chino Moreno, dos Deftones – também contribui para esse efeito. As estâncias, cantadas em rap, casam estranhamente bem com o acompanhamento atmosférico.

 

A parte musical condiz com a letra da canção. Mike terá composto Lift Off baseando-se na necessidade que sentiu, em diferentes alturas desde que Chester morreu, de fugir da tudo. De, lá está, tentar carregar no botão de pausa e sair do carrossel.

 

 

A expressão “Lift Off”, “descolagem” será, então, uma metáfora para este escapismo: levantando voo em direção ao espaço, longe de tudo, fugindo para um plano superior, etéreo. Para sítios perfeitos, como se calhar diria Lorde.

 

As estâncias também usam imagens espaciais. Na primeira estância, Mike usa um bocadinho de “braggadocio” – uma espécie de arrogância vazia que quase tudo o que é rapper demonstra na sua música. Não faz muito o meu estilo, confesso, mas depois do ano que Mike teve, não me importo. Se isso o ajuda…

 

A segunda estância é interpretada por Machine Gun Kelly (só me apercebi há relativamente pouco tempo que era o tal que não se encaixava em Papercut, durante o concerto por Chester). A parte dele lembra-me um pouco Airplanes, de B.o.b e Hayley Williams no sentido em que fala de sonhos falhados.

 

Agora que penso nisso, Airplanes e Lift Off são bastante parecidas: tanto pela parte de Machine Gun Kelly, pelas temáticas aeronáuticas e espaciais e pela sonoridade algo atmosférica e sonhadora.

 

 

Ghosts é a música mais pop de todo o álbum. Segundo Mike, nesta faixa ele permitiu-se a si mesmo divertir-se. “Já tive dias difíceis que chegue”, disse mesmo. “Se acordo e me sinto bem, não devia sentir-me culpado por me divertir.”

 

Eu também acho que não. O próprio Mike afirmou, durante o concerto no Hollywood Bowl, que Chester quereria que ele, o resto da banda, os fãs, se divertissem, que não estivessem sempre em baixo. Não quando existem horas e horas de vídeos de Chester fazendo palhaçadas, no YouTube.

 

E eu confesso que, com isto tudo, a última coisa que queria era que Mike perdesse essa faceta da sua personalidade. A faceta que se ria (e Mike é daquelas pessoas que se ri com a cara toda) quando o Chester fazia uma das suas; que ficou atónita quando, durante o concerto no Hollywood Bowl, o público cantou durante o vídeo dos Unicorns and Lollipops; que ainda hoje é conhecido por #trollnoda; que faz coisas destas.

 

Em Ghosts dá, então, para ver essa faceta – sobretudo no videoclipe. Foi o próprio Mike a produzi-lo. O protagonista é uma meia-fantoche, chamada Boris, acompanhado pela sua namorada (?), Miss Oatmeal.

 

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A música em si é bem menos pesada que a maioria de Post-Traumatic, mas  não é assim tão leve como parece. Ghosts fala sobre o lado sobrenatural da vida: sonhos, dejá-vus, coisas que vislumbramos pelo canto do olho e que desaparecem quando olhamos diretamente. Depois de uma perda como a de Chester, terão vindo muitas pessoas ter com Mike, falando-lhe destes aspetos mais surrealistas da vida.

 

 No que toca a estas coisas, Mike diz ter uma mente aberta, mas que nunca teve nenhum contacto direto com o sobrenatural – tirando uma experiência com uma médium, que lhe disse onde poderia encontrar um certo objeto.

 

Eu confesso que, no que toca a estas coisas, me inclino mais para o cético. Não digo preto no branco que não existe, mas sou uma mulher de ciência: tendo a acreditar no que é palpável, no que se pode provar sem contestação. No que toca a estes fenómenos, na minha opinião, muitos deles poderão ser manifestações do subconsciente.

 

Mas, lá está, compreendo o apelo, sobretudo se estivermos a falar de entes queridos. Além de que, como diria Albus Dumbledore, só porque ocorre nas nossas cabeças, não significa que não seja real. Como li algures no Twitter, estes fenómenos serão tão reais quanto uma pessoa necessite que sejam – desde que, claro, como também diria Dumbledore, não nos percamos em fantasias e nos alheemos por completo do presente.

