Hayley Williams – Petals For Armor (2020) #3
Terceira parte da análise a Petals For Armor. Podem ler as partes anteriores aqui e aqui.
Vamos agora começar a falar sobre a terceira parte do álbum, a tal que representa a fase da borboleta. Esta é a parte mais homogénea das três – tirando Watch Me While I Bloom, todas as faixas são canções de amor, todas sequelas maduras a The Only Exception, de uma forma ou de outra. Não surpreende que estas músicas tenham sido lançadas todas de uma vez, com o resto do álbum. São muito parecidas umas com as outras, talvez até demasiado parecidas, não fazia sentido individualizá-las.
Suponho que o elefante na sala seja o novo amor na vida de Hayley, depois do divórcio. Não se sabe se é o mesmo referido em Sudden Desire e Why We Ever – se ela conseguiu reparar a relação que sabotou – ou se é outro homem. Pessoalmente inclino-me para a primeira hipótese, mas é um mero palpite, não tenho nada em que me basear.
Hayley tem explicado muito sobre as músicas deste álbum, mas não revelou a identidade do seu novo companheiro. Não tem essa obrigação. A filosofia Petals For Armor é muito bonita e tal, mas quando envolve outra pessoa o caso muda de figura (aqui entre nós, já é um bocadinho questionável não conhecermos a perspetiva do ex no que toca ao casamento falhado).
Quase toda a gente diz que é o Taylor. Eu sinceramente espero que não. Em parte porque, da última vez que ela namorou um companheiro de banda, a coisa correu mal (é certo que Hayley e Taylor já não são adolescentes… mas mesmo assim).
Enfim. Quando Hayley e o namorado estiverem para aí virados (isto se não tiverem acabado entretanto), logo anunciam a relação. Eu pessoalmente não tenho pressa em saber.
Pure Love, que abre a terceira parte, parece uma resposta direta aos erros cometidos aquando de Why We Ever (isto é, segundo o contexto dado por Hayley). Uma vez mais, musicalmente é guiada pelo baixo e pela bateria, com um ritmo interessante. Quando começam os vocais começa também o teclado (é Hayley quem o toca, pelo menos uma parte. Gosto em particular das notas claras no refrão, a condizer com os agudos (menos polidos, sobretudo nos últimos refrões) de Hayley.
A letra de Pure Love é essencialmente a filosofia Petals For Armor aplicada ao romance. Essencialmente, para fazer o seu amor resultar, Hayley teve de aprender a deixar cair os muros, a ser vulnerável, a ser forte em vez de impermeável, como vimos antes. Hayley está disposta a fazer a sua parte para que a relação resulte (“I give a little, you give a little”).
No refrão, Hayley fala em ser “experimental”. Segundo ela, é no sentido de descobrir como é ter uma relação adulta e saudável – a primeira da sua vida – ultrapassando o seu medo de intimidade. Também admitiu que pode ser interpretado no sentido sexual, mesmo não tendo sido essa a sua intenção quando escreveu a letra – iria em linha com o tema de Sudden Desire, na minha opinião.
Quase todas as músicas desta parte do álbum andam à volta deste tema. Fazem-me lembrar o casal Emma e Hook em Once Upon a Time. Não foi por acaso que me lembrei dela, entre outras personagens, quando Hayley apresentou a filosofia Petals For Armor. Lá está, o romance Captain Swan foi apenas a faceta romântica da coisa – foi, aliás, o último muro a cair.
Taken é muito parecida com Pure Love, parecendo quase uma continuação desta última. A instrumentação é praticamente a mesma: baixo, percussão, teclados (ainda que estes últimos só apareçam no refrão). Tem no entanto notas de guitarra que lhe dão um toque de blues – eu gosto. A melodia é mais grave, sem os agudos de Pure Love.
Mesmo a letra acaba por entrar em territórios parecidos, de uma forma mais vaga até. Fala sobre acreditar de novo no amor, estar disposta a arriscar, tornar oficial: Hayley já não está o mercado. Acrescenta pouco a um álbum que já tem Pure Love e Crystal Clear.
Não me interpretem mal, eu gosto de Taken – gosto do ritmo e das influências de blues. No entanto, se tivesse de retirar uma faixa a Petals For Armor, retirava esta – na minha opinião, seria a única em que não se notaria a falta.
