Concertos #2 – Dois em um e um tributo pelo meio
Faz agora um ano desde que a Eras Tour passou por Portugal. Eu fui à segunda noite e foi um dos concertos mais marcantes da minha vida. Não só por ter trazido dois nomes de peso a Portugal, mas também pelo ambiente, pelo enquadramento. Como tal, esta publicação vai ser quase toda ela dedicada à Eras.
Conforme outros já descreveram, a Eras Tour foi o mais parecido que tivemos na vida real com a Barbieland. Aqueles dias foram uma celebração… eu nem diria da mulher, diria da menina. Do cor-de-rosa, das roupas, das lantejoulas, das pulseiras da amizade.
Algo que nunca foi muito muito a minha cena. Não que nunca tenha tido um lado feminino, mas sempre fui muito maria-rapaz. Sempre preferi calças a vestidos e sempre tive vários interesses tipicamente masculinos. Como muitas mulheres da minha geração, tive uma fase (mais longa do que me orgulho) em que pensava que isso fazia de mim melhor que as demais. Mas, mesmo depois de ter deixado essa mentalidade para trás, sei que nunca serei uma pessoa cem por cento estereotipicamente feminina.
Ainda assim, até entrei no espírito da Eras Tour. Eu e a minha irmã começámos a fazer pulseiras de amizade. Para mim foi difícil começar – não sabia onde arranjar as missangas. Comprei dois conjuntos, primeiro na Toys’R’Us, depois na Claire – nenhum deles com letras suficientes. Só mais tarde percebi que o melhor sítio para comprar é mesmo na Temu.
Enfim, não foi grave. Ao menos as pulseiras ficaram giras, ficaram diferentes das demais.
E de qualquer forma tomei-lhe o gosto. Ainda hoje faço dessas pulseiras de vez em quando. Na semana anterior ao concerto, a minha mãe viu-me a mim e à minha irmã a fazê-las e quis uma para si. Calhou o meu irmão revelar o nome da minha sobrinha nessa altura (ela nasceria pouco menos de dois meses depois). Nessa mesma noite, fiz um par de pulseiras com o nome dela: Laura. Mais tarde, sobretudo depois de ela nascer, fiz uma data de pulseiras para vários membros da minha família. Ainda hoje é a única pulseira destas que uso todos os dias.
Pelo meio, cometi a “asneira” de me oferecer para fazer para pessoas do grupo de fãs dos Hybrid Theory e tive várias amigas a pedir-me. E a verdade é que, quando os Linkin Park regressaram ao ativo, alguns fãs começaram a trocar pulseiras. Chegaram mesmo a oferecê-las à Emily.
Uma coisa a que não aderi, no entanto, foi ao cosplay. Pelo menos ao ponto a que vários dos outros fãs chegaram. Isso estava, ainda está, aquém das minhas capacidades. Em parte para ser do contra, em parte porque os Paramore também mereciam amor, vesti-me à Hayley Williams, a icónica vocalista. Isto apenas vagamente, com peças que já tinha no armário – incluindo uma t-shirt e um pin (na altura por estrear) da merch de After Laughter.
Não deixei, no entanto, de encher os pulsos de pulseiras nem de desenhar um “13” nas costas da mão. Nunca fui tão bem vestida para um concerto.
E adorei ver todas as pessoas vestidas ainda melhor do que eu. As meninas e mulheres recriando diferentes eras e visuais de Taylor. Os homens vestindo t-shirts semelhantes às de Taylor no vídeo de 22, dizendo “It’s me. Hi. I’m the Dad, it’s me.” ou “It’s Me. Hi. I’m the boyfriend, it’s me.” Nunca vi tantas lantejoulas juntas. A própria Hayley Williams o comentou durante a atuação dos Paramore: ainda à luz do dia, o sol refletindo-se nas roupas. O Estádio da Luz nunca brilhou tanto. Na altura citei Bejeweled. Hoje tenho pena de não me ter lembrado de Starlight: “The whole place was dressed to the nines and we were dancing, dancing, like we’re made of Starlight”.
