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Álbum de Testamentos

"Como é possível alguém ter tanta palavra?" – Ivo dos Hybrid Theory PT

Linkin Park – Hybrid Theory (2000) #2

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Segunda parte da análise a Hybrid Theory. Podem ler a primeira parte aqui

 

Uma das minhas preferidas, não apenas neste álbum, mesmo de toda a discografia da banda, é With You. Descobriu-se há pouco tempo que é também a preferida de Bella Swan, do Twilight. Não sei o que fazer com essa informação.

 

With You tem uma letra algo vaga, não se percebendo ao certo qual é o assunto. Parece falar de uma pessoa querida que está separada do narrador. Morreu? Partes da letra parecem apontar nesse sentido – “Even though you’re close to me, you’re still so distant and I can’t bring you back”. “The sound of your voice painted on my memories/Even if you’re not with me, I’m with you.” – mas é possível que seja apenas sobre uma separação. A letra também dá a entender que o relacionamento não seria muito saudável – e que o narrador guarda arrependimentos em relação a isso. 

 

Para mim, o melhor da música é o seu instrumental. Gosto muito da introdução – embora não consiga identificar todos os sons, tirando os discos giratórios de Mr. Hahn. Estes, aliás, estão presentes em toda a música, quase tão prevalentes como a guitarra, tendo até direito a um solo.

 

Já que falamos de guitarras, adoro a sequência dos acordes, imediatamente antes da primeira estância. Durante o rap de Mike, nas estâncias, a instrumentação torna-se mais leve, mais atmosférica (algo que torna a acontecer noutras faixas de Hybrid Theory, como veremos adiante). Ouvem-se apenas notas de teclado por cima da bateria – para depois se repetir a sequência inicial, durante o pré-refrão e o refrão. 

 

Não resisto a contar-vos uma historieta pessoal engraçada. Alguns de vocês devem conhecer a música Get With You, so Ritchie Campbell. No refrão, ele canta "but I just can't get with you, with you". Eu ganhei o hábito de, quando apanhava a música na rádio, pôr-me a cantar "You, now I see, keeping everything inside" ou "You, now I see, even when I close my eyes" durante os "with you, with you". Por algum motivo, isto irrita a minha irmã – logo, comecei a fazê-lo de todas as vezes que ouvíamos Get With You. 

 

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Quem tiver irmãos compreende. 

 

A partir de certa altura, bastavam soar os primeiros acordes para a minha irmã se virar para mim e dizer:

 

– Nem penses! 

 

Eu não cantava, mas ficava a rir que nem uma perdida. 

 

Tenho de confessar que, depois de Chester morrer, deixei de fazê-lo. Ainda assim, agora que já passaram uns anos, era capaz de voltar a irritar a minha irmãzinha com estes versos. Mas a verdade é que não a temos apanhado na rádio ultimamente. 

 

Durante muito tempo quis fazer um AMV para esta música. Era a próxima na lista há meia dúzia de anos, quando andava a fazê-los com os filmes de Pokémon. Só que o Windows Movie Maker deixou de funcionar no meu computador. O desejo não desapareceu por completo, confesso, mas agora tenho menos tempo livre. Quando o tenho, prefiro escrever.

 

 

Outra que também esteve sempre entre as minhas preferidas (agora nem tanto, anda a ser destronada) é Points of Authority. Esta é uma das músicas com mais demos em todo o álbum – como dá para ver agora, na edição de aniversário. Numa dessas versões o rap de Mike – que, na versão final, serve de introdução e de terceira parte – toma o lugar do refrão. Outra versão usa o refrão do álbum, mas o rap é diferente – pior, na minha opinião, mais previsível. 

 

Em suma, prefiro mesmo a versão final. Gosto imenso do rap na terceira parte, sobretudo quando Chester se junta a Mike (pelo menos nas versões ao vivo). Além disso, o refrão flui tão bem depois das estâncias que custa a acreditar que, a certa altura, a banda pôs a hipótese de não inclui-lo. 

 

Uma confissão: espero não ter sido a única a ficar baralhada por um momento quando, no Rock in Rio de 2014, cortaram o rap introdutório. Demorei a perceber que música era. 

 

Outra confissão: examinar a letra de Points of Authority para esta análise estragou-me um bocadinho a música para mim. Parva como sou, nunca me tinha apercebido de que o verso "while taking pleasure in the awful things you put me through" poderá ser uma referência aos abusos sexuais a que Chester foi sujeito em miúdo. Existem também referências a comportamentos auto-destrutivos, e dá-se a entender que o agressor também foi uma vítima, que está apenas a lidar com a vida da maneira que sabe. 

 

O que é capaz de ser verídico. 

 

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O instrumental não é dos mais interessantes neste álbum, mas sempre tem uma espécie de beatbox ao longo de toda a faixa, dando-lhe carácter próprio. O que de resto alude ao rap, que fala em corridas demasiado rápidas, em alguém que não está à altura do desafio. 

 

Neste momento e no que toca às últimas semanas, desde que comecei a examinar este álbum para escrever esta análise, as minhas músicas preferidas em Hybrid Theory são A Place For My Head e Forgotten. Já gostava delas individualmente antes disto – explicá-lo-ei porquê já a seguir – são ambas enérgicas, agressivas e soam muito bem em sequência, como surgem no alinhamento do álbum. A Place For My Head termina um pouco de repente – só temos um segundo para respirar, antes de Forgotten abrir logo a matar, com o potente refrão. 

 

Além disso, nestas últimas semanas tenho passado mais tempo com estas duas canções do que com a maioria das outras. A Place For My Head e Forgotten são as faixas mais antigas de Hybrid Theory, compostas ainda no tempo dos Xero. A edição de vigésimo aniversário inclui demos das mesmas – intituladas Essaul e Rhinestone – ainda com a voz de Mark Wakefield. E, como vimos antes, estas demos faziam parte da cassete de audição de Chester. 

 

A Place For My Head é uma das faixas mais pesadas em Hybrid Theory, com as guitarras e os gritos de Chester. Começa enganadoramente suave, com um riff de guitarra que faz uma boa ponte com o final de In the End. Seguem-se a bateria e os discos giratórios. É então que começa o rap de Mike, numa altura em que o riff passa a ser tocado por uma guitarra elétrica. As guitarras tornam-se mais pesadas por alturas do refrão. 

 

Um dos melhores momentos da música é a terceira parte. Quem disser que nunca se assustou quando Chester passa dia sussurros aos gritos está a mentir. 

 

 

Outra das minhas partes preferidas é o encerramento:os acordes trovejantes de guitarra, a bateria, os gritos de Chester antes de Mike repetir o rap do pré-refrão. Quando abriram o concerto do Rock in Rio de 2012, eles recriaram esta parte na introdução e ficou espetacular, como poderão ouvir. 

 

Muitos destes elementos da instrumentação de que gosto em A Place For My Head já vinham da demo Essaul – que recebeu o nome de um dos amigos de Mike e dos outros membros dos Xero. Já lá está a introdução, os sussurros que passam a gritos, a conclusão. 

 

A diferença mais significativa é o rap de Mike: bem mais rápido, que tem sido comparado a Eminem. É de facto impressionante – gosto em particular do início da segunda estância, da pequena explosão musical quando Mike diz "stronger than a nuclear bomb". Ainda assim, prefiro o rap na versão final – só mesmo porque esse consigo acompanhar, consigo cantar. O outro não. 

 

Por outro lado, o verso "Soon the Aztec Moon will heat my room, heal my wounds" é hilariante. Que raio significa? 

 

 

Para ser justa, a letra da versão final também não é espetacular. Não é má, apenas simples e inespecífica. Fala de pessoas tóxicas, calculistas, que fazem favores só para poderem cobrar de volta. O narrador deseja fugir delas. 

 

Quando tinha dezassete ou dezoito anos, esta era uma das músicas que me repelia, demasiado pesada para as minhas sensibilidades ainda muito pop. Hoje no entanto, como referi antes, é uma das minhas preferidas. Não sou a única – consta que é bastante popular entre os fãs. 

 

A letra de Forgotten é um bocadinho pior que a de A Place For My Head – pinta cenários vagamente emo, vagamente sombrios, mais nada. Uma vez mais, vale pelo instrumental. 

 

Nesse aspeto, Forgotten tem algumas semelhanças com With You no sentido em que alterna guitarras elétricas com momentos mais leves e atmosféricos, algo eletrónicos, nas estâncias. Gosto imenso do refrão, com Chester e Mike alternando na primeira metade e depois a parte melódica – quase de todas as vezes que oiço esta música, dou por mim a cantar esses versos, sobretudo no final: "In the memory, you will find me". E gosto da maneira como o último verso soa estranhamente esperançoso "until the sun rises up". 

 

By Myself é uma faixa muito parecida com Forgotten, não apenas no instrumental como também pelo facto de o refrão ser meio rap meio melódico. A letra é melhor, a musicalidade não (não que seja pior, é apenas menos impressionante). É uma música algo deprimente, que fala sobre solidão, cansaço, desânimo, insegurança, derrotismo. Só coisas boas, como podem ver. Se uma pessoa não se distrai dando uns headbands, fica na fossa. 

 

 

Consta que Chester não gostava muito de Runaway. Dizia que era uma das piores da banda, ao ponto de não querer mais tocá-la ao vivo. Eles mesmo assim mantiveram-na nas setlists até pelo menos 2012 – acho que só não a retiraram mais cedo porque sabiam que até era popular entre os fãs. 

 

Na minha opinião, é exagero dizer que é das piores dos Linkin Park, mas de facto não é nada de especial. A letra deixa um pouco a desejar – à semelhança de Forgotten, temos imagens sombrias, de revolta adolescente. Musicalmente segue a fórmula de Hybrid Theory, mas não tem a acutilância, a ferocidade de temas como One Step Closer ou A Place For My Head. 

 

Na verdade, agora que saiu a edição de vigésimo aniversário, gosto mais da versão demo desta faixa, Stick N Move – outra que vem dos tempos dos Xero. A versão mais antiga, com a voz de Mark Wakefield, não foi incluída na edição de aniversário, mas está disponível na Internet – em baixa qualidade. 

 

O instrumental é parecido com o de Runaway, mas o vocal é outro: as estâncias são em rap, o refrão é diferente. A versão cantada por Chester tem uma terceira parte apenas instrumental, mas a versão dos Xero tinha um rap de Mike interessante. 

 

Por mim, teria mantido a versão de Stick N Move cantada por Chester, juntamente com o rap da versão dos Xero. Sempre era um pouco mais interessante que Runaway. Mas consta que Don não gostava de Stick N Move. Mike e os outros também não morriam de amores pela canção, por isso, não se importaram que se transformasse em Runaway (mas no fim também não gostaram muito dessa…). Enfim. 