Sugar on the Rim é uma das músicas mais divertidas e experimentais de todo o álbum. Está entre as minhas preferidas. Claras influências disco nos sintetizadores, os vocais meio artificiais repetindo “sugar on the rim”, o tom algo sexy. Definitivamente nada compatível com o que os Paramore fariam.
O título da música vem de uma técnica de preparação de cocktails, em que se fixa açúcar na borda no copo para enfeitar ou alterar o sabor de uma bebida. Brian uma vez fez isso com uma margarita durante um almoço com Hayley (com margaritas é mais comum usar-se sal), dando a ideia para esta canção.
Esse açúcar na borda do copo serve de metáfora (bem… comparação, se quisermos ser rigorosos) para o amor, a alegria que contrabalança com a infelicidade. Ao contrário do Rose Colored Boy, não ignora o lado negro da vida – pelo contrário, Hayley fala em brincar com as sombras, diz que não tem medo do escuro. As coisas boas são suficientes para aguentar as coisas más – no final, doce é o sabor que fica nos lábios (pode também ser uma referência ao amargo em Leave it Alone).
Por outro lado, Hayley revelou que esta canção também é dedicada à comunidade gay. Suponho que seja por causa do “rimming” (vão ao Google… não em público, atenção!). Mas também a parte da vergonha e de viver escondido é algo com que, infelizmente, muitos da comunidade LGBT se poderão identificar.
É um conceito original e uma música muito gira. Se algum dia Hayley conseguir levar este álbum aos palcos, Sugar on the Rim será um ponto alto.
Watch Me While I Bloom é a única música nesta parte do álbum que não é uma canção de amor. Funciona um pouco como uma sequela a Rose/Violet/Lotus/Iris no sentido em que usa de novo metáforas florais – sobretudo na parte do “I myself was a wilted woman (...) forgot my roots, now watch me bloom”.
É sobretudo a canção de vitória de Hayley, que depois dos anos mais difíceis da sua vida, voltou a ser quem era, sente emoções boas de novo. Uma Tell Me It’s Okay mais madura. Hayley está pronta para sair do seu casulo, para desabrochar, para mostrar um novo lado de si mesma.
A música começa precisamente com “How lucky I feel to be in my body again” – aquilo que falámos antes sobre contacto com o próprio corpo. Por outro lado, ninguém me convence que o verso “Big invisible spark” não é uma referência a Let the Flames Begin, Part II e em particular Last Hope.
Hayley tem chamado a atenção para os versos “If you feel like you’re never gonna reach the sky ‘til you pull up your roots, leave your dirt behind, you’ve got a lot to learn”. Temos muito a tentação de esperar que a nossa vida esteja perfeitamente resolvida, com as pontas todas atadas, antes de irmos atrás do que queremos. Ou de achar que o processo é linear, que nunca daremos passos atrás.
Ora, a vida não funciona assim. Nunca seremos perfeitos, nunca teremos as respostas todas e não podemos ficar parados por causa disso.
Havemos de regressar a essa ideia.
Chegamos finalmente a Crystal Clear, a faixa que encerra Petals For Armor, outra que está entre as minhas favoritas. Esta foi outra das poucas em que Hayley não participou na composição da parte musical. Desta feita foi Taylor quem criou este instrumental, com notas de órgão algo etéreas e batidas à Phil Collins.
Uma vez mais temos uma canção romântica, que fala sobre arriscar de novo, acreditar no amor. Quer-me parecer, no entanto, que quando Hayley promete não ceder ao medo não se refere apenas ao romance – também se pode aplicar a outras áreas da sua vida.
O título, aliás, pode também aludir à filosofia Petals For Armor. Crystal Clear, transparência, honestidade, vulnerabilidade.
Hayley recorre de novo a metáforas aquáticas para falar de um relacionamento amoroso, desta feita numa luz muito mais positiva – o que condiz com a sonoridade, que faz pensar em águas calmas e transparentes, raios de luz atravessando o subaquático. Ao contrário do romance descrito em Pool, este dá-lhe oxigénio em vez de tirar-lho. Não tem medo de mergulhar até ao fundo porque a água continua transparente. Hayley está a arriscar de novo – pode ser que seja desta.
