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Álbum de Testamentos

"Como é possível alguém ter tanta palavra?" – Ivo dos Hybrid Theory PT

Músicas Ao Calhas – Here I Am & I'm With You

Tudo começou quando a minha irmã me enviou esta mensagem:

 

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É claro que eu estava a exagerar para efeito cómico, mas confesso que fiquei um bocadinho chateada. Depois de arranjar uma cadela, tornei-me um bocadinho sensível a animais abandonados ou maltratados. Associar histórias dessas a uma das minhas canções preferidas de todos os tempos era a última coisa que desejava. Não se faz!

 

A neura não durou muito, felizmente. Aliás, esta mensagem da minha irmã pôs-me a pensar nas minhas duas músicas preferidas: I’m With You, de Avril Lavigne, claro está, e Here I Am, de Bryan Adams. Foi aí que reparei – pela primeira vez em mais de metade da minha vida – que as duas canções têm aspetos em comum, o que pode não ser coincidência.

 

Daí este texto. Não é a primeira vez que escrevo sobre I’m With You – esta será a terceira vez. Escrevi sobre ela de passagem na primeiríssima entrada de Músicas Ao Calhas, neste blogue. Também falei sobre ela quando analisei o álbum Let Go.

 

Talvez seja um bocadinho de mais mas, em minha defesa… é uma das minhas canções preferidas de todos os tempos! E espero, com este texto, apresentar uma nova perspetiva sobre a música.

 

 

Antes de começarmos, já que vamos falar sobre as minhas duas músicas preferidas, uma curiosidade. Há cerca de um ano, encontrei este artigo, que descreve um estudo segundo o qual os homens conhecem a sua canção preferida quando têm, em média, catorze anos. Para a mulher, a média é os treze anos. Cheguei a enviar este artigo para o Jon da ARTV (o tal Youtuber, crítico de música, que refiro de vez em quando), ele comentou o artigo no vídeo acima e parece que é verdade – embora hajam exceções, claro.

 

Pelo menos no meu caso, é verdade. Here I Am e I’m With You foram editadas em álbum quando tinha doze anos – com um mês de intervalo, por sinal! Ouvi Here I Am pela primeira vez algures no verão ou outono desse ano, quando fui ver o filme Spirit (sobre o qual escrevi aqui) ao cinema. Por sua vez, só conheci I’m With You no ano seguinte.

 

Tanto Here I Am como I’m With You foram as primeiras canções que conheci como sendo de Bryan Adams e Avril Lavigne, respetivamente. Não sei se o facto de terem sido as primeiras contribuiu para o seu estatuto como favoritas – talvez um pouco. No que toca a outros artistas ou bandas do meu “nicho”, as minhas canções favoritas deles não costumam ser as primeiras que oiço deles.

 

Acho que isso aconteceu com a Avril e com o Bryan porque foram os primeiros artistas que “adotei” oficialmente. Sempre gostei de música e de cantar desde muito pequena, mas foi com a Avril e o Bryan que iniciei oficialmente a minha vida como fã de música.

 

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Ainda há bem pouco tempo comentei que a Avril é a minha mãe musical. Pela mesma lógica, Bryan também pode ser considerado o meu pai musical (e esse tem de facto idade para ser meu pai). A relação de fã que tenho tido com cada um deles é diferente, visto que Bryan, na altura em que o conheci, já tinha uma carreira feita, com toda uma discografia que levei anos a conhecer. Avril, por sua vez, estava ainda a dar os seus primeiros passos no mundo da música.

 

Para além de serem ambos canadianos e de terem um estilo maioritariamente pop rock (e, tanto quanto parece, aparecerem nas capas dos álbuns novos em pelota), aquilo que Avril e Bryan têm em comum é o facto de – não tenho problemas em admiti-lo – não serem os melhores músicos por aí. Nem sequer são os melhores do meu nicho musical.

 

Não significa que sejam maus, bem pelo contrário. Bryan tem tido uma carreira invejável, cheia de êxitos, sobretudo nos anos 80 e 90. Aquela voz enrouquecida é como o vinho do Porto: só fica melhor com o tempo. Tem um jeito especial para baladas de amor (conforme deu para ver aqui), embora também saiba compôr músicas mais animadas, mais soft rock.

 

No entanto, acaba por não se venturar muito para fora de temas de amor e luxúria. Nunca foi o género de artista que tenta esticar os limites da música ou fazer algo que nunca foi feito.

 

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Por sua vez, Avril tem uma voz única, inconfundível. Abriu caminho para outras mulheres no mundo da música, tanto no que toca a música rock como para comporem as suas próprias canções, serem honestas e vulneráveis atrás do microfone. É conhecida pelos temas pop rock com influências de punk pop, mas também tem uma queda para baladas. Além de que, mesmo passados estes anos todos, continua a dar a ideia de ser genuína, despretensiosa, faz a música que entende, sem se preocupar com modas ou em causar choque mediático, ao contrário de muitos artistas por aí.

 

No entanto, apesar de uma boa parte da sua discografia ser honesta e autobiográfica, muitas das suas letras deixam a desejar. Uma coisa são músicas com Sk8er Boi e Girlfriend. Outra coisa são músicas como My Happy Ending, Nobody’s Home e Let Me Go, que tentam passar por sérias e emotivas, mas cuja letra tira-lhes credibilidade.