 

Crawling é uma música que tem subido na minha consideração nos últimos anos, se bem que não pelos motivos mais felizes. Musicalmente é uma balada, uma das músicas mais lentas de Hybrid Theory, mas não é menos pesada que a maioria do álbum – com alguns elementos eletrónicos, nomeadamente na introdução. Em termos de vocais, é impossível não assinalar os agudos impossíveis de Chester no refrão – falaremos sobre isso já de seguida. 

 

 

Todos concordam que esta será uma das músicas mais autobiográficas de Chester. O próprio explicou que a letra de Crawling é sobre admitir, por difícil que seja, que se tem um problema consigo mesmo, que não se tem controlo sobre si mesmo. No caso de Chester, isso diz respeito ao seu alcoolismo e toxicodependência, aos seus traumas, aos demónios que, no fim, lhe custaram a vida. Crawling é sobre ser-se o seu próprio pior inimigo. 

 

Há pouco tempo, Mike contou uma história engraçada sobre a letra do refrão. Se ouvirem a versão demo, lançada agora na edição de aniversário, hão de reparar que, tirando uma secção de rap que foi cortada na versão final, existem algumas diferenças pontuais na letra. Por exemplo, o verso "Fear is powerful", no refrão. Consta que, quando Mike e Chester mostraram esta versão a Don e lhe perguntaram a opinião sobre a letra, ele respondeu:

 

– Está boa. Gosto muito do verso "Fear is how I fall". 

 

Don ouvira mal a letra, mas Mike e Chester não disseram nada – concordaram tacitamente que a versão de Don era melhor. 

 

Em todo o caso, esta história chamou-me a atenção para esse verso. "Fear is powerful/how I fall, confusing what is real". O medo deita abaixo, altera a nossa perceção da realidade. Os nossos traumas, as nossas inseguranças fazem-nos recear coisas a que, racionalmente, não daríamos importância. 

 

Chester deu a entender que compôr e cantar Crawling, pôr a nu as suas partes mais negras, obrigou-o a tomar responsabilidade sobre si próprio, sobre a sua saúde mental. Chester não tinha problemas em admitir o seu passado difícil, os seus comportamentos aditivos e autodestrutivos. Tinha mesmo orgulho em ser um alcoólico em recuperação, em canalizar essas facetas para música que, como no caso de Crawling, depois se vendia aos milhões, ganhava Grammys e tocava ouvintes lidando com problemas semelhantes. 

 

Pois… 

 

 

Queria agora falar sobre um momento que contribuiu para a minha elevada consideração por Crawling. Foi, uma vez mais, no concerto de 2012 no Rock in Rio (que coincidiu com a altura em que estava a tomar o gosto à música mais pesada dos Linkin Park). Quando tocaram Crawling, Chester foi cantar para junto do público. Houve um engraçadinho que colocou um cachecol do FC Porto aos ombros do vocalista – um momento hilariante que, como o próprio Chester descreveu, deixou "muita gente feliz e muita gente fula". 

 

Tenho apego a esse momento porque envolveu Chester provando um bocadinho de portugalidade, envolvendo-se por breves instantes nas nossas rivalidades clubísticas. Chester foi um bocadinho nosso. 

 

Mas mesmo sem o cachecol, foi um momento bonito – sobretudo para os sortudos dos fãs, até tiveram o privilégio de contactar com só um dos melhores vocalistas de todos os tempos. Fiquei com inveja, claro, mas também fiquei contente por eles, por fãs portugueses terem tido essa sorte. Sobretudo o rapaz que cantou o refrão cara a cara com Chester. 

 

Agora que ele já não está entre nós, recordações como esta – bem como quando lhe agarrei a mão por um momento no concerto do Rock in Rio de 2014 – ganharam um carácter agridoce. Pergunto-me como terão reagido aqueles fãs à notícia da morte de Chester. Terão dado graças por terem tido aquela oportunidade? Terão sentido pena por essa já não se poder repetir? Sentem mágoa, como eu, por as vozes deles cantando Crawling não terem falado mais alto que as vozes na cabeça dele? 

 

Depois do que aconteceu há três anos, tenho pensado muito no verso "Against my will I stand beside my own reflection, it's haunting", em como ele escolheu cantar esta música específica para junto do público – não apenas no Rock in Rio 2012, também noutras ocasiões, como no vídeo da digressão One More Light. Penso no verso de No Friend, dos Paramore (já não é a primeira vez que escrevo sobre isso aqui no blogue, pois não?): "I see myself in the reflection of people's eyes/Realising that what they see may not even be close to the image I see in myself". Seria por isso que Chester vinha para junto dos fãs? Para se ver refletido nos nossos olhos, para tentar ver-se a si mesmo como nós o víamos? Não o seu pior inimigo mas sim alguém digno de admiração, de carinho? 

 

Nunca saberemos. 

 

 

Queria agora falar sobre a versão de Crawling editada no álbum da digressão One More Light. Em linha com o disco menos pesado e agressivo, esta é uma versão apenas com piano num tom um pouco mais grave que a versão do álbum, mais cantada que gritada – Chester bem se tinha queixado que a melodia original era difícil de cantar. 

 

A música fica com um carácter completamente diferente assim. A versão de estúdio, com o refrão agudo, barulhento, soa raivosa, algo melodramática. Encaixa-se no estilo de Hybrid Theory, não me interpretem mal, e sei que é catártica para muitas pessoas, mas acho que distrai um pouco da mensagem trágica da letra. 

 

O que não é necessariamente um ponto fraco, agora que penso nisso. Um dos feitos de Hybrid Theory, é dos Linkin Park em geral, diz respeito à maneira como deram voz às angústias e revoltas de adolescentes, sobretudo rapazes. Isto nunca altura em que sentimentos no masculino ainda eram menos tolerados que agora. Ainda assim, a emoção dominante em Hybrid Theory é a raiva, que, como já tínhamos visto antes é a única emoção que homens podem exprimir, segundo o patriarcado. 

 

Nesse sentido, Crawling é um bom exemplo desta… ambiguidade, à falta de melhor palavra. À primeira vista (ou melhor, audição), esta é uma música dominada pela ira. No entanto, basta prestar um pouco de atenção para se perceber que essa ira esconde muita coisa.

 

A versão ao piano é mais transparente, nesse aspeto – o que faz sentido mais de quinze anos depois, num homem mais maduro. Esta é uma Crawling mais triste, mais resignada. Eu chorei da primeira vez que a ouvi, quando saiu o álbum ao vivo (tecnicamente já tinha ouvido esta versão antes, quando lançaram Heavy em fevereiro desse ano, mas muita coisa acontecera entretanto, tinha-me esquecido completamente). Ainda tinha passado pouco tempo, a dor era ainda recente. Esta versão soava – ainda soa – como uma versão memorial. Ainda agora, ao ver o vídeo da apresentação ao vivo, ao vê-lo cantando junto dos fãs, lacrimejei um pouco. Abracem-no. Abracem-no e não o larguem. 

 

Eu diria, para resumir, que a versão de estúdio de Crawling é a versão adolescente. A versão ao piano é a versão adulta. 

 

 

Existe outra versão adulta de Crawling, outra versão memorial. Eu já tinha falado dos Bad Wolves aqui no blogue, a propósito do cover de Zombie, que lançaram pouco depois da morte de Dolores O'Riordan. Este ano voltaram a homenagear outra lenda do rock que partiu demasiado cedo. Lançaram um cover de Crawling na semana do aniversário da morte de Chester. 

 

Este cover acaba por ter um tom semelhante da versão de Crawling ao piano. É uma versão acústica no fundo: conduzida pelo piano, também, acompanhada por guitarra acústica, violinos, percussão. Incluíram também um solo de guitarra muito fixe. Gosto muito deste cover. 

 

Quando publicaram esta versão de Crawling no Facebook, juntaram-lhe uma mensagem dolorosa sobre os efeitos a longo termo de abusos sexuais na infância (a parte de desvalorizar o racismo é que era desnecessária). Chester infelizmente foi um bom exemplo. 

 

Por paradoxal que seja, gosto cada vez mais de Crawling, em parte por causa destas versões mais recentes. Mas também reconheço que, depois de 20 de julho de 2017, é uma das mais dolorosas. Antes da morte de Chester, havia muita gente que não levava a letra de Crawling a sério. Achavam que era exagerada, talvez para apelar aos dramas de adolescentes – sendo esses próprios dramas desvalorizados. 

 

Mas não, não era exagero nenhum, era real – e quando muitos de nós o descobriram já era tarde. E foram precisamente as coisas sobre as quais cantou que o mataram. 

 

Eu sei que tanto a vida como a morte de Chester terão ajudado muitas pessoas. Se hoje se fala mais sobre saúde mental, se as mentalidades estão a mudar, é pelo menos em parte por causa do que lhe aconteceu. Mas dói à mesma. Nos meus piores dias tenho vontade de mudar a letra para "these wounds will never heal". 

 

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*suspiro* Às vezes chateia-me que, desde julho de 2017, sempre que se fala dos Linkin Park, falamos inevitavelmente do que aconteceu a Chester. Já foi um alívio não ter tido de falar no assunto quando escrevi sobre She Couldn't, tirando uma referência muito breve. Imagino que seja mil vezes pior para Mike e os outros – talvez seja por isso que ainda não regressaram em força como banda. 

 

Que se pode fazer? Chester era o coração dos Linkin Park. Sem ele é tudo diferente, sobretudo tendo partido da maneira como partiu. Talvez um dia seja possível recordar Chester sem dor, só com alegria. Quanto a mim e a este blogue, vou tentar não puxar o assunto sem necessidade, mas quando achar que se justifica não vou deixar de assinalá-lo. 

 

Enfim, perdoem-me este desabafo, perdoem-me terminar esta parte da análise numa nota tão triste. A terceira e última parte será menos deprimente. Publico-a amanhã. 

Linkin Park – Hybrid Theory (2000) #1

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Hybrid Theory, o primeiro álbum de estúdio dos Linkin Park, completou na semana passada vinte anos bem contados desde a sua edição. Conforme o prometido, para assinalar o aniversário (ainda que com alguns dias de atraso), hoje vamos começar a examinar este álbum. Digo começar porque, como o costume, tinha muito a escrever e, assim, a análise terá três partes. Esta é a primeira.

 

Sendo Hybrid Theory um álbum de estreia, não podemos falar sobre ele sem falarmos sobre as origens da banda. Até porque, no passado dia 9 de outubro, saiu uma edição especial do álbum, comemorativa do vigésimo aniversário, com uma data de material adicional, parte dele completamente inédito, que vai até aos primórdios dos Linkin Park enquanto banda. 