Adiantando-me um pouco, digo-o desde já: a minha parte preferida da Eras Tour foi o público no Estádio da Luz. Mais do que da própria Taylor Swift, mais ou menos ao mesmo nível que os Paramore. A minha irmã, as amigas dela, com quem fui, a minha vizinha do lado, as pessoas com quem troquei pulseiras (ou pura e simplesmente ofereci), os mais de sessenta mil que cantaram em altos berros a noite toda. As Swifties têm má fama e uma parte dela é merecida, mas naqueles dias vimos apenas a melhor faceta.
Na verdade, nós no grupo HT não somos assim tão diferentes de Swifties – há menos lantejoulas e cor-de-rosa e mais preto e metal. Mas aquela gente não está preparada para essa conversa.
Falemos, então, da abertura da Eras, a cargo dos Paramore. A minha banda preferida, tirando os Linkin Park. Não vou ao ponto de dizer que estava lá mais por eles do que pela Taylor, mas é diferente. O vínculo que tenho com os Paramore é mais forte. Conheço-os há mais tempo, vi-os passando por muito – conforme escrevi aqui – e, de igual modo, a música deles acompanhou-me por muito.
Por sua vez, gosto imenso da Taylor, mas nunca me afeiçoei muito a ela e duvido que alguma vez o faça. Em parte porque ela já era uma cantora de grande sucesso quando comecei a ouvi-la com regularidade. Sempre senti que Taylor não “precisava” de mim. Ela tem muitos por aí cumprindo o papel de fã melhor do que eu.
Regressando aos Paramore, durante a atuação deles fui para as escadas, para poder dançar à vontade, sem incomodar as pessoas à minha volta. Tinha tentado ao máximo evitar spoilers dos concertos anteriores, mas sabia mais ou menos o que esperar: os êxitos, o excelente cover de Burning Down the House.
Um dos pontos altos foi Still Into You. Eu entrei a pés juntos no espírito, cantando em altos berros, sentindo a letra, relacionando-a com a minha própria história com os Paramore. Cantando “Let’em wonder how we got this far” abrindo os braços para todo o Estádio da Luz.
Estava na minha, mas não deixei de reparar pelo canto do olho que a minha irmã, as amigas dela e o resto do público em geral estavam a aderir a Still Into You. Ainda agora, na preparação deste texto, encontrei este vídeo e dá para ouvir o público cantando.
No fim de Still Into You, a banda recebeu uma longa ovação de todo o Estádio da Luz. A Hayley pareceu ficar à beira das lágrimas – com o baterista Zac Farro atrás delas, tirando fotografias ou filmando. Eu estava ali sem acreditar que aquilo estava mesmo a acontecer, cheia de vontade de abraçar a Hayley.
Eu achava que seria das poucas pessoas naquele estádio a ralar-se com os Paramore. Escrevi todo um testamento aqui no blogue tentando aumentar o interesse pela banda. No entanto, não precisava de me ter preocupado. O Estádio da Luz não podia tê-los recebido da melhor forma – só mesmo se os Paramore estivessem a atuar para o seu próprio público.
Compreendem agora porque digo que o público foi a melhor parte da Eras?
A Hayley esteve à altura do momento, soltando um “Obrigada!” em bom português. Tanto quanto sei, isto não aconteceu em noites anteriores da Eras Tour e não voltou a acontecer depois. Desde então, recordo-me deste momento sempre que oiço Still Into You – e também noutras alturas.
Pois bem, nós fizemos a Hayley chorar (ou quase). Poucos minutos depois foi a vez deles me fazerem chorar (ou quase).
Depois de That’s What You Get, a Hayley começou a fazer um pequeno discurso explicando o conceito das músicas-surpresa. Como não estavam a tocar para o seu próprio público, o alinhamento dos Paramore focava-se maioritariamente nos êxitos. Eu tinha feito as pazes com isso, não contava com músicas como Pool ou All I Wanted ou a minha preferida Last Hope.
A banda, no entanto, percebeu que haviam fãs de Paramore acompanhando os concertos em direto através da Internet. Assim, resolveram incluir uma piscadela de olhos a essas pessoas. Até àquela data tinham tocado músicas como Pool, Forgiveness, Rose Colored Boy. Eu até estava com… bem, com esperanças para aquele concerto, mas não me atrevi a assumir nada.
Quando Hayley concluiu o seu discurso com “This song’s for you”, eu sustive a respiração. Segundos depois começou a cantar “I don’t even know myself at all…” e eu passei-me. Guinchei como uma miúda vinte anos mais nova, as mãos tremeram-me, vieram-me as lágrimas aos olhos. E naturalmente cantei a plenos pulmões, esticando os braços para os arcos do Estádio da Luz em “Gotta let it HAPPEN!”.