 

 

O que nos leva, de novo, à letra de Ghosts. Nesta, os fenómenos sobrenaturais são retratados como uma fonte de consolo, um mundo para onde Mike foge durante a noite. Não existem referências diretas a Chester em parte nenhuma desta canção, nem Mike falou dele a propósito de Ghosts, tanto quanto sei. Mas é possível que Mike interprete estas manifestações como sinais enviados pelo amigo. É possível que ele encontre algum consolo nisso, na “presença” do amigo.

 

Não me interpretem mal, isto são apenas especulações minhas. Não acredito que Mike alguma vez confirme esta minha teoria – o que é compreensível.

 

No que toca a estas coisas do sobrenatural, gosto muito mais deste lado agridoce do que da faceta assustadora. O mundo real assusta muito mais, sobretudo os seres humanos, não precisamos de inventar coisas sobrenaturais para nos assustarem. É por isso que não acho piada quase nenhuma ao Dia das Bruxas.

 

Mas estou a desviar-me.

 

I.O.U. é a faixa de que menos gosto em Post Traumatic. Não porque seja má, antes porque não faz muito o meu estilo: um tema puramente hip-hop, com muito “braggadocio”, que Mike terá composto a pensar em Fort Minor. Tenho vindo a descobrir que não gosto assim tanto desse estilo musical.

 

 

Não que não aprecie nada em I.O.U. – por exemplo, gosto imenso dos versos “Used to be the quiet kid in the sandbox, now it’s ‘hands up’ everytime that your man rocks”

 

Our man, o nosso homem. O nosso Mike. Ah ah!

 

Segundo o próprio, os amigo de Mike terão ficado descansados quando o ouviram a disparatar (a expressão que ele usou foi “talking shit”) numa música de rap. Era sinal de que ele estava a recuperar, a voltar a ser o Mike que conheciam e adoravam. Por isso é que não me queixo. Mais uma vez, se isso o fizer feliz…

 

Mas continuo a preferir rap/hip-hop temperado com outros estilos musicais, como em Post Traumatic e em quase toda a discografia dos Linkin Park.

 

 

Um exemplo disso é Running From My Shadow – uma música com a participação de grandson, com um estilo que é um denominador comum à maioria de Post Traumatic.

 

A letra fala sobre, bem, fugir da própria sombra: negração, procrastinação, empurrar problemas com a barriga, ciclos viciosos. Segundo Mike, Running From My Shadow não fala sobre uma situação específica, antes sobre uma infinidade de momentos diferentes, um padrão na sua vida.

 

Confesso que também tenho esse defeito, até certo ponto: complicando questões que poderia ter resolvido de maneira simples se as tivesse encarado como uma mulher adulta, boicotando-me a mim mesma, como reza Caught in the Middle. Já fui pior.

 

Destaco o verso de grandson, que resume bem a mensagem da canção: “Running from my shadow, now my shadow is my only friend!”. Se continuamos sempre a adiar, a adiar, um dia a batata quente explode-nos nas mãos. E não há ninguém que possamos culpar ou a quem recorrer senão a nós mesmos.

 

 

World’s on Fire tem uma sonoridade interessante. Começa minimalista e assim se mantém até ao primeiro refrão. Ganha, depois, alguns elementos eletrónicos que fazem lembrar Robot Boy.

 

Quando falámos sobre o vídeo de Nothing Makes Sense Anymore, comentámos que este parece comparar o que aconteceu à vida de Mike com os incêndios na Califórnia, no final de 2017. A letra de World’s on Fire também pega nessa metáfora – desta vez para dizer, em suma, “when the world’s on fire, all I need is you”. “

 

You” é quase de certeza a esposa de Mike, Anna Shinoda, talvez também os seus filhos. Numa altura em que, como temos assinalado várias vezes neste texto, uma parte do mundo de Mike ardeu, Anna terá sido o seu porto de abrigo, o seu consolo, quem o impediu de ir completamente abaixo. Mesmo que Mike perca tudo, só precisa dela para sobreviver.

 

E tem razão. Por muito que se fale, que se escreva, o que mais importa são as pessoas. O resto é irrelevante.