 

A qualidade aumentou no quinto álbum – e espero que continue a melhorar no próximo – mas, como vimos antes, a letra de Head Above Water, não sendo má, podia ser melhor.

 

Tenho de admitir, para além disso, falta a Avril algum carisma e presença em palco. Mais uma vez, ela tem melhorado com o tempo, mas continua intermitente – embora, na última digressão, os primeiros sintomas da Doença de Lyme podem explicar algumas apresentações mais apagadas.

 

Mesmo com estes “defeitos”, Avril e Bryan continuam a estar bem acima da média, a meu ver. Além disso, são os meus pais musicais, estarão sempre em primeiro lugar no meu coração.

 

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Mas falemos sobre as músicas em si, por ordem cronológica. Como referi acima, conheci Here I Am quando fui ver o filme Spirit. Conforme escrevi antes, Spirit é um dos meus filmes de animação preferidos de todos os tempos, o Rei Leão da DreamWorks, criminalmente subvalorizado (pergunto-me se terá a ver com o facto de os vilões serem os colonizadores americanos).

 

Um dos destaques do filme é a sua banda sonora, obviamente. Já escrevi aqui no blogue sobre várias das músicas. Ainda hoje tenho o CD no meu carro e, quando o oiço, não deixo de me maravilhar com os arranjos sublimes de Hans Zimmer – o homem é um génio! É um daqueles álbuns que considero clássicos.

 

Here I Am é considerado o tema principal da banda sonora de Spirit, mas a verdade é que I Will Always Return toca mais vezes ao longo do filme – enquanto Here I Am consiste, apenas, em uma estância e um refrão repetido, no início do filme, e nunca mais se ouve até aos créditos finais. No entanto, Here I Am foi lançada como single e acho que até se saiu bem. Portugal foi um dos três países, a par do Taiwan e do Azerbaijão onde chegou ao primeiro lugar (viva nós!). Mesmo nos Estados Unidos e nalguns países da Europa andou perto dos lugares cimeiros. Ainda hoje é tocada nas rádios.

 

Um rápido aparte: sabemos que estamos a ficar velhos quando a nossa música preferida passa na m80. E no entanto já apanhei Bad Romance, que tem menos de uma década…

 

Estou a desviar-me. Voltemos atrás.

 

 

Here I Am é o Circle of Life de Spirit: a música que toca quando o protagonista nasce. A versão que toca no filme está dentro do estilo dos arranjos de Hans Zimmer. Começa suave e inocente, como seria de esperar, até ganhar um carácter eufórico e grandioso no segundo refrão.

 

A versão single que toca nos créditos finais é diferente, claro: pop rock, mais compatível com as rádios do início dos anos 2000.

 

Ainda assim, Here I Am não é assim tão parecida com o resto da discografia de Bryan. Tem elementos de rock, sim, mas a percussão é diferente e os teclados são mais predominantes que o habitual. Segundo o booklet de Anthology – o álbum Greatest Hits que Bryan lançou em finais de 2005 – foram os produtores Jimmy Jam e Terry Lewis que, quando a banda sonora de Spirit estava quase pronta, pegaram nas gravações iniciais de Here I Am e deram-lhe um carácter mais R&B.

 

Suponho que, se tivesse sido produzida pelos seus colaboradores habituais, Here I Am seria mais parecida ao resto da discografia de Bryan.

 

Só sei que aquelas notas iniciais (de teclado?), que são a imagem de marca da música, aquecem logo o meu coração. A música começa suave, minimalista, até ao refrão. É nesta altura que surgem as guitarras elétricas e a batida, que conferem um tom eufórico que se mantém durante toda a faixa. Destaque para o tal riff que abre a canção e se vai repetindo e para o solo de guitarra.

 

 

A versão original de Here I Am tem quase cinco minutos de duração logo, como seria de esperar, existem versões mais curtas para passar nas rádios. A compilação Ultimate inclui uma delas. Nesta versão (que só ouvi pela primeira vez há coisa de duas semanas), curiosamente, a linha de abertura é tocada por guitarra elétrica, por cima do teclado. Não desgosto da alteração, dá um efeito fixe, mas gostava de saber se a fizeram por algum motivo especial.

 

Cortaram, no entanto, a repetição da primeira estância na terceira parte da música. Sei que é assim que Bryan a tem tocado nos concertos ao longo dos últimos anos, mas não sou fã.

 

Aliás, por princípio, não gosto de versões reduzidas para a rádio. Compreendo o seu propósito, mas por norma prefiro as versões integrais. Há exceções, claro – por exemplo, Let’s Make a Night to Remember é demasiado comprida e não me importo que Bryan corte a segunda parte quando a toca ao vivo. No entanto, regra geral, se os músicos achassem que dá para saltar uns compassos ou mesmo parte de uma estância, estes não teriam sido incluídos no álbum! Parecendo que não, alguns de nós conseguem concentrar-se numa música durante mais de quatro minutos.

 

No caso de Here I Am, então, não cortava nenhum momento de pausa, nenhuma nota do solo de guitarra. Na minha opinião, todos esses elementos, a alternância entre momentos de calma e momentos de euforia, contribuem para a emoção da música. Não digo que as versões editadas não tenham o mesmo efeito, mas fica definitivamente a faltar qualquer coisa.