 

Já que falo nisso, quero desde já avisar que esta análise focar-se-á sobretudo no alinhamento padrão do álbum, como já tinha dito antes. Isto porque, em primeiro lugar, é aquele com o qual estou mais familiarizada. Tirando um caso ou outro, no que toca aos Linkin Park, oiço sobretudo os álbuns de estúdio. Antes desta edição de Hybrid Theory, nunca liguei muito a B-sides, a demos ou mesmo a álbuns de remixes, como o Reanimation, o Collision Course ou o Recharge (exceto singles como Numb/Encore e A Light that Never Comes). Sou uma fã pouco hardcore

 

Em segundo lugar, esta nova edição de Hybrid Theory é constituída por nada menos que oitenta faixas, quatro horas e vinte e cinco minutos de música de acordo com o Spotify. É certo que uma parte parece ter sido para encher chouriços: algumas são versões ao vivo e, por exemplo, temos uma versão de One Step Closer literalmente igual à versão de estúdio, apenas sem os discos giratórios. Mas de qualquer forma, é demasiado material e esta análise já vai ser longa. Vou deixar algumas impressões sobre as B-sides mais perto do fim (tirando High Voltage e My December), e hei de referir algumas demos quando analisar as faixas principais do álbum. Mais nada.

 

Comecemos então pelo princípio. Mike Shinoda, hoje multi-instrumentista, vocalista/rapper e em geral cérebro dos Linkin Park, sempre mostrou aptidão para a música. Esta e o desenho são as suas grandes paixões. Aos seis anos já tocava piano. Em adolescente fazia misturas de música rock com hip-hop só pelo gozo, com equipamento de produção comprado por ele mesmo. Foi assim que aprendeu a produzir música.

 

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Quando estava no equivalente americano ao Secundário, Mike formou uma banda chamada Xero, juntamente com os seus amigos Brad Delson (atual guitarrista dos Linkin Park), Rob Bourdon (atual baterista) e Mark Wakefield, amigo de infância de Mike, como vocalista. Mais tarde, o grupo conheceu Joe Hahn (DJ) e Dave “Phoenix” Farrell (baixista) na faculdade e acolheu-nos nos Xero. Mark, no entanto, acabou por desistir da banda e, segundo Mike, acabou por seguir uma carreira como agente de bandas. 

 

Por esta altura, entretanto, Chester Bennington, cantor, tinha deixado a sua banda, Grey Daze. Esteve perto de desistir da música quando, no dia em que completava vinte e três anos, recebeu uma cassete com demos dos Xero. A edição de aniversário de Hybrid Theory inclui essas demos – segundo o que consegui averiguar com fãs mais bem informados do que eu, as faixas terão sido Pictureboard, Rhinestone (uma versão beta de Forgotten) e Essaul (uma versão beta de A Place For My Head). Chester terá faltado à sua própria festa de aniversário para gravar por cima das versões instrumentais destas faixas. 

 

Quando ouviram as músicas com a voz de Chester, Mike e os outros ficaram rendidos. Brad inclusivamente, a propósito do lançamento da edição de aniversário de Hybrid Theory, falou há pouco tempo sobre o momento em que ouviu Pictureboard cantada por Chester – o guitarrista quase chorou. 

 

Quem nunca?

 

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Brad e os outros pediram a Chester para vir, mas por algum motivo não lhes ocorreu desmarcarem as audições com outros cantores. Já estavam a ensaiar com Chester, mesmo a gravar com ele, mas oficialmente ainda estavam à procura de vocalista. As audições decorreram ao longo de três dias, com a banda a interromper os ensaios com Chester para ouvir outros candidatos.

 

Ora, Chester não estava a achar piada nenhuma à brincadeira. Eu, para ser sincera, reagiria da mesma forma, se tivesse sido comigo. Qual é a lógica de fazer audições se o vocalista já estava praticamente escolhido? Era muito mais honesto desmarcar as audições – ao menos não davam falsas esperanças aos candidatos. 

 

Consta que um desses recusou-se mesmo a fazer a audição depois de ouvir Chester a cantar, nos ensaios da banda. 

 

– Vocês são uns idiotas se não aceitarem este gajo [Chester] – terá ele dito. Depois voltou-se para Chester e disse – Se eles não te aceitarem, liga-me e começamos nós uma banda. 

 

Felizmente, Mike e os outros não foram idiotas. 

 

Assim, Chester juntou-se ao grupo e assumiram como nome “Hybrid Theory” – precisamente pela sua filosofia de fundirem géneros musicais. Como vimos antes, She Couldn’t foi uma das primeiras músicas a compôrem – embora não a tenham incluído no EP que gravaram de forma independente e começaram a enviar às editoras discográficas. Esse EP, também intitulado Hybrid Theory, foi incluído na edição de aniversário. Ao mesmo tempo, recorriam à Internet para fazerem a sua música chegar diretamente a possíveis fãs. 

 

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A Internet do final dos anos 90, há que sublinhar. Muito antes de o YouTube, o Soundcloud e afins existirem. Não deve ter sido fácil. 

 

De início tudo o que era editora os rejeitou, apesar de estarem a ter algum sucesso na Internet. Mesmo a Warner só aceitou assiná-los após os ter rejeitado três vezes – e a ideia com que fico é que o fez de má vontade, pois os primeiros tempos não foram fáceis para eles. Consta que o presidente da Warner não gostava deles, não queria lançar-lhes o álbum. Houve quem lhes dissesse para arranjarem algo que os distinguisse dos demais, tipo Joe Hahn usando bata de laboratório em palco (eu pessoalmente não me importava, mas pronto). 

 

O pior de tudo foi terem tentado meter Chester como protagonista da banda e despromoverem os outros membros a banda de apoio. Queriam mesmo expulsar Mike, o que seria uma blasfémia. Felizmente, Chester não era uma besta e disse-lhes onde podiam enfiarem essa ideia.

 

Até o produtor que trabalhou com eles, Don Gilmore (que mais tarde produziria algumas faixas de Under My Skin) lhes fez a vida negra. No entanto, fê-lo porque acreditava neles, não o contrário.  Consta que Don obrigou-os a comporem e gravarem uma grande parte do Hybrid Theory em dois meses – veja-se o facto de só A Place For My Head e Forgotten terem sobrevivido deste os tempos dos Xero até ao alinhamento final. Don obrigava-os a rescreverem letras umas trinta vezes, a regravarem instrumentais até ao infinito. A partir de certa altura, Mike e os outros já não podiam vê-lo à frente.

 

A meu ver, Don era como certos pais e professores muito exigentes com as crianças, não por maldade, antes por quererem extrair o melhor delas. Em pequenos não gostamos nada, mas mais tarde reconhecemos que a sua exigência nos tornou melhores. É claro que, com crianças, é preciso ter cuidado com tais pressões, podem ter o efeito oposto. Ao menos Mike e os outros já eram adultos – o que mesmo assim não os impediu de se irritarem com Don, ao ponto de escreverem uma letra sobre ele, como veremos adiante. E para sermos justos com Don, ele admitiu que sim, era exigente com Chester e os outros e estes irritavam-se, mas seguiam as suas instruções e os resultados estão à vista. 

 

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Chester contribuía para as letras baseando-se na sua vida difícil, com o divórcio dos pais, abuso sexual, toxicodependência, como todos sabemos – contrabalançando com a infância mais saudável de Mike e dos outros. Tentavam ser honestos, mas não demasiado específicos de modo a poder ressoar com a maioria da audiência. Consta que Don lhes ia dizendo:

 

– Não quero ouvir os vossos problemas, quero ser entretido!

 

Confesso que devo ser uma exceção à regra entre os fãs de Linkin Park porque, tirando alguns casos, no que toca a Hybrid Theory, ligo menos aos “problemas” e mais ao entretenimento: à sonoridade, à atitude, aos headbangs, ao mood. Como referi algumas vezes neste blogue, este género de música inspira-me quando escrevo cenas de ação, de luta, em ficção. Só há pouco tempo – e nalguns casos só agora, nas pesquisas para esta análise – é que comecei a prestar atenção à parte dos “problemas”.

 

Em todo o caso, os Linkin Park nunca tiveram problemas em combinar o seu lado autobiográfico com o lado do entretenimento.

 

Quando o álbum ficou pronto, toda a gente na editora se rendeu, esquecida de quaisquer problemas que pudessem ter com o grupo. O álbum passou a ser a prioridade número um. E, mais tarde, Don voltaria a colaborar com eles nos trabalhos de Meteora.

 

Não puderam, contudo, manter Hybrid Theory como nome da banda. A editora já tinha um grupo chamado Hybrid, ia criar muita confusão. E, aqui entre nós, Hybrid Theory não soa bem como nome de banda – é pouco fluido. Além de que, se quisessem algum dia criar música que não se encaixasse em teorias híbridas, estariam a contradizer o seu próprio nome. 

 

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Um dia Chester passou por um parque público chamado Lincoln Park. Consta que existe um em quase todas as cidades americanas. Tentaram adotá-lo como nome para a banda, mas quando tentaram criar um site o domínio “lincolnpark.com” já existia. Apropriarem-se dele sairia caro. Saiu mais barato mudarem para linkinpark.com – que, todos concordam, soa muito melhor.

 

Hybrid Theory ficou, deste modo, o nome do álbum. Eu, no entanto, não comecei por aí. Quando descobri os Linkin Park, estávamos em 2004/2005 – era de Meteora, quiçá de Collision Course. Mesmo assim, só fiquei a conhecê-los mais a fundo em 2007, na era Minutes to Midnight. No verão desse ano, o meu irmão foi passar férias com os meus padrinhos, que têm um filho pouco mais novo que ele. Regressou a casa com o MP3 cheio de música dos Linkin Park. Ele nunca me disse onde a obteve, mas estou certa de que foi legal. 

 

Na altura tinha dezassete anos. Gostava de rock, desde que não se afastasse demasiado do pop – embora já começasse a ouvir Green Day, também por influência do meu irmão. Sou uma exceção à regra no sentido em que comecei a ouvir música mais pesada como adulta (bem, adulta legal) e não como adolescente. Os Linkin Park foram, a par dos Green Day (que hoje em dia já praticamente não oiço), a banda que me ajudou a fazer a transição. 

 

Nesse primeiro ano, quando ouvia Linkin Park, ouvia as faixas todas em aleatório, sem querer saber a que álbum pertenciam. De início, as músicas que mais me atraíam eram as mais levezinhas – ou seja, Pushing Me Away e, mais tarde, In the End, no caso de Hybrid Theory. 

 

Vou admiti-lo desde já: o motivo pelo qual Pushing Me Away me atraiu diz respeito às semelhanças com Numb. O riff na introdução, as guitarras que se juntam, a estância cantada por Chester, umas frases em rap de Mike no pré-refrão. Isso na altura não pesou, mas outra semelhança é o facto de, tal como Numb, surgir no fim do alinhamento, depois de uma faixa instrumental. 

 

 

Mesmo a letra entra em territórios parecidos com Numb – no sentido em que o narrador se queixa de ter de suprimir emoções, uma parte de si, para agradar a outra pessoa. 

 

Sei que não é justo estar a comparar uma canção com outra composta mais tarde. Mas como ouvi Numb primeiro não consigo evitar – e, em minha defesa, a própria banda admitiu há pouco tempo que, se não tivessem criado Pushing Me Away, provavelmente não teriam composto Numb, que Numb é uma versão melhorada de Pushing Me Away. Esta faixa pode ter sido a primeira a cativar-me neste álbum, mas hoje considero-a a menos interessante. Isto sem deixar de ser uma boa canção. 