 

Por outro lado, tenho vindo a reparar que o refrão de World’s On Fire parece ter sido composto a pensar na voz de Chester – não tanto a melodia principal, mais os backvocals mais agudos. Fazem lembrar algumas canções dos Linkin Park, como por exemplo Waiting for the End ou Rebellion, em que as vozes dos dois harmonizavam, com Chester cantando as melodias mais agudas, regra geral. Não me custa imaginá-lo fazendo o mesmo nesta canção.

 

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Não sei se Mike se apercebe disto, se o seu subconsciente ainda está habituado a compôr para a voz de Chester, se esse hábito vai desaparecer com o tempo. Faz parte do processo, suponho eu.

 

Chegamos, finalmente, a Can’t Hear You Now, uma das minhas preferidas. Sendo este um álbum muito autobiográfico, com uma tracklist ordenada de forma mais ou menos cronológica, não surpreende que esta, a última faixa, seja uma das músicas mais animadoras e esperançosas. Não deixa, no entanto, de manter um certo grau de sarcasmo e melancolia.

 

Em Can’t Hear You Now, vemos um Mike mais confiante em si próprio – não com “braggadaccio”, como noutras músicas, algo mais genuíno. Admite que ainda tem dias maus, de vez em quando, que por vezes sente o controlo a fugir-lhe. No entanto, está numa fase bem melhor, no geral. Na maior parte do tempo consegue ignorar os seus demónios, as suas inseguranças, bloquear a sua influência.

 

Em Watching As I fall, Mike dizia que queria fugir precisamente a essas vozes – “Maybe I’m just falling to get somewhere they won’t”. Em Can’t Hear you Now, vemos que ele conseguiu.

 

 

Um dos motivos pelos quais gosto tanto de Can’t Hear You Now é por saber que, pelo menos no momento descrito pela canção, Mike está numa fase menos infeliz. Sinto pena quando o CD reinicia automaticamente no meu carro, regressando a A Place to Start.

 

Também gosto porque me identifico com ela. A minha vida não tem sido, nem de longe nem de perto, tão má como o 2017 de Mike, mas também sinto que estou num período melhor em relação ao ano passado. Tenho os meus dias maus, claro (demasiados), tenho as minhas neuroses, mas hoje tenho uma segurança e uma confiança em mim mesma que não tinha há anos – se é que alguma vez a tive.

 

Mas estou a desviar-me. Outra vez.

 

Alguns de vocês devem andar a perguntar por Looking for an Answer. Mike disse numa entrevista que a deixou de fora porque não se encaixava no ritmo do álbum – e eu acho que ele tem razão.

 

Não sei se Mike está a guardar Looking for an Answer para um, ainda hipotético, futuro álbum dos Linkin Park ou outro projeto qualquer. Pode ser até que ele nunca chegue a gravá-la. Talvez Mike não queira regressar ao momento em que compôs a canção (ele admitiu, em entrevista recente, que não lhe é fácil cantar músicas como A Place to Start e partes de Over Again). Talvez ele queira que seja uma faixa exclusiva do concerto por Chester.

 

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Para ser sincera, a ausência de Looking for an Answer não me incomoda. Estou bastante satisfeita com Post Traumatic tal como está.

 

A maior força deste álbum é o facto de ser tão pessoal, tão honesto – fazendo-me ignorar certos aspetos que, noutras circunstâncias, me incomodariam muito mais. Como, por exemplo, alguns efeitos na voz de Mike e o “braggadocio”. Conforme tenho referido várias vezes ao longo dos anos neste blogue, música assim tem muito mais valor.

 

É nesta parte que costumo fazer uma atualização sobre a maneira como tenho lidado com a morte do chester. Não que muitos de vocês se ralem, penso eu, mas escrever sobre isso, no texto de fim de ano e na análise às primeiras músicas de Post Traumatic, ajudou-me, na altura. Por isso, tenham paciência, vão ter de me aturar.

 

Até há cerca de mês e meio, estava mais ou menos da mesma maneira que em abril: melhor que em 2017, com altos e baixos. Momentos em que ainda não acreditava que aconteceu mesmo, vídeos antigos de bastidores que me davam – ainda dão – vontade de rir e chorar ao mesmo tempo.