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O pormenor delicioso desta canção ocorre na parte final, com versos cantados por Rusty Williams, o avô de Hayley – ela trata-o por “Grandat”. Rusty era um “crooner” quando era jovem (consta que era o nome dado a cantores masculinos que cantavam baladas, como Frank Sinatra por exemplo) e Hayley cresceu ouvindo-o cantando canções de amor compostas por ele mesmo. A sua preferida é uma chamada Friends or Lover. Um dia, Rusty tocou-a ao piano em casa de Taylor. Este gravou-a e, como surpresa para Hayley, incorporou uma parte dos vocais de Rusty em Crystal Clear.
O Taylor é um anjo.
Ficamos assim a saber a quem Hayley sai. A jovem fala muito sobre os avós, que começaram a namorar aos doze anos e ainda hoje estão juntos (isto é, dentro do possível, foi esta a avó que caiu das escadas e perdeu faculdades). É super amoroso, uma bonita homenagem àquela que será a história de amor preferida de Hayley.
E é isto Petals For Armor. Como fomos observando, este álbum começou sombrio e tornou-se gradualmente mais luminoso. Mas não nos deixemos enganar, nenhum destes casos ficou completamente resolvido. Hayley afirmou que a sua vida contiua uma confusão, que ainda passa por cada uma das músicas de Petals For Armor. Ainda sente raiva, luto, medo, dor, amor, tudo. Ainda não tem todas as pontas atadas, ainda tem lições por aprender. “As histórias são infinitas, cada uma delas entrelaçada com dor e esperança”, escreveu ela quando lançou o álbum.
Confesso que foi este o meu erro durante a era do Self-Titled: achar que já sabíamos tudo, que nunca voltaríamos atrás, que de alguma forma tínhamos ficado prontos para enfrentar qualquer coisa. Daí o choque quando Jeremy saiu da banda e com os temas abordados em After Laughter. A vida não é assim tão simples, de facto – e se a atual pandemia provou alguma coisa foi que tudo pode mudar de um momento para o outro, quase sem darmos por isso.
Por estranho que pareça depois deste testamento todo, ainda estou a processar o álbum. Gosto de todas as faixas, algumas mais do que de outras, mas não consigo escolher uma única como favorita absoluta. As minhas opiniões estão sempre a mudar. Daqui a uns meses, se calhar, terei novas coisas a dizer sobre este álbum.
Posso adiantar desde já, de qualquer forma, que Petals For Armor é um belo trabalho. Em termos musicais, é razoavelmente consistente em termos de instrumentação, conforme assinalado ao longo deste texto, mas é bastante eclético em termos de estilos musicais. Temos pop, new wave, disco, baladas, um bocadinho de rock, um bocadinho de jazz, um bocadinho de blues… Hayley e Taylor tiveram uma oportunidade de sair do território habitual dos Paramore, divertir-se um bocadinho noutros estilos musicais. Eu gosto de músicos multifacetados, que conseguem criar música em vários géneros – até porque eu mesma sou multifacetada, nunca fui de me interessar por uma só coisa.
Petals For Armor assemelha-se a álbuns como Melodrama e Post Traumatic no sentido em que as músicas funcionam muito bem como conjunto. O álbum é melhor que apenas o somatório das suas partes: vale tanto pelas músicas individuais como pela história que contam em conjunto. Um capítulo da história de Hayley, que continuará no próximo disco que ela lançar (quer a solo ou, mais provável, juntamente com os Paramore).
Tivemos, aliás, uma combinação de temas novos, com perspectivas diferentes, com temas já recorrentes no cânone dos Paramore e não só. Raiva, luto, desejo, feminilidade no primeiro caso. Amizade, esperança, redenção, desgostos românticos e acreditar de novo no amor no segundo. Há coisas que são clichés por algum motivo – há lições que temos de estar sempre a aprender.
Devo dizer, ainda, que foi divertido estar a olhar para as metáforas e temas recorrentes deste álbum, mesmo nem todos sendo super originais. E estou grata por Hayley ter dado tantas entrevistas, fornecido tanto material para esta análise. Demoro mais tempo a escrever, escrevo autênticos testamentos – gastei quase noventa páginas A5 com o primeiro rascunho manuscrito (é certo que a minha letra é grande), isto já vai em quase dez mil palavras – mas é uma delícia.