 

A segunda música de Hybrid Theory a cativar-me foi In the End – isto quando já ouvia a amálgama de músicas dos Linkin Park há uns meses. Tornou-se rapidamente uma das minhas favoritas. 

 

Não é difícil compreender o motivo pelo qual esta canção se distinguiu das demais: é uma versão mais leve, mais pop, mais acessível, da fórmula rap sobre guitarra elétrica dos Linkin Park, sobretudo no início da carreira deles. In the End começa com uma sequência de piano, composta por Mike, que se repete várias vezes ao longo da música. As estâncias são acompanhadas por notas de guitarra e baixo e, de vez em quando, piano. Os acordes mais pesados – mesmo assim, não demasiado – só surgem no refrão e na terceira parte. In the End terá sido incluída em Hybrid Theory e lançada como single precisamente para servir de ponte entre o mainstream e o som mais pesado do resto do álbum.

 

E resultou. Pelo menos comigo resultou, mesmo tendo conhecido a música fora do contexto do álbum. E pela maneira como In the End é uma das canções mais populares da banda, acho que não fui caso único – se calhar, para muitos fãs, esta foi a primeira música dos Linkin Park que conheceram. 

 

In the End caracteriza-se pelo tom leve, de apatia, de frustração. A letra é simples, fala sobre algo pelo qual se lutou, se sacrificou mas que… no fim… falha e/ou não vale o esforço. Pode referir-se a qualquer coisa: uma relação, um projeto, um emprego um objetivo qualquer.  Consta que foi inspirada pelos conflitos entre a banda e a editora – aquelas pessoas que queriam promover Chester a protagonista à custa de Mike. Uma altura em que o grupo receava que o seu sonho de editar um disco fosse ao ar. 

 

 

In the End foi sempre um ponto alto nos concertos dos Linkin Park – falo por experiência própria. Quando a tocaram no concerto do Rock in Rio de 2008, marcou-me particularmente – por ter decorrido poucos meses depois de me ter deixado cativar por In the End. Nunca irei esquecer a emoção de ouvir toda a gente à minha volta cantando (“rapando”?) em altos berros, de ver Mike junto do público. Ainda hoje partilho este vídeo nas redes sociais quando Mike faz anos.

 

In the End sempre foi a canção dos fãs nos concertos. Tecnicamente Chester cantava o refrão, um ou outro verso do rap, a terceira estância. Na prática, era frequente a voz dele afogar-se no coro da audiência. E na segunda parte da terceira estância, Chester pura e simplesmente voltava o microfone para o público. Como tal, não surpreendeu que, no concerto do Hollywood Bowl, o convidado especial de In the End tenha sido o preferido da banda: a audiência. Nem que, durante a digressão de Post Traumatic, Mike tenha escolhido esta música para deixar palavras sábias sobre Chester – antes de tocar a música ao piano, com a audiência cantando as partes melódicas. 

 

Demorei alguns anos a ganhar apreciação pelo som mais pesado dos Linkin Park. Foi na altura em que saiu o Living Things. Passei uma boa parte desse ano e do seguinte a ouvir essas músicas, uma vez mais fora do contexto dos álbuns – à mistura com os excelentes temas do quinto disco. Só mais tarde – em 2017, poucas semanas antes do lançamento de One More Light, quando comprei o Hybrid Theory e Meteora em CD – é que me apercebi que a maior parte das músicas de que mais gostava vinham de Hybrid Theory.

 

Falemos então sobre elas. Começando pelo single de apresentação da banda, One Step Closer. 

 

Este tema é um enorme clássico dos Linkin Park, um bom exemplo da sua sonoridade mais pesada – destaquem-se as guitarras na introdução, mas também Hahn com os discos giratórios, na terceira parte da música. 

 

 

Consta que a letra de One Step Closer foi inspirada pela irritação que Mike e Chester sentiam com Don Gilmore – que, como referimos acima, era muito exigente com eles, raramente ficava satisfeito com o seu trabalho. O “Shut up!” da terceira parte era dirigido a Don. One Step Closer fala de frustração, de raiva, de se sentir puxado até ao limite. É uma letra simples, não demasiado específica, aplicável a milhentas situações. Talvez seja daí que venha o apelo para muitos fãs. 

 

Eu pessoalmente acho a letra algo básica – sobretudo a terceira parte. Os gritos de Chester, entre Hahn arranhando discos, são impressionantes, não me interpretem mal. No entanto, o “Shut up when I’m talking to you” soa-me a um professor a gritar com alunos mal comportados. 

 

Em suma, é uma boa canção, um clássico, presença obrigatória nos concertos – durante vários anos encerrou setlists. Eu em particular tenho uma boa recordação com ela: no início de 2017, no Coliseu dos Recreios, enquanto esperava pelo início do concerto dos Sum 41. Como o costume, estavam a dar-nos música, literalmente – vinda dos altifalantes, para nos entreter. Quando tocaram o One Step Closer, uma grande parte do público, eu incluída, cantou em coro. 

 

Não surpreendeu. Os Sum 41 e os Linkin Park surgiram mais ou menos na mesma altura, têm algumas semelhanças no estilo, partilham muitos fãs. Foi um momento bonito, que serviu de aperitivo para o que viria mais tarde.

 

Ah, as saudades que tenho de concertos…

 

Ainda assim, One Step Closer não está entre as minhas preferidas dos Linkin Park. Nem mesmo de Hybrid Theory.

 

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Quais é que são as minhas preferidas? A resposta fica para amanhã.

Mike Shinoda – Post Traumatic (2018)

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Mike Shinoda lançou, no passado dia 15 de junho, Post Traumatic, o seu primeiro álbum em nome próprio – apesar de já habitar no mundo da música há cerca de vinte anos, sobretudo como cérebro dos Linkin Park, mas também com o seu side-project, Fort Minor.

 

O projeto Post Traumatic, aliás, começou com um EP de três músicas, lançado no início do ano – já falámos sobre ele antes, bem como sobre um par de músicas que Mike lançou uns meses depois.

 

Na verdade, à data do lançamento oficial, quase metade do álbum estava cá fora. Penso que já referi aqui que não gosto muito dessa moda: quando vamos ouvir o álbum pela primeira vez as músicas que já conhecemos antes ensombram as que não conhecemos. Demora imenso tempo até estarem todas em pé de igualdade.

 

Foi, em parte, por isso que depois de About You me esforcei por não ouvir nada até ao lançamento oficial do álbum. Mike, no entanto, explicou que a ideia era ir partilhando as músicas connosco em tempo real, dentro do possível, documentando o seu estado de espírito na altura.

 

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Post Traumatic é isso, aliás: um diário musical de Mike, nos primeiros nove meses, mais coisa menos coisa, após a morte de Chester Bennigton. A tracklist está ordenada de modo mais ou menos cronológico. E de facto nota-se uma evolução ao longo do álbum, começando com um tom sombrio (raiva, desesperança, frustração e, sobretudo, luto) e terminando num tom… não diria luminoso, mas bem menos pesado, com alguma esperança, até.

 

Não que seja uma progressão linear. Mesmo depois de um ponto de viragem algures entre Promises I Can’t Keep e Crossing A Line, há ocasiões em que Mike parece regredir, em que a uma música mais leve se segue uma mais sombria. O contraste mais ostensivo, na minha opinião, é Hold It Together (uma das mais pesadas de todo o álbum) a seguir a Crossing a Line. Outro exemplo é Ghosts vir antes de Make It Up as I Go – que, por sinal, começa com a frase “I keep on running backwards”. O próprio Mike já comentou, em diversas ocasiões, que o todo este processo não lhe tem sido linear, que as fases do luto – negação, raiva, negociação, depressão, aceitação – não ocorrem necessariamente por esta ordem. Cada pessoa tem a sua progressão.

 

Eu argumentaria que o tema principal de Post Traumatic é precisamente controlo. Não apenas sobre as emoções da perda, mais até sobre as consequências dessa perda.

 

Conforme tínhamos comentado antes, Mike não perdeu apenas uma das pessoas mais importantes da sua vida, ele essencialmente perdeu o seu emprego, o seu modo de vida, parte da sua identidade. Perdeu os Linkin Park. O futuro da banda tem sido amplamente discutido ao longo do último ano, ano e meio (se pode ou deve continuar sem Chester, se devem arranjar um novo vocalista, etc), mas lá está: não se sabe. Ninguém sabe. Depois de quase duas décadas de Linkin Park, da noite para o dia a vida profissional de Mike, tal como a conhecia, esfumou-se, deixando-o sem saber o que fazer.

 

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A frase “only my life’s work hanging in the fucking balance”, de Over Again, parece ser a ideia principal de Post Traumatic, o denominador comum à maioria das faixas. O álbum documenta a busca de Mike por controlo sobre o seu destino, a procura de, como o próprio têm referido, “um novo normal”.

 

Já escrevi antes sobre as primeiras quatro faixas do álbum. As minhas opiniões não mudaram radicalmente desde essa altura. No entanto, gosto um bocadinho mais de Watching As I Fall e Nothing Makes Sense. A primeira faz mais sentido no contexto do álbum – falaremos melhor sobre isso mais à frente – e ganhei apreço às guitarras elétricas, bem à Linkin Park, depois dos últimos refrões.

 

Também Nothing Makes Sense Anymore faz mais sentido (no pun intended) no contexto do álbum. Os efeitos na voz do Mike não me incomodam tanto e compreendo um bocadinho melhor a letra, as metáforas. A pintura que levou com tinta entornada quando estava quase pronta. Mike num penhasco sobre o mar, julgando-se protegido do tumulto das ondas, até o chão abater-se sobre os seus pés, atirando-o para a tempestade. Mike debatendo-se no escuro, à procura de uma luz. Gosto particularmente dos versos “I’m a calll without an answer, I’m a shadow in the dark, trying to pull it back together, as I watch it fall apart”.

 

Passou-se isso com a maior parte das músicas em Post Traumatic: precisei de tempo, de ouvir várias vezes, para aprender a apreciá-las. Isso, ou estou numa altura em que só consigo ouvir música com ouvidos de ouvir sob a forma de CDs no meu carro.

 

 

Quando About You foi lançada, por exemplo, não achei nada de especial – mais uma vez, não era fã dos efeitos na voz de Mike. No entanto, uma vez mais com o tempo deixei-me de ralar com isso, sobretudo no contexto do álbum.

 

O tema principal da canção é o facto de toda a gente assumir que toda e qualquer música criada pós Jullho de 2017 será sobre Chester. Não que não seja compreensível: foi um acontecimento de grande impacto na vida pessoal dele e toda a gente soube. Um pouco à semelhança do que acontece, por exemplo, com as músicas da Taylor Swift, em que toda a gente tenta descobrir sobre qual nos ex-namorados ela canta.

