Hoje, vamos falar sobre Kyousei, o quinto filme da série Digimon Adventure Tri, que começou fez dois anos no outro dia (custa a acreditar, confesso…).
Estamos a um filme da conclusão série e Tri continua consistente na sua inconsistência: os filmes ímpares são bons, os pares nem tanto. Não acho que nenhum destes filmes seja cem por cento mau – cada um destes filmes tem partes boas, sejam elas momentos de desenvolvimento das personagens, estreias de digievoluções ou, apenas, momentos de humor.
Mas há que distinguir os filmes que vão conseguindo entreter-nos, com a ocasional gargalhada e um ou outro momento mais tocante, daqueles que nos deixam emocionalmente arrasados. Aconteceu no ano passado com Kokuhaku. Voltou a acontecer agora, com Kyousei, ainda que de maneira diferente.
1) Spoilers: as entradas desta série terão inúmeras revelações sobre o enredo dos cinco primeiros filmes de Digimon Adventure Tri e, possivelmente, dos enredos de Adventure e 02. Leia por sua conta e risco.
2) Alguns conceitos próprios desta série animada têm traduções controversas – na língua portuguesa, têm mais do que uma possível. Neste texto, vou adotar as traduções com que estou mais familiarizada e/ou que considero mais adequadas.
3) Apesar de as legendas do filme usarem os nomes japoneses das Crianças Escolhidas, eu vou usar as versões americanizadas dos nomes, visto que estou mais habituada.
Uma das várias coisas que não funcionaram em Soshitsu foram os Deus Ex-Machinas, as coisas que aconteceram sem motivo aparente. Kyousei supera o filme anterior precisamente por o enredo voltar a ser guiado pelas personagens: os Escolhidos, o governo japonês, Daigo, Yggdrasil através do Dark Gennai, até mesmo a Homeostase. Esta, antes de Tri, era apenas uma figura divina que governava o Mundo Digimon, que só aparecia para debitar informação que deixava a audiência ainda mais confusa. Não deixa de ser uma figura divina em Tri, mas começou a participar ativamente no enredo e, sobretudo neste filme, a entrar em conflito com as outras personagens.
Quando é assim – sobretudo quando a maior parte do elenco é tão acarinhada e há tanto tempo – é muito mais fácil deixarmo-nos levar pela história.
Não que Kyousei não tenha falhas. À semelhança de alguns dos seus antecessores, o filme torna-se demasiado lento em certas alturas. Existem aspetos que continuam por explicar – nomeadamente o elefante na sala, como se diz em inglês: os miúdos de 02.
Mas vamos por partes. Mais uma vez, estiquei-me um bocadinho com esta análise, tive de dividi-la em três partes. Que cara é essa? Não escolhi o nome "Álbum de Testamentos" só por soar fixe...
Antes de começarmos a análise a sério, uma nota: durante meses o título oficial do filme no Crunchyroll foi Symbiosis, ou seja, Simbiose. No entanto, o dia em que o filme saiu, o título passou a ser Coexistence, Coexistência. Fiquei um bocadinho chateada porque Simbiose é um título perfeito para este filme, o melhor título até agora em Tri, na minha opinião. O principal tema do filme, como veremos a seguir, é a relação simbiótica entre um Escolhido e o seu Digimon. Além disso, uma das coisas que permanece sob ameaça ao longo do filme é a simbiose entre o Mundo Real e o Digital – levando a algumas medidas extremas.
Por comparação, o termo Coexistência pouco ou nada tem a ver com o filme.
Kyousei começa exatamente no ponto em que Soshitsu terminou (muito mal): quando o Dark Gennai (ou Homem Mistério, segundo as informações oficiais) ataca Meiko, de modo a desestabilizar Meicoomon. Vai repetindo várias vezes: “Não devias ter nascido. Não devias ter nascido.”
Esta frase será importante mais frente. Para já, somos brindados com um flashback do outono de 1999: ou seja, poucos meses após os eventos de Adventure. Também não parece ser muito depois de Meiko ter “adotado” Meicoomon.
Não aprendemos nada que não tivéssemos suspeitado antes: vemos que Meicoomon, de vez em quando, sofre ataques de fúria destrutiva, um deles no laboratório onde estava a ser estudada. A única coisa que descobrimos é que Maki testemunhou esse ataque, no laboratório.
Está é, aliás, uma das únicas aparições de Maki neste filme. Mais vale falar já sobre as outras – que, na verdade, se limitam a dois vislumbres. Se na última vez que a vimos em Soshitsu, depois de reencontrar Bakumon, ela parecia estar à beira de um ataque psicótico, em Kyousei, esse ataque já deve ter ocorrido. Ouvimos Maki chamando por Bakumon (entretanto desaparecido), balbuciando sobre salvarem juntos o Mundo Digimon.
Seria esse o plano dela? Colaborar com Yggdrasil até recuperar Bakumon e depois, de novo na condição de Escolhida a sério, salvar o Mundo Digital das garras dele? Em jeito de indireta para a Homeostase, dando-lhe a entender que fizera mal em sacrificar Bakumon e em descartá-la como Criança Escolhida?
De referir, também, que Maki, nesta cena, enverga uma das armas anti-Digimon (que tinham aparecido em Ketsui por um instante e esquecidas desde então). Isto apesar de, segundo o que se vê em Kokuhaku e Soshitsu, Maki ter ido de mãos a abanar para o Mundo Digimon.
Como é que Maki arranjou a arma de um filme para o outro? Eu diria que só as Bestas Sagradas o sabem mas, à luz do que aprendemos em Soshitsu, seria de mau gosto.
O segundo vislumbre ocorre já perto do fim do filme, que mostra que Maki indo parar ao Mar Negro. Chega a encontrar os Divermon e tudo! Aponta-lhes uma arma (desta vez uma pistola vulgar, que sempre faz mais sentido), mas acaba por se deixar afundar nas águas escuras.
Pontos para Kyousei por ter resgatado um dos elementos mais interessantes de 02. Resta saber, agora, como é que Maki se vai escapar das profundezas do Mar Negro – ou melhor se se vai escapar.
Regressemos ao início do filme e ao ataque do Dark Gennai a Meiko. Este, ao que parece, consegue o que quer com esta habilidade: quebrar a ligação entre Meiko e Meicoomon. Esta última digievolui para Meicrackmon, entra em modo berserk e as distorções multiplicam-se, inclusivamente para o Mundo Real, que começa a ser invadido por Digimon. Meiko recupera a consciência e, quando chama por Meicrackmon, esta ataca-a. A jovem só sobrevive porque Tai a desvia a tempo. Depois desta, Meicrackmon foge… outra vez.
As consequências, desta feita, são mais graves – agora temos uma invasão em massa de Digimon no Mundo Real, trazendo o caos. Ainda assim, fica a sensação de que o pior ainda está para vir.
Um aspeto curioso nesta parte da história é que, pela primeira vez neste universo, os civis identificam estes monstros como Digimon. Não é claro como é que se descobriu a verdade (mais à frente no filme, fala-se de fugas de informação para a Imprensa). Também descobrimos que a Homeostase – provavelmente através de Hackmon – tem andando em contactos com o governo.
Suponho que tudo isto seja para abrir caminho para a parte do Epílogo em que “toda a gente tem um Digimon”. Agora que penso nisso, o tema recorrente em Tri, dos danos colaterais dos Digimon no Mundo Real, parece ser uma preparação para esse desfecho.
Inteligente como sou, precisei de quase dois anos para me aperceber disso...
Entretanto, Daigo encontra-se com o Professor Mochizuki, o pai de Meiko – ambos, ao que parecem, marginalizados pela organização governamental. Quando Mochizuki explicava a Daigo a experiência da filha como Escolhida, Hackmon junta-se a eles e explica, finalmente, qual é o problema de Meicoomon.
Meicoomon nasceu infetada com um fragmento de Apocalymon. Este é responsável pelo seu temperamento instável e poderes destrutivos. Devido à sua instabilidade, Meicoomon foi banida (pela Homeostase? Não é dito preto no branco, mas estão quase todos a assumir que foi ela a tomar a decisão) para o Mundo Real. Arranjaram-lhe, também, uma Criança Escolhida cuja presença e afeição contrabalançasse as tendências destrutivas de Meicoomon.
A minha antiga teoria de que Meicoomon teria sido criada de propósito para o Reinício estava errada, portanto. Contudo, esta também é uma boa explicação, consistente com a cronologia do universo Adventure e mostra um lado diferente da Homeostase e mesmo do conceito de Crianças Escolhidas.
Tem sido mesmo um dos temas recorrentes em Tri: a desconstrução da dinâmica de escolher crianças para salvar o Mundo Digimon.
Na primeira metade de Tri, essa desconstrução foi protagonizada pelos oito Escolhidos originais. É possível ser-se um Escolhido quando as nossas ações parecem agravar mais o problema? (Saikai) Ou quando os deveres de Escolhido entram em conflito com outras responsabilidades? (Ketsui) E se, de repente, vos dessem a opção de não serem Escolhidos, de fingirem que os últimos seis anos nunca aconteceram? O que fariam? (Kokuhaku)
Na segunda metade de Tri, por sua vez, esta desconstrução foca-se em Maki e, sobretudo, em Meiko. Já na análise a Soshitsu tínhamos questionado a ética do conceito habitual de Crianças Escolhidas – sobretudo depois de descobrirmos o que a Homeostase fizera a Maki.
Mas aquilo que fez a Meiko? Impôr a uma menina de onze anos uma criatura que, se não for controlada, pode atuar como uma bomba atómica? Não há palavras.
Não é de surpreender que Daigo se enfureça, quando Hackmon revela que ele e a Homeostase vão matar Meicoomon, com a colaboração do próprio governo japonês. Daigo vira a sua amiga de infância (e ex-namorada… certo?) perder o seu Digimon às mãos da Homeostase. Acabara de descobrir que essa perda lançara Maki num caminho destrutivo. Afeiçoara-se a Meiko, bem como aos outros miúdos, presenciara as suas batalhas, estivera lá quando o Reinício ocorreu e os Escolhidos perderam os Digimon. Fizera, desde o início de Tri, para proteger os miúdos, bem como Meicoomon. Agora a Homeostase dizia fora tudo em vão, que Meicoomon tinha de morrer?
O facto de Hackmon mandar uma indireta sobre o suposto falhanço da missão das Primeiras Crianças Escolhidas não ajuda – pelo contrário, acentua a frieza da Homeostase, que usa e descarta os seus peões com um desprendimento impressionante.
Tudo isto, bem como a perceção de que mais ninguém defenderá os Escolhidos, faz com que Daigo comece a agir por contra própria pela primeira vez em Tri – finalmente! O que faz ele? Veremos adiante…
Para já, regressemos ao Mundo Digital que, depois da fuga de Meicoomon, parece estar a voltar-se contra os Escolhidos. Temos alguns momentos caricatos, à Looney Tunes, em que o chão literalmente desaparece debaixo dos pés dos miúdos. Também também ataques de Digimon (muito mal animados e despachados em três tempos) e das próprias árvores. Kari, com a sua intuição, confirma a certa altura que o Mundo Digimon está a rejeitá-los. Daí estes fenómenos, a meteorologia instável e os ciclos dia/noite irregulares.
Os miúdos lá arranjam um intervalo entre os ataques do Mundo Digimon para fazerem o ponto da situação à volta da fogueira. Meiko, como tem vindo a fazer desde Kokuhaku, culpa-se por tudo o que acontecera até ao momento. Agora que sabemos a história toda, ou quase toda, acho que todos concordamos que este era um fardo demasiado para alguém suportar.
Meiko fez o melhor que podia. Duvido que tivesse sido diferente com qualquer um dos outros Escolhidos – com T.K.não foi. Meiko tivera um momento de hesitação após o Reinício, mas acabara por fazer aquilo que Sora, T.K., Mimi e os outros lhe tinham ensinado: viera ao Mundo Digital e lutara pela sua companheira. No entanto, fora pior a emenda que o soneto: ao vir ao Mundo Digimon, colocara-se a jeito para ser usada por Gennai para desestabilizar Meicoomon.