Não estava de todo à espera que os Paramore a tocassem – só uma das minhas canções preferidas de todos os tempos. Tinha escrito em duas ocasiões diferentes aqui no blogue a propósito da Eras: “Gostava que tocassem Last Hope, mas é pouco provável”. Mesmo depois de saber que os Paramore tinham músicas-surpresa, quais as probabilidades de a tocarem no concerto a que eu fui?
E peço desculpa por estar outra vez a bater nesta tecla, mas o facto de isto tudo ter acontecido no Estádio da Luz – um sítio que conheço bem de outro dos meus mundos – contribui para a mística disto tudo. Adoro ver fotos dos Paramore – e de Taylor Swift – emolduradas pela Catedral.
Last Hope e Still Into You (e respetiva ovação) foram, assim, os grandes destaques da atuação dos Paramore – e ficaram entre os momentos mais felizes do meu 2024. Foi um bom concerto em geral, com boa adesão por parte do público. Acho que tivemos mais sorte em termos de alinhamento em relação à noite anterior – Last Hope e That’s What You Get em vez de Told You So e Caught in the Middle. Nada contra estas duas últimas – e até fiquei com alguma pena por não ter visto as dancinhas de Hayley em Caught in the Middle – mas, lá está, Last Hope é Last Hope e gosto mais de That’s What You Get. Até porque esta tem ganho novos significados para mim no último ano, ano e meio.
Por outro lado, o público do dia 24 pôde ver Hayley levantando a camisola e abanando as mamas. Já não sei quem teve mais sorte.
Uma coisa é certa: os Paramore gostaram de nós, gostaram de estar cá em Portugal. Acho que fomos um dos preferidos deles na Eras, se não tivermos sido o número um. Para além do que aconteceu no segundo concerto, foram à praia, comeram marisco (n’O Ramiro! E não pagaram!) e deram um passeio de barco pelo Tejo – algo que eu mesma fiz um par de vezes, ambas em despedidas de solteira. Sabemos isto tudo pois eles publicaram-no nas redes sociais – pelo que se pode ver aqui, mais nenhum país teve tanto conteúdo publicado como o nosso.
Ver fotos e vídeos da banda no nosso país, da Hayley e do Brian no barco, com a Ponte 25 de Abril no fundo… A mensagem que a Hayley nos deixou, como poderão ver acima/abaixo… E quando ela fez anos, vários meses mais tarde, os Paramore publicaram uma foto inédita da Hayley que eu tenho quase a certeza de que foi tirada em Portugal.
Oh sim, fomos os melhores alunos. Não me convencem do contrário.
Na pior das hipóteses, terão ficado com vontade de voltar cá para um concerto em nome próprio. Não sei até que ponto isso depende da vontade deles. Infelizmente, não deverá acontecer tão cedo – eles estão em pausa outra vez e podem voltar a demorar anos a lançar um álbum. Mas fica a esperança de que, um dia destes, voltarão a tocar Last Hope e Still Into You para nós.
Antes de continuarmos a falar sobre a Eras, ainda dentro do universo dos Paramore, quero fazer um aparte para falar dos Decoded. No último ano, ano e meio, fiquei mais aberta a bandas de tributo e bandas de covers (saibam a diferença), por motivos óbvios. Claro que os Hybrid Theory são um caso à parte, em vários aspetos – não espero que outros tributos tenham a mesma dimensão ou o mesmo impacto.
Mas gosto de música ao vivo. Na pior das hipóteses é uma banda tocando-me músicas de que gosto – permitindo-me criar novas memórias com elas e outros benefícios que referi antes.
No que toca aos Decoded, tributo aos Paramore, já os vi duas vezes. Bem, três vezes, se contarem com um ensaio aberto. A primeira vez foi no Pátio do Sol (onde os próprios Hybrid Theory tocaram um par de vezes), no dia 27 de julho do ano passado. Soube do concerto e da própria existência da banda meros dias antes – um amigo meu que já os tinha visto deixou o seu carimbo de aprovação. Como estava livre nessa noite, resolvi ir, mesmo a solo.