 

 

Here I Am foi uma das canções incluídas no álbum ao vivo Bare Bones, em 2010 – e também no que foi gravado ao vivo na Casa da Ópera de Sydney e editado em 2013. Este arranjo também funciona – a música chega a parecer uma balada, com o piano tocando o riff de marca da canção e Bryan improvisando o solo na guitarra acústica.

 

Na verdade, a meu ver, Here I Am é daquelas músicas – como, por exemplo, Heaven – cuja melodia é tão boa que soa bem em quase todos os arranjos possíveis.

 

Passando à letra de Here I Am, sou a primeira a admitir que esta não é das melhores – curta, demasiado vaga, perdendo-se um pouco em clichés. Como ainda era muito nova quando conheci a música, nem sequer reparei na letra fraquinha. Nos dezasseis anos seguintes, não fiz outra coisa que não projetar significados nela.

 

Vimos acima que a música foi composta para assinalar o nascimento do protagonista de Spirit. Para mim, Here I Am é precisamente isso: uma música de começos, ou de recomeços. Bryan, por exemplo, escolheu-a para abrir o concerto que deu cá, em fevereiro de 2003 (o primeiro a que assisti na vida). Também em dezembro de 2011 (o segundo dele a que fui) foi uma das primeiras da setlist.

 

Here I Am, no entanto, serviria para marcar o início de qualquer história, desde que não seja demasiado sombria. Um nascimento. O Harry Potter vislumbrando Hogwarts pela primeira vez. Um treinador de Pokémon começando a sua jornada numa região nova. As Crianças Escolhidas despertando, pela primeira vez, no Mundo Digimon.

 

 

Para além destas, há muitos anos que associo Here I Am à Seleção Nacional. Montei este vídeo há quase uma década (!!!). As imagens estão desatualizadas (O Meireles sem barba!) e a qualidade não é a melhor, mas a emoção é a mesma: a euforia de um jogo da Equipa de Todos Nós, sobretudo ao vivo, de um golo, da presença num campeonato de seleções.

 

Fez particular sentido no 10 de julho de 2016 – tonight we’ll make our dreams come true.

 

No fundo, o tema de Here I Am é este: alguém que chegou a um sítio novo, ou regressou a um sítio, que é exatamente onde quer estar.

 

Por sua vez, I’m With You é sobre alguém que não quer estar onde está.

 

 

Avril compôs I’m With You com Lauren Christy (as duas colaboraram outra vez, passados estes anos todos, no sexto álbum, na música It Was in Me) quando estava a ter um dia daqueles: o tempo estava cinzento, ela sentia-se triste, vazia, chateada por não ter namorado.

 

Todos nós já tivemos dias assim. Todos nós nos sentimos sozinhos de vez em quando, sem saber onde estamos nem para onde vamos. Ou até sabemos, mas não queremos lá estar.

 

É aí que está uma das forças de I’m With You: a sua mensagem universal.

 

Já contei antes a minha história, de ter treze anos e de cantarolar I’m With You enquanto esperava que me viessem buscar à escola. Tenho, aliás, visto muitas pessoas na Internet gracejando que I’m With You é sobre estar à espera de um Uber.

 

Também já me vi numa situação parecida à do videoclipe, quando tinha dezoito anos: numa festa a que fui contrariada, em que literalmente toda a gente menos eu se estava a divertir, em que passei a noite inteira à espera que acabasse para poder ir para casa.

 

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Liability, da Lorde, possui uma emoção parecida: a sensação de estar num sítio – ou numa relação – onde não nos integramos, onde não somos bem-vindos, onde nos sentimos isolados. A narradora de Liability decide, em resposta, voltar-se para si mesma, fazer companhia a si mesma. A narradora de I’m With You não tem uma atitude tão saudável, como veremos adiante.

 

Segundo Lorde, de resto, um dos temas do álbum Melodrama é solidão: as partes boas e as partes más.

 

Não gostei da cena dos cãezinhos abandonados, mas a interpretação não está errada. Há pessoas que se comportam como cachorrinhos perdidos: extremamente solitárias, sedentas de companhia, que se agarram a qualquer pessoa. Já apanhei utentes assim na farmácia. Não é o comportamento mais saudável, mas a narradora de I’m With You apresenta traços dele – ao pedir companhia a um estranho.

 

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Uma coisa em que só reparei há cerca de um par de anos foi que, se formos a ver, Give You What You Like é uma versão erótica de I’m With You. Em ambas as canções, as narradoras buscam uma cura para a solidão. Em I’m With You, essa vem da companhia de um estranho. Em Give You What You Like, essa cura vem de um encontro sexual.

 

Mesmo em termos musicais, as duas faixas possuem semelhanças entre si. Ambas começam num tom grave e intimista. Só que Give You What You Like mantém-se nesse tom, enquanto I’m With You evolui para uma power ballad de respeito.

 

O que me leva, então, à parte musical de I’m With You. Segundo a Avril, esta foi composta ao piano – terá sido a única do álbum Let Go a ser composta ao piano – mas, tanto quanto consigo ouvir, esse instrumento não aparece em parte nenhuma da música. I’m With You é guiada por uma guitarra acústica em tom grave, acompanhada por um violoncelo e uma ou outra nota de guitarra. É no refrão que surgem as guitarras elétricas.