É de surpreender que Meiko passe este filme quase todo numa crise existencial?
Os outros Escolhidos tentam ajudá-la da maneira que sabem: fazendo-a acreditar em si mesma e na sua ligação com Meicoomon. É uma cena adorável, aliás – o lindíssimo tema instrumental de Butter-fly, tocando no fundo ajuda nisso – com as nossas eternas Crianças Escolhidas mostrando o porquê de eu as adorar, mesmo passados estes anos todos.
Os conselhos de cada um, aliás, refletem perfeitamente a evolução de cada um como personagem. Sora, por exemplo, encoraja Meiko a não sofrer em silêncio. Kari aconselha-a a não ceder às suas próprias inseguranças e a pedir ajuda quando não conseguir enfrentá-las sozinha. Matt lembra-lhe que nenhum Escolhido está sozinho, eles são uma equipa. Tai – invulgarmente caloroso para com Meiko neste filme – diz-lhe para não fugir dos problemas.
Queria, de resto, comentar este comportamento de Tai. Este tinha passado os quatro filmes anteriores, não ignorando Meiko, mas interagindo menos com ela que os outros veteranos (tirando Joe, acho eu). No entanto, de Soshitsu para Kyousei – nem se pode dizer que tenha sido da noite para o dia, porque a mudança começou logo na cena do ataque a Meicoomon, que se dividiu pelos dois filmes – Tai começou a portar-se como o melhor amigo de Meiko (ou algo mais). Trocam confidências, estabelecem contacto físico, ele desvia-a de ataques na sua direção.
Tem graça, aliás, a maneira como nenhuma das personagens femininas é capaz de se mexer quando alguém tenta atingi-las. Tem de vir um dos rapazes protegê-las (ou, no caso de Sora em Soshitsu, dois ao mesmo tempo).
Mas estou a desviar-me.
Não que eu não goste deste lado mais caloroso de Tai, pelo contrário. E também compreendo que os digiguionistas tivessem querido voltar os holofotes para o jovem, em jeito de preparação para o que acontece no fim (embora isso me recorde o problema dos tempos de antena desiguais em Adventure). Mas podiam ter feito esta mudança de forma mais gradual. Ou, pelo menos, dado uma explicação para o novo comportamento – culpa por não ter protegido Meiko do Dark Gennai, genuína preocupação e empatia com a situação dela, sei lá…
A conversa profunda à volta da lareira é interrompida de forma hilariante por Agumon, que acorda de repente, pensando que estão a falar sobre comida – o que irrita os outros Digimon.
Uma coisa que me tem vindo a incomodar desde Kokuhaku, aliás, é a mudança na personalidade de Agumon. Em Tri, quase tudo o que sai da boca dele é relacionado com comida. Do género:
– O que é um Reinício? Dá para comer?
Não que Agumon alguma vez tenha sido particularmente inteligente ou sofisticado em Adventure ou 02, mas sempre foi ele quem ajudou BlackWarGreymon nas suas dúvidas existenciais. E, na larga maioria das vezes, não tem piada, é apenas irritante – sobretudo porque uma das primeiras vezes que acontece é durante a cena em que os Digimon descobrem acerca do Reinício.
A diferença em relação aos filmes anteriores é que Kyousei, ao menos, faz bom uso da unidimensionalidade de Agumon. Na cena da fogueira, pela primeira vez, referências a comida fazem rir – mais porque interrompe uma cena particularmente emocional do que por outro motivo qualquer. Outro exemplo virá mais à frente.
Nesta fase, a prioridade dos Escolhidos é regressarem ao Mundo Real – algo que, mesmo assim, só ocorre a meio do segundo episódio. É um dos problemas deste filme: a tensão está mais elevada do que nunca, estamos todos à espera que a bomba rebente mas, mesmo assim, as coisas demoram a acontecer.
Havemos de regressar a isso. A certa altura, o Mundo Digimon larga os miúdos sem cerimónias no Mundo Real, logo no pior sítio possível: no meio de pessoas que sabem exatamente o que são Digimon – algo que, para eles, é inédito – incluindo polícias.
Tai, sendo o mestre da subtileza que é (a sério, como é que este miúdo se torna um diplomata?), decide que a melhor atitude é dar à sola. Os outros seguem atrás dele porque, depois de duas temporadas e quatro filmes, os Escolhidos continuam à espera que seja Tai a tomar as decisões – mesmo que estas nem sempre façam sentido.
Lembremo-nos disso mais adiante.
A fuga, ao menos, dá-lhes tempo para esconderem os Digimon no sistema informático criado por Izzy, antes de serem detidos. E para Joe se lamentar por, agora, ter cadastro, o que lhe pode arruinar a carreira.
Tenho algumas dúvidas relativamente à legalidade desta detenção. Oito dos nove miúdos são menores de idade, para começar. Para além disso, não parece que tenham sido informados que teriam direito a pedir um advogado – assumindo que as leis japonesas são semelhantes às nossas, nessa área. Seria de esperar, por outro lado, que pelo menos Joe ou Matt tivessem alguma noção dos seus direitos.
Felizmente, Daigo aparece a tempo e usa a sua posição para obter a custódia dos miúdos.
Daigo é uma das minhas personagens preferidas neste filme. O António do Odaiba Memorial Day Portugal concorda comigo, chegou a chamar-lhe o “pai das Crianças Escolhidas”. Eu não escolheria esse termo – na minha opinião, o seu papel assemelha-se mais a um irmão mais velho. Alguém com idade suficiente para se sentir à vontade entre adultos: para se responsabilizar pelos miúdos perante os pais deles, para falar em nome deles com outros adultos, para dar-lhes boleia de um lado para o outro, para zelar pela segurança deles. Mas, ao mesmo tempo, suficientemente jovem para ser acessível para os Escolhidos, para ainda se recordar de como é ter a idade deles.
Quando era miúda e me imaginava como personagem no universo de Digimon, imaginava-me como uma Criança Escolhida – tal como todos nós fizemos nessas idades, calculo eu. Desde que redescobri Digimon há dois anos, no entanto, vejo-me mais num papel semelhante ao de Daigo. Ou ao de Jim Kido, o irmão mais velho de Joe, durante os episódios 44 e 45 de 02. Até porque não seria um papel muito diferente do que, às vezes, desempenho com a minha irmã adolescente e os amigos dela.
Com as devidas diferenças, já que a minha irmã não é uma Criança Escolhida. Se o é, esconde-o muito bem.
Agora que penso nisso, pergunto-me se isto terá sido intencional. Se Daigo e Maki foram criados, pelo menos em parte, como representação da audiência de Tri: crianças aquando da exibição original de Adventure, em 1999, e agora, aquando de Tri, na casa dos vinte; homens e mulheres feitos, mas ainda Crianças Escolhidas no seu coração.
Também é possível que seja eu a projetar-me nestas personagens. Já sabem como sou.
Ficamos aqui por hoje, amanhã continuamos – o melhor ainda está para vir!
Terceira e última parte da análise a Soshitsu. Podem ler as partes anteriores aqui e aqui.
Aquando do combate com Machinedramon, que atua às ordens do Dark Gennai, as incoerências continuam. Um dos exemplos é o ataque da Salamon (de nível Infantil) que foi capaz de afetar o Machinedramon. O navio para onde os Escolhidos fogem também parece vindo do nada (será o mesmo daquele episódio filler do segundo arco de Adventure?).
No navio, os Escolhidos dispõem de apenas alguns minutos para respirarem e processarem o monólogo do Dark Gennai. Quando este último regressa, com o Machinedramon, Sora recebe instruções para ficar para trás, com Meiko. O resto do grupo divide-se, numa tentativa de despistar o Dark Gennai: Tai, Matt e Kari para um lado, os restantes para outro.
Matt, Tai e Kari são atacados por um MetalSeadramon, sendo arrastados para o mar (ou lago? Não dá para perceber…). Nova incoerência (alguém está a contar? Vamos em quantas?) quando Gabumon atinge MetalSeadramon com eficácia. No momento seguinte, contudo Tai e Matt apenas conseguem desviar os respetivos companheiros Digimon antes de o MetalSeadramon tentar afogá-los.
Não sei se o mesmo aconteceu com vocês, mas eu não consegui evitar afligir-me ao ver Kari sozinha, à superfície, gritando pelo seu onii-chan.
Debaixo de água, Tai e Matt têm uma estranha epifania em que, de alguma forma, comunicam com Agumon e Gabumon. Os dois rapazes, em suma, renovam os votos de amizade e lealdade eterna para com os seus Digimon – tal como Meiko havia feito antes. Conforme o António assinalou, a cena faz lembrar o momento da Mega Evolução do Charizard, em Pokémon Origins. Em todo o caso, é o suficiente para ativar os dispositivos digitais. Assim, Tai e Matt regressam à superfície nas costas de WarGreymon e MetalGarurumon, respetivamente, ao som de Butter-fly.
Depois disso, temos digievoluções como o ketchup. A primeira é a de Salamon para Gatomon, quando Kari nem se tenta desviar de mais um ataque do MetalSeadramon. Temos direito à sequência completa de digievolução (não imaginam a estranheza que me provoca ouvir Butter-fly durante este momento… mas também estavam a guardar Brave Heart para outra ocasião) e, pelas Bestas Sagradas, o desenho de Gatomon nesta sequência é horrível!
Por outro lado, desapareceram os "2" que, antes, víamos nas sequências de digievolução em Tri. Talvez seja porque, agora, os Digimon não estão infetados – mas isso quer dizer que eles foram infetados logo em Saikai? E só desenvolveram sintomas em Kokuhaku?
Por sua vez, Joe, Mimi, Izzy e T.K. haviam fugido para uma zona de icebergues, mas Gennai e Machinedramon conseguem chegar a eles. É agora que temos um dos pontos altos do filme: Joe atirando-se ao Dark Gennai (eu adoro este rapaz!). Gennai, infelizmente, afasta-o com facilidade, mas logo Gomamon riposta com os seus icónicos peixinhos.
Entretanto, Sora – que tivera já um momento Byomon, em que a última reconhece, pela primeira vez, que Sora é boa pessoa – junta-se ao grupo, deixando Meiko para trás. Isto revelar-se-á um erro fatal, como veremos já a seguir.
Uma das coisas por que mais ansiava em Soshitsu era, naturalmente, a digievolução de Byomon para o nível Extremo/Hiper Campeão. No geral, fiquei satisfeita, mas essa estreia veio acompanhada de uns quantos momentos WTF?!? A certa altura, Machinedramon agarra Byomon e Sora, sendo Sora, atira-se à garra dele. Segue-se a maior incoerência de todo o filme: Machinedramon esmaga Sora contra o icebergue duas vezes e a jovem sobrevive sem uma costela partida ou um órgão rompido que seja.
A Sora é a irmã perdida do Super Homem e ninguém nos avisou.
De qualquer forma, é aí que Byomon percebe, finalmente, que, para a miúda fazer uma parvoíce daquelas, é porque a ama a sério, tal como vinha dizendo desde início. Sora e Byomon unem-se verdadeiramente pela primeira vez desde o Reinício.
Toda a gente sabe o que acontece a seguir.
As primeiras notas de Brave Heart e o momento da digievolução não desiludem. Hououmon/Phoenixmon é lindíssima – de longe o Digimon mais bonito que conheço. O conflito de Sora neste filme não me deixou completamente satisfeita pelos motivos que expliquei antes. Mas, confesso, não consigo resistir a uma digievolução acompanhada de Brave Heart.