 

No entanto, uma coisa são ex-namorados, outra coisa muito diferente é um homem que morreu demasiado cedo e de uma forma horrível. Tendo em conta que Mike sente dificuldade em manter o luto sob controlo (e havemos de voltar a falar sobre esse aspeto), não lhe será fácil ouvir toda a gente perguntando-lhe coisas como:

 

– E neste verso, em que falas de beijar o céu? És tu a tentares ir ter com o Chester ao Além?

 

Talvez isto tenha sido um fator pesando contra a decisão de lançar música a solo – saber que não poderia fugir a estas perguntas, que mesmo que compusesse sobre outros temas, as pessoas iriam sempre ligá-lo a Chester. Aliás, em About You, Mike parece não querer dar esse passo. Em parte pelos motivos que acabámos de discutir, em parte porque já passara metade da sua vida fazendo música. Talvez já não tivesse nada sobre que cantar.

 

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É um medo que todas as pessoas criativas têm de vez em quando: que um dia a fonte seque e já não tenham nada para criar. Mike chega mesmo a pôr a hipótese de aproveitar a desculpa e zarpar.

 

Ainda bem que não o fez.

 

Em About You, temos a participação de blackbear. Segundo Mike, os versos que ele interpreta foram inspirados na experiência que ele teve com os Linkin Park (ele colaborou com Mike na composição de Sorry For Now, no álbum One More Light). Os versos são abstratos de propósito, a ideia é cada ouvinte fazer a sua interpretação.

 

A meu ver, estes versos refletem sobre o processo de cantar sobre, lá está, alguém que morreu. O narrador (o próprio blackbear?) parece achar que é apenas uma cura rápida, nada que funcione a longo prazo (“Find something that works fits the symmetry, for only a quick broken remedy”). Ao mesmo tempo, também fala da falta de controlo sobre o processo de luto, tal como referimos antes.

 

 

A faixa que se segue, Brooding, é um tema instrumental. O termo “brooding” não tem tradução literal em português – significa algo como amuar, sem a conotação condescendente.

 

É um bocadinho complicado tentar interpretar o significado de uma peça instrumental, mas vou tentar... Brooding começa, de facto, de forma melancólica, ganhando ritmo depois do primeiro minuto – talvez simbolizando emoções em conflito, talvez representando uma tomada de decisão. Não sei. Signifique o que significar, faz uma boa transição entre About You e Promises I Can’t Keep.

 

Em termos musicais, esta última tem um estilo parecido ao do álbum Living Things. É o que acontece com muitas músicas neste álbum: adotam um estilo híbrido entre rock e eletrónico, semelhante ao dos álbuns A Thousand Suns e Living Things. Promises I can’t Keep tem ainda alguns elementos que me recordam Leave Out All the Rest. Em todo o caso, é um estilo de que gosto.

 

Em termos de letra, Promises I Can’t Keep pega de novo no tema da perda de controlo, parecendo até uma sequela direta a A Place to Start. Mike lamenta o fim da sua vida antiga com os Linkin Park, segura, previsível. Receia o futuro. Culpa-se a si mesmo por ter sido apanhado de surpresa, por não ter conseguido evitar o que aconteceu.

 

 

Ao mesmo tempo, no refrão, Mike parece ganhar noção que a segurança da sua vida antiga, o controlo que tinha sobre ela, eram ilusórios. Que não havia muito que ele pudesse ter feito. Assim, Mike procura habituar-se a isso. Procura aceitar que poderá não conseguir pôr os seus planos em prática e, lá está, cumprir as suas promessas.

 

Penso que é aqui que se dá o switch, que quando Mike se conforma com a instabilidade, quando aceita que a sua vida nunca mais será a mesma, que fica em condições de dar o próximo passo.

 

O que nos leva a Crossing A Line.

 

Tal como já tínhamos visto antes, esta faixa também pega no tema da falta de controlo, da incerteza, mas sob um ponto de vista mais esperançoso. Mike continua a sentir-se impotente perante o desconhecido, mas ao menos sabe o que quer fazer e acredita em si mesmo.

 

Crossing A Line continua a ser uma das minhas preferidas. Após uma primeira parte bastante sombria, o seu tom luminoso é agradável.

 

 

Avançando um pouco na tracklist, aliás, encontramos Make it Up As I Go, que me soa a uma versão sombria de Crossing A Line. Em ambas as canções, Mike mostra-se decidido a seguir em frente, a construir uma nova vida, a encontrar “um novo normal”. A diferença está na motivação. Em Crossing A Line, Mike é motivado por esperança. Em Make it Up As I Go, Mike é motivado por resignação, impaciência, mesmo teimosia, diria eu.

 

Mike queixa-se, mais uma vez, que o caminho para a recuperação não é linear, que de vez em quando dá passos para trás. Admite mesmo que ainda não está bem, que ainda tem dúvidas, que de vez em quando perde a esperança.

 

No entanto, Mike não quer de todo ficar parado e ceder ao desespero. Sabe que ninguém pode ajudá-lo, que tem de ser ele mesmo a desenrascar-se. Quer seguir em frente, mesmo que não saiba para onde vai, mesmo que tenha de se venturar no desconhecido. Mesmo que tenha, como reza o título da canção, de ir improvisando, de ir inventando pelo caminho.

 

É uma letra que acho muito interessante e algo estranha, mesmo. No que toca a músicas sobre seguir em frente, estou habituada a temas luminosos e letras esperançosas – Last Hope, dos Paramore, Keep Holding On, da Avril Lavigne, Million Reasons, da Lady Gaga, Crossing a Line neste mesmo álbum. Não estava habituada a uma música ao mesmo tempo sombria e motivadora. Mas acredito que existam pessoas que se identifiquem mais com este estilo do que com músicas como as que referi acima.

 

 

K.Flay é quem canta o refrão de Make it Up As I Go. Julgo que esta é a primeira vez que ouvimos a voz de Mike ao lado de uma voz feminina. Não sou grande fã da voz de K., soa-me demasiado artificial. Em Make it Up as I Go até encaixa bem, mas não sei se ia gostar de ouvir uma música cantada a solo por ela.

 

Voltando um bocadinho atrás na tracklist, a Crossing a Line, uma das músicas mais esperançosas de todo o álbum, segue-se uma das mais deprimentes. Holding It Together mostra as piores partes do processo de luto: os esforços que Mike ia fazendo para não ir abaixo, as noites mal dormidas, a sua esposa, Anna Shinoda, sofrendo com ele.

 

A música fala especificamente de um episódio verídico, em que alguém terá falado a Mike acerca de Chester, durante uma festa de anos de uma criança- Mike não gostou e terá respondido com uma piada que não caiu bem.

 

Estou certa que o tal sujeito, ou sujeita, não terá falado com más intenções. Eu própria, se calhar, também meteria o pé na poça. Mas, lá está, Mike estava com dificuldades em manter as emoções do luto sob controlo. Talvez pensasse que a festa de anos do miúdo ajudá-lo-ia a espairecer. Até vir esta pessoa estragar tudo.

 

 

Há pessoas que dão tempo a Mike para recuperar, que o aconselham a não ter pressas. Um bom conselho, só que Mike sente o tempo a passar, deixando-o para trás. Como diria Ellis Grey, o carrossel não pára de girar. Não dá para carregar no botão de pausa, não dá para andar para trás, não dá para sair dele.

 

Não que Mike não o tenha tentado, como vemos em Lift Off.

 

Esta é uma faixa interessante. Tem uma sonoridade inesperadamente etérea, fazendo pensar em voos noturnos e céus estrelados. A interpretação do refrão – por Chino Moreno, dos Deftones – também contribui para esse efeito. As estâncias, cantadas em rap, casam estranhamente bem com o acompanhamento atmosférico.

 

A parte musical condiz com a letra da canção. Mike terá composto Lift Off baseando-se na necessidade que sentiu, em diferentes alturas desde que Chester morreu, de fugir da tudo. De, lá está, tentar carregar no botão de pausa e sair do carrossel.

 

 

A expressão “Lift Off”, “descolagem” será, então, uma metáfora para este escapismo: levantando voo em direção ao espaço, longe de tudo, fugindo para um plano superior, etéreo. Para sítios perfeitos, como se calhar diria Lorde.

 

As estâncias também usam imagens espaciais. Na primeira estância, Mike usa um bocadinho de “braggadocio” – uma espécie de arrogância vazia que quase tudo o que é rapper demonstra na sua música. Não faz muito o meu estilo, confesso, mas depois do ano que Mike teve, não me importo. Se isso o ajuda…

 

A segunda estância é interpretada por Machine Gun Kelly (só me apercebi há relativamente pouco tempo que era o tal que não se encaixava em Papercut, durante o concerto por Chester). A parte dele lembra-me um pouco Airplanes, de B.o.b e Hayley Williams no sentido em que fala de sonhos falhados.

 

Agora que penso nisso, Airplanes e Lift Off são bastante parecidas: tanto pela parte de Machine Gun Kelly, pelas temáticas aeronáuticas e espaciais e pela sonoridade algo atmosférica e sonhadora.

 

 

Ghosts é a música mais pop de todo o álbum. Segundo Mike, nesta faixa ele permitiu-se a si mesmo divertir-se. “Já tive dias difíceis que chegue”, disse mesmo. “Se acordo e me sinto bem, não devia sentir-me culpado por me divertir.”

 

Eu também acho que não. O próprio Mike afirmou, durante o concerto no Hollywood Bowl, que Chester quereria que ele, o resto da banda, os fãs, se divertissem, que não estivessem sempre em baixo. Não quando existem horas e horas de vídeos de Chester fazendo palhaçadas, no YouTube.

 

E eu confesso que, com isto tudo, a última coisa que queria era que Mike perdesse essa faceta da sua personalidade. A faceta que se ria (e Mike é daquelas pessoas que se ri com a cara toda) quando o Chester fazia uma das suas; que ficou atónita quando, durante o concerto no Hollywood Bowl, o público cantou durante o vídeo dos Unicorns and Lollipops; que ainda hoje é conhecido por #trollnoda; que faz coisas destas.

 

Em Ghosts dá, então, para ver essa faceta – sobretudo no videoclipe. Foi o próprio Mike a produzi-lo. O protagonista é uma meia-fantoche, chamada Boris, acompanhado pela sua namorada (?), Miss Oatmeal.

 

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A música em si é bem menos pesada que a maioria de Post-Traumatic, mas  não é assim tão leve como parece. Ghosts fala sobre o lado sobrenatural da vida: sonhos, dejá-vus, coisas que vislumbramos pelo canto do olho e que desaparecem quando olhamos diretamente. Depois de uma perda como a de Chester, terão vindo muitas pessoas ter com Mike, falando-lhe destes aspetos mais surrealistas da vida.

 

 No que toca a estas coisas, Mike diz ter uma mente aberta, mas que nunca teve nenhum contacto direto com o sobrenatural – tirando uma experiência com uma médium, que lhe disse onde poderia encontrar um certo objeto.