 

O destaque, no entanto, é mesmo o desempenho vocal. Conforme vimos quando falámos sobre Let Go, nesta altura a voz da Avril não era tão firme como agora. Era pura, inocente, com nuances deliciosas – uma das minhas partes preferidas em I’m With You é a maneira como ela canta o verso “tryin’ to figure out this life” no último refrão.

 

 

Mesmo com vocais ainda algo frágeis, estes não falham na hora de cantar os agudos. A escalada dos yeah-yeah é um exemplo óbvio, mas a minha parte preferida da música é o último minuto: com os “I’m with you! I’m with you!” agudos e os últimos em tom normal, de novo. Sempre adorei esta transição. É como se houvesse um alívio da tensão após o clímax da música.

 

I’m With You é uma música triste na sua maioria, mas sempre deixa uma nota de esperança – a narradora consegue encontrar companhia no fim. Vimos antes que confiar em estranhos pode não ser a atitude mais saudável, pode correr mal. Mas também pode vir a correr bem. Pode ser que esse estranho se torne alguém importante na nossa vida – talvez um novo amor ou “apenas” um novo amigo. Se estivermos dispostos a dar esse salto de fé.

 

Numa sessão de perguntas e respostas que ela deu no Twitter, em dezembro último, Avril revelou que, se pudesse dedicar uma canção aos seus fãs, essa seria I’m With You. Para começar, é a sua favorita (embora, nos primeiros anos da sua carreira, alegasse que Losing Grip era a sua favorita). Em concertos, ela costuma virar o microfone para o público, para a primeira parte do último refrão. Nos últimos anos, chega mesmo a fazer as audiências repetirem essa parte várias vezes. Avril revelou que, mais do que qualquer outra, quando a canta, sente-se em sintonia com os seus fãs.

 

Gosto de pensar que é, também, dedicada àqueles que têm usado a música da Avril para combater a solidão, para conhecer e ligar-se a outra pessoas, para descobrir quem eram e o seu lugar no mundo. Como eu.

 

 

 

Como podem ver, as minhas duas músicas preferidas são o oposto uma da outra, de certa forma. I’m With You é sobre estar-se perdido – ou, pelo menos, no sítio errado – e encontrar uma luz que nos poderá conduzir ao sítio certo. Here I Am é sobre a euforia de estar no sítio certo.

 

Que diz isso sobre mim? Que alterno entre perdida e achada? Que ando sempre à procura de algo? De sítios perfeitos, como reza outra das minhas canções preferidas?

 

Talvez seja isso. Afinal de contas, existiram muitas alturas na minha vida em que me sentia isolada, desajeitada, sem saber o que estava a fazer com a minha vida, incapaz de me integrar entre os “normais”. Demorei muito tempo a aprender a sentir-me confortável na minha pele – ainda ando a trabalhar nisso. Fui capaz em parte porque, nos últimos anos, tive o prazer de conhecer várias pessoas, de viver experiências fabulosas, precisamente à conta das minhas paixões – as coisas que dificultavam a minha integração.

 

Por outras palavras, de viver momentos como os descritos em Here I Am.

 

E, agora que penso nisso, se houver uma canção equivalente a Here I Am na discografia de Avril – uma canção sobre estar no sítio certo – é Innocence.

 

 

I’m With You e Here I Am funcionam, assim, como prequela e sequela, duas facetas de mim mesma – com Perfect Places a funcionar, talvez, como um intermédio entre ambos esses modos. À medida que envelheço tenho conseguido inclinar-me mais para o modo Here I Am, mas continuo a ter os meus dias I’m With You.

 

Ou talvez tudo isto sejam coincidências. Talvez esteja a projetar, a ver tratados filosóficos em músicas pop. Mas também de que serve a música – e a arte em geral – senão como ponto de partida para descobrir quem somos?

 

Felizmente, como referido no texto anterior, nas próximas semanas vou receber dois álbuns novos de cada um destes artistas, com duas semanas de intervalo – já depois de ter recebido Resist, dos Within Temptation. Mais de trinta músicas novas no total para catalisarem as minhas introspeções.

 

Ou, pelo menos, para cantar no carro ou para ajudar a suportar um dia difícil.

 

Como é habitual, quero escrever análises desses três álbuns. E como também é habitual, essas análises devem demorar. Não quero escrever sobre Resist sem escrever sobre My Indigo – uma análise que ando a adiar desde o verão passado. No entanto, é possível que comece a escrever sobre Head Above Water mal o álbum esteja disponível.

 

Que querem? É a minha mãe musical!

 

De qualquer forma, as análises a esses quatro álbuns deverão ser as próximas publicações neste blogue, mesmo que ainda demorem umas semanas (se não forem meses).

 

Obrigada por terem lido este texto particularmente egocêntrico. Faltam oito dias e picos para Head Above Water e vinte e dois dias para Shine A Light. Até lá... 

Avril Lavigne - Let Go (2002)

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Hoje completam-se treze anos desde que saiu Let Go, o álbum que apresentou Avril Lavigne ao mundo e que revolucionou a música pop. É também o meu álbum preferido da Avril e um dos meus preferidos de todos os tempos.