Foi um dia engraçado: durante o dia foi o encontro do Odaiba Memorial Day. À noite, tive concerto. Apareço na foto com a minha t-shirt da Ruki.
E gostei, mesmo tendo sido uma atuação curta.
Com isto, passaram-se vários meses e os Decoded comemoraram o primeiro aniversário em março deste ano. Como forma de o assinalarem, eles fizeram um ensaio aberto. Quando falaram disso no Instagram, comentei logo mostrando interesse – mas estava à espera que viessem mais fãs para além de mim. Se soubesse que seria a única (eles escolheram outra rapariga para além de mim que acabou por não vir), talvez pensasse duas vezes.
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Mas isto era só a minha timidez a falar, claro. A banda recebeu-me muito bem na sua sala de ensaios – onde também estavam amigos deles, outra banda, os The Reptilians, tributo aos Strokes. Nunca tinha assistido a um ensaio de banda, foi uma experiência gira. Quase um concerto privado – embora também tenham transmitido uma parte em direto no Instagram.
Na altura, a banda indicou-me as duas datas seguintes em Lisboa e eu prometi ir a pelo menos uma – de preferência acompanhada. Vim ao The Family Values Punk Edition no RCA Club, dia 9 deste mês. Essencialmente uma festa do pop punk/punk rock. Para além dos Paramore, tivemos tributo a Blink 182, Green Day e Offspring.
Um registo algo diferente da Eras, digamos. Aliás, foi mesmo uma noite para beber um pouco mais e andar ao moche como nunca antes (não durante os Decoded, mais durante Blink +351 e Green Play). Em termos de pura diversão, foi das melhores que tive.
Consegui, então, arrastar uma amiga da família HT (apesar de esta só conhecer a música dos Paramore muito superficialmente). Encontrámos os Decoded mal entrámos no RCA, junto ao bar. Fizeram-me logo uma festa, com elogios à minha t-shirt (a mesma que usei na Eras).
Eu é que não tenho remédio, continuo tímida e desajeitada no primeiro contacto. Ainda hoje acontece com os Hybrid Theory, mesmo já os conhecendo há dois anos e treze concertos. O que vale é que acabo sempre por sair da minha concha – geralmente quando os concertos começam.
Gostei mais deste segundo concerto – por estar acompanhada, pelo maior à-vontade com a banda e também porque, da minha experiência, o RCA tem melhor ambiente que o Pátio do Sol (não desfazendo). Havia um grupinho que volta e meia cantava pelo Ricardo (Ricardo Lopes, o guitarrista que "faz" de Josh). E, durante The Only Exception, aquela malta que, mais tarde, andaria ao moche, pôs-se toda a cantar de braço dado.
Mais uma recordação para associar a uma música que está na minha vida há quinze anos, uma das minhas canções de amor preferidas.
...pois, temos de falar do que se passa no vídeo acima. Não vou mentir, depois de ter estado no ensaio deles, sabia que havia a possibilidade de os Decoded me chamarem ao palco para Misery Business. Não queria ser arrogante, não queria assumir... mas sabia. Passei uma boa parte do concerto sentindo uma mistura de nervos e excitação antecipando o momento. Quando começaram a tocar MizBiz, deixei de sentir as pernas. Finalmente, a Inês (Inês Martinho, a vocalista) chamou-me ao palco. Lembrei-me de passar o telemóvel à minha amiga para que me filmasse e lá consegui trepar para o palco, com os meus braços e pernas a tremer. Não fui a única convidada – como podem ver acima, chamaram também outra rapariga, chamada Diana.
Como qualquer fã de Paramore, tinha passado anos e anos sonhando com um convite para cantar Misery Business em palco. Tudo o que fiz foi passar da fantasia à realidade e consegui vencer os nervos. Acho que me saí bem. Pude ser uma estrela de rock durante dois minutos – e a minha amiga, abençoada seja, fez de minha fã, como se pode ouvir.
Ainda só estamos em maio mas este foi já um dos melhores momentos do meu ano. Como se não bastasse, ainda me tiraram uma foto espetacular, como poderão ver abaixo.
Não admira que os Paramore não consigam matar a música, por muito que tentem. Estes momentos são demasiado bons. Misery Business não pode nunca desaparecer.