 

Eu confesso que, no que toca a estas coisas, me inclino mais para o cético. Não digo preto no branco que não existe, mas sou uma mulher de ciência: tendo a acreditar no que é palpável, no que se pode provar sem contestação. No que toca a estes fenómenos, na minha opinião, muitos deles poderão ser manifestações do subconsciente.

 

Mas, lá está, compreendo o apelo, sobretudo se estivermos a falar de entes queridos. Além de que, como diria Albus Dumbledore, só porque ocorre nas nossas cabeças, não significa que não seja real. Como li algures no Twitter, estes fenómenos serão tão reais quanto uma pessoa necessite que sejam – desde que, claro, como também diria Dumbledore, não nos percamos em fantasias e nos alheemos por completo do presente.

 

 

O que nos leva, de novo, à letra de Ghosts. Nesta, os fenómenos sobrenaturais são retratados como uma fonte de consolo, um mundo para onde Mike foge durante a noite. Não existem referências diretas a Chester em parte nenhuma desta canção, nem Mike falou dele a propósito de Ghosts, tanto quanto sei. Mas é possível que Mike interprete estas manifestações como sinais enviados pelo amigo. É possível que ele encontre algum consolo nisso, na “presença” do amigo.

 

Não me interpretem mal, isto são apenas especulações minhas. Não acredito que Mike alguma vez confirme esta minha teoria – o que é compreensível.

 

No que toca a estas coisas do sobrenatural, gosto muito mais deste lado agridoce do que da faceta assustadora. O mundo real assusta muito mais, sobretudo os seres humanos, não precisamos de inventar coisas sobrenaturais para nos assustarem. É por isso que não acho piada quase nenhuma ao Dia das Bruxas.

 

Mas estou a desviar-me.

 

I.O.U. é a faixa de que menos gosto em Post Traumatic. Não porque seja má, antes porque não faz muito o meu estilo: um tema puramente hip-hop, com muito “braggadocio”, que Mike terá composto a pensar em Fort Minor. Tenho vindo a descobrir que não gosto assim tanto desse estilo musical.

 

 

Não que não aprecie nada em I.O.U. – por exemplo, gosto imenso dos versos “Used to be the quiet kid in the sandbox, now it’s ‘hands up’ everytime that your man rocks”

 

Our man, o nosso homem. O nosso Mike. Ah ah!

 

Segundo o próprio, os amigo de Mike terão ficado descansados quando o ouviram a disparatar (a expressão que ele usou foi “talking shit”) numa música de rap. Era sinal de que ele estava a recuperar, a voltar a ser o Mike que conheciam e adoravam. Por isso é que não me queixo. Mais uma vez, se isso o fizer feliz…

 

Mas continuo a preferir rap/hip-hop temperado com outros estilos musicais, como em Post Traumatic e em quase toda a discografia dos Linkin Park.

 

 

Um exemplo disso é Running From My Shadow – uma música com a participação de grandson, com um estilo que é um denominador comum à maioria de Post Traumatic.

 

A letra fala sobre, bem, fugir da própria sombra: negração, procrastinação, empurrar problemas com a barriga, ciclos viciosos. Segundo Mike, Running From My Shadow não fala sobre uma situação específica, antes sobre uma infinidade de momentos diferentes, um padrão na sua vida.

 

Confesso que também tenho esse defeito, até certo ponto: complicando questões que poderia ter resolvido de maneira simples se as tivesse encarado como uma mulher adulta, boicotando-me a mim mesma, como reza Caught in the Middle. Já fui pior.

 

Destaco o verso de grandson, que resume bem a mensagem da canção: “Running from my shadow, now my shadow is my only friend!”. Se continuamos sempre a adiar, a adiar, um dia a batata quente explode-nos nas mãos. E não há ninguém que possamos culpar ou a quem recorrer senão a nós mesmos.

 

 

World’s on Fire tem uma sonoridade interessante. Começa minimalista e assim se mantém até ao primeiro refrão. Ganha, depois, alguns elementos eletrónicos que fazem lembrar Robot Boy.

 

Quando falámos sobre o vídeo de Nothing Makes Sense Anymore, comentámos que este parece comparar o que aconteceu à vida de Mike com os incêndios na Califórnia, no final de 2017. A letra de World’s on Fire também pega nessa metáfora – desta vez para dizer, em suma, “when the world’s on fire, all I need is you”. “

 

You” é quase de certeza a esposa de Mike, Anna Shinoda, talvez também os seus filhos. Numa altura em que, como temos assinalado várias vezes neste texto, uma parte do mundo de Mike ardeu, Anna terá sido o seu porto de abrigo, o seu consolo, quem o impediu de ir completamente abaixo. Mesmo que Mike perca tudo, só precisa dela para sobreviver.

 

E tem razão. Por muito que se fale, que se escreva, o que mais importa são as pessoas. O resto é irrelevante.

 

Por outro lado, tenho vindo a reparar que o refrão de World’s On Fire parece ter sido composto a pensar na voz de Chester – não tanto a melodia principal, mais os backvocals mais agudos. Fazem lembrar algumas canções dos Linkin Park, como por exemplo Waiting for the End ou Rebellion, em que as vozes dos dois harmonizavam, com Chester cantando as melodias mais agudas, regra geral. Não me custa imaginá-lo fazendo o mesmo nesta canção.

 

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Não sei se Mike se apercebe disto, se o seu subconsciente ainda está habituado a compôr para a voz de Chester, se esse hábito vai desaparecer com o tempo. Faz parte do processo, suponho eu.

 

Chegamos, finalmente, a Can’t Hear You Now, uma das minhas preferidas. Sendo este um álbum muito autobiográfico, com uma tracklist ordenada de forma mais ou menos cronológica, não surpreende que esta, a última faixa, seja uma das músicas mais animadoras e esperançosas. Não deixa, no entanto, de manter um certo grau de sarcasmo e melancolia.

 

Em Can’t Hear You Now, vemos um Mike mais confiante em si próprio – não com “braggadaccio”, como noutras músicas, algo mais genuíno. Admite que ainda tem dias maus, de vez em quando, que por vezes sente o controlo a fugir-lhe. No entanto, está numa fase bem melhor, no geral. Na maior parte do tempo consegue ignorar os seus demónios, as suas inseguranças, bloquear a sua influência.

 

Em Watching As I fall, Mike dizia que queria fugir precisamente a essas vozes – “Maybe I’m just falling to get somewhere they won’t”. Em Can’t Hear you Now, vemos que ele conseguiu.

 

 

Um dos motivos pelos quais gosto tanto de Can’t Hear You Now é por saber que, pelo menos no momento descrito pela canção, Mike está numa fase menos infeliz. Sinto pena quando o CD reinicia automaticamente no meu carro, regressando a A Place to Start.

 

Também gosto porque me identifico com ela. A minha vida não tem sido, nem de longe nem de perto, tão má como o 2017 de Mike, mas também sinto que estou num período melhor em relação ao ano passado. Tenho os meus dias maus, claro (demasiados), tenho as minhas neuroses, mas hoje tenho uma segurança e uma confiança em mim mesma que não tinha há anos – se é que alguma vez a tive.

 

Mas estou a desviar-me. Outra vez.

 

Alguns de vocês devem andar a perguntar por Looking for an Answer. Mike disse numa entrevista que a deixou de fora porque não se encaixava no ritmo do álbum – e eu acho que ele tem razão.

 

Não sei se Mike está a guardar Looking for an Answer para um, ainda hipotético, futuro álbum dos Linkin Park ou outro projeto qualquer. Pode ser até que ele nunca chegue a gravá-la. Talvez Mike não queira regressar ao momento em que compôs a canção (ele admitiu, em entrevista recente, que não lhe é fácil cantar músicas como A Place to Start e partes de Over Again). Talvez ele queira que seja uma faixa exclusiva do concerto por Chester.

 

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Para ser sincera, a ausência de Looking for an Answer não me incomoda. Estou bastante satisfeita com Post Traumatic tal como está.

 

A maior força deste álbum é o facto de ser tão pessoal, tão honesto – fazendo-me ignorar certos aspetos que, noutras circunstâncias, me incomodariam muito mais. Como, por exemplo, alguns efeitos na voz de Mike e o “braggadocio”. Conforme tenho referido várias vezes ao longo dos anos neste blogue, música assim tem muito mais valor.

 

É nesta parte que costumo fazer uma atualização sobre a maneira como tenho lidado com a morte do chester. Não que muitos de vocês se ralem, penso eu, mas escrever sobre isso, no texto de fim de ano e na análise às primeiras músicas de Post Traumatic, ajudou-me, na altura. Por isso, tenham paciência, vão ter de me aturar.

 

Até há cerca de mês e meio, estava mais ou menos da mesma maneira que em abril: melhor que em 2017, com altos e baixos. Momentos em que ainda não acreditava que aconteceu mesmo, vídeos antigos de bastidores que me davam – ainda dão – vontade de rir e chorar ao mesmo tempo.

 

No entanto, tive uns dias maus em finais de outubro – mais especificamente no aniversário do concerto por Chester. Estava a rever partes do vídeo no YouTube. A certa altura, cheguei à parte do discurso de Chester no último concerto que deu em vida. E fui-me abaixo.

 

 

Naquele dia tinha havido (mais) um tiroteio nos Estados Unidos – com motivações anti-semíticas. No dia seguinte, Jair Bolsonaro ganharia as eleições no Brasil. Nessa altura, eu só pensava que Chester tinha morrido menos de duas semanas depois de fazer aquele discurso – um discurso que ele fez para tentar consertar o mundo, no rescaldo do atentado em Manchester. E desde julho de 2017 só via – ou melhor, só vejo – o mundo deteriorando-se cada vez mais.

 

Onde está a justiça nisto? Quem permite que isto aconteça? Que entidade superior achou por bem tirar-nos Chester, deixando-nos a braços com um mundo cheio de energúmenos?

 

Demorei uns dias a sair desta. Uma das coisas que me salvou deste estado de espírito foram palavras de Mike. Ele tem andado em digressão para promover Post Traumatic. Não passou por Portugal e, infelizmente, tão cedo não deverá fazê-lo.

 

Tenho, mesmo assim, evitado ao máximo spoilers dos concertos, mas sei que estes têm incluído um momento de homenagem a Chester, na forma de In the End – com o público cantando as partes que não o rap. Antes dessa música, Mike costuma falar um bocadinho sobre o amigo que perdeu e tudo o que se tem passado desde aí. Numa das vezes, disse que uma das coisas que queria fazer com esta digressão era deixar os fãs exprimirem as suas emoções em relação a Chester.

 

 

Eu fiquei sem palavras. Mike não tinha de fazer isto. Ele tinha todo o direito de ignorar-nos, de dizer que a nossa dor não era nada comparada com a dele, da família e amigos próximos de Chester – e não é, nunca tive ilusões disso.