 

Avril cresceu em Napanee, no estado de Ontário, no Canadá. Foi descoberta aos quinze anos - depois de muitos anos cantando em público na igreja da sua terra, em diversas feiras e festas locais, de ter cantado nos álbuns do cantor de folk local Stephen Medd, e de ter ganho um concurso para um dueto em palco com Shania Twain - por diversos produtores, entre os quais Peter Zizzo (com quem colaboraria na composição para Let Go). Este convidou-a para vir a Nova Iorque, onde seria apresentada a Antonio LA Reid, na altura presidente da Arista Records. Nessa lendária reunião, Avril cantou Why, uma canção que compusera com Zizzo. LA terá sido um dos primeiros a quem a voz da cantautora canadiana acabou com o mau humor que sentia na altura. Nesse mesmo dia, Avril assinaria um contrato de dois discos com a Arista.

 

Mesmo assim, os primeiros tempos não terão sido fáceis. A ideia da gravadora era colocá-la a cantar músicas mais folk (pergunto-me se foi assim que surgiu Breakaway), compostas por outras pessoas, algo que Avril recusou quando, ainda por cima, acabara de descobrir o rock. Eventualmente, colocaram-na a trabalhar com Cliff Magness, com quem obteve maior controlo criativo. A parceria resultou em músicas como Losing Grip e Unwanted, pouco comerciais, o que deixou a gravadora à beira de um ataque de nervos. Por fim, a equipa de compositores The Matrix acolheu-a, compreendeu que o rock era o estilo mais consistente com a atitude de Avril, mas sempre com o cuidado de não se desviar demasiado do espectro do pop. No primeiro dia de trabalho compuseram Complicated e o resto é História.

 

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Há que dizer que muito do sucesso de Let Go se deveu ao retrato que a Comunicação Social traçou dela: a Sk8er Girl, a anti-Britney, a menina rebelde, a princesa do punk, etc. Eu admito que essa imagem foi uma das coisas que me atraiu para a Avril e para a música dela e não fui a única. Mas obviamente as pessoas são mais complicadas do que isso. A própria Avril, na altura, não gostava de ser encarada como um produto que era necessário vender e quando ela cresceu para além desses rótulos todos, todos se atiraram ao ar.

 

Depois temos velha questão sobre se ela é pop ou rock. Avril gosta de referir-se a si mesmo como roqueira, mas muitos não concordam, defendem que ela foi sempre pop. Eu confesso que me ralo cada vez menos com essas questões, prefiro focar-me na música em si.

 

Passemos então à análise do álbum. Let Go é um disco bastante eclético, com faixas abordando diferentes temas e emoções (alegria, tristeza, raiva, frustração, determinação, insegurança, vulnerabilidade, rebeldia...). É um álbum exploratório, como seria de esperar de um estreante, que mostra diferentes facetas da Avril - nos três álbuns que se seguiram a Let Go, a cantautora escolheria uma faceta em particular para cada álbum. De uma maneira geral, os temas são adolescentes, mas outros não são assim tão juvenis quanto muitos assumem. Ao mesmo tempo, existe uma certa homogeneidade nos arranjos musicais, o que confere consistência ao álbum. São raros os discos que conseguem fazer isso: serem consistentes sem se tornarem monótonos, serem diversificados sem serem demasiado heterogéneos, ou sem surgirem os inevitáveis outliers (embora haja quem diga que Sk8er Boi seja um outlier).

 

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Este álbum tem, ainda, a minha voz preferida da Avril. Um dos aspetos mais interessantes da carreira da cantautora cananiana diz respeito às mudanças no timbre da voz dela a cada álbum. Em Under My Skin, os seus vocais são firmes, cheios de personalidade, quase à maria-rapaz, condizendo com um álbum fortemente roqueiro. Em The Best Damn Thing, eles soam muito diferentes: agudos, um bocadinho esganiçados, fazendo lembrar uma menina mimada mascando pastilha elástica, mesmo a ver com músicas como Girlfriend. Em Goodbye Lullaby, os vocais estão menos esganiçados, mais amadurecidos, compatíveis com um álbum mais intimista. Em comparação com estes álbuns, há quem diga que os vocais de Let Go são ainda pouco firmes, imaturos, mas eu não o vejo como uma falha. Pelo contrário, considero que a voz inocente de Avril é adequadíssima a este género de álbum. Ainda que essa inocência nunca tenha desaparecido da voz dela, tenho saudades das nuances que nunca mais surgiram na música da Avril, tal como julgo já ter dito antes aqui no blogue.

 

Nestas críticas que tenho feito a álbuns, costumo começar pelas minhas faixas preferidas. Com este álbum, vai ser difícil pois, ao longo destes dez anos que passaram desde a primeira vez que ouvi o CD, praticamente todas as músicas estiveram entre as minhas preferidas, numa altura ou noutra.

 

Recentemente, uma música que tem tido um significado especial para mim é Mobile. Já falei sobre ela aqui no blogue, mas a verdade é que a canção ganhou novo significado quando vivi sozinha pela primeira vez e andei aos saltos entre Lisboa e Évora, durante o meu estágio. Mobile é uma das músicas mais populares de Let Go, o que não é de surpreender. Para além de ter uma melodia extremamente cativante, é uma música sobre, como se diz agora, "coming of age", com que toda a gente se identifica a certa altura na sua vida.