E os Decoded dão um bom espetáculo. A Inês tem uma boa voz. O timbre não se parece muito muito com o de Hayley, mas ela reproduz bem os maneirismos, a maneira de cantar. Durante este segundo concerto, ouvi a minha amiga, bem como outras pessoas na audiência do RCA, a elogiar a baterista Marta Ferreira (ou seja, "faz" de Zac). E ela merece: é pequena, mas tem energia suficiente para as baterias dos Paramore – mais intricadas do que muitos pensam. Eu diria no entanto que o meu preferido é o baixista, Pedro Araújo ("faz" de Jeremy. Gosto da postura dele, do seu entusiasmo, das suas interações com os outros colegas da banda.
Depois disto tudo, os Decoded agora são dos meus. Era o mínimo. Hei de continuar a acompanhá-los dentro das minhas possibilidades – e hei de tentar trazer mais amigos ou, no mínimo, converter a amiga que veio aos Paramore. Não hão de faltar oportunidades – até porque estes, ao menos, são de Lisboa.
Voltemos à Eras Tour. Tenho de dizê-lo: em termos de produção e de dimensão, foi o melhor concerto a que assisti até agora. Os bilhetes foram caros, sim, mas pelo menos neste caso o preço até se justifica.
Não digo que seja o meu tipo de concerto. Estou habituada a concertos de rock, focados na música. Os de Taylor Swift (e de outras estrelas pop, na verdade), no entanto, sempre foram diferentes: teatrais, com várias mudanças de visual, coreografias elaboradas, pouco espaço para espontaneidade. Mais musicais que concertos, por vezes.
É uma questão de gosto, claro. E de qualquer forma, a Eras Tour consegue manter o calor, a proximidade, aquele je ne sais quoi que faz de concertos das melhores experiências do mundo. Como já muitos descreveram, Taylor tem o dom de fazer os outros sentirem que são as pessoas mais importantes do mundo, de parecer que ela canta pessoalmente para cada um de nós.
Como escrevi acima, não consegui evitar todos os spoilers, mas evitei o suficiente para ter muitas surpresas. Começando logo pelo relógio e a contagem decrescente – que nós, no público, fizemos aos gritos e em bom portugês, como se fosse Ano Novo. E depois o tema de introdução, com excertos de letras de músicas em que Taylor diz os títulos dos diferentes álbuns. Que termina com a própria Taylor aparecendo em palco, cantando "It's been a long time coming but it's you and me, that's my whole world". Eu não sou grande Swiftie e no entanto o raio da música ainda hoje me deixa com pele de galinha, leva-me lágrimas aos olhos.
Depois disto foram só três horas e meia de concerto, só quarenta e seis músicas no alinhamento. Várias delas tiveram parte cortadas, algo de que não gosto muito por norma, mas aqui aceita-se. Pelo meio, muitas coreografias, muitas mudanças de visual, quase sempre de saltos altos (“in stilettos for miles”), sem parar.
Eu pensava que existiriam pausas de, vá lá, cinco minutos entre diferentes “eras” – nem por sombras. Não dava para sequer trocar impressões com a vizinha do lado. Estou convencida de que Taylor troca de roupa como um Sim – desce no seu elevadorzinho, faz uma pirueta e o maillot transforma-se num vestido. Não há outra explicação possível.
Dar um concerto assim será mais exigente em termos físicos do que um jogo de futebol profissional. Há artigos na internet sobre os treinos que Taylor fazia – três horas seguidas na passadeira a diferentes velocidades enquanto cantava o alinhamento completo. Há quem tenha tentado recriar este esquema de treino – claro que não é recomendável começar logo com as quarenta e seis músicas. O melhor é começar com, vá lá, metade da secção de Lover e ir aumentando progressivamente.
Não sou de ir ao ginásio ou mesmo de fazer corrida. Para fazer exercício, pratico natação. Mas até era capaz de tentar este esquema de treino. Cantando músicas de Taylor Swift, até seria divertido.
Música em geral torna tudo mais divertido, ponto.
Imenso respeito a Taylor, assim. E talvez ainda mais à sua equipa. Muita coisa terá tido de funcionar na perfeição para montar este espetáculo.
Mas volto a reforçar que o público foi das melhores partes. Mais de sessenta mil gargantas cantando em altos berros durante mais de três horas e meia. Acho que fiquei com perdas auditivas. O videozinho que filmei de You Belong With Me foi uma boa amostra.
