Músicas Ao Calhas – I Want What I Want e Break It So Good
Hoje trago de volta uma personagem recorrente no cânone deste blogue e mesmo das Músicas Ao Calhas. Nem sequer é a primeira vez que escrevo sobre B-sides do álbum mais recente de Avril Lavigne. Ao contrário de Bright, que saiu mais de um ano depois de Head Above Water – na altura certa, como escrevi na altura – as músicas sobre as quais vou escrever neste texto surgiram na Internet no mesmo dia em que o álbum foi editado oficialmente. Não foram as únicas mas, como já tinha referido antes, foram as únicas de que gostei. Falo de I Want What I Want, um cover de Lauren Christy, e Break it So Good.
Lauren é, aliás, o denominador comum a estas duas músicas: foi ela que cantou o original da primeira e contribui com vocais para a segunda. Qualquer fã razoavelmente bem informado de Avril saberá que Lauren fazia parte do The Matrix – a equipa por detrás da co-composição de uma grande parte do Let Go, nomeadamente o triunvirato Complicated, Sk8er Boi e I’m With You. Anos mais tarde, Lauren tornaria a colaborar com Avril durante os trabalhos de Head Above Water.
Antes de fazer parte do The Matrix, no entanto, Lauren teve uma relativamente curta carreira a solo. I Want What I Want faz parte de Breed, o seu segundo álbum – e o último antes de desistir da carreira a solo e formar o The Matrix.
A versão original tem aquele som pop rock dos anos 90, início dos anos 2000 que eu sempre adorei. Sinto mesmo que é o meu género musical primordial, sobretudo quando cantado no feminino. Além disso, as semelhanças com as músicas de Let Go são evidentes.
Desse modo, ouvir Avril cantando I Want What I Want bate certo. A versão da canadiana tem uma roupagem mais moderna, melhor que a original, na minha opinião. Eu ainda assim gostava que fosse menos eletrónica – mas lá está, é apenas uma demo. Se fosse para ser lançada oficialmente, a qualidade seria melhor.
Também gosto mais da interpretação de Avril – e nem sequer falo apenas da interpretação vocal. Gosto mais das vozes de apoio na versão de Avril, em particular os “and I want, and I want, and I want” no refrão. Para além disso, Avril alterou a terceira parte da música – para melhor, na minha opinião.
Entretanto, enquanto escrevia este texto, descobri uma outra versão de I Want What I Want, cantada por Tata Young, uma cantora tailandesa. Esta é mais parecida com o original – é como se tivessem aplicado um filtro pop na versão de Lauren. Continuo a gostar mais da versão de Avril, mas esta não é má. Tata tem uma voz bonita.
Ora, Break it So Good é uma música bastante diferente. Esta também é uma demo, ainda menos polida que I Want What I Want. Tem um instrumental minimalista e algo sombrio, apenas piano (?), batida e sintetizadores. É como se fosse uma Give You What You Like mais eletrónica.
Um pormenor estranho é o facto de Avril só cantar o refrão. Lauren canta as estâncias, com algum auto-tune (para a sua voz soar mais parecida com a de Avril?). É possível que esta canção tenha sido composta e gravada numa fase má da Doença de Lyme. Avril poderá ter conseguido gravar o refrão, mas depois pode não se ter sentido suficientemente bem para cantar as estâncias, logo, Lauren tomou o lugar dela. Se quisessem incluí-la em Head Above Water, gravariam uma nova versão, cantada a solo por Avril.
De qualquer forma, a verdade é que, na minha opinião, esta produção minimalista, imperfeita, resulta. Break it So Good ficou com um tom intimista, sombrio e estranhamente sexy. Para lançarem oficialmente esta música teriam de manter o instrumental mais ou menos assim.