 

Em vez disso, Mike virou o microfone para nós, deu-nos espaço para sentirmos o que tínhamos a sentir, exprimirmos o que tínhamos a exprimir. Nós não merecemos Mike, tal como não merecíamos Chester.

 

E no entanto é essa a questão. É isso que Chester faria, é isso que Chester quereria que Mike fizesse. Afinal de contas, Chester teve uma vida muito mais difícil que muitos de nós, sofreu muito mais que muitos de nós. E em vez de se tornar uma pessoa cínica, amarga e misantrópica, tornou-se o completo oposto disso: um homem gentil, divertido, que adorava os seus fãs, que distribuía alegria, que tentou quase até ao fim da sua vida fazer deste mundo um lugar melhor.

 

Ele escolheu ser assim, ele escolheu ser melhor. Escolheu tratar bem um mundo que não o merecia – embora não tenha sido capaz de tratar bem a si mesmo.

 

É isto que significa a hashtag #MakeChesterProud (demorei mais de um ano a percebê-lo), o movimento que Mike começou e que ele e outras pessoas próximas de Chester têm conduzido. Escolhermos ser melhores, apesar da nossa dor, cuidarmos uns dos outros como de nós mesmos, agarrarmos todos os momentos de felicidade que encontrarmos, virarmos as costas ao ódio, à intolerância, à toxicidade. Se não pudermos consertar o mundo inteiro, consertarmos o que está ao nosso alcance.

 

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Eu quero pelo menos tentá-lo.

 

Isto ficou um bocadinho lamechas, admito-o, mas eu precisava de escrever isto. Tenham paciência comigo, ainda estou a aprender a lidar com este mundo, com esta vida. Conforme escrevi no texto anterior, estes últimos anos não foram fáceis para ninguém. Consola-me um bocadinho saber que estamos no mesmo barco, de certa forma, que estamos todos a fazer o que podemos para, lá está, mantermos a cabeça à tona da água.

 

 

Estive várias semanas sem publicar – este texto demorou-me mais do que estava à espera – mas tão cedo não tenciono fazer um hiato tão grande. Estou já a trabalhar nos meus textos habituais de fim de ano, tenho uma entrada de Músicas Ao Calhas planeada e respostas a uma tag.

 

Em todo o caso, como sempre, obrigada pela vossa paciência.

 

Música de 2012 #2

Para além de Guardian, duas músicas que me marcaram o ano que termina são do âmbito, não deste blogue, mas do meu outro, sobre a Seleção Nacional. Isto por serem hinos de apoio à Equipa de Todos Nós, lançados a propósito do Euro 2012 - o melhor período deste ano para mim. As músicas em questão são o "Hino da Seleção 2012" de Paulo Lima e o tema "Portugal Is All In" composto pela Adidas. A primeira por, entre outros motivos, me recordar um dos meus melhores dias de 2012. A segunda é um grande guilty pleasure. Mais pormenores no meu blogue O Meu Clube É a Seleção!, em particular nestas entradas AQUI e AQUI.
 

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No entanto, em termos musicais, para mim, 2012 pertenceu aos Linkin Park. Cortesia do concerto que eles deram no Rock in Rio e do álbum que lançaram, Living Things. Sei que já fiz a crítica a esse álbum (podem lê-la AQUI) mas essa foi escrita pouco após tê-lo ouvido as músicas pela primeira vez, são apenas as primeiras impressões. Com o tempo, com o lançamento dos videoclipes, das versões instrumentais, entre outras coisas, as músicas foram ganhando significados diferentes.

 
Os singles Burn It Down, Lost in The Echo, Castle Of Glass e Powerless continuam a ser as minhas músicas preferidas. É curioso, os Linkin Park costumam escolher para single as músicas de que mais gosto. Isso já tinha acontecido com A Thousand Suns mas nunca acontece com os álbums da Avril Lavigne... Talvez tenha uma queda para as faixas mais rentáveis comercialmente dos Linkin Park. Contudo, no caso de Living Things, acredito firmemente que, independentemente do potencial comercial, os singles lançados até agora são as músicas mais fortes do álbum.

 

"Let the sun fade out and another one rise
Climbing through tomorrow"


Dizem que o próximo single será I'll Be Gone. Não acho que seja má escolha. E mesmo que fosse, os quatro primeiros singles são suficientemente bons para compensá-lo. I'll Be Gone não é das mais marcantes de Living Things, na minha opinião, mas não deixa de ser uma faixa interessante. Como já tinha afirmado na crítica ao Living Things, I'll Be Gone é uma faixa pós-apocalíptica, de tom melancólico. Faz-me recordar um pouco a música Goodbye, de Avril Lavigne. Ambas as músicas falam sobre a necessidade de partir de modo a encerrar um capítulo e a abrir um novo - embora o sentimento seja diferente. Em I'll Be Gone há uma amargura de derrotado, de pessoa que perdeu tudo e se vê obrigada a desistir.

 

"I watched you fall apart and chased you to the end
I'm left with emptiness that words cannot defend
You'll never know what I became because of you..."

Powerless assemelha-se a I'll Be Gone em termos de sentimento, podendo mesmo servir de prelúdio à segunda. O assunto da letra é típico Linkin Park: desilusão, traição, impotência. O ponto forte da faixa é mesmo a parte musical: a introdução Tinfoil, o piano, a bateria forte, os vocais que se perdem na música após o segundo e o terceiro refrão, dando grande emotividade à faixa e mesmo um carácter épico.


"I can't fall back, I came too far
Hold myself up and love my scars"

O segundo single de Living Things com direito a videoclipe é a faixa que abre - primorosamente - o álbum: Lost in The Echo. Para além daquilo que referi na primeira crítica de Living Things, um dos seus pontos fortes é a letra: poderosa, desafiadora, cheia de personalidade - embora uma significativa parte disso venha da interpretação de Mike Shinoda, para mim o melhor rapper do Mundo. Tem vários versos marcantes, frequentemente citados por mim e pela minha irmã: "Test my will, test my heart" "Ya'll go hard, I'll go smart" e em particular "Hold myself up and love my scars". Acaba por ilustrar uma situação marcante do meu segundo livro, "O Tsunami", assemelhando-se, nesse aspeto, a Faster, dos Within Temptation.

Estava bastante curiosa relativamente ao videoclipe mas este acabou por ser dececionante. Estava à espera de algo mais dinâmico, com mais história. Já sairia beneficiado se pelo menos incluísse imagens da banda interpretando a música. Mas admito que teve a sua graça ver pessoas chorando e gritando perante uma foto minha em biquíni.

 

"Bring me home in a blinding dream
Through the secrets that I have seen..."

Outra faixa marcante este ano foi Castle Of Glass. Como já afirmei na primeira crítica, esta música tem um efeito engraçado: fala sobre vulnerabilidade, pede cura e consolo após uma dura batalha mas, ao mesmo tempo, o seu tom etéreo é reconfortante por si só - esse efeito acentua-se na versão usada no videoclipe. Uma entrevistadora disse o mesmo há uns tempos. Sei que estou a repetir-me mas sim, também serve de banda sonora à minha história. Neste caso, ao episódio do terceiro livro em que estava a trabalhar aquando do lançamento de Living Things.


Esta música teve, finalmente, um videoclipe à altura da qualidade de Living Things. Embora, inicialmente, não tenha achado muita piada à associação da música a um videojogo, o Medal Of Honor Warfighter. Foi uma das coisas de que menos gostei neste regresso dos Linkin Park, a parte da publicidade. Começando pela Honda Civic Tour e terminando em só lançarem o vídeo de Castle Of Glass após não sei quantos downloads do jogo.

Já me disseram, contudo, que a Honda Civic Tour é algo que várias bandas fazem de vez em quando, que depois é lançado um carro criado pelos artistas. Não é tão mau como pensei à primeira, mas... Mesmo a parte dos videojogos acaba por ter razão de ser. Eu mesma já colhi inspiração a videojogos, direta ou indiretamente - destaque para o Pokémon - e não me admirava se os Linkin Park tivessem feito o mesmo - parece que o Chester gosta de videojogos... Acho, apenas, que uma música estilo Lost in the Echo seria mais adequada.


"So when you fall, I'll take my turn
And fan the flames as your blazes burn"

No entanto, a música de 2012 foi Burn It Down. Não há volta a dar, nenhuma outra música teve neste ano o impacto que o primeiro single de Living Things teve. Afirmei, anteriormente, que o impacto não seria muito diferente se Lost In The Echo ou Castle Of Glass tivessem sido escolhidas como introdução ao álbum - agora não tenho tanta certeza disso pois a música tem vários motivos que a tornam especial, para além do facto de ter sido o primeiro single.

Um deles, já foi mencionado na primeira crítica: por ilustrar um episódio importante do meu segundo livro. Outro tem a ver com o AMV (anime music video, ou seja, videoclipe de anime) do Pokémon que montei poucos dias após o lançamento do single. É algo que faço há alguns anos, montagens de vídeo para o YouTube e fui ganhando jeito com a prática. Para além da parte do conceito do fogo, o terceiro verso descreve um pouco o início do primeiro filme do Pokémon, a história de Mewtwo e Geovanni. Modéstia à parte, acho que o meu AMV ficou melhor que o videoclipe oficial, mais porque este último não faz justiça à música. Mas vejam por vocês:


Burn It Down tem, além disso, uma energia incrível, poderosa e contagiosa, do início ao fim. Começando pela sequência de notas que abre e fecha a música, passando pelas fortes batidas, pelos acordes de guitarra, a melodia fortíssima. O rap do Mike está também bem conseguido, relativamente pausado, tornando-se fácil de acompanhar e decorar (o que não acontece, por exemplo, em Lost In The Echo. Estou sempre a trocar-me toda...) sem deixar de ter grande atitude. Sempre que passa na rádio, e não têm sido poucas vezes - foi até a quarta mais votada na Rádio Comercial em 2012 - eu e a minha irmã aumentamos o volume e cantamos. Já lhe disse que, um dia, temos as duas de cantá-la num karaoke.



Todo o álbum é extraordinário. Poderoso, contagiante e francamente inspirador. Mais de metade das músicas serão citadas nos meus livros, o que o torna, para mim, um álbum imortal.

Ouvir um CD novo de um artista ou banda é como ler uma sequela de um livro - quando lemos de novo o(s) antecessor(es), vemo-lo sob uma nova perspetiva, reparamos em coisas em que não tínhamos reparado antes, ou melhor, ganham novo significado. Foi o que aconteceu com os álbuns antigos dos Linkin Park, redescobri músicas que já conhecia. Gosto particularmente de Hybrid Theory, da energia das músicas, apesar de serem muito parecidas umas com as outras. Esse e o Living Things são, na minha opinião, os melhores dos Linkin Park.

 

Descobri, também, que os elementos da banda são divertidos, surpreendentemente divertidos tendo em conta a música que criam e interpretam. O Mike é o meu favorito, embora o Chester também seja engraçado. A minha irmã costumava ter medo dele - ele no concerto do Rock in Rio estava um bocado assustador, suando em cascata, fazendo cara de mau - mas isso passou-lhe depois de vê-lo cantando enquanto saltava à corda...
 