Ainda assim, acho que o melhor exemplo foram mesmo os dez minutos de All too Well. A plenos pulmões, uma dose saudável de dramatismo. Foi cá uma catarse – dá para senti-lo no modesto vídeo que filmei. O desgraçado que inspirou a música devia ficar com as orelhas em fogo em todas as noites da Eras.
Houveram outros destaques, claro. Um deles também durante Red, mais especificamente durante We Are Never Getting Back Together – quando o dançarino Kam Saunders completou a frase “Like, we are never getting back together…” com “... nem que a vaca tussa”, em português.
Esta é daquelas coisas que não sabia que acontecia na Eras: o Kam dizendo uma frase diferente em cada noite, na língua do país em questão. Sou suspeita, mas acho que a nossa foi das melhores: mais original que um palavrão e, na verdade, uma das expressões mais engraçadas da língua portuguesa.
E pergunto-me quem ensinou a frase ao Kam (e à própria Taylor?). Se foi ideia de algum dos trabalhadores portugueses por detrás dos concertos.
Outros destaques ocorreram durante folkmore. August era das que por que mais ansiava. Uma surpresa bem agradável foi a transição, no fim, para aquilo a que os fãs chamam illicit affairs (angry version).
Por outro lado, devia ter antecipado o efeito de marjorie. Marjorie é daquelas que me leva lágrimas aos olhos sempre. A letra foi inspirada pela falecida avó de Taylor e, como já escrevi antes, a mim recorda-me a minha própria falecida avó. Estávamos na Eras Tour, que pontenciava cada emoção associada àquelas músicas. Mas também, como expliquei antes, foram poucos dias depois de conhecermos o nome da minha sobrinha, a primeira bisneta dela do lado da minha mãe.
No fim da música olhei para a minha vizinha do lado e vi que ela também estava a chorar. Rimo-nos as duas. No fim do concerto, ofereci-lhe uma pulseira, só mesmo por causa deste momento.
Marjorie foi imediatamente seguida por willow – e eu adorei o cenário mágico que montaram no palco. Agora percebo porque é que a secção mais básica e retrógrada da população americana acusou Taylor de bruxaria.
The Tortured Poets Department é capaz de ter sido das minhas partes preferidas de todo o concerto – curiosamente, uma das mais teatrais. Como muito boa gente, tenho os meus problemas com este álbum, mas a Eras sempre me fez gostar mais de algumas músicas. Deu-me imenso gozo, por exemplo, gritar “Who’s afraid of little old me?!?!”.
O melhor, mesmo assim, foi a sequência antes de I Can Do It With A Broken Heart. Um momento muito meta, que parecia retirado de uma comédia muda dos anos 20. Uma artista de palco que bateu no fundo. Vêm um par de colegas ou assistentes (?) reanimá-la, vesti-la, colocá-la de novo de pé, dar-lhe um empurrão para que o espetáculo continue.
A cena pode ser interpretada de duas maneiras. Uma: Taylor obrigada a trabalhar, a subir ao palco, mesmo estando mais morta do que viva. Outra: Taylor mais morta do que viva, mas a sua equipa e/ou os seus entes queridos dão-lhe forças para subir ao palco, fazer aquilo para que nasceu. A ocasião em que Travis, o atual namorado de Taylor, desempenhou o papel de um dos assistentes, como é possível ver em baixo, parece apoiar a segunda interpretação.
A música em si é uma das minhas preferidas em The Tortured Poets Department. Como o pequeno sketch na Eras Tour dá a entender, é a The Show Must Go On de Taylor, o momento After Laughter de Taylor. Aliás, se formos a ver, nos primeiros meses da Eras Tour, Taylor estava numa situação semelhante àquela em que Hayley estava no início da era de After Laughter: “obrigada” a subir ao palco e a dar espetáculo, enquanto a vida pessoal se desfazia em pedaços. Hayley uma vez chegou a comparar-se a uma marioneta caída, com o amigo e colega de banda Taylor York a puxar-lhe as cordas. Mais ou menos o que acontece no sketch antes de I Can Do It With A Broken Heart.
Eu coloquei o verbo “obrigar” entre aspas, porque não me convencem que Taylor ou Hayley foram obrigadas ao que quer que fosse. Não terá sido por falta de dinheiro, ao contrário da maior parte de nós, simples mortais.
