Manuscrito
Depois de uma longa série de entradas sobre música, decidi escrever algo diferente. A inspiração para este texto veio-me da seguinte imagem, que me apareceu no Facebook há algum tempo:
Estive a pesquisar na Internet sobre o assunto e, pelo que li, escrever ao computador e escrever à mão são, de facto, atividades muito diferentes, em diversos níveis. Sendo a escrita manual uma atividade mais intensa a nível sensorial, estimula uma parte diferente do cérebro, a área de Broca, ligada à linguagem - talvez isso explique a maior facilidade das palavras em surgirem na escrita em papel, testemunhada por mim e por outras pessoas. Outros estudos demonstraram que, por dar mais trabalho e por requerer maior concentração, a escrita manual facilita a aprendizagem, em particular no que toca a símbolos e fórmulas e mantém o cérebro ativo, contrariando os efeitos do envelhecimento. No fundo, as diferenças entre escrever à mão e escrever no computador acabam por serem equivalentes às diferenças entre praticar um determinado desporto e ver alguém a praticá-lo.
Devo dizer que fui sempre uma grande adepta da escrita à mão, em detrimento da escrita a computador. Não que nunca digite, é óbvio que não, se assim fosse não estariam a ler este texto. O que costumo fazer é rascunhar manualmente estes textos e depois passá-los a computador.
Foi, de resto, quase sempre a regra no que toca à minha escrita: primeiro em suporte de papel, com lápis ou caneta. Devo ter escrito milhões de páginas desde os meus oito anos. Tirando os meus diários, durante muitos anos escrevi em folhas soltas, pouco recorrendo a cadernos. Isto porque, muitas vezes, escrevia durante as aulas. Ao contrário dos cadernos, as folhas podem, facilmente, ser escondidas debaixo de um dossier ou entre as páginas de um manual ou caderno diário. Os inconvenientes eram o facto de poderem ser perdidas e a ordem das páginas baralhadas.
Só em 2010, quando comecer a pensar seriamente em escrever algo publicável, é que adotei, definitivamente os cadernos. Prática que mantenho ainda hoje. Geralmente, são cadernos A5, que podem ser levados para todo o lado na minha mala. Muitas vezes, são oferecidos aos meus pais, em congressos, outras vezes são sobras de material escolar, minhas ou dos meus irmãos, outras vezes sou eu que os compro. Se puder escolher, prefiro argolas e folhas quadriculadas. Por possuírem mais linhas - e a minha letra, ainda por cima, é grande - e por darem jeito para fazer esquemas. Como poderão ver nesta fotografia, e no topo do blogue, gosto de guardá-los e exibi-los. Em parte por vaidade, para poder olhar para eles e pensar: "A minha "obra" está toda ali". Também gosto de folhear os cadernos, ver os rascunhos de certos capítulos ao lado de notas ou rascunhos de entradas para os meus dois blogues, para me recordar das circunstâncias em que escrevi aquelas passagens (jogos da Seleção, episódios de séries que acompanhava, músicas recém-lançadas...). Mas sobretudo por conterem imensas notas para as sequelas de "O Sobrevivente".
Posso acrescentar às que disse acima mais umas quantas vantagens da escrita manual: é mais prática, pois não tenho de carregar com um computador portátil, com o risco de esgotar a bateria e não ter acesso a eletricidade. É claro que, para a escrita manual, estou dependente de papel e caneta, mas estas últimas são bem mais fáceis de transportar - um aparte só para referir que sou a maior consumidora do mundo de canetas bic - e, mesmo que me esqueça do caderno, existem sempre guardanapos em cafés e restaurantes.
Outra vantagem de estar longe do computador é estar longe da Internet. Eu, aliás, nos últimos tempos, tenho escrito relativamente pouco em casa. Se tenho um computador por perto, fico irremediavelmente presa ao Twitter, ao Facebook, ao YouTube e afins. Sou muito mais produtiva à mesa de um café, por exemplo. E agora, com o regresso do bom tempo, tenho escrito bastante em jardins públicos e esplanadas, enquanto faço a fotossíntese.
A maior vantagem já foi, contudo, mencionada aqui: as palavras saem-me com mais facilidade quando escrevo à mão.
Vou dar um exemplo relacionado com o meu primeiro blogue, sobre a Seleção Nacional. No primeiro ano, ano e meio, de entradas (não conto com o ano que estive sem publicar nada), escrevia diretamente no editor do blogger. Só em meados, finais de 2010, é que me habituei aos rascunhos manuscritos. Ora, aquando do particular com a Argentina, em fevereiro de 2011, andava cheia de exames, só tive tempo de trabalhar na entrada de antecipação do jogo na tarde do dia do próprio encontro. Como achava que não teria tempo para o rascunho manuscrito, resolvi escrever o texto diretamente no computador. Levou-me a tarde toda. Só consegui terminar menos de uma hora antes do início do jogo.
Daí que, agora, escreva sempre à mão antes. Dá bastante mais trabalho e consome-me bastante tempo - durante o Euro 2012, às vezes, só conseguia publicar as entradas vários dias depois dos respetivos jogos. A do jogo com a Espanha, então, levou-me uma semana - mas, quando comparo entrada, as que foram manuscritas primeiro estão melhores. Mesmo pequenos textos, para as páginas no Facebook, por vezes custam-me a sair quando escritas diretamente no computador. Por fim, o ato de passar os rascunhos a limpo já constitui uma primeira correção.
Por outro lado, passar os rascunhos das minhas histórias a computador sempre foi uma das minhas partes preferidas, nem eu sei bem porquê. Ao longo de uns bons doze anos, tenho tido muitas tardes felizes, ou mesmo noites, de férias em particular, digitando rascunhos das minhas pequenas "obras" de ficção, ao som da minha música. As memórias mais antigas que tenho disso remontam aos meus onze anos de idade. Na altura, penso que eram histórias inspiradas n'"Os Cinco" e/ou n'"Uma Aventura" e a música era a banda sonora do Pokémon. Hoje, as histórias são as sequelas d"O Sobrevivente" e as músicas são playlists por mim compiladas de modo a adequarem-se ao espírito da cena em que estou a trabalhar.
Sei perfeitamente que sou uma raridade, que a tendência é a digitalização de tudo. Não sei por mais quanto tempo fabricarão papel e caneta. Duvido que seja tão cedo, contudo, nem que seja porque a eletricidade pode, sempre, falhar. De qualquer forma, enquanto me for possível, não deixarei de recorrer ao suporte em papel e, quando a altura chegar, farei questão de que os meus filhos aprendam a escrever manualmente. Nem que os tenha de ensinar eu mesma.
Entretanto, terminei na semana passada o rascunho do meu terceiro livro. Quase dois anos depois de o ter começado... Estou, portanto, a entrar numa parte de que gosto muito. O que também significa que terei de fazer uma pausa aqui no blogue. Não convém estar a aumentar a resma de papel que tenho de passar a computador com entradas para o Álbum. Com a agravante de ter imenso trabalho para a Faculdade este semestre.
Esta pausa não se deve prolongar muito, no entanto, já que se aproxima o término da temporada de séries e quero falar, pelo menos, de Era Uma Vez.
Em todo o caso, não deixem de visitar aqui o Álbum de vez em quando, caso continuem interessados nestes meus monólogos, primeiro manuscritos e depois digitalizados.