Muitos têm-se queixado de Seraphimon e HerculesKabuterimon roubarem o momento a Phoenixmon. Eu compreendo a crítica, mas não me importo muito. Pelo contrário, uma das coisas de que me queixei em Ketsui foi da falta de participação dos Digimons nos combates, tirando Rosemon e Vikemon. Logo, gosto que, em Soshitsu, se tenham todos juntado à luta.
Importo-me mais que tivéssemos de levar com as sequências de digievolução todas. Regressou a velha mania de Digimon de queimar tempo com digievoluções. A de HerculesKabuterimon, pelo menos, era desnecessária.
A aparição de Seraphimon tem, também, causado alguma controvérsia. Falando apenas de Soshitsu, T.K. não teve grande destaque – não mereceu a digievolução da maneira que Sora a mereceu neste filme e Izzy mereceu no filme anterior. Por um lado, suponho que T.K. já a tinha merecido em Kokuhaku.
Por outro lado, esta, tecnicamente, não terá sido a estreia de Seraphimon. A sua primeira aparição terá ocorrido na terceira parte de Digimon, o Filme – embora muitos fãs não considerem que essa história faça parte do cânone oficial do universo de Adventure. Nesse aspeto, Tri fez bem em manter a ambiguidade, sem invalidar nenhuma das hipóteses.
Entretanto, o Dark Gennai aproveita a distração dos outros Escolhidos nos combates para se enfiar no navio e assediar Meiko. E, apesar de Gomamon, Patamon (ambos de nível Infantil) e Sora terem sido capazes de fazer frente a Gennai sem grande dificuldade, Meicoomon – nível Adulto, veículo da Infeção, claramente poderosa, vendo a jovem que está programada para proteger sendo asfixiada – não consegue fazer um arranhão que seja a Gennai. Fuck logic!
As cenas de Meiko e Gennai estão, ainda por cima, enfiadas entre digievoluções e combates, de tal forma que uma pessoa quase se esquece do que está a acontecer no navio. A verdade é que o última parte do filme está muito mal organizada em termos de montagem das diferentes cenas: com as sequências de digievolução que nunca mais acabam, apenas um minuto ou dois para mostrar Maki e Bakumon e as cenas de Gennai assediando Meiko no navio.
O pior é mesmo o final. Depois de derrotarem o Machinedramon e o MetalSeadramon, os Escolhidos têm mais do que tempo para respirarem. Sora chega a ter um momento com Tai e Matt que até seria giro e tal se eu não estivesse, nessa altura, a gritar para o ecrã:
– PESSOAL! O DARK GENNAI ESTÁ PRESTES A MATAR A MEIKO! COMBINEM A VOSSA MENÁGE À TROIS DEPOIS, AGORA CORRAM PARA A P***A DO NAVIO!
A certa altura, lá vemos Meiko desmaiada (se o poster do filme seguinte não tivesse saído logo a seguir, muitos pensariam que ela estaria morta), Meicoomon em modo Infeção, o Dark Gennai soltando um evil laugh daqueles bem fatelas… e o ecrã desvanescendo-se para preto, seguido dos créditos finais.
Yep, é assim que o filme termina, com um dos cliffangers mais forçados de que há memória. É de admirar que muitos de nós tenham ficado com vontade de atirar com o computador (ou telemóvel, ou tablet ou qualquer gadget através do qual tenham visto o filme) pela janela depois disto?
Na minha opinião, a última impressão que Soshitsu deixa é pior que o filme em si. Mas os digi-guionistas (ou digi-produtores ou digi-realizadores ou digi-quem-quer-que-seja-responsável-por-isso) já deviam saber da importância de um final como deve ser. Não é bom quando os espectadores saem da sala de cinema de mau humor. E nem era assim tão difícil! Bastavam uns ajustes aqui e ali para tudo parecer mais orgânico.
Apesar de tudo isto, apesar de este filme ser mal executado ao ponto da frustração, contudo a achar que é melhor que Ketsui. Mal por mal, pela primeira vez desde que Tri começou, sabemos ao certo o que se está a passar e em direção vão as coisas. Quase tudo o que aconteceu foi importante para o enredo. Por fim, praticamente todos os Escolhidos tiveram pelo menos um momento de destaque.
Eu não podia acabar de falar sobre Soshitsu sem referir o eterno mistério que continua por resolver: os miúdos de 02. Nesta fase, as minhas expectativas atingiram mínimos históricos. Que revelem a resposta quando lhes apetecer, já nem me ralo!
Agora, o próximo filme chamar-se-á Kyosei, o que significa União ou Simbiose. Este é capaz de ser um dos títulos mais fascinantes até agora em Tri. Para aqueles que não conhecem o termo, Simbiose é uma relação de benefício mútuo. No contexto de Digimon e de Tri existem várias interpretações possíveis. A mais óbvia é referir-se à relação entre Escolhido e companheiro Digimon. No entanto, a meu ver, sabendo o que se sabe, o mais provável é referir-se à relação entre o Mundo Digital e o mundo dos humanos. Ou entre a Luz e a Escuridão.
O que me leva ao poster de Kyosei. Nele aparecem Meiko e Kari. Já se sabia que o quinto filme seria protagonizado pela Escolhida mais nova. Acho que ninguém tinha a certeza de que Meiko apareceria num poster em Tri mas, já que apareceu, não surpreende.
Na minha opinião, faz sentido emparelharem Meiko com Kari no protagonismo. Dos oito Escolhidos originais, Kari é de longe a mais parecida do Meiko em termos de carácter. Se bem se recordam, aquando de Ketsui, a amizade entre Meiko e Mimi recordou-me a amizade enre Kari e Yolei em 02 (típicos pares introvertida-extrovertida).
E contudo (penso que já o disse aqui) só conhecemos Meiko desde Saikai e esta já tem mais personalidade que Kari, que conhecemos desde Adventure.
Para além das raparigas, aquilo que chama a atenção nos posters são os Digimon. Vemos uma nova digievolução de Meicoomon cujo nome ainda não se conhece tanto quanto sei. Mais importante é Ophanimon.
Durante anos e anos e, sobretudo, nas semanas que antecederam Soshitsu, a comunidade de fãs debatera sem parar sobre qual das possíveis digievoluções de nível Extremo para Gatomon era a oficial para Kari: se Holydramon, se Ophanimon. A Angewomon de Kari aparece na tal terceira parte de Digimon, o Filme, que não se sabe se pertence ao cânone. Por outro lado, consta que no jogo Digimon Adventure para a PSP, a Gatomon de Kari digievolui para Ophanimon.
Pessoalmente, não tenho uma preferência definida por nenhuma das formas. Por um lado, Ophanimon faz mais sentido como o nível que se segue à Angewomon. Além disso, faz melhor par com Seraphimon – não, não “shipo” (odeio essa palavra…) T.K e Kari, longe disso, mas gosto da química que a Gatomon/Angewomon e o Angemon partilham desde os tempos de Adventure. Por outro lado, Holydramon tem traços claramente feninos, logo, também faz sentido como digievolução de Gatomon. Além disso, é uma das poucas digievoluções das raparigas Escolhidas que não é gritantemente sexualizada.
Ora, este poster não confirma nem desmente nenhuma das possíveis digievoluções porque a Ophanimon aparece em modo Fall Down. Segundo a Wiki do Shika, é essencialmente um anjo caído/desertor. Ou seja, esta será a primeira vez desde SkullGreymon que teremos uma digievolução negra no universo de Adventure. O que é fascinante.
Estando esta análise tão atrasada, à data da publicação, já temos uma sinopse para Kyosei. Mais vale falar sobre ela.
Só para arrumarmos o assunto Ophanimon, a sinopse dá a entender que alguma coisa de mau vai acontecer a Kari “que tem a alma mais iluminada e delicada que ninguém” – o que é demasiado vago para se tirar conclusões. Penso que é quase certo que Kari poderá voltar a servir de porta-voz à Escuridão e… não me agrada. Estou farta do velhíssimo cliché da Kari possuída por coisas sobrenaturais.
Não sei se alguma vez o referi aqui no blogue, mas uma das coisas que gostava de ver em Tri era Kari, por uma vez, salvando o couro a Tai ou T.K. em vez de ser a eterna donzela indefesa. Mas já ficava contente se Kari se salvasse a si mesma do que quer que a atormentará e/ou tenha uma evolução significativa como personagem.
Podiam, por exemplo, abordar a relação dela com o irmão – que, por sinal, esteve em destaque há umas semanas atrás, quando um dos antigos realizadores de Adventure apontou para momentos do episódio 21 (aquele em que Tai, após a derrota de Etemon, regressa brevemente ao Mundo Real e reencontra a irmã) que poderiam apontar para atração incestuosa (*arrepios de horror*). Pontas soltas como a culpa de Tai por ter enviado a irmã para o hospital e a dependência excessiva de Kari no irmão – conforme referido no episódio do Mar Negro, em 02.
Passando ao resto da sinopse, parece que as coisas vão rapidamente reverter ao estado pré-Reinício. Os miúdos regressarão ao Mundo Real, onde estão a ocorrer distorções e estragos por todo o lado. Parece que, desta vez, a população virar-se-á a sério contra os Escolhidos.
Eu não estou lá muito satisfeita por irmos voltar ao Mundo Real, depois de termos passado o quê? Um dia e meio, dois dias no Mundo Digimon? Por outro lado, se o objetivo de Yggdrasil for mesmo extreminar a raça humana, não faz sentido o elenco permanecer no Mundo Digital. É provável, também, que as dúvidas existenciais de Tai regressem, após terem sido deixadas em stand-by no início de Kokuhaku.
A sinopse revela ainda que, segundo Hackmon, a Homeostase quer matar Meicoomon. Este desenvolvimento não surpreende, sobretudo depois de Soshitsu ter praticamente confirmado que Meicoomon foi criada para ser o veículo da Infeção. O mais certo é os Escolhidos serem apanhados no fogo cruzado. Sobretudo Meiko que, naturalmente, não permitirá que matem o seu Digimon sem dar luta.
Estou certa de que pelo menos alguns dos Escolhidos ficarão do lado dela. Sora, T.K. e Mimi fá-lo-ão logo de início. No entanto, não me surpreenderia se Tai começasse a culpar Meicoomon e, por associação, Meiko por tudo de mau que aconteceu em Tri até agora. Talvez Izzy concorde com ele, pura e simplesmente pelo sentido prático da coisa, se não houver mesmo outra solução. Quanto a Matt, ele estará do lado completamente oposto a Tai – nesta fase é uma lei da natureza.
Em todo o caso, uma coisa é certa: as coisas irão de mal a pior. O que era de esperar no penúltimo capítulo, antes da resolução final no sexto filme.
É um bocadinho estranho ainda não haver data de estreia de Kyosei. Mas, como me atrasei tanto com este monstro de análise, não me queixarei se o próximo filme ainda demorar um bocadinho. Estou com esperanças de que o filme coincida com o Odaiba Memorial Day.
E por falar disso…
Já faz parte da praxe falar do Odaiba Memorial Day Portugal – sobretudo tendo em conta que já participei num par de emissões/podcasts juntamente com o António, o Danny (do canal de YouTube A minha vida em bits) e o Shika (que gere a Digimon Wiki em português de Portugal).
Ao lado deles sou uma amadora, que só conhece (e, mesmo assim, não muito bem) o universo de Adventure. Além disso, estou longe de ser uma entertainer, farto-me de gaguejar e não tenho um microfone decente – o YouTube não é de todo uma carreira viável para mim.
Dito isto, diverti-me imenso nos podcasts em que participei. Geralmente, as emissões começam de forma mais ou menos refinada mas, ao fim de algum tempo, começamos a disparatar. O podcast mais recente em que participei acabou connosco a cantar a versão portuguesa de Butter-fly - de início, cantámos a versão da Animedia, comigo a trocar-me toda na letra (que o Danny escreveu, ainda para mais!) e, por algum motivo, acabámos por cantar o refrão da versão da velhinha dobragem portuguesa. Esta parte da emissão já não ficou gravada no YouTube… graças a Deus, sinceramente.