 

 

 

 

Também já falei sobre Naked. Outra que sempre esteve entre as minhas favoritas é Nobody's Fool. Esta é uma daquelas faixas que, na minha opinião, define muito bem a Avril, em particular durante os primeiros anos da sua carreira. Nesta música, Avril canta em rap por cima de uma sonoridade pop rock, uma combinação que resulta surpreendentemente bem. Só o rap seria suficiente para dar personalidade à canção. Essa personalidade reforçada pela letra, que fala de recusa em abdicar dos seus princípios, da sua personalidade - uma clara referência à sua luta, durante os primeiros anos da sua carreira, para que a sua imagem e estilo não fossem alterados por motivos comerciais. A mensagem de Nobody's Fool marcou-me fortemente entre os quinze e os dezasseis anos (tive uma fase em que escrevinhava os versos desta música em todo o lado). É, de resto, uma boa mensagem para jovens nessas idades, sobretudo quando, em contexto escolar, qualquer miúdo que revele ter personalidade própria corre o risco de ser vítima de bullying (mais sobre isso um dia destes).

 

Things I'll Never Say também foi uma das minhas preferidas entre os quinze e os dezasseis anos. É uma canção de amor muito alegre, reforçada pela guitarra acústica e pelos "la da da da" que se tornam a imagem de marca da faixa. Existe uma versão alternativa desta música, mais rock, mas que não funciona tão bem precisamente por não ter estes elementos. A letra da canção descreve muito bem uma paixoneta de menina de quinze anos, que fica nervosa por se encontrar com o objeto da sua afeição, sonhando estar com ele a toda a hora. É um lado que a Avril, na altura - como ela mesma o admite na música - não gostava de mostrar. Destacaria, ainda, um par de trocadilhos sexuais no refrão que eu, felizmente, só compreendi vários anos depois de ouvir a música pela primeira vez. 

 

Um aspeto que Let Go partilha com o álbum Reckless, de Bryan Adams, é o facto de os seus singles serem intocáveis, estarem acima de toda a crítica, pela parte que me toca. O primeiro single foi Complicated, que dispensa apresentações e, muito sinceramente, é uma das melhores canções pop de todos os tempos, ponto. Foi uma das primeiras músicas que conheci dela e tem andado sempre nos lugares cimeiros do meu top de canções da Avril. Com o tempo, aliás, tenho reparado melhor em alguns pormenores, tais como o sotaque canadiano (reparem na maneira como ela pronuncia "laugh out", "pose", "clothes") e as nuances na voz dela. É uma música que, apesar de falar de frustração, é alegre e divertidíssima de cantar, mesmo passados estes anos todos.

 

 

 

Outra que dispensa apresentações e é uma diversão do princípio ao fim é Sk8er Boit. Já na crítica a Reckless tinha-a comparado a Summer of 69 pelo seu carácter narrativo, pelas guitarras que se tornaram icónicas, pela estrutura semelhante, pelo protagonista que toca guitarra. A letra é igualmente icónica, daquelas que de tão má se torna boa, contribuindo para a graça - confessem, isto não teria a mesma piada sem o "he was a boi, she was a girl"! A história que conta é um típico cliché de liceu americano (daí que não me interesse particularmente o filme baseado na música de que se fala de vez em quando), embora se possa argumentar que o Sk8er Boi podia ser a própria Avril - afinal, aquando de Let Go, ela usava calças largas, andava de skate e tornou-se uma estrela de rock. De qualquer forma, mesmo passados estes anos todos, mesmo já muito depois de a Avril ter largado o visual de Sk8er Girl, Sk8er Boi continua a ser, e sê-lo-á para sempre, a faixa-símbolo da Avril Lavigne.

 

I'm With You, tal como já dei a entender amiudadas vezes aqui no blogue, foi a primeira música que conheci da Avril - completar-se-ão doze anos algures em agosto próximo - e é uma das minhas preferidas de todos os tempos. Numa altura em que ouvia bastante música na rádio e gostava (e hoje odeio...), I'm With You ficou-me no subconsciente. Meses mais tarde, quando eu saía das aulas depois das seis (já de noite) e ia alguém buscar-me à escola, dava por mim a cantar "Isn't anyone trying to find me? Won't somebody come take me home?"

 

Como muitas vezes acontece, com o tempo a canção foi ganhando novos significados, novos simbolismos - para além da menina solitária na noite que encontra um desconhecido. Já falei de um deles aqui. A noite fria pode simbolizar muitas coisas: uma depressão, uma vida sem sentido. I'm With You pode falar de procura de consolo, tendo mesmo uma leve mensagem de esperança, de um salto de fé (traduzido à letra uma expressão inglesa muito conhecida) - na medida em que a narradora decide confiar num estranho. Estranho esse que pode ser literal ou apenas alguém cuja história é ainda desconhecida. 

 

 

Losing Grip é o quarto single de Let Go, mas não se insere na mesma categoria que os outros três singles. No início da sua carreira, Avril falava dela como a sua preferida. No meu caso, foi uma daquelas canções de que só comecei a gostar verdadeiramente depois de começar a ouvir música mais pesada. É uma faixa rock, começa relativamente suave mas depois revela um refrão explosivo. Como o costume, apesar da letra imperfeita, Avril consegue transparecer na perfeição todas as emoções que sente: vulnerabilidade, desilusão, tristeza, raiva. Losing Grip fala de amor não correspondido, supostamente sobre um antigo namorado de Avril que não a terá tratado como deve ser. Pergunto-me se terá sido esse desgraçado que, segundo a própria Avril, ficou com as orelhas a arder depois de ouvir a música dela e telefonou-lhe a pedir desculpa.