Mas a questão é precisamente essa. É por isso que After Laughter é um álbum que teima em manter-se relevante. É por isso que I Can Do It With A Broken Heart é mais universal do que soa à primeira vista. Todos nós como adultos temos de fazê-lo com um coração partido. Trabalhar, cuidar dos filhos, cuidar de nós próprios, seguir com a nossa vida, mesmo que estejamos tristes, doentes, cansados. Mesmo que (sobretudo nos últimos anos, sobretudo nos últimos meses) tenhamos o mundo a desmoronar-se à nossa volta.
Mas estou a desviar-me.
Regressando à Eras, queria falar agora sobre as músicas-surpresa. Num concerto com esta complexidade tecnológica, não dá para variar o alinhamento. As músicas-surpresa, no entanto, são apenas Taylor com uma guitarra acústica numa e um piano noutra – é mais fácil alterá-las todas as noites. Consta que é algo que Taylor já fazia em digressões anteriores.
E eu acho uma excelente ideia. A mulher tem onze álbuns, quatro deles com baús, um deles com várias faixas extra, um deles duplo. Incluir estes temas todos no alinhamento de um concerto é obviamente impossível. Mas, sobretudo com a popularidade de Taylor, cada uma destas músicas é a preferida de alguém. Essas pessoas merecem vê-las tocadas ao vivo pelo menos uma vez.
Dito isto, nesta o trabalho era todo de Taylor. Recordar os acordes de todas estas músicas, reduzi-las ao seu esqueleto (quando várias delas têm um instrumental eletrónico originalmente). A coisa só terá ficado mais complicada quando ela começou a fazer misturas – mashups, como são mais bem conhecidas. O trabalho adicional de pegar em duas músicas diferentes e tentar encaixá-las uma na outra, como um puzzle.
Antes do concerto fiz por não ouvir nenhum mashup. Depois de ver por mim mesma, no entanto, adoro o conceito. Sempre gostei de encontrar paralelismos, temas em comum entre músicas – sejam elas dos mesmos artistas ou de artistas diferentes. Isso já inspirou uns quantos textos aqui no blogue. É um exercício giro ver as músicas que Taylor combinou e tentar descobrir o raciocínio por detrás.
No que toca ao meu concerto, tive alguma sorte. Ainda não conheço a discografia de Taylor assim tão bem. Calhou conhecer as quatro músicas. Ambas músicas de que gosto mais ou menos misturadas com músicas de que até gosto. Não me posso queixar.
A primeira mistura foi de The Tortured Poets Department, a música, com Now That We Don’t Talk. Na altura, TTPD, o álbum, tinha saído pouco mais de um mês antes. Naturalmente, Taylor favoreceu-o nas músicas-surpresa. Na altura até gostava de The Tortured Poets Department, a música. Mais pela sonoridade – gosto da percussão, quase soa a bateria ao vivo.
Não consigo levar a letra a sério, no entanto. “No fucking body” soa a algo dito por uma menina de dez anos dizendo palavrões pela primeira vez. E nem me digam nada sobre o início da segunda parte.
Dito isto, fez sentido combiná-la com Now That We Don’t Talk, que tem um estilo de narrativa semelhante. Misturando as duas, criou-se uma história nova. Começando por The Tortured Poets Department (que ela tocou praticamente inteira), a relação está de pé mas algo tremida – em Now That We Don’t Talk já terminou. A fase de transição entre as duas corresponde ao luto: “Who’s gonna love you like me… now that we don’t talk?”. No fim, chega à aceitação: “Guess this is how it has to be now that we don’t talk”.
Ao piano, Taylor misturou You’re On Your Own, Kid com Long Live. A primeira foi uma das músicas-surpresa mais tocadas na Eras. É claramente uma das preferidas de Taylor – e uma das mais populares entre os fãs. Não é o meu caso, mas já gostei menos.
E, de qualquer forma, a mistura com Long Live foi muito bem sacada. You’re On Your Own, Kid é uma retrospetiva da carreira de Taylor, o bom e sobretudo o mau. Long Live é também sobre a carreira dela, mas foca-se no bom, nas vitórias.