Não posso falar pelos outros três participantes, mas eu garanto que, nessa noite, não estava sob o efeito do álcool nem de outra substância – só mesmo um descafeinado da Nespresso. Eu posso parecer simpática e certinha à primeira vista mas, se me derem tempo, a minha maluquice vem toda ao de cima.
De qualquer forma, só por momentos como estes vale a pena ter escrito tanto testamento sobre Digimon nos últimos dois anos.
Com tudo isto deu-me ainda mais vontade de ir ao encontro no primeiro de agosto. Infelizmente, este ano não vou, quase de certeza, poder ir este ano. Acreditem, isto deixa-me com vontade de chorar.
Enfim, já foi bom ter participado nos podcasts ou apenas ouvi-los. Conforme julgo já ter referido aqui no blogue, sabe bem conviver com pessoas com as mesmas maluqueiras do que nós, mesmo que apenas via internet. Especialmente para mim que, como já sabem, sou uma mulher com muitas maluqueiras.
Voltaremos a falar sobre Digimon quando sair Kyosei – espero não tornar a atrarar-me tanto com essa análise, mas não posso prometer nada. De qualquer forma, na página de Facebook deste blogue, vou publicando e comentando qualquer notícia ou pista que saia sobre Kyosei.
Continuem ligados. Análise a After Laughter dos Paramore em breve.
É a partir da primeira aparição de Machinedramon que Soshitsu começa a dar tiros nos pés. Até à parte do Tri-ângulo amoroso, a história decorria de forma consistente. Um bocadinho lenta, sim, mas todos os filmes de Tri, até agora, tiveram um começo lento. Soshitsu, ao menos, estava a ter bons momentos entre personagens. No entanto, Machinedramon interrompeu um momento crucial para o desenvolvimento de Sora e, a partir daí, as coisas ficaram estranhas.
Machinedramon aparece quase literalmente do nada, perseguindo Meicoomon. Não, não é o mesmo Machinedramon que fazia parte dos Dark Masters/Mestres das Trevas. Por esta altura, toda a gente está a assumir que Yggdrasil e/ou o Dark Gennai têm a capacidade de conjurar cópias de Digimon de nível Hiper Campeão, ainda que uns quantos furos abaixo em relação aos originais – primeiro o Imperialdramon de Ketsui e, neste filme, o Machinedramon e, mais tarde, o MetalSeadramon. É uma explicação tão boa como qualquer outra. No entanto, chateia-me um bocado que ainda não tenha sido confirmada oficialmente.
Tai, Matt e Sora voltam rapidamente para junto dos amigos. Como Machinedramon continuasse a atacar, os Escolhidos voltam-se, naturalmente, para os seus Digimon, dispositivos em riste e…
...nada acontece.
Eu sabia, desde logo, que a digievolução não ia funcionar à primeira, depois do Reinício. Os Escolhidos descobrem-no na pior altura possível. É, adequadamente, um momento “Oh crap!”
Infelizmente (ou felizmente), no momento em que Machinedramon devia, pela lógica, matá-los a todos, abrem-se distorções no local, que transportam os Escolhidos para outros sítios – ou seja, um dos maiores Deus Ex-Machinas de que há memória.
Este é apenas o primeiro de vários Deus Ex-Machinas e outras incongruências neste filme, mas quero falar já sobre isso. Um dos motivos pelos quais Kokuhaku foi tão bom foi porque quase todos os eventos do enredo ocorreram por causa de decisões tomadas pelas personagens. O Reinício e tudo o que ele implicou aconteceram porque, em primeiro lugar, nem Maki, nem Daigo nem Meiko disseram aos outros Escolhidos a verdade acerca de Meicoomon; em segundo lugar, T.K. não disse a ninguém, tirando Meiko, que Patamon estava infetado; em terceiro, os Digimon não disseram aos seus companheiros humanos que ia haver Reinício – só Agumon e Tentomon e, mesmo assim, não foi a sua primeira escolha.
É precisamente por isso que Kokuhaku é, em simultâneo, tão belo e tão trágico: porque o Reinício podia ter sido evitado e não o foi por causa da humanidade e imperfeições das personagens. Até as atitudes de Maki são compreensíveis, agora que conhecemos as motivações dela!
É por isso que ninguém gosta de Deus Ex-Machinas: porque as personagens não fazem absolutamente nada para merecerem o que lhes acontece. Já ajudava, neste caso, se por exemplo Meicoomon tivesse criado as distorções de propósito, numa tentativa de salvar os Escolhidos e os seus Digimon.
Não que ela alguma vez tenha dado sinais de se ralar com outra criatura que não ela mesma ou Meiko. Mas, se tivesse acontecido, abriria imensas possibilidades.
Isto nem seria tão mau se, ao menos, Soshitsu tivesse aproveitado as oportunidades criadas pelo Deus Ex-Machina. O grupo divide-se, com alguns dos humanos a serem emparelhados com companheiros Digimon alheios. Quando, aliás, vi pela primeira vez, nos trailers, por exemplo, Joe com Palmon e Patamon e Mimi com Tentomon, pensei que isso tivesse sido escolha dos próprios Digimon. Afinal de contas, eles não têm memórias dos seis anos anteriores e, provavelmente, nem sequer sabem que estão programados para protegerem um dos humanos em específico. Seria fascinante se, em certos momentos, sentissem maior afinidade para com os humanos “errados”.
O que remete, de novo, para a questão dos Ex-Machinas.
Alguns dos Escolhidos vão, ainda, parar a locais significativos da sua primeira estadia no Mundo Digimon. Como Mimi no palácio dos Gekomon, Joe no restaurante do Vegiemon e do Digitamamon e T.K. na Aldeia do Início. Posso estar enganada, mas o local a onde Tai foi parar, juntamente com a irmã, Gabumon e Salamon (momento fofinho quando Tai e Salamon acordam Kari, que estava desmaiada), lembra-me o cenário da parte do segundo arco de Adventure – aqueles episódios em que ele cometeu várias asneiras graves, tais como forçar a digievolução de Greymon e permitir que Sora seja raptada.
Esta mixórdia de temáticas abria imensas possibilidades: os Digimon amnésicos descobrindo mais acerca dos seus companheiros humanos; os Escolhidos recordando episódios marcantes do seu passado (episódios de que, se calhar, não se orgulham) e falando deles com os seus Digimon (seus companheiros oficiais ou não).
Mas quase todas essas oportunidades são desperdiçadas. Mimi limita-se a elogiar Izzy perante Tentomon, mesmo no estilo de adolescente apaixonada. T.K. explica o Reinício a Elecmon e reforça do desejo de reencontrar Patamon (ou seja, nada que acrescente alguma coisa). Izzy mostra algumas fotografias pré-Reinício a Agumon e Gomamon. Pelo meio, há um momento inútil, mesmo estúpido, em que Agumon e Gomamon ficam a olhar especados para um comboio que vem na direção deles, antes de Matt e Izzy os afastarem no último segundo. Por fim, o grupo que abarca Joe, Patamon e Palmon nem sequer tem direito a falas.
É também nesta altura que se volta a manifestar a aparente falta de orçamento de Tri, com o regresso dos planos estáticos que já tinham aparecido em Ketsui. Nem sequer é a primeira vez que aparecem no fime, mas esta é a mais flagrante, chegando a aparecer uma apresentação de diapositivos. Não percebo, sinceramente. Kokuhaku não teve nada disso (ou, se teve, foi tão discreto que nem sequer reparei). Filme sim filme não reduz-se o orçamento?
Felizmente, temos uns quantos momentos que se aproveitam. Por exemplo, quando Agumon pergunta a Matt se este odeia Tai. Eu podia escrever páginas e páginas só para responder a essa pergunta, mas Matt diz apenas:
– Espero demasiado dele.
Não é preciso acrescentar mais nada.
Por sua vez, Tai desabafa com Kari sobre as consequências do Reinício, sobretudo o facto de a digievolução não funcionar A irmã tem um raro momento de profundidade ao dizer que talvez os Digimon estejam melhor assim, sem recordações dos anos anteriores. Eles, os Escolhidos, têm de aceitá-los e amá-los tal como são agora.
Este discurso não é particularmente original – é comum dizerem-se coisas parecidas sobre doentes de Alzheimer, por exemplo – mas é significativo que tenha partido de Kari. A sua companheira encontra-se, agora, na forma da adorável Salamon. No entanto, antes do Reinício, era a mais madura dos Digimon dos Escolhidos – tanto pelo seu passado como por ser do nível Adulto. Sem essas memórias, Salamon é tão inocente como os outros Digimon – algo que não passou despercebido a Kari. Salamon está, sem dúvida nenhuma, melhor assim, sem saber que Myotismon a escravizou e lhe matou o melhor amigo
Por agora, pelo menos.
No entanto, os melhores momentos foram os que envolveram Sora – também era o mínimo, já que este era o filme dela! Depois o ataque do Machinedramon, Sora é transportada para um deserto (provavelmente o mesmo que o grupo atravessou no segundo arco de Adventure), juntamente com Byomon que, nesta altura, não tem desculpa nenhuma, está a ser mesquinha (eu e o António, o Danny e o Shika, do Odaiba Memorial Day Portugal, usámos palavras mais coloridas e menos simpáticas para descrever Byomon), acabando por fazer a pobre rapariga chorar.
Não se faz, Byomon! Não se faz!
Entretanto, as duas encontram o corpo inconsciente de Meiko, que terá aparecido no Mundo Digimon por obra de graça do Espírito Santo – ou, vá lá, da Homeostase. Em todo o caso, ainda bem que isso acontece, já que Meiko proporciona alguns dos melhores momentos do filme – nomeadamente, ao ser a primeira conseguir ajudar Sora, por pouco que seja.
Por esta altura, Byomon já percebera que estava a ir longe demais e tenta ser um pouco mais cordial. A certa altura, chega a ser mais calorosa para com Meiko do que para Sora, o que, naturalmente, magoa esta última. Mas não é, de todo, incompreensível, já que Meiko a pressiona menos. Quando Sora desabafa com Meiko sobre a difícil reaproximação a Byomon, Meiko recorda à amiga as suas próprias palavras, sobre o lanço inquebrável entre Escolhidos e os seus Digimon.
Eu, no passado, queixei-me do tratamento que Digimon (no que toca ao universo de Adventure, pelo menos) tem dado às suas personagens femininas. No entanto, as relações entre as meninas Escolhidas têm sido alguns dos pontos altos de Tri, com cada filme (tirando Saikai) tendo uma cena em que uma das raparigas dá apoio a outra – tal como demonstrei no vídeo acima/abaixo, que publiquei na página de Facebook deste blogue, a propósito do Dia da Mulher.
De assinalar que Meiko é quem está no centro destas interações. A jovem está longe de ser a personagem mais popular de Tri. Meiko também não me entusiasmava muito, de início, mas tenho vindo a gostar cada vez mais dela. Por um lado, por a achar parecida comigo, mas também pela maneira como Meiko tem vindo a ser desenvolvida, em paralelo com outros Escolhidos: Mimi em Ketsui, T.K. em Kokuhaku e Sora neste filme.
O momento alto de Meiko, aliás, foi o seu reencontro com Meicoomon. Esta última tinha passado a primeira metade do filme chorando por a sua humana não ter vindo procurá-la. Quando finalmente a encontra, tem uma birra destrutiva, acusando Meiko de não ter vindo por Meicoomon ser “má”. Meiko admite que sim, Meicoomon é “má”, tem-lhe tornado a vida difícil, mas isso não impota. Tal como temos visto outra e outra vez em Tri, tal como Sora e T.K. lhe tinham ensinado, um Escolhido não volta as costas ao seu Digimon. Meiko não o fará agora.