 

No entanto, tive uns dias maus em finais de outubro – mais especificamente no aniversário do concerto por Chester. Estava a rever partes do vídeo no YouTube. A certa altura, cheguei à parte do discurso de Chester no último concerto que deu em vida. E fui-me abaixo.

 

 

Naquele dia tinha havido (mais) um tiroteio nos Estados Unidos – com motivações anti-semíticas. No dia seguinte, Jair Bolsonaro ganharia as eleições no Brasil. Nessa altura, eu só pensava que Chester tinha morrido menos de duas semanas depois de fazer aquele discurso – um discurso que ele fez para tentar consertar o mundo, no rescaldo do atentado em Manchester. E desde julho de 2017 só via – ou melhor, só vejo – o mundo deteriorando-se cada vez mais.

 

Onde está a justiça nisto? Quem permite que isto aconteça? Que entidade superior achou por bem tirar-nos Chester, deixando-nos a braços com um mundo cheio de energúmenos?

 

Demorei uns dias a sair desta. Uma das coisas que me salvou deste estado de espírito foram palavras de Mike. Ele tem andado em digressão para promover Post Traumatic. Não passou por Portugal e, infelizmente, tão cedo não deverá fazê-lo.

 

Tenho, mesmo assim, evitado ao máximo spoilers dos concertos, mas sei que estes têm incluído um momento de homenagem a Chester, na forma de In the End – com o público cantando as partes que não o rap. Antes dessa música, Mike costuma falar um bocadinho sobre o amigo que perdeu e tudo o que se tem passado desde aí. Numa das vezes, disse que uma das coisas que queria fazer com esta digressão era deixar os fãs exprimirem as suas emoções em relação a Chester.

 

 

Eu fiquei sem palavras. Mike não tinha de fazer isto. Ele tinha todo o direito de ignorar-nos, de dizer que a nossa dor não era nada comparada com a dele, da família e amigos próximos de Chester – e não é, nunca tive ilusões disso.

 

Em vez disso, Mike virou o microfone para nós, deu-nos espaço para sentirmos o que tínhamos a sentir, exprimirmos o que tínhamos a exprimir. Nós não merecemos Mike, tal como não merecíamos Chester.

 

E no entanto é essa a questão. É isso que Chester faria, é isso que Chester quereria que Mike fizesse. Afinal de contas, Chester teve uma vida muito mais difícil que muitos de nós, sofreu muito mais que muitos de nós. E em vez de se tornar uma pessoa cínica, amarga e misantrópica, tornou-se o completo oposto disso: um homem gentil, divertido, que adorava os seus fãs, que distribuía alegria, que tentou quase até ao fim da sua vida fazer deste mundo um lugar melhor.

 

Ele escolheu ser assim, ele escolheu ser melhor. Escolheu tratar bem um mundo que não o merecia – embora não tenha sido capaz de tratar bem a si mesmo.

 

É isto que significa a hashtag #MakeChesterProud (demorei mais de um ano a percebê-lo), o movimento que Mike começou e que ele e outras pessoas próximas de Chester têm conduzido. Escolhermos ser melhores, apesar da nossa dor, cuidarmos uns dos outros como de nós mesmos, agarrarmos todos os momentos de felicidade que encontrarmos, virarmos as costas ao ódio, à intolerância, à toxicidade. Se não pudermos consertar o mundo inteiro, consertarmos o que está ao nosso alcance.

 

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Eu quero pelo menos tentá-lo.

 

Isto ficou um bocadinho lamechas, admito-o, mas eu precisava de escrever isto. Tenham paciência comigo, ainda estou a aprender a lidar com este mundo, com esta vida. Conforme escrevi no texto anterior, estes últimos anos não foram fáceis para ninguém. Consola-me um bocadinho saber que estamos no mesmo barco, de certa forma, que estamos todos a fazer o que podemos para, lá está, mantermos a cabeça à tona da água.

 

 

Estive várias semanas sem publicar – este texto demorou-me mais do que estava à espera – mas tão cedo não tenciono fazer um hiato tão grande. Estou já a trabalhar nos meus textos habituais de fim de ano, tenho uma entrada de Músicas Ao Calhas planeada e respostas a uma tag.

 

Em todo o caso, como sempre, obrigada pela vossa paciência.

 

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