 

Avril Lavigne: vingando-se musicalmente dos ex muito antes de aparecer a Taylor Swift! 

 

Unwanted tem uma sonoridade semelhante a Losing Grip, embora um tudo nada mais agressiva e com teclados mais evidentes. Unwanted fala, como o nome indica, de rejeição. À primeira vista, pensar-se-ia numa história semelhante à de Losing Grip; no entanto, já falei com fãs que dizem que esta música fazia-lhes lembrar o relacionamento com os seus pais. Por sinal, há relativamente pouco tempo, descobrir que Avril escreveu a letra de Unwanted sobre os pais de um namorado que não gostavam dela. A semelhança do que acontece com algumas músicas de Under My Skin, não me importava se Avril regressasse a este estilo musical.

 

Tomorrow é, à parte os singles, uma das músicas mais populares de Let Go. É também uma das mais tocadas ao vivo pela Avril , embora, na minha opinião, nenhuma dessas atuações roce a beleza da versão original. Sobretudo porque, aqui, a voz ainda inocente da Avril, cheia de nuances, assenta na perfeição e os backvocals foram muito bem colocados, dando um tom etéreo à canção. A letra, que fala de insegurança, deixa algo a desejar (mais uma vez, ela não consegue ser mais subtil que "tomorrow is a different day"), embora a simplicidade até combine com o tema e os vocais puros.

 

 

 

Anything But Ordinary foi uma das músicas que mais me agradou quando ouvi Let Go pela primeira vez. É outra música que simboliza bem uma faceta da Avril: neste caso, o gosto pela adrenalina ao invés de jogar pelo seguro. Algo que partilharia com muitos outros adolescentes, para o melhor e para o pior. Tem provavelmente a melodia mais pop de todo o álbum mais fácil de gostar. Talvez por isso, terá sido considerada para single - fico feliz por terem mudado de ideias por acho que o público cansar-se-ia de Anything But Ordinary do que se cansaram de Complicated. Do mesmo modo, Anything But Ordinary teria sido o título do álbum, se Avril não tivesse insistido em Let Go - mais sobre isso adiante. Mesmo assim, não deixou de ser uma expressão muito associada a Avril durante os primeiros anos da sua carreira.

 

Em My World - outra das mais pop de todo o álbum, com uma sonoridade alegre - Avril fala sobre a sua juventude em Napanee, ainda que a letra esteja longe de ser perfeita. Segundo um rumor que li na Internet, Avril teria composto parte da canção durante uma aula - provavelmente o refrão, que fala sobre sonhar acordado.

 

Too Much to Ask é a faixa de que gosto menos em Let Go. É uma balada com algumas semelhanças a I'm With You, cuja letra foi inspirada numa paixoneta de verão de Avril não correspondida. Não é má, atenção, é uma audição tão agradável como qualquer outra neste álbum. No entanto, é mais uma break-up song entre muitas na discografia da Avril e nem é das mais interessantes. Entre as b-sides de Let Go (muitas estão disponíveis na Internet) pelo menos meia dúzia delas são melhores que Too Much to Ask. A minha preferida é a que partilha o nome com este álbum.

 

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Conforme disse antes, Anything But Ordinary chegou a ser considerado para título deste álbum. Também funcionaria, pela maneira como Avril se destacava do resto da música, rompendo com os dogmas da pop da altura, abrindo caminho a outras cantoras para se expressarem através do rock. Chegava a ser irritante: sempre que alguma cantora tinha guitarra elétrica na sua música, gritava-se logo "Avril Lavigne!". 

 

No entanto, faz sentido que Avril tenha feito questão de chamar ao seu álbum Let Go. Não tanto pelo tema das músicas em si, mais pelo significado que o disco teve na sua vida. Tal como afirmei na crítica a Goodbye Lullaby, o primeiro álbum de Avril Lavigne marcou o início de um novo capítulo na sua vida. O título Let Go refere-se a tudo o que ela teve de abdicar para realizar o seu sonho. Tal como referi anteriormente, aquando de Let Go, Avril estava ainda a tentar adaptar-se ao mundo do espetáculo, à vida caótica, ao escrutínio incessante da Comunicação Social, etc. Hoje, treze anos depois, tem cinco álbuns lançados. Pelo meio, participou nalguns filmes, lançou uma linha de roupa, três perfumes e criou a sua própria Fundação (que já tem um hino e tudo). Infelizmente, a sua carreira foi perdendo relevância e mesmo a originalidade que caracteriza Let Go, o que pode ser desanimador. De qualquer forma, ela sempre deu a entender que, enquanto puder, continuará a criar música. Enquanto for capaz de se manter fazendo aquilo que mais gosta, não tem motivo para desistir. Pode ser que recupere o arrojo que perdeu com o seu quinto álbum e, mesmo, que volte a ter um êxito semelhante aos seus primeiros tempos.