Esta deverá ser a primeira vez em anos (se não for a primeira vez, ponto) que Meiko é completamente sincera para com Meicoomon – e talvez mesmo consigo mesma. É uma evolução significativa relativamente à Meiko que passou quase todo Kokuhaku em depressão, com pena de si própria.
Depois disso, o falso Imperador Digimon aparece perante Sora e Meiko, juntamente com Machinedramon, tentando deitar as mãos a Meicoomon. Como Sora tentasse impedi-lo, ele volta-se para ela. É nesta altura que ele revela finalmente a sua verdadeira (será?) identidade: Gennai.
Não, não vou falar sobre a infame cena que arruinou a infância a toda uma geração que cresceu com Adventure e 02. Passemos à frente.
A isto seguem-se uma série de incoerências. A primeira é o facto de Sora ter conseguido tirar o Dark Gennai de cima de si, sem dificuldade aparente - apesar de não ter conseguido fazer nada quando Gennai lhe tirou o dispositivo digital.
De seguida, repete-se o Deus Ex-Machina quando as distorções trazem todos os outros Escolhidos para o local, ao mesmo tempo. Tai e Matt, então, como disse antes, aparecem no momento exato para proteger Sora de um ataque do Machinedramon.
É nesta altura, enquanto o Machinedramon tenta atingir os miúdos, que o Dark Gennai começa o monólogo, explicando as suas motivações. Conforme Hackmon já tinha explicado, Gennai está a trabalhar para Yggdrasil.
Quando li este nome nas legendas do filme pela primeira vez, eu sabia que já o tinha lido algures, a propósito de Digimon. Foi uma das primeiras coisas que perguntei ao António, depois de ver o filme: quem era Yggdrasil. Consta, então, que ele é o principal computador que aloja o Mundo Digital e/ou uma espécie de divindade do Mundo Digimon. Já tinha usado como vilão na temporada Savers, onde se terá voltado contra os humanos por os considerar uma ameaça para os Digimon. Parece que, em Tri, as suas motivações são semelhantes.
Pelo menos é isso que se deduz do monólogo de Gennai, que dá como exemplo os Digimon dos Escolhidos – selecionados e programados para protegerem humanos, mesmo que lhes custe a vida. Gennai acusa mesmo os Escolhidos de escravizarem os seus Digimon
Eu não consigo evitar pensar nos fãs de Digimon detratores de Pokémon, que questionam (não sem razão) a moralidade da premissa de capturar criaturas e obrigá-las a lutar. No entanto, já que Soshitsu foi por essa via, devo perguntar: será muito melhor termos criaturas nascidas e obrigadas a proteger humanos, mesmo que não seja essa a sua vontade? Tri desperdiça, aliás, outra oportunidade ao não ter pelo menos um dos Digimon amnésicos questionando o seu propósito de vida.
No entanto, os Escolhidos são os últimos que merecem ser culpados por isso. Conforme assinalei antes, nenhum dos miúdos escolheu ir parar ao Mundo Digimon – foram literalmente atirados para lá. Pode-se argumentar que a afeição que desenvolveram pelo Mundo Digital é, pelo menos em parte, Síndrome de Estocolmo. Como disse antes, os companheiros Digimon são tudo o que os miúdos receberam como ajuda ou compensação. Sim, os Digimon é que são obrigados a arriscar a pele, mas não foram os Escolhidos que definiram as regras.
Aliás, fica cada vez mais claro que esta é uma luta (se não for guerra aberta) entre Yggdrasil e a Homeostase e os miúdos, os respetivos Digimon, Maki e talvez mesmo o Dark Gennai não passam de peças num tabuleiro de xadrez.
Voltaremos a falar sobre isso e muito mais na última parte desta análise. Continuem desse lado!
Hoje vamos falar, finalmente, sobre Soshitsu – peço imensa desculpa por este épico atraso. Soshitsu (que, em português, significa Perda), é o quarto de seis OVAs que constituem Digimon Adventure Tri – uma série que serve de sequela às duas primeiras temporadas do anime de Digimon, também conhecidas por Adventure e 02. Desta feita, a análise virá dividida em três partes: as próximas duas virão amanhã e depois, em princípio.
Numa altura em que vamos em dois terços da série, podemos já assinalar um dos maiores problema de Tri: a inconsistência. Temos alternado entre filmes bons e filmes menos bons. Saikai, o primeiro, é um filme bom, mas o segundo, Ketsui, está uns quantos furos abaixo. Kokuhaku suplantou os seus antecessores e elevou as expectativas para o filme seguinte.
Soshitsu, infelizmente, não foi capaz de corresponder a essas expectativas.
Não me interpretem mal, eu gosto de Soshitsu. Fez várias coisas bem – sobretudo o facto de fazer o que nenhum dos filmes anteriores tinha feito: dar-nos respostas (embora não sejam aquelas que alguns de nós desejavam). Percebe-se, também, que os digi-guionistas tinham uma série de potenciais boas ideias. O pior é que não souberam pô-las em prática: ou as exploraram mal ou não as exploraram de todo.
É esse o grande problema de Soshitsu: a execução.
Antes de prosseguirmos, os alertas habituais...
1) Spoilers: as entradas desta série terão inúmeras revelações sobre o enredo do primeiro, segundo e terceiro filmes de Digimon Adventure Tri e, possivelmente, dos enredos de Adventure e 02. Leia por sua conta e risco.
2) Alguns conceitos próprios desta série animada têm traduções controversas – na língua portuguesa, têm mais do que uma possível. Neste texto, vou adotar as traduções com que estou mais familiarizada e/ou que considero mais adequadas.
3) Apesar de as legendas do filme usarem os nomes japoneses das Crianças Escolhidas, eu vou usar as versões americanizadas dos nomes, visto que estou mais habituada.
É frustrante, pois Soshitsu tinha tudo para ser um filme bem melhor – dá para ver claramente, ao longo do filme, onde se podia melhorar. Até porque Soshitsu começa de forma bombástica, com um flashback em estilo filme retro, mudo, capaz de deixar os fãs a especular durante anos.
Confesso que não estava à espera que Maki e Daigo fossem as Crianças Escolhidas Originais (referidas de forma muito rápida na reta final de Adventure, as primeiras a derrotar os Dark Masters/Mestres das Trevas). Olhando agora, em retrospetiva, no entanto, não sei como é que não considerei a hipótese (julgo ter dado com ela algures na Internet). Mas também nunca dei muita importância a essas misteriosas Crianças Escolhidas Originais.
No entanto, agora que sabemos a verdade, faz todo o sentido. Descobrimos, assim, que, quinze ou vinte anos antes dos eventos de Tri, Maki e Daigo fizeram parte das primeiras cinco Crianças Escolhidas a salvar o Mundo Digimon nos Mestres das Trevas. Pelos óculos caídos junto a Daigo, este terá sido o líder.
Este flashback confirma algo que, segundo consta, vinha referido na versão em livro da história de Adventure: o facto de as quatro Bestas Sagradas terem sido, originalmente, os parceiros dessas Crianças Escolhidas Originais. A única exceção foi o parceiro de Maki: Bakumon/Tapirmon, na forma Infantil, Megadramon na forma Perfeita/Super Campeã, que, segundo o que percebi, foi exigido como sacrifício por parte da Homeostase.
Descobrimos mais à frente no filme que Maki terá passado a segunda metade da sua vida – talvez mais – procurando uma maneira de recuperar o seu parceiro Digimon. Noutro flashback, de quando Maki e Daigo eram adolescentes, Maki aparece já estudando a hipótese de um Reinício.
Nesse flashback, vemos, aliás, Daigo preocupado com o rumo que Maki está a tomar: incapaz de deixar o passado no passado, obcecada por trazer Bakumon de volta à vida. Ele sabe perfeitamente que aquilo não vai acabar bem. Daigo tenta ajudar Maki a sair daquele buraco, oferece-se mesmo para tentar preencher o vazio deixado pela morte de Bakumon.
Em vão. Daigo poderá, aliás, ter feito mais mal do que bem – é provável que Maki, depois daquele episódio, tenha tomado precauções extra para que o amigo não descobrisse o que ela andava a fazer.
Em todo o caso, isto prova que as minhas suspeitas, que começaram em Ketsui, estavam certas: Maki deixara Meicoomon vulnerável ao falso Imperador Digimon de propósito; podia ter evitado o Reinício e escolhera deliberadamente não fazê-lo. O Reinício fazia parte dos planos dos vilões.
Estão a ver? Aqui a Sofia tinha razão!
Ter um humano a colaborar com os vilões não é nada de novo em Digimon, nem mesmo no universo de Adventure. Pelo contrário, os paralelismos com Oikawa são evidentes. Ambos perderam um amigo próximo, que associam à sua infância. No caso de Oikawa, foi Hiroki, o pai de Cody, o seu melhor amigo de infância, na companhia de quem descobriu o Mundo Digimon. No caso de Maki, foi o seu companheiro Digimon. Nenhum deles é capaz de fazer o luto como deve ser, o que os coloca numa posição vulnerável à influência dos vilões.
Mas existem diferenças. Oikawa foi controlado por Myotismon, não fez nada por vontade própria. Tendo em conta que o público-alvo de 02 era o infantil, não admira que os digi-guionistas tenham escolhido este desenvolvimento mais simplista, mais a preto e branco. Por sua vez, Tri é dirigido a uma audiência mais velha, os digi-guionistas podem tornar Maki mais ambígua moralmente.
Pode-se questionar como é que uma antiga Criança Escolhida trai o Mundo Digimon desta maneira mas, na minha opinião, motivos não lhe faltam. Se assumirmos que as coisas se passaram de maneira semelhante a Adventure, Maki, Daigo e as outras Crianças Escolhidas Originais terão sido atirados, quase literalmente, para o Mundo Digimon, sem que ninguém lhes tivesse perguntado se era isso que queriam. Terão, depois, sido obrigados a sobreviver só com a ajuda dos respetivos companheiros Digimon. Pelo meio, terão descoberto que o Mundo Digital estava em perigo e só eles podiam salvá-lo, blá blá blá, Whiskas Saquetas.
Como penso já ter referido aqui, no blogue, pedir a crianças de dez ou onze anos (ou talvez mais novas) que arrisquem a vida por um mundo inteiro já de si é uma violência. A Homeostase tem, ainda, o desplante de exigir Bakumon (a única coisa boa que Maki recebera como Criança Escolhida) como sacrifício.
Não sei como é com vocês, mas eu também ficaria a odiar a Homeostase e talvez mesmo o próprio Mundo Digimon e tudo o que ele representa. E diria a Daigo e a outros que tais onde poderiam enfiar a conversa recorrente em Tri, sobre “seguir em frente” e “crescer”.
Por falar em Daigo, é durante o presente em Soshitsu que este descobre a verdade acerca de Maki. Depois de os miúdos terem partido para o Mundo Digimon, Maki desaparece sem deixar rasto. Daigo investiga no gabinete dela e acaba por descobrir os seus planos para o Reinício, e-mails trocados com Gennai, uma lista com a localização dos Digimon da Ilha do Ficheiro, com o nome de Bakumon destacado.
De seguida, Hackmon aparece no gabinete. Depois de ter passado a primeira metade de Tri sendo misterioso, observando os principais acontecimentos à distância, finalmente revela quem é e o que quer da vida. Hackmon apresenta-se a si mesmo como um mensageiro da Homeostase – cargo que antes, era ocupado por Gennai, antes de ele, tal como o próprio Hackmon confirma, se juntar ao lado negro da Força.
Hackmon confirma, também, tudo o que Daigo acabara de descobrir e ainda mais: Maki fizera um acordo com Yggdrasil usando Gennai como intermediário. A antiga Criança Escolhida trabalharia para ele e ele ajudar-lhe-ia a provocar um Reinício. Acho que ninguém o confirma preto no branco no filme, mas vários dão a entender que Meicoomon terá sido criada de propósito para ser o veículo da Infeção – não percebo, no entanto, se a ideia partiu de Yggdrasil ou de Maki.