O que acontece agora? O plano de Hayley era ir em digressão, levar Petals For Armor aos palcos, mas isto é 2020, um péssimo ano para planos. Ela tenciona ir em 2021, mas sabe-se lá se será possível – até porque a situação está catastrófica nos Estados Unidos. Não dá para calcular quanto tempo durará a era Petals For Armor – talvez mais um ano, talvez mais dois. Talvez a pausa nos concertos se prolongue tanto que Hayley se canse de esperar e ela e Taylor comecem a trabalhar noutra coisa.
Já que falamos nisso, Hayley tem deixado pistas em relação à direção tomada no próximo álbum dos Paramore. Para o júbilo de muitos fãs, a jovem admitiu que ela e Taylor têm saudades das guitarras pesadas dos álbuns pré-After Laughter.
Eu devo ser a única fã da banda que não fazia questão de regressar a essa sonoridade. Adoro as músicas antigas deles, claro que adoro, mas fazem parte do passado – tal como o cabelo cor de chama de Hayley. Nunca lhes pediria para voltarem para trás – a uma altura em que, agora sabemos, eles não estavam assim tão felizes. Não quando, hoje em dia, continuam a fazer música de qualidade, melhor até nalguns aspetos.
Mas se eles mesmo quiserem regressar a esse estilo não me queixo. O mais certo é adorar à mesma – tenho adorado todos os álbuns até agora…
Na verdade, mais do que o género musical, estou curiosa em relação à influência de Petals For Armor nos próximos trabalhos dos Paramore. Irá Hayley contribuir para a composição dos instrumentais ou voltará ao hábito antigo de esperar pelo material composto por Taylor e Zac? Por falar em Taylor, irá ele produzir os próximos álbuns sozinho? (Tenho quase a certeza que sim.) Voltarão a compôr com Joey? Irão incorporar estilos de Petals For Armor na música da banda?
Eu espero que sim, espero que algumas coisas mudem. Na minha opinião, seria um desperdício não aproveitar o que aprenderam com Petals For Armor para enriquecer o som dos Paramore.
Eu, aliás, tenciono escrever em breve sobre All We Know is Falling e Brand New Eyes, os dois álbuns que me faltam analisar. Estes são daqueles textos que ando a adiar há anos mas, pelo menos neste caso, estou contente por ter esperado. Não só porque, como já é habitual no cânone dos Paramore, Petals For Armor fez com que olhasse de maneira diferente para esses álbuns. Mas também Hayley prestou novos testemunhos sobre esses períodos nas múltiplas entrevistas que deu, em particular nesta.
Não vou escrever já já sobre esses álbuns. Depois de tanto tempo à volta de Petals For Armor, preciso de uma pausa de tudo o que se relacione com os Paramore.
Os meus planos a curto, médio prazo para este blogue ainda estão um bocadinho incertos. Estou a pensar escrever uma entrada de Músicas Ao Calhas, um texto mais rápido e curto que estes últimos dois e, possivelmente, os textos seguintes.
É aí que as coisas estão um pouco indefinidas. Já revelei antes que quero escrever sobre Hybrid Theory e Meteora dos Linkin Park em breve. Queria no entanto que o primeiro saísse no dia em que completa vinte anos, ou seja lá para 24 de outubro. Provavelmente começo já a escrever sobre ele em agosto. Sei que o texto vai demorar e, como em setembro e outubro devo estar ocupada com o meu outro blogue (porque, se tudo correr bem, a Seleção irá regressar, fazendo de mim uma mulher feliz), mais vale deixar o trabalho adiantado.
Pelo meio, gostava de escrever sobre o filme Digimon Adventure: Last Evolution Kizuna, quando conseguir vê-lo. Tecnicamente já dá para sacar na Internet, mas é uma versão de fraca qualidade, não me atrai. Talvez se surgir uma versão melhor entretanto… mas mesmo assim não sei. Supostamente o filme sairá nos cinemas portugueses a 12 de novembro – se isso se cumprir, eu quero ir ver, mesmo que já tenha visto o filme antes. E talvez espere por essa data para escrever e publicar a análise.
É assim que tenho sobrevivido a isto tudo: escrevendo, lendo, vendo Digimon (os episódios da nova versão de Adventure ao domingo e, quando esta esteve em pausa porque Covid, vi Frontier pela primeira vez), jogando Isle of Armor, a expansão de Pokémon Sword&Shield, recordando antigos jogos da Seleção Nacional, sobretudo no Euro 2016. Sempre foi mais ou menos assim, agora ainda mais. Como sempre, obrigada por lerem e por me aturarem. Até à próxima!