Além de que Long Live é uma das minhas preferidas de Taylor. Long Live foi uma de várias retiradas do alinhamento normal aquando da inclusão de The Tortured Poets Department, com muita pena minha. Esta, no entanto, foi uma boa forma de compensar. E, se lerem aqui os motivos pelos quais gosto desta música, não será surpresa se vos disser que, mais do que qualquer outra música, foi especial cantar Long Live no Estádio da Luz.
Depois deste concerto fiquei livre para ouvir outras misturas, anteriores e posteriores. Não ouvi todas ainda – são demasiadas! Mas, das que ouvi até agora, tenho algumas favoritas. Is it Over Now com I Wish You Would e loml com White Horse, por exemplo – daquelas que fazem todo o sentido, mesmo de maneira óbvia, pelas semelhanças na sonoridade das versões originais. E as letras encaixam na perfeição. No caso de loml com White Horse, por exemplo, a frase “I’m gonna find someone someday who might actually treat me well” soa ainda mais poderosa após o contexto de loml (a minha preferida em TTPD neste momento).
Outra de que gostei foi de Haunted com exile em Edimburgo. Não tanto pelas músicas em si mas pelo público – que foi uma excelente segunda voz. Adoro quando coisas como estas acontecem em concertos (como, por exemplo, algumas vezes, no Live in Lisbon de Bryan Adams).
A minha preferida, no entanto, foi The Great War com You’re Losing Me. A primeira é a minha canção preferida de Taylor, para começar. Fez sentido combiná-la com You’re Losing Me, que usa imagens semelhantes – e acaba por mudar a história da guerra. Desta feita, a relação não se aguentou, mas a narradora sobreviveu.
Entre Paramore e Taylor Swift foram, então, mais de quatro horas de cantoria. A minha garganta já está habituada a concertos, mas desta vez foi muito tempo. E isto ao ar livre, com um ventinho fresco a soprar. Saí da Luz com uma constipação daquelas, passei mais de uma semana a tossir como uma desalmada.
Zero arrependimentos, claro. E agora que faz um ano, tenho saudades. Tenho imensa pena de não poder repetir este dia.
Depois desta, cheguei a ver algumas transmissões de concertos posteriores. Regra geral, deixava a passar enquanto fazia outras coisas. Sempre dava para ir acompanhando um bocadinho. Tive a sorte de ver um momento lindo: o público de Milão fazendo uma serenata a Taylor. Imenso respeito. A reação dela foi adorável.
E, se me permitem o aparte, o vestido que ela estava a usar era lindíssimo.
A Eras Tour terminou no final de 2024. Foi a maior e a mais lucrativa digressão de todos os tempos. Tenho pena que já tenha acabado – mas sinto-me privilegiada por ter podido estar lá.
Tenho-me perguntado o que Taylor irá fazer a seguir em termos de digressões. Se voltará a dar concertos “normais”, em estádios mas focados apenas no álbum mais recente. Ou se criará algo semelhante à Eras em termos de conceito, tentando talvez suplantá-la. Só o tempo o dirá.
Neste momento, ao que parece, Taylor irá manter-se afastada dos holofotes por uns tempos. Ninguém a censura, após dois anos de digressão e de vários anos seguidos lançando álbuns. Eu mesma já pedia uma pausa no ano passado – não fazia questão de ter The Tortured Poets Department. Agora que este já saiu, não vou dizer que lamento que este tenha sido lançado. Tenho algumas críticas a fazer-lhe, mas este texto já vai longo, ficam para outra ocasião (ou talvez não).
Agora finalmente vou ter tempo para (continuar a) explorar a discografia existente de Taylor, ao meu ritmo, sem que ela venha do nada atirar mais trinta músicas para cima de mim. O que tem acontecido nos últimos anos (nem é a primeira vez que o refiro), tirando quando Taylor lança álbuns, é ter fases breves de obsessão por uma música dela que me apareceu no aleatório. Espero conseguir continuar a fazê-lo
Acho que mesmo o projeto Taylor’s Version só deverá ser retomado, na melhor das hipóteses, no outono deste ano. Aposto que a reedição de Reputation sairá no início de 2026 e o álbum de estreia será reeditado no outono desse ano – para coincidir com o vigésimo aniversário da carreira de Taylor.
E para já ficamos por aqui. A segunda parte ainda vai demorar um bocado – ainda nem a rascunhei. Mas já estou contente por ter conseguido publicar duas vezes este mês.
Obrigada pela visita.