Agora que penso nisso, Maki a ter a ideia de usar um Digimon como veículo da Infeção e, depois, oferecê-lo como companheiro a uma criança – essencialmente impôr a Meiko um destino semelhante ao seu, se não for pior – seria de uma frieza arrepiante. Mas como nada disto ainda foi confirmado oficialmente, não vou por aí.
Falaremos de Gennai e Yggdrasil mais adiante. Para já, queria só comentar que, nesta fase, esperava mais participação de Daigo nos acontecimentos. Passou os três primeiros filmes a reboque de Maki – nem sempre concordando com as ações dela e dizendo-o explicitamente, mas nunca indo contra a vontade ela. Agora, em Soshitsu, pouco mais foi que o avatar da audiência na revelação das motivações de Maki e da história principal de Tri.
Espero que, nos próximos filmes, Daigo tenha um papel mais ativo. É provável, aliás, que seja ele a chamar Maki à razão, quando for necessário.
Regressemos a Maki. Esta acaba por reencontrar Bakumon perto do fim do filme… mas ele não a reconhece, para surpresa desta.
É uma das muitas inconsistências em Soshitsu. Maki passara metade da sua vida planeando o Reinício, não sabia que um dos efeitos secundários para os Digimon era amnésia? Não faz sentido.
À parte esse aspeto, quando Bakumon não reconhece Maki e se retrai, esta tem um mini surto psicótico, tornando-se algo violenta. É certo que Maki passou por muito. Esperou metade da vida por aquele momento. Passara o dia e meio anterior sozinha, no Mundo Digital, à procura de Bakumon. É possível que estivesse desidratada e privada de sono. É pouco provável, assim, que estivesse capaz de pensar e agir racionalmente. Muitos de nós enlonqueceríamos um bocadinho naquelas circunstâncias.
Mesmo assim, atacar um Digimon inocente, de nível Infantil? Não se faz.
Infelizmente, a cena acaba ali – é capaz de ter durado menos que algumas das sequências de digievolução. Que acontecerá a seguir? Eu diria “só as Bestas Sagradas sabem” mas, nestas circunstâncias, parece-me de mau gosto…
Por esta altura, é óbvio que Maki não passa de um peão nas mãos de forças muito maiores do que ela, que governam o Mundo Digimon. Nesse aspeto, não difere muito dos Escolhidos atuais… Mas estou a adiantar-me.
Tirando o prólogo analéptico, o filme retoma a narrativa poucos minutos após, o filme retoma a narrativa poucos minutos após o final de Kokuhaku – ou seja, poucos minutos após os Escolhidos reencontrarem os seus Digimon amnésicos. Temos direito a uns quantos momentos fofinhos: T.K. certificando-se de que Tokomon está curado da Infeção; Tsunomon intimidado por Matt; Tanemon com medo de que Mimi a comesse; Nyaromon reconhecendo Kari pelo seu cheiro, igual ao do apito, que ela identifica como algo reconfortante.
Gostei desse pormenor. Na “vida real”, o olfacto desempenha um papel importante na memória e nas emoções. Faz sentido, assim, que o olfacto tenha sido fulcral para uma das reaproximações entre Digimon e respetivo Escolhido.
Outro momento de que gostei foi de ver Motimon fascinado por Izzy, pelo seu computador e pelas coisas que sabe. Faz lembrar o discurso de despedida de Tentomon, em Kokuhaku.
Na verdade, quase toda a gente parece dar-se relativamente bem com os seus companheiros Digimon. Demasiado bem, segundo alguns fãs, que esperavam mais dificuldades aquando do reencontro. Eu, por um lado, concordo. Aliás, mais à frente falarei sobre possíveis ângulos que podiam ter sido explorados.
Por outro lado, já no início de Adventure, Digimon e Crianças Escolhidas não demoraram muito a tornar-se amigos do peito. Mesmo os iniciais atritos entre Joe e Gomamon resolvem-se no episódio da estreia de Ikkakumon. Porque não haveria de acontecer o mesmo agora?
Apenas Sora e Yokomon não se entendem à primeira. Para além de começar literalmente com o pé errado, Sora tenta retomar as coisas exatamente no ponto em que tinham terminado, aquando do Reinício – ao invés de, tal como os amigos estavam a fazer, em graus diferentes, ir-se aproximando devagar, dando tempo a Yokomon para se habituar a ela.
Sem surpresas, as atitudes de Sora afastam Yokomon.
Isto é consistente com o que vimos no final de Kokuhaku – Sora deprimida no rescaldo do Reinício, precipitando-se para Yokomon ao reencontrá-la. E esta atitude mais compreensível se torna quando… ninguém parece reparar no que se passa com Sora. Estão todos habituados a ter Sora como mamã do grupo – que, ainda por cima, trouxe uma refeição completa para toda a gente – mas ninguém lhe retribui o favor. Byomon era, literalmente, a única que dava apoio a Sora, mas agora rejeita-a.
Eu gostava que este conflito relativamente ao papel de Sora nos Escolhidos tivesse sido melhor desenvolvido ao longo do filme. Infelizmente, só se explora a relação entre esta e Tai e Matt – o Tri-ângulo amoroso, como chegou a dizer o António do Obaiba Memorial Day. E esta linha narrativa nem sequer tem uma conclusão satisfatória, conforme veremos mais à frente.
Havemos de voltar a Sora. Para já, falemos de outro arco narrativo relevante de Tri. Pouco após o primeiro encontro entre os Escolhidos e os seus companheiros Digimon, Meicoomon aparece perante o elenco lavada em lágrimas, perguntando por Meiko. Antes que os Escolhidos pudessem reagir, Meicoomon foge de novo para as distorções. Tai vai atrás dela – de notar que ele hesita por um segundo – mas não consegue apanhá-la.
Para os Escolhidos, esta é a primeira prova de que o Reinício não funcionou como o previsto – Sora, sem surpresa, é a que reage pior à descoberta. Os miúdos pensam em ir à procura de Meicoomon, mas Tai, ao imício, não parece ter muita vontade. Não é admirar que o jovem sinta algum rancor para com Meiko e Meicoomon. Afinal de contas, elas foram parcialmente responsáveis pelo Reinício – e, conforme veremos mais à frente, Tai não está assim tão satisfeito com a situação. O facto de Meicoomon não ter perdido as suas memórias não ajuda. Suspeito, aliás, que este possível ressentimento venha a ser relevante no futuro… mas estou a adiantar-me. Por agora, o grupo decide ser leal para com Meiko e procurar o seu Digimon.
No entanto, os Escolhidos não chegam a levar a cabo esse plano. Já veremos porquê. Para já, durante a primeira noite que o elenco passa no Mundo Digital, temos uma cena dedicada ao Tri-ângulo amoroso.
É um aspeto caricato deste filme: Sora não tem um único momento a sós com Matt ou a sós com Tai. Os dois aparecem sempre juntos perante ela, como gémeos siameses. Até em momentos em que Sora dá uma de donzela indefesa, Soshitsu foi ao extremo de pôr os dois atirando-se para a frente de um ataque para protegê-la. A ideia que fica é de que os digi-guionistas estavam cheinhos de medo de favorecer um dos vértices do Tri-ângulo amoroso relativamente ao outro – e imagino que isso tenha levado muitos shippers à loucura.
Com tudo isso, tenho visto mais sinais favoráveis a um casal Tai-e-Matt – e não me parece que seja essa a intenção dos digi-guionistas.
Quando Sora se afasta do grupo, Tai e Matt vão atrás dela. Tentam consolá-la mas, de uma forma hilariante, não têm jeitinho nenhum para isso. Tai é um pouco pior, conforme provado pelo vídeo acima – é por estas e por outras que ela, no fim, não se casa contigo, Yagami!
Outro momento delicioso é quando Matt pensa em pedir conselhos a… T.K. A imagem de T.K. ensinando o seu onii-chan, Tai e talvez Izzy a falar com raparigas é irresistível…
É também nisto que está a força de Tri. Aquando de Adventure, quem imaginaria que o bebé do grupo se tornaria a referência em termos sentimentais dos Escolhidos?
Piadas à parte, é um bocadinho triste que nem Tai nem Matt nem nenhum dos outros Escolhidos – amigos de infância de Sora, recordemo-nos – não tenham, ao que parece, reparado que Yokomon/Byomon estava um pouco afastada de Sora e do grupo em geral. Ainda se pode perdoar que dois rapazes de dezassete anos tenham dificuldade em consolar uma rapariga da idade deles – sobretudo se nutrirem sentimentos românticos por ela. Mas é preciso ser-se muito egocêntrico para não se reparar no que se está a passar à frente dos olhos. O mais certo, contudo, é estarem tão habituados a ter Sora tomando conta de toda a gente que não lhes ocorreu que talvez ela precisasse de alguém que se preocupasse com ela.
Sora está perfeitamente ciente disso e, tal como eu tinha previsto, despeja o saco. Atira à cara dos rapazes todas as vezes em que eles andaram às turras um com o outro e ela teve de apaziguá-los. Infelizmente, antes que Sora pudesse dar o golpe de misericórdia, mandando-os dar banho aos… bem, aos respetivos parceiros Digimon, suponho eu (não que Agumon precisasse), Mugendramon/Machinedramon interrompe a cena.
Falaremos sobre o que acontece a seguir da próxima vez. Obrigada pela vossa visita. Continuem ligados!
Segunda parte da análise a Kokuhaku (primeira parte aqui).
1) Spoilers: as entradas desta série terão inúmeras revelações sobre o enredo do primeiro, segundo e terceiro filmes de Digimon Adventure Tri e, possivelmente, dos enredos de Adventure e 02. Leia por sua conta e risco.
2) Alguns conceitos próprios desta série animada têm traduções controversas - na língua portuguesa, têm mais do que uma possível. Neste texto, vou adotar as traduções com que estou mais familiarizada e/ou que considero mais adequadas.
3) Apesar de as legendas do filme usarem os nomes japoneses das Crianças Escolhidas, eu vou usar as versões americanizadas dos nomes, visto que estou mais habituada.
O último dos cinco episódios em que Kokuhaku foi dividido assemelha-se, nalguns aspetos a um epílogo. Há quem diga que esta parte podia ter sido emitida separadamente, mais ou menos a meio entre a exibição do terceiro e do quarto filmes, em jeito de episódio especial. Faria sentido, se mudassem um ou outro pozinho. Mas, se já agora ficámos todos arrasados com Kokuhaku, imaginem como ficaríamos se tivesse acabado no quarto episódio. Não, Kokuhaku não podia terminar assim. Não sobreviveríamos aos cinco meses até ao próximo filme.
Este episódio ocorre uma semana após o Reinício. Vemos os Escolhidos em depressão, como seria de esperar, tentando processar o que aconteceu. Pelas palavras de Maki, percebemos que o que se espera é que os Digimon sejam rapidamente esquecidos pela população e que os Escolhidos continuem as suas vidas, como se nada tivesse acontecido, como se nunca tivessem conhecido os Digimon. Que, em suma, cresçam.
Essa será também uma indireta para nós, a audiência? Nós que estamos aqui, vendo a continuação de algo que marcou a nossa infância?
Izzy é o primeiro a revoltar-se contra essa ideia. Quando T.K. desabafa com ele por não ter conseguido evitar aquele desfecho, o amigo chega mesmo a dizer “Não interessa o que não conseguiste fazer, interessa o que vais fazer agora.” Os amigos, de início, recusam mas, no fim, concordam. Eles podiam ter optado por fazer o mesmo que os seus Digimon tinham sido obrigados a fazer: viver como se nada tivesse acontecido, como se Adventure e 02 tivessem sido apenas sonhos. Mas não o fizeram. Eles escolheram honrar tudo aquilo por que passaram ao longo dos anos com os seus Digimon e voltar ao Mundo Digital mais uma vez.