 

Pela parte que me toca, mesmo numa altura em que já não venero a música dela da maneira que venerava há uns anos, Avril Lavigne continua a ser a artista cuja carreira conheço melhor - ainda que comece a gostar mais de outros artistas, não tenho pachorra para me inteirar de cada pormenor do trabalho deles, da maneira como me tenho inteirado do trabalho de Avril. E, claro, como já referi imensas vezes, a mulher tem conseguido deixar-me presa à música dela para lá do racional, ao longo destes anos todos. Portanto, como podem calcular, enquanto Avril Lavigne continuar a lançar música, eu estarei aqui. 

Músicas Ao Calhas: How Do Ya Feel Tonight

Neste momento, encontro-me em aulas, num semestre difícil e, no que toca à minha escrita, consegui, finalmente, inspiração para dar seguimento ao meu terceiro livro. Em princípio, devo conseguir terminar o primeiro rascunho ainda este ano. Com tudo isto, tenho deixado este blogue um pouco de lado. Tenho compilado várias notas para futuras entradas, daquelas extensas, estilo a que escrevi sobre o Ciclo da Herança. E, nesta altura do campeonato, não tenho tido tempo nem paciência para redigi-las e duvido que tenha tão cedo.
 
Como, no entanto, não queria deixar este blogue ao abandono, decidi criar uma rúbrica intitulada "Músicas Ao Calhas". Nestas entradas, tenciono escrever, não exatamente críticas, mas pura e simplesmente a minha interpretação e o significado de faixas da lista de reprodução que ando a construir há já quase sete anos - desde que recebi o meu primeiro leitor de MP3 - e que, atualmente, vai em mais de quinhentas músicas. Em princípio, serão textos relativamente pequenos. Relativamente... De qualquer forma, implicam menos planeamento que outras entradas e podem ser redigidos, rapidamente em dias menos inspirados para outras escritas.
 
 
(Este foi o único vídeo que consegui encontrar no YouTube com esta música)
'Cause being here feels right
Quero começar por falar de How Do Ya Feel Tonight, uma das músicas de Bryan Adams mais especiais para mim. Conheci-a em março de 2010, numa altura em que os CD's do cantautor canadiano andavam a sair em fascículos de dez euros cada. Aproveitei pois, apesar de o Bryan já ser havia imenso tempo o meu cantor masculino preferido, apenas conhecia os dois últimos álbuns de estúdio, a banda sonora de Spirit, os singles e pouco mais.
 
Ora, comprei o CD On A Day Like Today apenas um dia depois de ter tido a epifania que deu a ideia-base para O Sobrevivente e respetivas sequelas. Apaixonei-me imediatamente pela primeira faixa, How Do Ya Feel Tonight. Durante os dias que se seguiram, ouvi frequentemente o CD, até porque, nessa altura, estava sem MP3. How Do Ya Feel Tonight destacava-se de entre todas. Foi também nessa altura que, partindo da ideia-base, defini os primeiros conceitos e escrevi os primeiros capítulos de O Sobrevivente. How Do Ya Feel Tonight não foi propriamente uma inspiração. O que aconteceu foi que, na minha mente, o espírito do livro que comecei a escrever na altura entrelaçou-se com o espírito da música. Desse modo, How Do Ya Feel Tonight acabou por se tornar como que a faixa-tema da minha saga.
 
 
Quando à música em si, no que toca ao arranjo musical, esta não difere muito de On a Day Like Today, a faixa que dá o título ao CD e que também sempre foi uma das minhas preferidas. Ambas começam com apenas uma guitarra, a que se vão juntando discretamente outros instrumentos, ganhando acompanhamento completo após o primeiro refrão. How Do Ya Feel Tonight tem, contudo, uma aura mais melancólica, tanto em termos de sonoridade como de letra. No que toca à letra - bastante simples, como de resto todas as músicas de Bryan Adams - e ao sentimento, lembra-me um pouco I'm With You, de Avril Lavigne, que também fala de solidão, de procura por alguém que ofereça consolo e companhia.


I don't know who you are but I, I'm with you

Citei ambas as músicas no primeiro capítulo de O Sobrevivente pois achei - bastante depois de escrevê-lo, bem entendido - que ambas as músicas traduzem relativamente bem aquele primeiro encontro entre as minhas personagens principais, Bia e Alex. Porque ela passara os últimos anos, em vários aspetos, sozinha e, a partir daquele momento, estava irreversivelmente ligada àquele desconhecido, ainda que não o soubesse na altura ("I don't know who you are but I, I'm with you"). Porque ele apenas a conhecera por acidente mais sentia que estava no lugar certo à hora certa e, mais tarde, quando se recordasse daquele momento, tal pressentimento transformar-se-ia numa certeza. ("'Cause being here feels right").

Tive alguma pena por o Bryan não ter tocado esta no concerto que deu no ano passado, no Pavilhão Atlântico. Não que isso me tenha surpreendido por aí além pois How Do Ya Feel Tonight não é single. No entanto, o Bryan deu a entender, no Twitter, que vai lançar um segundo CD Bare Bones no próximo ano. Tenho andado a fazer figas para que How Do Ya Feel Tonight seja incluído no álbum ao vivo, para ficar a conhecer uma nova versão da faixa. Em todo o caso, How Do Ya Feel Tonight será sempre uma das minhas músicas preferidas por estar tão ligada aos meus primeiros livros.

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