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Em 2013, deverão sair muitos bons álbuns. Os Paramore já anunciaram o deles para abril. Foi batizado com o mesmo nome da banda - mais pormenores numa eventual crítica ao álbum - e o single Now deve ser lançado em breve. A Avril Lavigne supostamente já acabou as gravações há umas semanas, ou mesmo há uns meses, mas ainda não anunciou o seu quinto álbum, o que está a levar-nos a nós, os fãs, à loucura. Mas em princípio sairá em 2013. O Bryan Adams tem dado a entender que se encontra em estúdio, trabalhando num álbum novo - a ser verdade, será o primeiro álbum de estúdio a ser lançado desde 11, de 2008. E visto que, trinta anos de carreira e não sei quantas músicas mais tarde, ele ainda consegue tocar-me quando descubro uma ou outra música antiga que ainda não conhecia, estou também ansiosa por esse álbum. Por fim, diz-se que os Within Temptation também devem editar um disco em 2013.
 
Como se pode ver, não deverá faltar música de qualidade no ano que começou há menos de uma hora. Para me dar inspiração ou, pura e simplesmente, para nos alegrar os dias. Não deixarei de falar aqui no blogue sobre os singles e álbuns que forem saindo. Bem como de séries que estiver a ver - tenho já uma ou duas entradas planeadas sobre esse assunto -  de livros, de filmes, enfim, o que me der na gana.
 
Deixo, por isso, os meus votos de um bom ano, boas músicas, boas séries, bons livros, bons filmes, enfim, tudo de bom. Feliz 2013!
 

 

Linkin Park - Living Things (2012)

 

 
Começo, desde já, por falar sobre o último CD que ouvi. Esta crítica já tinha sido publicada no Fórum Avril Portugal.
 
Os Linkin Park são há já vários anos uma das minhas bandas preferidas. Não só por, obviamente, gostar da música deles, mas também por causa do inesquecível concerto do Rock in Rio de 2008. Esse concerto, a química que conseguiram manter com o público - tal como voltou a acontecer no RiR de 2012 - fizeram com que me apaixonasse pela banda. Atrevo-me a dizer que é a minha banda preferida, mais porque, pelo carinho que demonstraram para com os fãs nestes concertos, simpatizo particularmente com os vocalistas Chester Bennington e Mike Shinoda - algo que não acontece, ou melhor, acontece em menor escala com outras bandas de que gosto: Sum 41, Paramore, Green Day, Within Temptation, Simple Plan...
 
O grupo californiano sempre teve um estilo único, muito claro nos seus dois primeiros álbuns, Hybrid Theory e Meteora. Agrada-me a mistura de rock alternativo, nu-metal (o que quer que isso seja...), rap e um ou outro elemento eletrónico - sobretudo porque eu não sou grande apreciadora de rap cru, só com batida, sem acompanhamento musical. Parece que isto é um processo que ocorre naturalmente na banda. Cada um mete os elementos de que gosta nas músicas, criando um som que não é possível rotular sem ser como "Linkin Park".
 
Não sou daqueles fãs mais hardcore, que conheceram a banda com Hybrid Theory e/ou Meteora, se agarraram àquele estilo e ofenderam-se quando os Linkin Park quiseram experimentar coisas diferentes. Já conhecia músicas como Breaking The Habbit e Numb antes de Minutes to Midnight mas foi com esse CD que me tornei fã. As minhas favoritas eram músicas como In The End, Numb, Leave Out All The Rest, demorei algum tempo a aprender a gostar das faixas mais pesadas, como Place For My Head e Faint. Por isso, não me tem incomodado tanto como, se calhar, tem incomodado outros fãs mais puritanos, eles explorarem outros estilos musicais. Eu, aliás, gosto de alguma variedade nestas coisas. Mas já lá vamos. 
 
Os dois primeiros álbuns são bastante homogéneos, tornando-se um pouco repetitivos em certas alturas. A fórmula é quase sempre a mesma: guitarra elétrica, um ou outro elemento eletrónico, vocais de Chester Bennington, às vezes apimentados com os seus icónicos gritos, o rap de Mike Shinoda. 
 
Em Minutes do Midnight nota-se alguma evolução. Algumas faixas repetem a velha fórmula, noutras há abertura a sons diferentes, a emoções diferentes. Como em Leave Out All The Rest. Em 2008, o Mike disse que achava que esta era a melhor faixa que eles haviam composto até à altura. Hoje, dois álbuns mais tarde, ainda acho que é uma das melhores deles.
 
A Thousand Suns é, na minha opinião, o álbum menos conseguido da banda. Percebe-se que eles queriam experimentar coisas novas, é de louvar essa atitude, e a sonoridade está de acordo com as tendências da altura. No entanto, neste, de alguma forma, perderam-se no processo. Tirando The Catalyst - abusa do auto-tune mas é incrivelmente contagiante - e Waiting For The End to come, as músicas são bastante insonsas. Não me interpretem mal, não são más mas não cativam verdadeiramente, não viciam, não têm alma.
 
 

 

 
Ora, Mike afirmou que Living Things, o mais recente álbum da banda, editado há poucas semanas, nunca teria sido concebido se não fosse cada um dos quatro álbuns anteriores, que o quinto disco assenta no passado dos Linkin Park e projeta-se para o futuro. É o que, de facto, acontece em Living Things: a sonoridade é atual, moderna, com elementos da música urbana, à semelhança de A Thousand Suns - com a diferença de que não são deixados de fora os elementos mais clássicos dos Linkin Park - guitarras elétricas pesadas, nu-metal, a antiga fórmula - nem as emoções de Minutes to Midnight. O resultado é um som poderoso e... espetacular. As músicas seguem-se umas às outras a uma velocidade vertiginosa. Quando damos por ela, o CD já acabou.
 
As três primeiras faixas do disco são um bom exemplo desta nova sonoridade híbrida: teclados contagiantes, batidas poderosas, letras com a atitude in-your-face de músicas como Bleed It Out e New Divide, energia incrível.
 
                                           
 
 
Especificando, Lost in The Echo, que será o próximo single com direito a videoclipe, abre o CD de forma especular com aquela introdução contagiante, o rap enérgico de Mike, cheio de personalidade e, no final, a alternância entre os "Go" cantados e os "Go" gritados. 
 
In My Remains lembra um pouco o material mais antigo da banda, embora também inclua elementos mais recentes. O terceiro verso que se prolonga até aos refrões finais está muito bem metido, dá vontade de nos juntarmos ao coro. 
 
 
 
Burn It Down foi o primeiro single e tem estado, há várias semanas, entre as minhas músicas preferidas. Tal como as duas anteriores, tem batidas poderosas, atitude e energia à New Divide. A letra, à volta do conceito do fogo - recordando-me músicas como  Iron, dos Within Temptation, e Into the Fire, de Bryan Adams -  é particularmente interessante para mim, por causa dos meus livros. Sobretudo, porque refletirão muito bem um momento particular daquele que, em príncipio, será a sequela de "O Sobrevivente".
 
 
 
O álbum outras músicas mais pesadas, de que não gosto tanto. Tirando Victimized, abusaram um pouco do auto-tune e efeitos semelhantes. Until it Breaks, então, é a faixa de que menos gosto neste álbum - embora tenha gostado de ouvir os vocais de Brad, o guitarrista, pela primeira vez, o resto da música ficou demasiado aleatória, sem coesão. Por outro lado, Lies Greed Misery não me agradou à primeira vez, precisamente pelo auto-tune que considero desnecessário, mas, depois de ouvi-la algumas vezes, o refrão ficou-me preso na cabeça. Agora, dou por mim cantarolando: "I want to see you choke in your lies..."
 
 
Tem, por fim, algumas baladas, recordando um pouco Minutes to Midnight: Roads Untraveled, I'll Be Gone, Castle of Glass e Powerless, com letras excelentes e tons, em geral, melancólicos, recordando músicas como Shadow Of The Day e Leave Out All The Rest. A primeira tem uma espécie de sininhos irritantes mas, à parte isso, parece uma Iridiscent aperfeiçoada, uma mensagem de consolo. Em Castle of Glass, por seu lado, pede-se consolo. A própria música é, aliás, estranhamente reconfortante. I'll Be Gone e Powerless invocam um cenário pós-apocalíptico, dominam sentimentos de desilusão, de resignação. 
 
Em suma, em Living things há um equilíbrio quase perfeito entre o que é clássico e o que é moderno no grupo oriundo da Califórnia. A sonoridade pode não ser a mesma mas não há dúvida que aquilo é Linkin Park. Os temas são os mesmos de sempre, muito emo: raiva, frustração, traição, busca por conforto, revolta, tormenta, mas também esperança. Fazem o mesmo que têm feito nos últimos doze anos: fornecem uma maneira saudável de gerir emoções negativas. No meu caso, o tom de desafio, combativo, de muito do seu material constitui, à semelhança dos Within Temptation e de algumas músicas dos Sum 41, a banda sonora perfeita para a minha escrita, para quando estou a trabalhar em cenas de ação, em que as minhas personagens estão em confronto direto com os maus da fita. 
 
Não sei dizer qual destas faixas é a minha preferida. Talvez Burn it Down, pelos motivos que já mencionei, pelo impacto que me causou. No entanto, outras músicas, como, se calhar, Lost in the Echo, Castle of Glass e Powerless teriam efeitos semelhantes caso fossem o primeiro single. Diria que estas quatro são as melhores de Living Things mas é difícil escolher.
 
Espero agora que os Linkin Park regressem em breve a Portugal para um concerto em nome próprio, em que dê para ver a energia deste álbum transportada para o palco. Não me é difícil, aliás, imaginá-los a interpretar algumas destas músicas ao vivo. Mas gostava de vê-lo com os meus próprios olhos. Ou, pura e simplesmente, ser capaz de voltar a cantar as velhas músicas em coro com milhares de pessoas.
 
Isto é como diz a minha irmã: o Justin Bieber, a Lady Gaga, os One Direction, são todos muito bonitos e tal, são grandes fenómenos, mas não demorarão a serem substituídos por outras modas. Por outro lado, músicos como os Linkin Park, a Avril Lavigne, os Coldplay, entre outros, podem nem sempre ter tanta atenção mediática, mas manterão sempre uma legião significativa de fãs, sem precisarem de artificialismos. Continuarão a fazer música de qualidade durante mais vinte, trinta ou quarenta anos, crescerão connosco.  Em suma, o primeiro grupo de músicos que mencionei serão de curta duração, os outros ainda têm vários anos de carreira pela frente. Depois, levaremos os nossos filhos aos concertos deles e contar-lhes-emos acerca daquela vez em que um tipo deixou o Chester numa posição difícil depois de lhe colocar um cachecol do F.C.Porto ao pescoço no concerto do Rock in Rio.

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