Isto é significativo. Pode-se argumentar que, desde o primeiro de agosto de 1999, os miúdos apenas têm reagido ao que lhes acontece. Nunca escolheram eles mesmo irem ao Mundo Digimon pela primeira vez; foi uma outra entidade (a Homeostase?) que, quase literalmente, pegou nos miúdos e os atirou para o Mundo Digital. Noutras ocasiões (incluindo os miúdos de 02), eles puderam escolher se regressavam ou não, mas era sempre sabendo que o Mundo Digimon precisava deles. Até àquele momento, Tri tinha seguido essa regra: coisas acontecem, os Escolhidos intervém (ou recusam-se a fazê-lo, como Tai e, sobretudo, Joe).
Esta será a primeira vez que os Escolhidos regressam sem serem solicitados (a menos que considerem uma solicitação o som de um apito que Tai ouve, no momento em que decide regressar. Mais sobre isso adiante.). Tanto quanto sabem, o Mundo Digimon não precisa deles, não tem nada para eles – os seus Digimon, provavelmente, nem sequer se lembram deles. A partir de agora, eles não são heróis porque a Homeostase ou outra entidade semelhante os Escolheram. Eles são heróis porque eles Escolheram sê-lo.
O que nos remete para os primeiros teasers relacionados com Tri. Neste vídeo, aparece Tai perante Agumon dizendo: “Finalmente reencontrei-te. Este mundo escolheu uma realidade e um futuro que não deveria ter escolhido. E é por essa razão que eu aqui estou.” Conforme apontaram aqui, depois de Kokuhaku, estas palavras fazem muito mais sentido. Além de que o primeiro poster de Tri parece ter como cenário mais ou menos o mesmo local onde os Escolhidos reencontram os seus Digimon, no fim do terceiro filme. Talvez tenha sido essa a intenção dos digi-guionistas desde o início: mostrar que, mesmo com as suas crises existenciais, mesmo que tenham uma hipótese se se afastarem de tudo aquilo e seguirem em frente, as eternas Crianças Escolhidas nunca virarão costas ao Mundo Digimon.
Não terá sido por acaso que, no momento da decisão, toca Butterfly pela primeira vez em todo o filme (tirando, obviamente, os genéricos dos episódios). Butterfly é a canção que tocava nos genéricos da primeira temporada de Digimon, é a música que associamos ao início da aventura. Até a própria letra se adequa à situação: os Escolhidos vão tentar colocar de lado os seus próprios traumas e inseguranças, pegar em asas pouco firmes e voar aos encontro dos seres que amam.
Mas estou a adiantar-me, pois existem ainda assuntos por resolver antes de eles regressarem. Falo de Meiko. Tendo ela uma experiência diferente como Escolhida, é natural que as suas atitudes difiram das dos amigos. Meiko revela a T.K. que sabia que Meicomoon estava Infetada desde o momento em que a encontrou. Isto explica os traços de relacionamento mãe-galinha e criança insegura que notei em Ketsui. Ao perceber que existia alguma coisa de errado com Meicoomon, era natural que Meiko se tenha tornado demasiado protetora da sua companheira Digimon. Da mesma forma, também era natural que Meicoomon desenvolvesse a tendência para vaguear, embora não soubesse tomar conta de si mesma.
Tudo poderia ter sido evitado caso Meiko tivesse sido sincera para com os outros Escolhidos desde o momento em que Meicoomon matou Leomon. E, no entanto, da mesma maneira como se compreendeu a omissão da infeção de Patamon por parte de T.K. e a omissão do Reinício por parte dos Digimon, também se compreende esta omissão por parte de Meiko. Não me orgulho disso mas eu, provavelmente, teria feito o mesmo se estivesse no lugar dela.
Ando, aliás, a identificar-me cada vez mais com ela. Meiko é a miúda nova, acabada de se mudar para a cidade, sem grande aptidão para socializar. Tal como referi anteriormente, os outros Escolhidos foram impecáveis com ela, desde o primeiro momento. Como alguém que não faz amigos facilmente, posso testemunhar o quão tocantes são gestos como Mimi defendendo-a das perguntas de Izzy, Sora oferecendo-lhe literalmente um ombro onde chorar, T.K escolhendo-a para confidenciar acerca de Patamon. Com que cara ia Meiko dizer que a sua inclusão no grupo, todos os gestos de carinho a ela dirigidos e a Meicoomon, tinham sido precisamente aquilo que, passe a expressão, os lixou a todos?
Desse modo, é compreensível que Meiko não se sinta no direito de ir ao Mundo Digital e voltar a ver Meicoomon. Não só por se sentir responsável por tudo o que aconteceu até ao momento em Tri, mas também porque sente que, ao menos agora, livrou-se do fardo de ter de manter Meicoomon sobre controlo. O que ao mesmo tempo a alivia… e lhe aumenta ainda mais o sentimento de culpa.
Se houve coisa que aprendemos com o arco narrativo de Joe em Ketsui é que, independentemente dos nossos problemas pessoais, das nossas neuroses, não viramos costas aos nossos Digimon. É essencialmente isso que T.K. diz a Meiko antes de partir, bem como o facto de ela continuar a ser bem-vinda no grupo (a meio da conversa com Meiko, T.K. ouve o mesmo som de um apito que Tai ouvira antes). E, de facto, Meiko acaba por mudar de ideias mas, quando procura ir ter com os amigos, estes já partiram.
É possível que Meiko, a certa altura, vá ter com os outros Escolhidos ao Mundo Digital. Por outro lado, talvez ela opere como Escolhida a partir do Mundo Real, sozinha ou em colaboração com Daigo, Maki e/ou o seu pai.
Gostava de comentar o facto de os oito terem partido para o Mundo Digital envergando os respetivos uniformes escolares. Não sou de todo fã da ideia. Uma das coisas que mais gostava em Adventure eram os looks diferentes de cada um dos miúdos, a forma como estes refletiam as personalidades e os Cartões de cada um (talvez um dia escreva sobre isso). Há uns meses, aliás, um post no Tumblr fez-me pensar na roupa que usaria no Mundo Digital, se pudesse escolher (é outro possível tema para um texto: o que levaria comigo se visitasse o Mundo Digimon). Camisas brancas (que se sujam facilmente), gravatas ou lacinhos, saias plissadas ou calças de fazenda seriam as minhas últimas escolhas (exceptuando vestidos de gala e saltos agulha). Custa-me a acreditar que os miúdos tenham escolhido essas roupas, sobretudo quando eles estavam já de férias. O motivo mais provável é, pura e simplesmente, o fetiche que a animação japonesa tem por uniformes escolares.
Pouco depois de regressarmos ao Mundo Digital, dá para ver que algo não bate certo. Tanto Izzy como Kari percebem-no. Nós, a audiência, vemos ligeiras corrupções na paisagem. Cedo, reencontramos Alphamon, desta feita lutando contra Jesmon (que, segundo consta, é a forma digievoluída de Hackmon, o Digimon que tem aparecido amiudadas vezes ao longo de Tri, seguindo os acontecimentos à distância. Será o mesmo?). Conforme os próprios Escolhidos assinalam, com o Reinício aquilo não deveria ser possível. Das duas uma: ou eles os dois morreram, renasceram e algo os fez passar do nível Bebé para Extremo em pouco mais de uma semana; ou o Reinício não os afetou, por um motivo ou por outro. Pessoalmente, aposto mais na segunda hipótese, tendo em conta algo de que falaremos adiante.
O som de um apito desvia-lhes as atenções. Acabam por encontrar o Tokomon brincando com o apito que Kari deixara a Gatomon, no fim de Adventure. Pergunto-me se é o mesmo som que T.K. ouviu durante a conversa com Meiko. Consta que o apito de Kari já desempenhou um papel importante anteriormente, na parte de Digimon, o filme, que serve de prequela a Adventure. É possível que, como sugerem aqui, que este som tenha cruzado os mundos e chegado aos ouvidos de, pelo menos, T.K.
De qualquer forma, enquanto Tokomon brinca com o apito, os outros Digimon juntam-se a ele, todos na forma de Bebé, todos sem reconhecerem nenhum dos Escolhidos.
Mesmo tendo em conta tudo o que escrevi antes, sobre os nossos heróis estarem a escolher o seu próprio destino, em vez de ser o oposto, a amnésia dos Digimon não deixa de doer. E muito. Atrevo-me a dizer que a cena da morte deles, aquando do Reinício, doeu menos que a cena do reencontro. O contraste entre a inocência dos Digimon Bebés e a dor dos Escolhidos – Sora, por exemplo, mal se conseguia controlar. É Izzy quem encontra as palavras certas. Baseando-se nas últimas palavras de Tentomon, o jovem pede aos Digimon Bebés que lhes sirvam de guias.
Deixando as emoções um pouco de lado, tenho uma infinidade de perguntas sobre a situação atual, sobre as consequências da amnésia dos Digimon. No início de Adventure, os Digimon reconhecem os respetivos companheiros pelo nome próprio. É certo que, supostamente, os Digimon já teriam conhecido os seus companheiros humanos uns anos antes dos eventos de Adventure. No entanto, Gatomon foi separada dos outros ainda antes de nascer e, mesmo assim, sempre soube que lhe faltava qualquer coisa, que estava à espera de alguém. Nada disso acontece desta vez, aparentemente. Não existiu nenhum indício de ligação especial dos Digimon para com os seus companheiros humanos. Não sei se a digievolução será, sequer, possível nestas circunstâncias.
Sabemos, no entanto, que no próximo filme estrear-se-á o Hououmon/Phoenixmon (acerca do qual falei há relativamente pouco tempo, noutras circunstâncias), logo, de alguma forma, a digievolução será possível, pelo menos para Yokomon. E a verdade é que só vimos os Escolhidos com os seus Digimon amnésicos durante um minuto ou dois. Pode ser que o instinto protetor que os caracteriza se manifeste, mais cedo ou mais tarde. Uma trama possível para próximo filme poderia envolver os Escolhidos colocando-se deliberadamente em perigo, numa tentativa de despoletarem esse instinto – estilo o que Tai fez no segundo arco de Adventure, quando quis forçar Greymon a desbloquear o nível Perfeito/Super Campeão. Por outro lado, todos se recordam que o truquezinho de Tai falhou epicamente – Sora chegou a referi-lo na primeira metade de Kokuhaku. Duvido que os Escolhidos tentem repetir a gracinha, a menos que estejam desesperados.
Também é possível que os Digimon recuperem as memórias, sobretudo se se vier a descobrir que o Reinício não funcionou como se esperava. Do ponto de vista narrativo, fazerem isso logo no próximo filme corre o risco de parecer demasiado fácil, um deus ex-machina. Não que me pareça muito mais plausível que um Yokomon amnésico se afeiçoe a Sora o suficiente para atingir vários estágios de digievolução até chegar a Phoenixmon em apenas um filme (e daí não sei… em Adventure, Byomon começou a adorar Sora como um cachorrinho logo nos primeiros episódios).
Voltaremos a este assunto mais à frente. Antes, temos de falar sobre as últimas revelações de Kokuhaku. Nos instantes finais, descobrimos que Meicoomon se lembra de Meiko (pelo menos sabe o nome dela); que o Imperador Digimon é, na verdade, Gennai sob disfarce (whoa!); que Maki consegue vir ao Mundo Digimon (como? Só as quatro bestas sagradas saberão – se não tiverem sido afetadas pelo Reinício) e, aparentemente está a trabalhar com Gennai.
