Digimon 02 #4 - Um líder ainda mais imperfeito
As Personagens são o grande calcanhar de Aquiles de 02. Não sei se é por mera nostalgia da minha parte, se é mesmo por má escrita nesta temporada ou por Adventure ter sido muito mais guiado pelo seu elenco de heróis mas, tal como insinuei antes, não gosto das Crianças Escolhidas em 02 da mesma maneira como gosto das suas antecessoras. Ainda agora, em Tri, ao ver o elenco de Adventures reunido de novo, reavivando cumplicidades, trocando picardias, diverti-me como em nenhum momento me diverti em 02.
No entanto, para ser justa, tenho de dizer que todas as Crianças Escolhidas nesta temporada tiveram, pelo menos, um momento que me agradou.
Vou começar pela personagem de que gosto menos. Davis é o líder do grupo, nomeado por Tai que lhe confia os seus icónicos óculos. Porém, apesar de Tai ter sido um líder imperfeito, Davis é uma fraca imitação dele. Em termos de personalidade, é muito semelhante ao antigo líder - alegre, extrovertido, entusiasta, impaciente. No entanto, para além disso, é exasperantemente fútil e oco e, ao contrário do que aconteceria em Adventures, esses defeitos não são corrigidos. A maior prova da superficialidade de Davis é a maneira como desbloqueia a Digievolução para nivel Campeão: obrigando o seu companheiro, Veemon, a Digievoluir para impressionar Kari, por quem nutre uma irritante paixoneta.
O mais triste? Davis consegue a Digievolução. Quando Tai tentou fazer o mesmo, por motivos bem mais legítimos que tentar conquistar uma rapariga (a irmã de Tai, por sinal), a coisa correu horrivelmente mal, mas com Davis não.... Nem no Mundo Digimon há justiça!
Eu, sinceramente, dispensava esta atração de Davis por Kari. Em Adventures, nunca houveram paixonetas (tirando uns Digimons que queriam sair com Mimi... *arrepios*) e vejo agora que era uma coisa boa. Há histórias em que ligações românticas não acrescentam nada. A ideia que fica é que puseram Davis a perseguir Kari só para que a personagem tivesse algo que fazer quando não liderava as Crianças Escolhidas.
Na verdade, a superficialidade de Davis, longe de corrigida, chega a ser recompensada. Personagens como Yolei e Cody têm uma certa tendência para cederem ao desespero e desistirem de lutar, precisando de Davis para obrigá-las a continuar, em parte por coragem legítima, em parte porque... ele não pensa muito nas coisas. No final de 02, no Mundo dos Sonhos, quando as Crianças Escolhidas estão demasiado assustadas para lutarem, Myotismon (que adota a forma de MaloMyotismon) encerra-as numa realidade ilusória, em que os seus maiores desejos se realizaram. Davis é o único em quem a ilusão não funciona, pois ele não tem problemas nenhuns, é uma criança satisfeita e feliz, não deseja mais nada que não fazer o seu trabalho como Criança Escolhida. De certa forma, é realista. A ideia que eu tenho é que as pessoas de mente mais simples, sobretudo crianças, de uma maneira geral, costumam ser mais felizes, ao contrário do que acontece as mais inteligentes. No entanto, a verdade é que pessoas cem por cento felizes e satisfeitas não dão grandes personagens.
Uma coisa admito: teve piada quando, num final bastante sombrio, perguntaram a Davis qual era o seu maior sonho e ele saiu-se com:
- Quero ter um restaurante italiano!
De qualquer forma, Davis redime-se aos melhos olhos pelo seu apoio a Ken, quando este tentava reconstruir a sua vida e redimir-se dos seus feitos como Imperador Digimon. Não sei se isto é por mera ingenuidade, não sei se é esta a prova de que Davis merece o Digiovo da Amizade (o episódio em que ele o obtém não convence), mas ele é o primeiro a perdoar Ken e eu respeito-o por isso. Aliás, ambos conseguem a Digievolução ADN quando Davis diz a Ken para parar de ter pena de si próprio e o dissuade de se sacrificar pelo Mundo Digital. Se Davis não lhe tivesse estendido a mão, Ken não teria saído do buraco onde caíra - só por isso, este líder pouco dotado e, por vezes, irritante, merece louvores.