Por outro lado, o carácter também vem da letra, uma das partes mais interessantes de Break it So Good. Esta aborda uma relação que já se percebeu que não vai durar. No entanto, a narradora está disposta a aceitar o antigo amante (assumindo que se trata de um homem), não porque acredite na relação, mas porque se quer vingar dele (“Imma break your heart but I’ll break it so good/(...)/Do to you what you do to me”).
É bem possível que estejamos a falar da mesma relação abordada em I Fell In Love with the Devil e sobretudo Tell Me It’s Over. Compare-se os versos desta última – “you come and you leave” – com os de Break it So Good – “maybe I’ll come and go, a taste of your own medicine”. Um amante que brinca com os sentimentos dela, que lhe vira as costas, mas que volta e meia diz que quer regressar para ela (“Come and whisper you miss me”, “you say you still adore me, you’re still kind of a mess”). Ao contrário de Devil e Tell Me It’s Over, a narradora não se limita ao papel de vítima, quer derrotar o amante no jogo dele.
Segundo a minha teoria, Avril não incluiu Break it So Good em Head Above Water porque esta canção não se encaixa na narrativa de I Fell In Love With the Devil e Tell Me It’s Over. Sobretudo na altura em que andava a promover a primeira, Avril tentou vender-se como a vítima de uma relação tóxica, tendo tido de ganhar forças para sair dela (ainda que nenhuma dessas músicas sustentem bem esta última parte. Só esticando muito.)
Break it So Good, por seu lado, é uma resposta menos politicamente correta, mesmo menos moralmente correta, a uma relação tóxica. Uma resposta de que Avril talvez não se orgulhe, que talvez lhe tenha saído pela culatra se de facto a tentou. Mas não deixaria de ser uma resposta humana, uma perspetiva mais única, provando que Avril também não fora propriamente uma santinha na relação.
Acaba por ser este o meu problema com Avril nos últimos anos. A partir de certa altura deixou de parecer genuína, esconde-se atrás de clichés e superficialidades. Em retrospetiva, uma parte de mim acha que ela se aproveitou da “moda” do feminismo e das relações tóxicas para promover I Fell In Love With the Devil, Tell Me It’s Over e Dumb Blonde. Da mesma forma, nos últimos meses parece estar a aproveitar-se da nostalgia pelo pop punk dos anos 2000 – juntamente com Mod Sun, Machine Gun Kelly e Travis Barker – para se tornar relevante de novo, preparando o lançamento do seu sétimo álbum.
Quando é que eu me tornei tão cínica em relação à minha cantora preferida?
Já que falamos nisso… sim, Avril terá um álbum pronto a ser editado, radicalmente diferente de Head Above Water e mesmo das músicas de que falámos aqui. Mesmo à moda dela, a mulher anda a acenar-nos com este lançamento desde finais do ano passado e, até agora, nada.
Para ser sincera, as minhas expectativas estão em mínimos históricos para este álbum. Não tenho pressa em ouvi-lo. Preocupa-me mais a digressão europeia, adiada desde o início da pandemia. A equipa de Avril se calhar está à espera deste novo ciclo de álbum antes de confirmar as datas.
A ser verdade, é melhor esperarmos sentados.
Numa nota menos cética… não deixará de ser um álbum da Avril. Terá quase de certeza pelo menos uma mão-cheia de músicas de que gostarei, mesmo que não adore todas.
Para já, por estes dias já só penso em ouvir Solar Power, o álbum novo de Lorde. Sai já esta sexta-feira. A sua análise deverá ser o próximo texto deste blogue. Noutras notícias musicais do meu nicho, Bryan Adams deverá lançar um single em outubro – na altura decido se escrevo sobre ele.
Entretanto, já comecei a rever e a anotar Digimon Frontier, desta feita dobrado em português. Neste momento vou para o episódio 14. Dentro de algumas semanas já devo estar pronta para escrever sobre essa temporada.
É mais ou menos este o plano para os próximos tempos. Obrigada pela vossa visita, como o costume. Visitem a página de Facebook deste blogue.