Eu, sinceramente, não sei muito bem o que pensar acerca de Maki. Em diversas alturas, ela podia ter evitado certos eventos que tiveram como consequência o Reinício – nomeadamente quando optou por não dizer a verdade sobre Meicoomon aos Escolhidos – mas não o fez. Ao contrário do que se poderá dizer acerca de outras personagens em Tri, acho que Maki sabia perfeitamente o que estava a fazer, quais seriam as consequências das suas ações. Se ainda é prematuro chamar-lhe vilã, eu diria que podemos definitivamente considerá-la uma antagonista: alguém que tem agido contra os interesses dos heróis. Muitos fãs dizem que Maki será, provavelmente, a típica vilã incompreendida. É possível, mesmo provável. O meu problema é que não consigo perceber qual é o objetivo dela, porque é que ela tem tomado as decisões que tomou até agora. Do meu ponto de vista, as motivações de Maki são a maior incógnita de Tri até ao momento. Assim, não consigo simpatizar com ela. Não quando as suas ações causaram tão sofrimento a personagens que conheço e adoro desde os meus onze/doze anos.
De uma coisa podemos ter a certeza: Maki está do lado de Gennai, que parece ter passado para o lado negro da Força (pergunto-me se a bolinha preta que Piedmon lhe enfiou nas costas, nos flashbacks mostrados no último arco de Adventure, terá alguma coisa a ver com isso). Isto faz-me suspeitar que a Homeostase esteja, também, corrompida – daí ter recorrido ao Reinício e ele não ter corrido como o previsto. Se isso se confirmar, se a própria entidade que mantém o equilíbrio do Mundo Digimon está comprometida, os Escolhidos tem um imbróglio daqueles entre mãos.
No meio disto tudo, também não sabemos que papel tem o Alphamon nesta história toda. Antes, pensava que o tal Huckmon estava a trabalhar com ele e que os dois, sabendo que Meicoomon está na origem disto tudo, andavam atrás dela (no Digimon Wikia diz que o Huckmon é muito sensível à estabilidade do Mundo Digital). A luta entre Jesmon e Alphamon, no fim de Kokuhaku, contradiz essa teoria. Assim, faz mais sentido que ele esteja a trabalhar para Gennai, como explicam aqui.
E, claro, os 02 continuam desaparecidos em combate. A minha suspeita é que Maki tem-nos aprisionados algures – daí possuir o D-3 e o D-Terminal de Ken. Às tantas esse seria o destino mais desejável. Num cenário alternativo, eles estariam no Mundo Digimon aquando do Reinício… o que não me parece nada agradável. Outra questão que se coloca diz respeito ao efeito que o Reinício terá tido nos outros Escolhidos espalhados pelo mundo, que conhecemos em 02.
Todas estas perguntas que continuam por responder deixaram vários fãs insatisfeitos com Kokuhaku. Ainda que compreenda esse ponto de vista e me tenha fartado de me queixar do mesmo na análise a Ketsui, desta feita não acho que isso seja tão grave. Ao contrário dos filmes anteriores, em Kokuhaku aconteceram coisas, a história avançou – finalmente. Além disso, perguntas por responder são a definição de tensão numa história, aquilo que nos faz virar páginas num livro, ficar vidrado no ecrã durante um filme ou o episódio de uma série. Se todas as perguntas estivessem respondidas nesta altura do campeonato, em que Tri vai a meio, qual era o interesse de vermos os três próximos filmes?
Acho, aliás, que Kokuhaku é o melhor filme de Tri até agora. Como referi no parágrafo anterior, tivemos avanços significativos na narrativa. Mas, mais do que outra coisa, Kokuhaku apostou naquilo que sempre foi o ponto forte de Digimon: as suas personagens. T.K. e Izzy destacaram-se, sim, mas, ao contrário do que aconteceu em Ketsui, todos os Escolhidos tiveram o seu momento (tirando Kari, que continua a ser pouco mais que uma espécie de mensageira divina). Com as voltas que o enredo deu, era inevitável – isto não é uma menorização, pelo contrário. Estão a ver as coisas boas que acontecem quando não perdemos tempo com visitas a termas e festivais culturais, digi-guionistas?
Kokuhaku, aliás, apostou muito no drama, ao ponto de deixar-me emocionalmente arrasada durante pelo menos três dias – não me lembro de alguma vez ter ficado assim por causa de um trabalho ficcional. Não cheguei a chorar porque não consigo, vai além disso. Ainda hoje me custa rever certas cenas. O facto de eu conhecer estes Escolhidos e os seus Digimon desde miúda predispôs-me para estas reações, sim. No entanto, só prova que que os digi-guionistas fizeram as coisas bem desde o início: criaram um elenco de jovens protagonistas bem construídos, com qualidades e defeitos, com quem sempre nos identificámos. Estes tornaram-se reais para nós, velhos amigos de infância. O único outro elenco em que algo semelhante aconteceu comigo foi o de Harry Potter – o que é significativo, tendo em conta que, desde miúda, me farto de consumir ficção. Os digi-guionistas merecem louvores por isso.
Por outro lado, o maior defeito de Tri tem sido, até agora, o ritmo da história – como referi no início da análise, o tom mudou demasiado de repente entre Ketsui e Kokuhaku. Se já não tinha gostado assim muito do segundo filme quando este saiu, a comparação com o terceiro fá-lo parecer ainda pior. Quero acreditar que os próprios guionistas deram por isso, daí terem prolongado o intervalo de lançamento entre Ketsui e Kokuhaku.
O próximo filme de Tri sai no dia 25 de fevereiro do próximo ano. Eu estava com esperanças de que saísse um mês antes, mais coisa menos coisa, mas desta vez não me importo com o longo intervalo. A espera por Kokuhaku acabou por não me custar assim muito – o Euro 2016 e Pokémon Go ajudaram. Além disso, conforme comentou comigo o António da página Odaiba Memorial Day em Portugal (mais sobre isso já a seguir), quanto menores os intervalos entre os lançamentos dos filmes, mais depressa Tri acabará. Como não quero que acabe demasiado depressa, tão cedo não me torno a queixar – sobretudo se isso permitir aos produtores elevarem a qualidade dos filmes, como aconteceu do segundo para o terceiro. Por outro lado, se o intervalo se mantiver, talvez o quinto filme saia perto do Odaiba Memorial Day do próximo ano.
O quarto filme chamar-se-á Soshitsu, que significa Perda – ou seja, não ficaremos por aqui em termos de drama, ao que parece. No poster aparece Sora com Phoenixmon, bem como Tai e Matt, o que tem levado muita gente a pensar que vamos ter um triângulo amoroso. Eu, muito sinceramente, espero que não pois, como já disse várias vezes cá no blogue, não quero que Sora seja reduzida a interesse amoroso. Além de que existem possíveis linhas narrativas envolvendo a jovem bem mais interessantes.
Conforme referi antes, Kokuhaku mostra Sora abraçando por completo o seu estatuto de mamã do grupo, tomando conta de toda a gente. O Reinício, no entanto, tirou-lhe a única criatura que tomava conta dela e, como se pode calcular do seu comportamento quando reencontrou Yokomon, Sora não está bem. Conforme explica este post no Tumblr, no pós-Reinício, antes da ida para o Mundo Digimon, vemos Sora na cama, fitando o seu telemóvel com um olhar vazio – o telemóvel através do qual falava com os amigos todos, certificando-se de que estavam bem. Não sendo ela capaz de tomar conta de si mesma ou, se calhar, de aceitar a ajuda de outros, como poderá ela tomar conta de toda a gente? Não me admiraria se o seu arco em Soshitsu se baseasse nessa ideia: Sora incapaz de cumprir o papel que impôs a si mesma de mamã do grupo e odiando-se por isso.
De qualquer forma, estou muito feliz por, aparentemente, a minha personagem preferida ir receber tempo de antena de que precisava há muito. Digi-guionistas, por favor, não estraguem isto.
Por outro lado, o facto de, agora, estarmos no Mundo Digimon promete. Gosto muito de ver Digimon no Mundo Real, os jovens conjugando as suas vidas normais com os seus deveres como Escolhidos. No entanto, é quando estes estão confinados ao Mundo Digimon, à companhia uns dos outros, sem poderem fugir às adversidades, que as suas personalidades se revelam, que surgem os conflitos, quer individualmente, quer uns com os outros. Estou curiosa relativamente à dinâmica do grupo agora, que passaram seis anos desde a última vez que estiveram juntos no Mundo Digimon durante mais do que algumas horas. Por exemplo, tenho quase a certeza que Tai deixará de ser o líder – Matt e Izzy têm mostrado muito mais espírito de iniciativa. Não me admirava, aliás, se fosse esse o motivo pelo qual Tai e Matt aparecem no poster de Soshitsu: os dois rapazes entrando em conflito a propósito da liderança do grupo. De qualquer forma, a segunda metade de Tri promete.
Eu sei que isto já vai mais comprido do que devia mas, antes de terminar, queria escrever sobre as celebrações do Odaiba Memorial Day deste ano, que incluíram um encontro de fãs portugueses no Parque das Nações. Eu estive lá, tal como desejava, mas não pude aproveitar como queria. Passei o dia quase todo preocupada com assuntos pessoais, perdi-me à procura do ponto de encontro (o stress não ajudou) e tive de sair mais cedo.
Tirando isso, gostei imenso da experiência. Houve, entre outras coisas, cantoria – incluindo este momento hilariante – mostra de dispositivos digitais e outros artefactos (como poderão ver, cheguei a usar o Cartão da Coragem para a foto de família – tenho de arranjar um, do Amor, para mim), batalhas entre digivices e o quiz. Cheguei a participar neste último mas, como só conhecia o universo de Adventure, o meu desempenho não foi brilhante – mas diverti-me à mesma!
Adorei conhecer outros fãs de Digimon, sobretudo o António (que organizou aquilo tudo) e o Danny d’A minha vida em bits. Gosto sempre de conhecer pessoas com as mesmas maluqueiras do que eu – apesar de a minha timidez ser quase incapacitante em circunstâncias como estas. Cheguei a imaginar o que aconteceria se, de repente, abrisse ali mesmo um portal para o Mundo Digimon e nos tornássemos todos Escolhidos, como funcionaríamos como grupo. O mais certo era eu colar-me ao António e ao Danny, aqueles que eu conhecia “melhor” (das emissões de rádio do primeiro, do canal de YouTube do segundo) e que, provavelmente, saberiam mais sobre Digimon do grupo (embora pudesse estar enganada). Foi uma boa experiência. Ainda é cedo para se falar do Odaiba Memorial Day do próximo ano mas, se o encontro se repetir e eu puder ir, vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para estar lá a hora e ficar até ao fim, sem distrações.
Tudo isto será, provavelmente, uma coincidência, mas ultimamente tem sido difícil “crescer”. Várias franquias que marcaram a minha infância e adolescência escolheram mais ou menos a mesma altura para fazerem uma espécie de renascimento. Pokémon voltou a estar na moda após Pokémon Go (embora a febre já tenha arrefecido). Saiu um novo “livro” do Harry Potter e temos Digimon Adventure Tri há quase um ano. (Além disso, começou a ser emitida em outubro uma nova série de Digimon: Digimon Universe Appmon. Ainda não vi porque, até agora, só vi Adventure e as suas sequelas. Se resolver explorar para além desse universo, começarei por Tamers). Tem sido, aliás, esse o principal tema de Tri: o “coming of age”, o conflito entre o passado e o futuro, entre infância e idade adulta.
Na minha opinião, o facto de continuarmos a regressar, outra e outra vez, a estes mundos que marcaram a nossa infância, não significa que sejamos todos criancinhas no corpo de adultos (pelo menos é o que gosto de pensar). Em vez disso, é mérito dessas franquias por terem sido capazes de nos manterem interessados ao longo de todos estes anos, por terem crescido connosco, evoluído connosco. Tenho a certeza que, no fim de Tri, os protagonistas descobrirão que, mesmo que cresçam, comecem a trabalhar, a constituir família, nunca deixarão de ser Crianças Escolhidas. Da mesma maneira, nós nunca deixaremos de ser Crianças Escolhidas, mestres Pokémon, alunos de Hogwarts. Ainda que isso só aconteça em livros, videojogos, em sites de transmissão de anime, em filmes ou na nossa imaginação. Mas, lá está, isso não significa que não seja real.
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